Santos de vestir da Procissão das Cinzas do Rio de Janeiro - Fisionomias da fé
Nancy Regina Mathias Rabelo
RABELO, Nancy Regina Mathias. Santos de vestir da Procissão das Cinzas do Rio de Janeiro - fisionomias da fé. 19&20, Rio de Janeiro, v. IV, n. 1, jan. 2009. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/obras/imagens_nancy.htm>. [Français]
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As virtudes morais, por estarem ligadas às emoções, devem também se relacionar à nossa natureza composta, e as virtudes morais de nossa natureza composta são humanas; por conseguinte, também são humanas a vida e a felicidade que lhe correspondem.
Aristóteles, Livro X - 8, 20
1 - A escultura processional: aspectos gerais
Um dos segmentos mais significativos da escultura religiosa são as imagens de roca e de vestir, compostas geralmente para os eventos solenes das comemorações cristãs, e intrinsecamente ligadas às vivências religiosas da comunidade. Até bem pouco tempo ignoradas pelos historiadores de arte ou subestimadas em seu valor artístico, estas imagens vêm recentemente sendo contempladas com estudos que lhes conferem a merecida dignidade, tais como os de Maria Regina Emery Quites e Adalgisa Arantes Campos, em Minas Gerais, e Maria Helena Flexor, na Bahía.
Quanto à composição técnico-estrutural, as imagens de vestir podem ser categorizadas de modo geral em três tipos[1]:
* Escultura completa - feitas em madeira ou pasta, policromadas, ou feitas em tela encolada.
* Imagens de vestir anatomizadas - os corpos são esculpidos anatomicamente e recebem uma policromia que imita uma “vestimenta de baixo.”
* Imagens de roca - são esculturas em que a parte superior do corpo do santo se sustenta sobre ripas de madeira afixadas numa base quadrada, oval ou oitavada.
Adotaremos aqui a terminologia “santo de roca” para as imagens estruturalmente compostas sobre ripas de madeira, e “santo de vestir” para as imagens articuladas, mas estruturalmente compostas em vulto, sejam feitas em madeira, tecido ou papel. Cabe considerar que todas, roca e de vestir, são articuladas e preparadas para uso de indumentária, o que nos leva a generalizá-las às vezes como imagens de vestir.
Pelo seu valor didático e persuasivo, adequado às intenções tridentinas, desde cedo estas imagens foram adotadas pelos padres catequistas entre o gentio. Referindo-se aos primórdios desta prática, assim afirmou Debret (1834/1839):
As cerimônias da religião católica, introduzidas no Brasil pelos missionários portugueses, conservaram seu caráter bárbaro, isto é, o exagero de que fora preciso revesti-las para impressionar os índios, apresentando-lhes imagens esculpidas e coloridas em gigantescas proporções. Esses missionários sentiram, com razão, que o aspecto dessas figuras humanas, seres intermediários entre o homem e a divindade, faria nascer na imaginação dos selvagens a idéia de grandeza e da força extraordinária do novo deus imposto.[2]
Nesta breve análise, sagaz na captação de sentido, Debret percebeu a importância das procissões herdadas da Espanha vindas para o Brasil através de Portugal, realizadas nos momentos culminantes do calendário litúrgico. Sobretudo reconheceu a força das imagens, personagens chave dos rituais processionais, cuja força persuasiva e capacidade de impressionar o âmbito afetivo, foram qualidades das quais se prevaleceram os padres missionários. Neste tempo, as procissões realizavam-se dentro do espírito catequético, não descartando ajuda de leigos fervorosos. Os engenhosos jesuítas punham em prática as técnicas teatrais: aos efeitos visuais da procissão juntavam-se os exemplos e recursos de som e luz, conforme descreveu o padre jesuíta Manoel da Nóbrega[3], em carta de 1559:
Na semana Santa me fui para esta igreja de São Paulo para ahi fazermos os ofícios deste tempo [...]. Fizemos a procissão de Ramos mui solemne e todos os mais officios das Trevas[4] e encerramos o Senhor, porque Simão da Gama tomou por sua devoção cuidado de a armar muito bem e de acompanhar o Senhor com toda sua casa e criados; mas o que aconteceu em a noite de Trevas é muito para louvar ao Senhor porque, quando vão ao Miserere mei Deus[5], que se diz por derradeiro, os Irmãos disciplinaram-se todos, quando o diziam às escuras; os Índios que da Paixão de Nosso Senhor já tinham alguma notícia, irruit spirituss Domini in eis[6], e movidos de grande compunção se davam bofetadas mui asperamente, derramando muitas lágrimas, segundo soube de todos os Christãos brancos que na Igreja estavam.
As Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahía[7] referem-se às procissões como “uma oração pública feita a Deus por um comum ajuntamento de fiéis disposto em certa ordem, que vai de um lugar sagrado ao outro lugar sagrado.” Afirma que se trata de uma tradição tão antiga, que seu uso remonta ao tempo dos Apóstolos. No entanto, dentro do espírito de exaltação e glória promovido pelos romanos ao imperador, sabe-se que realizavam procissões solenes dirigidas pelo próprio imperador exaltando os feitos de proeza. A igreja católica se apropriou da prática pagã[8], conferindo um sentido religioso
A imaginária processional teve a sua melhor tradução na Espanha, de onde se passou a Portugal, e por extensão, tornou-se amplamente popular no Brasil até finais do século XIX. Suas características apropriadas aos eventos públicos de rua eram compatíveis às idéias e propósitos da contra-reforma, e correspondiam ao desejo de estreitar a distância entre o humano e o divino, dando às imagens a aparência real[9]. Segundo Werner Weisbach (1948)[10], “após a Reforma, o catolicismo viu-se obrigado a satisfazer as massas, acolhendo e favorecendo seus interesses materialistas”. O elemento retórico, estimulante, excitante, foi aceito e adotado nas concepções artísticas, com a inclusão de materiais e valores mundanos, em que houve uma tolerância ao luxo desmedido. As festas proporcionavam às associações laicas oportunidades de demonstrações públicas de riqueza, a pretexto da fé.
O antigo hábito de realizar procissões evoluiu ao longo do tempo, passando do sentido puramente espiritual da igreja quinhentista, severa, para assumir nuance profana sob patrocínio laico atingindo grandiosidade compatível com a estética barroca, que no início do século XVIII já promovia obras suntuosas, como foi o exemplo citado por Frei Agostinho de Santa Maria[11] referindo-se à Igreja de Nossa Senhora da Candelária: “[...] tem muytas Capellas, & todas com o ornato de ricos retabolos dourados, & quase todas tem Confrarias, que com muita devoção se empregão nas suas festividades, o que fazem com grande fervor & muita despeza” [grifo nosso]. Exemplo típico em Minas Gerais foi o Triunfo Eucarístico, comemoração ocorrida em Vila Rica, que Ávila (1994, p. 33) definiu como “uma festa mais de regozijo dos sentidos que propriamente comprazimento espiritual.”[12] Abundaram, neste contexto, os recursos plásticos e cenográficos de riqueza e luxo, a pretexto de exaltação aos valores divinos.
Na dinâmica dos espetáculos religiosos pelas ruas, os irmãos das confrarias, ordens e irmandades, investiam grandes somas, as senhoras esmeravam-se em ricos bordados a ouro para os tecidos da festa, e os homens dedicavam-se à administração e realização do evento, esforços que eram recompensados pelo reconhecimento social que isto lhes trazia.
As imagens de vestir inseriam-se no meio deste aparato cenográfico luxuoso, pensadas e feitas para participar da pompa que a ocasião exigia. Portanto, não se tratam de objetos “mal acabados”, ou feitos de forma econômica, menos dispendiosas do que as tradicionais imagens de vulto. Os santos de vestir são esculturas muitas vezes finamente acabadas, projetadas para o acréscimo decorativo que lhes seriam apostos; não são pensadas finitas na forma imediata que lhes é conferida, mas posteriormente integradas aos tecidos, jóias, perucas, adereços e todo o aparato que lhes será acrescido. A estrutura de que se constituem são na verdade um suporte para as vestes que serão colocadas, com a vantagem de torná-las mais leves, aliviando o peso e o esforço daqueles que carregam seus andores. Isto em nada diminuía o empenho na representação das formas aparentes. Pelo contrário, nas imagens estudadas observamos que as partes visíveis da escultura - mãos, rosto e eventualmente pés, esmeram-se os recursos expressivos, qualidades anatômicas e carnação delicada. Não menos engenhosas e preciosistas eram as soluções das articulações, feitas para dar movimento e facilitar a vestimenta do santo, que por vezes resistiram a centenas de anos.
É importante não se perder de vista que estas imagens faziam parte de um espetáculo artístico efêmero de forte comoção, que, finito numa duração temporal, deixaria impregnada uma impressão comovente e transformadora no fiel. De todo o material utilizado, os mais duráveis eram as imagens e os andores, sendo tudo o mais composto de materiais perecíveis, tais como tecidos, cera colorida, papel. A análise isolada das imagens de vestir, sem contextualizá-las ao espetáculo do qual faziam parte não apenas empobrece, com também não dá a correta dimensão de seu papel religioso e artístico.
Como espetáculos públicos, estas procissões tinham um perfil eminentemente urbano. As localidades onde ocorriam possuíam um perfil populacional significativo, e para a instituição de ordens terceiras eram incorporados membros de poder aquisitivo e expressão social. Muitos personagens da cidade estavam envolvidos em sua organização, e nesta hora, em reverência ao Divino, toda a população se envolvia de forma ativa ou passiva, cabendo aos nobres e dignitários os papéis principais de coadjuvantes deste teatro sacro, já que os protagonistas eram os próprios santos. O percurso empreendido transformava o espaço da cidade em palco, propiciando a ação, e conseqüentemente, a vivência. O fiel conduzia não apenas a imagem, mas o próprio corpo através das ruas, entoando cantos, participando teatralmente do “Encontro” ou do percurso da paixão. É a forma mais completa da estética barroca, em que submerge dramaticamente o espectador na realidade do mistério, fazendo uso de todos os sentidos.
A integração do santo e do fiel neste drama intensificava a emoção participativa, pois além da identificação física pelo tamanho, cabeleira e vestes, o cenário era real, transpondo o que era antes lugar visível na imaginação, em lugar vivenciado, envolvendo inteiramente os sentidos.
Os santos mais comuns entre as imagens de vestir são os processionais, sobretudo ligados ao culto da Paixão, como o Cristo, Nossa Senhora das Dores e o Senhor Morto[13], e os da Procissão das Cinzas. No entanto, encontram-se outras imagens, ligadas ao fervor das irmandades que homenageavam os oragos nos seus dias festivos. Em Itaboraí, município que conheceu grande desenvolvimento nas primeiras décadas do século XIX, havia sido instituído um teatro desde o final do século XVIII, que deu grande impulso às artes locais. Ali encontramos na igreja matriz de São João Batista uma Santa Cecília de vestir, protetora dos músicos e artistas [Figura 1].
O uso de imagens de vestir não é unicamente processional. A Irmandade de Nossa Senhora da Glória existente na Igreja do outeiro do mesmo nome no Rio de Janeiro, mantém em seu retábulo principal de orago uma santa de roca [Figura 2], que no dia 15 de agosto - dia da Assunção de Nossa Senhora, é retirada, e num ritual do qual só participam as irmãs da Ordem, trocam-lhe o vestido por outra nova e rica indumentária.
O gosto de vestir as imagens estendia-se às imagens de vulto, de forma que mesmo imagens esculpidas, douradas e policromadas, adotavam mantos, ornatos, jóias ou vestes complementares. No Santuário Mariano, referindo-se ao território da Capitania do Rio de Janeiro, Frei Agostinho de Santa Maria cita cinco imagens de roca, e duas de vestir; no entanto, registramos na obra descrições de onze imagens vestidas de seda, e dezesseis usando mantos, além de jóias e coroas.
As irmãs do Convento de Santa Tereza mantêm pequenas imagens de Menino Jesus, cujas vestes são feitas em tecido e constantemente trocadas, como um pequeno enxoval, hábito, aliás, recorrente também entre as freiras do Recolhimento de Nossa Senhora dos Humildes de Santo Amaro da Purificação[14]. O empenho de vestir o Menino Jesus estende-se também ao público laico das igrejas em geral, pois é muito comum encontrar imagens de vulto de Santo Antônio, Nossa Senhora do Carmo ou do Rosário, ou Santo Antônio de Cartagerona, com o Menino Jesus vestido com roupinha confeccionada pelos fiéis. Na sacristia da Ordem Terceira de São Francisco existe um gracioso Menino Jesus com a veste ornamentada com rico bordado a ouro e protegido em redoma de vidro [Figura 3].
2 - A Procissão das Cinzas no Rio de Janeiro
No Rio de Janeiro, os eventos religiosos processionais foram bastante populares até o final do século XIX, sendo que alguns se realizavam com imagens de vulto, e outros, com santos de roca ou de vestir. Hoje em dia, as procissões não desapareceram por completo, mas perderam a forte penetração popular e o efeito de suspensão do cotidiano dos tempos coloniais, sendo mais recorrentes nas áreas periféricas.
A realização de uma procissão era evento inadiável e imprescindível, tal a sua importância religiosa, momento solene para os fiéis. Em oito de Janeiro de 1689, o rei de Portugal comunicava ao Bispo, através de ordem régia[15], que o povo do Rio de Janeiro se queixara do prelado que não permitira realizar a Procissão do Corpo de Maria por falta de cera[16]. O séquito processional ao corpo de Nossa Senhora[17] tornou-se imensamente querido no século XVIII, reunindo representantes de todas as ordens religiosas e confrarias, num fenômeno aglutinador social católico articulado pelo santo e pela participação comum proporcionada pela procissão.
O gosto pelas imagens de vestir justificava constantes encomendas. A historiadora Marcia Bonnet, em seu estudo sobre os artistas coloniais, fez o levantamento de alguns testamentos. Bonifácio Trindade[18], um modesto pintor e escultor, ao falecer em 1815, deixou em sua oficina uma imagem do Santo Cristo, um oratório e uma Nossa Senhora do Carmo de vestir. Em outro extremo, encontrou o abastado escultor Antônio da Conceição Portugal[19], natural do Porto, que era dono de uma oficina de santeiro onde atuavam 65 escravos nas diversas especializações, sendo dez ligados à escultura, cinco pintores e doze douradores. Falecido em 1849, o artista deixou diversos objetos de trabalho e oito imagens em sua oficina, sendo uma delas uma Nossa Senhora da Conceição de vestir.
O evento que mais se destacava em importância, suntuosidade e número de imagens era a Procissão das Cinzas, que tinha sua referência modelar no Porto, onde ocorria com tamanha majestade, que “tinha nomeada dentro e fora do reino”[20]. No Rio de Janeiro era realizada pelos terceiros franciscanos na quarta-feira de Cinzas, inauguração da Quaresma, e pela diversidade de personagens do cortejo gozava de reputação que a tornava famosa e chamariz de público[21].
A Ordem, tradicionalmente composta pelos membros mais abastados e influentes da sociedade, organizava anualmente a partir de 1650 a Procissão na quarta-feira de Cinzas, anunciando o tempo da Quaresma e Penitência que se iniciava. O primeiro cortejo saiu com vinte andores, e assim se manteve até 1758, quando uma forte tempestade destruiu os objetos e alfaias[22]. Em 1850 foi reorganizada, saindo o séquito em doze andores.
Apesar de alguns equívocos cometidos por Debret[23], temos em sua descrição uma idéia de sua ordenação na cidade do Rio de Janeiro, que diferia do Porto[24], e de Minas[25].
Segundo Debret (1839, 1996, p. 373), a procissão das Cinzas acontecia na seguinte disposição: o pomposo séquito era inaugurado por oficiais, anjos e portadores de candelabros e cruzes. O primeiro andor apresentava um casal de reis. Em seguida, vinha um andor com imagens representando São Francisco com a cruz, ao lado de Cristo também com a cruz, aludindo à similaridade da vida de S. Francisco com a de Jesus Cristo. O terceiro andor trazia o conjunto da Cúria, representando a entrega da Regra de São Francisco ao papa, assistido pelos cardeais. O quarto andor trazia “um rei e uma rainha de pé”. O quinto andor exibia a imagem de Santo Antônio de Noto. Seguia-se Nossa Senhora da Conceição, a padroeira da Ordem. Logo em seguida, a imagem de Santa Margarida de Cortona, a pecadora arrependida. O andor seguinte vinha com a representação de São Francisco e o Senhor crucificado. Após este, aparecia o andor de São Roque seguido pelo de São Luís, Rei de França, e logo atrás, Santa Isabel, rainha de Portugal. O último andor, que encerrava a procissão, era a cena marcante do recebimento das chagas, em que São Francisco adora o Cristo Seráfico na cruz e dele recebe os estigmas.
O grupo de imagens de vestir que se encontra no espaço-museu, localizado à esquerda da igreja, é constituído de onze imagens processionais, incluindo o Cristo, que pertenciam ao acervo da procissão das Cinzas [Figura 4]. São obras de inestimável valor estimativo para a história da cidade e grande importância artística, embora não corresponda ao conjunto integral da procissão. Encontram-se com parte das vestes originais, falta alguns atributos e aos personagens nobres os mantos reais e primitivas coroas de ouro.
2.1 - Objetos processionais
Dos paramentos e objetos que restaram da Procissão das Cinzas estão expostos no espaço-museu dois andores [Figura 5], entalhados e inteiramente dourados, obra de Antonio de Pádua e Castro[26], que nos dá uma remota idéia da magnificência do espetáculo, de que fazia parte também o enorme frontal em tecido dividido em seis segmentos com bordados e franjas de ouro, de que Debret assim fez menção:
Esses grupos imponentes, resplendentes de tule dourado e prateado figurando nuvens e raios, muitas vezes semeados de cabeças de querubins, apresentam-se como enormes massas fixadas em estrados ricamente recobertos de veludo vermelho com galões e franjas de ouro. São carregados, conforme o peso, por quatro a seis homens em uniforme da irmandade da paróquia.[27]
Ali também está a cruz do santo padroeiro da Ordem, e os estandartes com cartelas que prenunciavam os santos processionais com escritos em latim [Figura 6]. Cada cartela, colorida suavemente e contornada com palmas, trazia uma citação da Bíblia, seguida da numeração do livro, capítulo e versículo[28].
* MIHI VIVERE CHRISTUS EST - 1º AD
PHILIPP - V 21
Para mim, viver é Cristo - Fl 1,21.
Texto: Porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é ganho.
* CHRISTI BONUS ODOR - 2º 2 N 15
Bom odor de Cristo - 2 Cor 2,15
Texto: Porque para Deus somos o bom perfume de Cristo, nos que se salvam e nos que se perdem.
* IN PACELLIUS ERIT PAX VOBIS -
JEREM 29 V7
Na paz encontreis a paz - Jr 29,7
Texto: E procurai a paz da cidade, para onde vos fiz transportar em cativeiro, e orai por ela ao SENHOR; porque na sua paz vós tereis paz.
* DEDIT VOBIS JUSTITIAE. JOEF. 2ºV23
A Vos será dada a justa medida - Jl 2, 23
Texto: E vós, filhos de Sião, regozijai-vos e alegrai-vos no SENHOR vosso Deus, porque ele vos dará em justa medida a chuva temporã; fará descer a chuva no primeiro mês, a temporã e a serôdia.
* ME AUTEM PROPTER INOCENTIAM SUCEPISTE SALM 40
Conservaste minha inocência e recebeste-me - Sl 40
Texto: Quanto a mim, tu me sustentas na minha sinceridade, e me puseste diante da tua face para sempre.
* EVACUATUM EST SCANDALUM CRUCIS AD GALAT 6 V 11
Perseguidos pelo escândalo da cruz - Gl 6,11
Texto: Todos os que querem mostrar boa aparência na carne, esses vos obrigam a circuncidar-vos, somente para não serem perseguidos por causa da cruz de Cristo?
* DILECTUS MEUS MIHI ET EGO ILLI
Eu sou do meu amado e meu amado é meu. Cânticos, 6:3.
Texto: Eu sou do meu amado, e o meu amado é meu. Ele apascenta entre os lírios.
* REPOSITA EST MIHI CORONA TUSTITIAE 2º ADT HIMOT N º 8
A coroa da justiça será colocada sobre mim - 2 Tm 4,8
Texto: Desde agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que amarem a sua vinda.
* DECOLORAVIT ME SOL 1º CANTIC Nº 5
Queimada pelo sol - Ct 1,5
Texto: Não olheis para o eu ser morena; porque o sol resplandeceu sobre mim; os filhos de minha mãe indignaram-se contra mim, puseram-me por guarda das vinhas; a minha vinha, porém, não guardei.
* OPRUIT CILICIO CARNEM SUAM - 3º REG 21 Nº 27
Texto: Sucedeu, pois, que Acabe, ouvindo estas palavras, rasgou as suas vestes, e cobriu a sua carne de saco, e jejuou; e jazia em saco, e andava mansamente. 1Rs 21,27
* STIGMATA DNI JESU IN CORPORE MEO PORTO AD GALAT Nº 17
Texto: Desde agora ninguém me inquiete; porque trago no meu corpo as marcas do Senhor Jesus. Gl 6,17
As imagens que estão no espaço museu são predominantemente do século XIX[29]. A maior parte foi executada por Joaquim Alves de Souza Alão, em cedro. Dois famosos escultores portuenses estão associados a estas obras: Manoel Joaquim Alves de Souza Alão, e seu filho João Joaquim Alves de Souza Alão, que foram os insígnes escultores das imagens da Procissão das Cinzas da Ordem Terceira de São Francisco do Porto[30]. João Joaquim veio para o Brasil para ser escultor da Casa Real e mestre de desenho dos príncipes, tendo se tornado professor da classe de escultura da Real Academia de Belas Artes. Depois, Manoel Joaquim, o pai, também veio para o Rio de Janeiro em 1824, com cerca de 70 anos, onde ainda exerceu sua profissão de escultor. Em 1806, quando ainda estava no Porto, requereu à Ordem Terceira do Porto sua entrada na irmandade, obrigando-se a aprontar e vestir todos os anos, enquanto vivo fosse, as imagens da Procissão das Cinzas.
É bem provável que a execução das obras do Rio de Janeiro[31] tenha sido ou dos dois artistas - pai e filho, ou predominantemente do filho, já que o pai estaria com avançada idade na época. A primeira encomenda foi realizada em 1842: solicitavam-se as imagens de São Francisco, Santo Lúcio e Santa Bona, em tamanho natural, ao preço de seiscentos mil reis, portanto, duzentos mil reis cada uma. Em 1849, outro Termo registra a encomenda de Santa Isabel e São Gualter, por quatrocentos mil reis, donde se infere o mesmo valor de duzentos mil reis para cada uma. Ainda em 1849 são encomendadas as imagens de São Luís, São Roque e Santa Margarida de Cortona, pelo que a Ordem ajustou o preço de quinhentos mil réis. Aqui cabe um parênteses, a ser esclarecido, pois a Santa Margarida de Cortona difere literalmente das demais imagens, tanto no que se refere à técnica, quanto às características formais. Existe na escultura uma etiqueta que a atribui a Manoel Inácio da Costa discípulo de Felipe Pereira, que faleceu em 1848, portanto, antes da encomenda de 1849 a Joaquim Alves de Souza Alão. Acreditamos que possa ter havido um engano no registro da encomenda, pois a imagem que não é citada e que se harmoniza com as demais executadas pelo mestre portuense é a de Santa Rosa de Viterbo, que teria sido mais em conta por ser menor, de roca, e articulação simples.
Para que tenhamos uma idéia comparativa do alto valor que a Ordem pagou pela execução destas esculturas religiosas, basta lembrar que ao falecer em 1849, o escultor portuense Antonio da Conceição Portugal, que já citamos anteriormente, deixou uma imagem de Nossa Senhora da Conceição de vestir de quatro palmos (cerca de 90 cm), que foi avaliada em dez mil reis. Levando-se em conta que as imagens dos terceiros franciscanos são de tamanho natural e custaram à Ordem a razão de duzentos mil reis cada uma, ainda assim temos uma diferença de preço que deve incluir a pintura, as vestes e a “griffe” dos afamados escultores da época.
2.2 - Nossa Senhora da Conceição
No Rio de Janeiro, a antiga capela da Ordem Terceira, localizada do lado direito da nave da Igreja de Santo Antônio, já era dedicada à Virgem desde a sua fundação em 1619. Posteriormente, D. João VI instituiu no Rio de Janeiro a Ordem Militar da Conceição, em 6 de fevereiro de 1818; nesta mesma época várias ordens e confrarias tomaram a Virgem como padroeira e especial protetora.
A imagem de Nossa Senhora da Conceição [Figura 7] é um delicado exemplar em madeira policromada, que se insere nas recomendações das Constituições da Bahia de 1707: determinaram zelo especial em relação às imagens marianas, proibindo sua fatura em roca ou anatomizadas. A partir de então, as imagens de Virgem de vestir se apresentam como esculturas paramentadas com túnicas simples policromadas. Possui olhos de vidro e cabelos naturais.
O semblante é plácido, calmo e equilibrado, feição adequada ao caráter virtuoso da Virgem. A Virgem está em posição orante, com mãos postas, palmas unidas, voltadas para cima. O olhar direciona-se para baixo, na direção dos fiéis como piedosa intercessora, já que se posicionava no alto do magnífico andor. Sua indumentária é preciosa[32], portando túnica e manto em damasco de seda bordado a fios de ouro com motivos de parras e flores arrematado por galões em ouro fino. O longo manto azul também recebeu elaborada padronagem bordada a ouro. A escultura foi colocada sobre uma base azul de perfil sinuoso com ornatos dourados, mas durante a procissão saía sobre o globo celeste com trono angélico e o crescente lunar situado no alto do andor.
As formas de representação destas esculturas religiosas eram controladas pela igreja, devendo estar sempre adequadas e decentes em respeito ao caráter santo. Visava facilitar a identificação através de expressões associadas ao caráter e passagens da vida santificada. No caso da Nossa Senhora da Conceição, sua expressão superior e amorosa, manteve-se ajustada a preceitos e dogmas estabelecidos desde o século XVII, em Trento. O ensino acadêmico firmaria regras e cânones de aplicação para as expressões compatíveis com as virtudes dos personagens. Atentemos à descrição fisionômica estabelecida para o Amor Simples, conforme Le Brun:
Os movimentos desta paixão, desde que seja simples, são fortemente doces e simples, pois a fronte será plana, as sobrancelhas um pouco elevadas do lado onde se encontra a pupila, a cabeça inclinada em direção ao objeto que causa o amor; os olhos podem ser ligeiramente abertos, o branco do olho fortemente vivo e brilhante; a pupila docemente virada para o lado onde está o objeto, ela parecerá um pouco cintilante e elevada; o nariz não receberá nenhuma mudança, da mesma forma que todas as partes do semblante, que era somente cheios do espírito que aquecem e animam ficando a cor mais viva e mais vermelha e particularmente no lugar das bochechas e dos lábios a boca deve estar um pouco entre aberta e os cantos um pouco elevados e os lábios parecem úmidos e esta umidade pode ser causada pelo vapor que se eleva do coração.[33]
2.3 - São Lúcio e Santa Bona. “Os Bem casados
Segundo MATTOS (1880), São Lúcio era um abastado comerciante florentino, ligado também à vida política. Ao ouvir um sermão de São Francisco, resolveu desprender-se de todos os bens materiais e junto com Bona, sua esposa, filiou-se à Ordem Terceira franciscana, tornando-se os primeiros membros da Ordem recém fundada. A partir de então, dedicou a vida às obras de penitência e misericórdia, cuidando dos doentes e dos condenados. Bona o acompanhava em todas as práticas piedosas, mas morreu primeiro que ele, que sentindo sua ausência, logo a sucedeu na morte. Na procissão das Cinzas do Rio de Janeiro, ocupavam o primeiro andor, numa referência à sua condição de primeiros filiados da Ordem.
As imagens dos bem casados interagem entre si, uma vez que São Lúcio segura o crucifixo e Santa Bona olha na direção do Cristo crucificado [Figura 8a]. Desta forma, existe uma triangulação que une o casal ao Cristo, como se voltados para um objetivo comum.
São Lúcio tem articulação nos braços em esfera bipartida, possui olhos de vidro e cabelos esculpidos na madeira. Traduzindo sua condição de comerciante rico e eminência política, é representado calçado com sapatos de fivela de ouro [Figura 8b]. Trata-se de uma escultura de vestir mista, isto é, possui uma parte anatômica e parte de roca: as ripas de madeira estendem-se apenas na parte das coxas. O enfoque no rosto e mãos das imagens que aqui analisamos é um aspecto característico da imaginária processional.
Ambas as imagens apresentam indícios de erudição: possuem boa configuração anatômica, equilíbrio e proporção entre as partes, e carga expressiva. As mãos têm articulações proeminentes e a disposição dos dedos é artificiosa e elegante. O casal veste o hábito da ordem terceira franciscana, consistido de túnica de seda creme com cordão franciscano na cintura e o terço do lado esquerdo. São Lúcio tem capa, enquanto Santa Bona traz um véu negro cobrindo a cabeça. A carnação é delicada, com suaves passagens de tons. Os cílios são pintados em torno dos olhos.
Santa Bona é anatomizada, tendo a articulação dos cotovelos em esfera bipartida. Possui olhos de vidro, e cabelos naturais. Sua expressão facial é bastante feminina e viva [Figura 8c]. Constatando o estabelecimento de regras expressionais de representação, de novo recorremos a Le Brun, onde encontramos a definição de Estima:
A estima não se pode representar de outra forma que não pela atenção e pelo movimento das partes do semblante que parecem fixados ao objeto que causa esta atenção, já que então as sobrancelhas parecerão elevadas sobre os olhos e pressionadas no supercílio entre o nariz. A outra parte então, sendo um pouco elevada, o olho fortemente aberto, e a pupila elevada. Às vezes os músculos da fronte parecerão um pouco inflados e aquelas que estão ao redor dos olhos, as narinas puxadas para baixo, as bochechas serão aprofundadas em direção do queixo. A boca é um pouco entreaberta, os cantos puxando para trás e pendendo para baixo. [34]
2.4 - São Luís Rei de França
São Luís nasceu em Poissy, na França, em 1215, e ascendeu ao trono em 1226 sob a denominação de Luís IX, assumindo a regência sua mãe, Branca de Castela, de quem recebeu uma educação rigorosa e piedosa. Sua vida foi de cristão modelar, e na condição de rei por duas vezes participou das Cruzadas, tendo sido preso na segunda investida. Seis anos depois, retornou à França. Em 1270 reorganizou outro exército, mas morreu em Túnis dois meses após a partida. Foi pródigo na oferta de esmolas às igrejas. Tornou-se padroeiro dos barbeiros, cabeleireiros e fabricantes de perucas por andar sempre barbeado e bem penteado. Devido à construção da Saint-Chapelle, erigida para acondicionar suas preciosas relíquias, foi eleito padroeiro de numerosos ofícios, tais como carpinteiros, pedreiros, costureiros, e fabricantes de paramentos. Um de seus feitos significativos foi a aquisição da coroa de espinhos em Constantinopla, que complementou sua formidável coleção de raras e santas relíquias, que incluía partes da Cruz, a esponja e a lança.
É sempre representado com uma encorpada cabeleira e bigodes. Sobre o hábito franciscano vestia o manto real azul estrelado, e seus atributos são a coroa, o cetro, podendo incluir a coroa de espinhos.
A imagem de São Luís [Figura 9] possui uma longa cabeleira esculpida em madeira, que se eleva sobre as costas de forma a facilitar a colocação das vestes. As articulações são fixas, isto é, são montadas e presas com parafusos. O pescoço é significativamente longo, o que aumenta a majestade e realça a expressão facial. Nas mãos segurava a coroa de espinhos e os três pregos[35], relíquias que adquiriu e com a qual costuma ser representado.
A análise expressional recai sobre um momento de suspensão, no que podemos comparar mais uma vez à descrição de Le Brun sobre a Admiração:
Como nós tínhamos dito, a admiração é a primeira e a mais temperada de todas as paixões e onde o coração sente menos agitação; o semblante também recebe pouca mudança em todas as suas partes e se existe, não é mais do que uma elevação da sobrancelha. Mas terá os dois lados iguais, o olho será um pouco mais aberto que o comum e igualmente a pupila entre as duas pálpebras sem movimento, fixadas sobre o objeto que causou admiração. A boca será também entreaberta, mas ela parecerá sem alguma alteração, não mais do que o resto do semblante. Esta paixão não produz mais do que uma suspensão do movimento para dar tempo à alma de deliberar e para considerar com atenção o objeto que se apresenta a ela, já que este objeto é raro, extraordinário; do primeiro e simples movimento de admiração se obtém a estima. [36]
2.5 - São Guálter Bispo
Discípulo de São Francisco, foi designado pelo santo juntamente com Frei Zacarias, para fundar conventos franciscanos em Portugal. Frei Zacarias foi para Santo Antonio de Olivais, e Frei Guálter foi para Guimarães, onde estabeleceu o convento passando a ser o guardião. Enquanto viveu, sua vida foi marcada pela ação do apostolado, tendo morrido em 1258[37].
A escultura de São Guálter [Figura 10] possui olhos de vidro num tom esverdeado, cabelos esculpidos, e rosto fortemente marcado por massas anatômicas, sulcos e rugas, numa caracterização convincente, baseada em modelo.
Na indumentária, sobre o hábito franciscano é aposto a murça púrpura e na cabeça, o barrete negro forrado de roxo. É representado com o báculo, atributo próprio de seu cargo eclesiástico.
No caráter expressional, exibe atitude que muito o aproxima da descrição de Le Brun sobre o Enlevo:
Mas se a admiração é causada por qualquer coisa que esteja acima do conhecimento da alma, como pode ser o poder de Deus e sua grandeza, então os movimentos de admiração e de veneração serão diferentes dos precedentes, pois a cabeça estará inclinada do lado do coração, e as sobrancelhas elevadas ao alto,assim como a pálpebra. A cabeça inclinada como tenho dito, parece reforçar a redução da alma. É por isso que nem os olhos, nem as sobrancelhas são pontos atraídos pelo mundo, mas elevados em direção ao céu, onde parecem estar concentrados para descobrir o que a alma não conhece. A boca é entreaberta, tendo os cantos um pouco elevados, testemunhando uma espécie de enlevo.[38]
2.6 - São Roque
Segundo a lenda, São Roque, nascido em Montpellier em meados do século XIV, possuía uma marca no peito em forma de cruz vermelha que lhe valeu o nome Roc, que é uma derivação de “rouge”. Cedo ficou órfão, e despojou-e de todos os seus bens doando-os aos pobres e combalidos, passando a viver como peregrino. Foi à Roma, e ao retornar, dedicou-se a cuidar dos leprosos, cuja doença acabou contraindo. Seu corpo ficou repleto de chagas, e foi abandonado por todos. Um senhor vizinho, compadecido de sua sorte, mandava seu cão levar-lhe pão todos os dias. Roque conseguiu curar-se, e retornou à sua cidade, onde não foi mais reconhecido e o tomaram por espião. Levaram-no preso, e acabou morrendo no cárcere.
É um santo buscado na defesa das pestes. Seus atributos são o bastão de peregrino e o cachorro, que hoje não consta mais na coleção do Rio. Com a mão direita, segura o hábito, expondo a chaga na perna.
Temos neste São Roque uma das mais expressivas imagens da coleção de santos de vestir dos terceiros franciscanos [Figura 11a]. A compleição robusta e a segura delineação anatômica dos pés, mãos e rosto [Figura 11b], encontram nesta obra um momento eficiente do mestre Joaquim Alão, numa linha de fatura miguelanguelesca.
Também aqui podemos nos reportar às recomendações de Le Brun, encontrando sentido nas expressões referentes à Dor Corporal:
Mas se a tristeza é causada por qualquer dor corporal, e que esta dor seja aguda, todos os movimentos do semblante parecem agudos, pois a sobrancelha que se eleva ao alto estará ainda mais elevada do que na paixão precedente (tristeza), e se aproximam mais uma da outra; a pupila estará escondida sobre a pálpebra, as narinas se elevam também deste lado, e marcam a prega das bochechas, a boca estará mais aberta que na ação precedente e mais retirada para trás, e fará uma espécie de figura quadrada nesta parte. Todas as partes do semblante parecem mais ou menos marcados, e mais agitados conforme a dor for mais violenta. [39]
2.7 - Santo Antonio de Noto (São Vivaldo?)
Aqui levantamos uma questão de caráter iconográfico, referente à denominação deste santo. No espaço-museu esta escultura aparece com a denominação de Santo Antônio de Noto, que é negro, e segura o Menino Jesus ou um crucifixo.
Maria Regina Emery Quites (2008) aponta recorrente confusão entre o santo negro e outro Antônio branco, pertencente à ordem primeira franciscana, falecido em Caltagirone.
Cremos que se trata de São Vivaldo, um beato franciscano, que nas ordens terceiras de Recife e Salvador é branco, com o rosto sempre voltado para os céus (de olhos fechados)[40]. O exemplar do Rio de Janeiro tem os olhos voltados para cima, segura disciplina composta por galhos espinhentos e tem próximo de si, como atributo, um crânio de caveira, que também aparece ao lado da imagem de São Vivaldo da Capela da Ordem Terceira de São Francisco de Salvador.
São Vivaldo era italiano, nascido em San Geminiano em 1250. Cuidava com intensa caridade dos leprosos, e depois que seu mestre Bartolo de San Geminiano morreu, retirou-se para a vida eremítica, impondo-se a solidão, longas vigílias e auto-imolação, além de alimento escasso. Morreu aos 72 anos.
A imagem [Figura 12] é anatomizada, sendo composta sobre o corpo com uma veste inteiriça . Possui sistema de articulação em esfera bipartida, olhos de vidro e foi feita em madeira policromada. Esta imagem não consta entre as encomendas feitas a Joaquim Alves de Souza Alão, embora não destoe técnica, estilística e formalmente das demais, sendo também em tamanho natural e a disposição anatômica compatível com a de São Roque.
A boca está entreaberta, com dentes aparentes. O nariz é proeminente, com a ponta projetada. A testa apresenta-se franzida, barba em ondulação sulcada animada com cachos definidos. Anatomia do pescoço acentuada. A escultura tem ótima configuração anatômica, com gesto contraído das mãos e minuciosa descrição de dedos, unhas, articulações. Os olhos têm coloração azulada.
Veste túnica e manto em seda creme própria dos componentes da ordem terceira, atada na cintura por cordão franciscano de onde pende um terço do lado esquerdo.
A expressão remete ao céu, revelando sua permanente evocação mística, já que na sua condição de beato eremita afastou-se voluntariamente do mundo para viver unicamente voltado para Deus. A caveira que o acompanha como atributo [Figura 13] alude à vanitas, lembrando a inutilidade do apego às coisas materiais, pois a morte é o fim comum e irremediável. Neste santo também procede a mesma definição do Enlevo, retirada das conferências de Le Brun, conforme aplicamos anteriormente a São Gualter:
É por isso que nem os olhos, nem as sobrancelhas são pontos atraídos pelo mundo, mas elevados em direção ao céu, onde parecem estar concentrados para descobrir o que a alma não conhece. A boca é entreaberta, tendo os cantos um pouco elevados, testemunhando uma espécie de enlevo.
2.8 - Santa Rosa de Viterbo
Santa Rosa nasceu em Viterbo, em 1235. Morreu muito jovem, com apenas dezoito anos, mas durante sua curta vida fez vários milagres, entre eles, transformau pão em rosas, o que procede ser comum confundi-la com Santa Isabel. Tem por atributo o crucifixo, ou rosas que apresenta num cesto ou aba do manto.
Esta imagem [Figura 14a] não é documentalmente atribuída à Joaquim Alves de Souza Alão, mas integra-se perfeitamente ao conjunto, tendo os mesmos estilemas característicos do artista.
Trata-se de uma santa de roca, feita em madeira, tendo nas junções parafusos, portanto, não se articula. Possui olhos de vidro e cabelos naturais ruivos.
O rosto oval [Figura 14b] tem carnação clara, com grandes olhos negros circundados por cílios pintados. A boca está entreaberta, com parte dos dentes superiores aparentes. O nariz é reto, o queixo redondo e proeminente. Veste o hábito franciscano com véu negro cobrindo a cabeça, e segura na mão direita a cruz que se estende até o chão. O pé tem sapatinho de fivela dourada pintada. A representação das mãos articula delicada composição dos dedos, em gesticulação delicada, feminina e virtuosa.
A feição é jovem e reflete as expectativas e esperanças da idade. O olhar fixo à frente, conecta-se com o mudo à sua volta, mas traduz também a bondade e idealismo da adolescente.
Nas “lições” de Le Brun, podemos detectar indícios expressionais da Esperança nesta santa:
Sempre que somos levados a desejar um bem, e existe a possibilidade de o conseguirmos, então o bem excita em nós a esperança. Ou, como os movimentos desta paixão não são tanto exteriores, mas interiores, nós diremos pouca coisa, e somente reforçaremos que esta paixão aparenta todas as partes do corpo suspensas entre a incerteza e a segurança, de sorte que se uma parte da sobrancelha marca o temor, a outra parte marca a certeza, assim todas as partes do corpo e do semblante são divididas e misturadas pelo movimento destas duas paixões.[41]
2.9 - Santa Margarida de Cartona
Margarida levou uma vida irregular e luxuriosa durante bom tempo. Face à visão de um cadáver corrupto, arrependeu-se amargamente e aterrada com a visão, filiou-se à Ordem Terceira de São Francisco, onde passou a penitenciar-se e buscou a expiação de seus pecados[42]. É representada com o cilício e o crucifixo.
A imagem de Santa Margarida de Cartona [Figura 15a] é anatomizada, mas apresenta cortes no quadril e nas pernas, não sabemos se devido a restauro ou adaptações. Devido ao estado de deterioração das vestes, não nos foi possível analisar sua estrutura completa, mas é um exemplar que difere do conjunto analisado, pois tem o dorso projetado, cabelos esculpidos, policromia que intensifica a dramaticidade. Grossas lágrimas de resina foram aplicadas nos dois olhos, com coloração escura que sugere “lágrimas de sangue” [Figura 15b]. Sua autoria está atribuída a Manoel Inácio da Costa, em etiqueta no quadril da imagem, do lado direito.
A boca está entreaberta deixando os dentes aparentes e os lóbulos das orelhas assomam entre as longas madeixas louras. Na mão direita segura o cilício e na mão esquerda, o crucifixo.
Veste túnica e manto em damasco de seda, com padronagem de flores e perdizes - símbolo da luxúria. Os cabelos longos foram esculpidos sem encostar-se ao corpo, de modo a facilitar a colocação das vestes. Os pés também não são fixados à base, para que possam ser calçados. Encontra-se sobre base esculpida em madeira dourada com recorte sinuoso.
Quanto ao aspecto expressional, cada santo deveria trazer no rosto a expressão que caracterizasse sua vida, para que fosse reconhecido e relembrado o seu exemplo. Assim Santa Margarida de Cartona traduz a tristeza causada pelo arrependimento da vida desregrada que levara. Conforme Le Brun, assim deve ser representada a Tristeza:
Como dissemos, a tristeza é langor desagradável onde a alma recebe os incômodos do mal que as impressões do cérebro representam. Esta paixão se caracteriza também pelos movimentos que parecem marcar a inquietude do cérebro, e o abatimento do coração, já que os lados das sobrancelhas são mais elevados em direção ao meio da fronte do que do lado das bochechas, e aquele que está agitado com esta paixão tem as pupilas perturbadas, o branco dos olhos amarelo, as pálpebras abatidas e um pouco infladas, o redor dos olhos lívido, as narinas apontando para baixo, a boca entreaberta e os cantos abaixados, a cabeça parece indolentemente sobre uma das espáduas, toda a cor do semblante está chumbada, e os lábios pálidos e sem cor. [43]
2.10 - Santa Isabel de Portugal
Segundo TAVARES (2004) a rainha Isabel era filha do rei Aragão e nasceu c. de 1271. Foi desposada por D. Diniz, rei de Portugal. Após ter enviuvado, em 1325, entrou para o convento de Santa Clara e tornou-se monja, vindo a falecer em 1336. Ao longo de sua vida, não cansou de realizar ações caridosas atuando junto aos pobres e doentes. Realizou muitos milagres, mas um dos mais conhecidos foi a transformação do pão em rosas. Na política, intercedeu pela paz com ações conciliadoras. Em Portugal, foi tomada como padroeira do país, além de ser a santa protetora de Coimbra e Saragoça. O papa Urbano VIII canonizou Santa Isabel em 1625. Seus atributos são a coroa e um apanhado de rosas, numa alusão ao seu mais famoso milagre.
A imagem em estudo [Figura 16a] tem a cabeça voltada para a direita, para onde também direciona o olhar. O nariz é grande e definido, boca entreaberta com dentes aparentes, queixo proeminente com covinha no centro. Os cabelos são naturais, em tom castanho claro.
Veste o hábito franciscano com túnica e manto em seda adamascada creme, e véu negro cobrindo a cabeça. A cintura está marcada pelo cordão franciscano, de onde pende o rosário à esquerda. Ao seu lado se encontra um pequeno pedestal sobre o qual existe uma almofada vermelha onde se encontram a coroa e o cetro de rainha.
Pela disposição das mãos [Figura 16b], devia segurar o avental ou cesto de rosas, descrevendo no momento da realização do milagre, que é quando o Deus opera o “maravilhoso” através do santo. Por isso, seu rosto expressa a Alegria.
Se no lugar de todas as paixões das quais acabamos de mencionar, a alegria se apodera da alma, os movimentos que exprimem são bem diferentes daqueles que acabamos de notar; pois nesta paixão a fronte é serena, a sobrancelha sem movimento, elevada pelo meio, o olho discretamente aberto e risonho, a pupila viva e brilhante, as narinas um pouco abertas, a boca terá os cantos um pouco elevados, a aparência viva, as bochechas e os lábios avermelhados. [44]
2.11 - O Recebimento das Chagas
Na descrição de Debret, a cena do “Recebimento das Chagas” era o décimo segundo andor da procissão, ou seja, o último. Trata-se do momento culminante da vida de São Francisco, quando recebeu de Cristo os estigmas, passando a conviver com as Suas chagas no próprio corpo. Milagre supremo da vida repleta de feitos miraculosos de São Francisco, este fato o tornou especial dentre todos os santos, por ter sido o único estigmatizado com as cinco chagas
São Francisco de Assis era assim conhecido por ter nascido em Assis, em 1182, na Itália. Pertencia a uma família abastada, tendo vivido durante a infância, adolescência e juventude uma vida despreocupada e ainda não entregue inteiramente a Deus. Sua conversão plena deu-se ao ouvir as palavras de Deus num texto do evangelho de Mateus, recomendando que o homem se desprenda de todos os bens terrenos. Seguindo este ideal, fundou a Ordem dos Frades Menores, mendicante, baseada no apostolado e na feliz renúncia aos bens terrenos. Viajou para vários locais em ação de apostolado, sempre zelando pelos princípios de pobreza que estabelecera e realizando vários milagres. Em 1224 retirou-se para o Monte Alverno, onde teve a visão do Cristo Seráfico, crucificado, que lhe transferiu os cinco estigmas. Cada vez mais mortificado na carne e quase cego, morreu em 1226.
A imagem de São Francisco [Figura 17a] fez parte da primeira encomenda feita a Joaquim Alves Alão, em 1842. Hoje, encontra-se no altar mor, como é costume das ordens terceiras manterem no seu altar este santo padroeiro de vestir. Existem outros exemplares de São Francisco de vestir no acervo da igreja, mas guardando-se as proporções entre a imagem e o Cristo, a do altar mor é a que melhor se ajusta à cena em conjunto. Juntas, compõem um conjunto de imagens narrativas, descrevendo a cena mística com intensidade dramática. Sendo uma imagem oitocentista executada por um artista de formação acadêmica, vale ressaltar que, talvez pela função processional ou pela tradição barroca portuguesa impregnada no artista, algumas técnicas do barroco ainda prevaleceram, tais como a intensidade expressional valorizando o êxtase místico, acentuação de referências visuais para que a imagem fosse vista à distância e volumetria ressaltada. Aspectos referentes à vida do santo foram criteriosamente respeitados, tais como a magreza causada pela vida ascética, as roupas simples e rudes, a identificação das chagas. Eram testemunhos de sua santidade, sendo imprescindíveis para a correta identificação.
Assim descreveu Jacopo de Varazze a estigmatização de São Francisco:
Em uma visão, o escravo de Deus viu acima dele um serafim crucificado que lhe imprimiu as marcas de sua crucificação de maneira tão evidente que parecia ter sido ele próprio o crucificado. Suas mãos, seus pés e seu flanco foram marcados com as feridas da cruz; mas com cuidado ele escondeu dos olhos de todos esses estigmas. Alguns, no entanto, viram-nos enquanto vivia, e após a sua morte muitos puderam examiná-lo. [45]
À imagem foi conferida a expressão de êxtase místico [Figura 17b], e na sua forte relação estabelecida com o espaço em torno e a imagem do Cristo com a qual articula, sentimos nesta obra uma maior aproximação com a escultura berniniana do que com os princípios acadêmicos. A visão de Francisco é viva, contundente, arrebatada pelo sobrenatural. Gesticulação e expressão facial compõem um momento de comoção emocional suspensa, que atrai o espectador para a cena teatral.
O Cristo Seráfico [Figura 17c] foi confeccionado em papel, uma técnica que se adequava muito bem à finalidade das procissões por tornar a imagem mais leve. É uma escultura refinada na fatura, com pathos intenso, tanto na escultura quanto na carnação. Cremos tratar-se de imagem provavelmente do século XVIII. Os cravos foram substituídos por grandes pedras semipreciosas, numa alusão simbólica que conecta o suplício da carne à raridade, beleza e supremo valor da alma. Os pés estão representados separados, e fixados com cravos distintos. Encontramos outro exemplar feito em papel em Porto dos Caixas, venerado como “Cristo que sangra” no Santuário do Senhor Crucificado, que pode ser oriundo da Ordem Terceira de São Francisco da extinta freguesia de Santo Antônio de Sá de Macacu.
A imagem possui boa configuração anatômica, compondo um corpo harmonioso e bem proporcionado, com definição de músculos, veias e ossos aflorados à pele. O sangue ganhou realce não apenas pelo colorido intenso e jorro farto, como também por ter sido elaborado com volumetria; foi conferida à carnação a mesma intensidade dramática.
A par dos testemunhos corporais de sofrimento, o todo da escultura se impõe belo e nobre, adequado à dignidade extrema do Cristo. O panejamento do perizônio é abundante, e descreve movimentação animada, característica dos setecentos.
O Cristo contempla São Francisco, seu filho dileto, com piedade e ternura. Cúmplice, reconhece a difícil opção de vida do santo, sua simplicidade ilimitada e grandeza de caráter que o faz merecedor das chagas que lhe transfere.
2.12 - O Conjunto da Cúria
No segundo andar, do lado oposto ao consistório (ou lado esquerdo do coro), subsistem alguns exemplares de santos de roca mais antigos, que também faziam parte da Procissão das Cinzas, remanescentes do século XVIII. Trata-se de três exemplares que compunham a cena em que São Francisco entrega a Regra de sua Ordem ao papa Inocêncio III, conhecido como “Conjunto da Cúria” [Figura 18a]. Debret refere-se a esta cena como integrante do terceiro andor da procissão. Originalmente faziam parte quatro cardeais, o Papa tendo à frente a Regra de São Francisco sobre uma mesinha coberta por um tapete vermelho, e São Francisco prostrado de joelhos apresentando o precioso documento. Cabe considerar que como sempre, em se tratando das obras da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, os irmãos esmeraram-se na encomenda, incorporando à procissão peças de considerável valor artístico. Tal fato demonstra que, mesmo no século XVIII, quando as imagens eram produzidas em oficinas locais e sem as premissas impostas pelo aprendizado acadêmico, as obras destinadas à burguesia atingiam alto nível técnico e artístico. Desgastadas pelo tempo, os interessantes modelos de roca aguardam reforma para serem exibidos ao público.
Segundo Le Goff[46], São Francisco teve três audiências com o Papa Inocêncio III. Na primeira vez, o Papa o toma por um criador de porcos. Na segunda tentativa, Guy, Bispo de Assis e o Cardeal João de São Paulo intervêm para que o Papa o receba; nesta ocasião, o Papa se surpreende com a rigidez da Regra e considera absurda sua viabilidade, recomendando que São Francisco reze e aguarde uma nova entrevista. No entanto, após o encontro, o Papa Inocêncio teve um sonho visionário, que interpreta como sendo São Francisco salvando a igreja. O pontífice torna a recebê-lo e aprova verbalmente a regra, ordenando que os frades lhe obedecessem e à Francisco, autorizando-os a pregar.
A cena da Cúria de que estamos tratando refere-se à segunda entrevista.
Os personagens interpretam exatamente a situação narrada: o papa traduz no semblante o impasse da dúvida e do assombro, enquanto os dois cardeais que intercederam para que o Papa o recebesse, simplesmente denominados nas esculturas com “cardeal da direita” e “cardeal da esquerda” [Figura 18b], mostram-se cúmplices. O olhar é ligeiramente voltado para baixo, pois São Francisco está ajoelhado na cena descrita por Debret, e em seus semblantes pode-se interpretar a simpatia pelo rigoroso projeto de Francisco.
Como afirmou Myriam Andrade Ribeiro de Oliveira[47], “a intenção de dar às esculturas a aparência de “figurações vivas” atinge o seu ponto culminante nas imagens processionais, destinadas a serem vistas de perto e sob ângulos variados.” As esculturas de vestir da ordem terceira franciscana do Rio de Janeiro comprovam a permanência deste hábito até o XIX. Comprovam, também que não se tratavam de imagens de terceira de categoria, mas uma categoria de imagens, podendo ser encomendadas por pessoas de elite como os membros da Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, a artistas de grande valor social e artístico na época, como Joaquim Alves de Souza Alão.
A questão expressional era um fator de grande importância, pois feições e gestos deveriam ser eloqüentes, de forma a enfatizar a emoção e associar o fato demonstrado à passagem da vida do santo, realimentando a memória dos fiéis. Os dogmas acadêmicos foram aplicados e as mãos e rostos das esculturas surgiram das roupas concentrando contundente narrativa.
Com o tempo, o cortejo religioso sofreu desprestígio. Muito contribuiu a época ingrata de sua ocorrência, quando inaugurava a Semana Santa logo após o Carnaval. Ainda sobre o efeito do Entrudo, as pessoas incrédulas o associavam ao último evento do Carnaval, enquanto para os fiéis inaugurava-se o período de reclusão, abstinência e reflexão contrita. A vida urbana, cada vez mais laica e sob influência francesa, assumiu com o tempo caracteres associados à elegância social, ao progresso e cultura humanística, despojando-se do passado religioso e milagreiro português. O povo que assomava às ruas para ver o séquito das Cinzas às vezes o fazia mais motivado pelo deboche e galhofa do que pelo respeito e veneração cristã. Em função destas irreverências, em 1862 a procissão foi suspensa em definitivo.
Findava-se o percurso que levava o corpo não só das imagens, mas também dos fieis, de um lugar sagrado a outro lugar sagrado, simulando a própria a vida: um percurso do momento sagrado do nascimento ao sagrado momento da morte.
Findavam-se os momentos de suspensão, que para um povo que acreditava em visões, as viam surgir uma após outra, tão próximas e convincentes quanto reais.
A cidade crescia, mudava. E uma etapa de sua vida simplesmente, findava.
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Siglas
ACNRJ - Arquivo da
Cúria Municipal do Rio de Janeiro
IPHAN - Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
OTSFP - Ordem
Terceira de São Francisco da Penitência.
Agradecimentos
Dr. Carlos
Pinheiro - administrador da OTSFP
D. Mauro Fragoso
OSB.
Rejane Oliveira
dos Santos
Lúcia Rabelo
Funcionários da
OTSFP
Igreja Ordem
Terceira de São Francisco da Penitência
Largo da Carioca,
s/n. Centro, Rio de Janeiro.
_________________________
[1] OLIVEIRA, 2004.
[2] DEBRET, 1966, v.2, p. 371.
[3] NÓBREGA, 1549-1560. 1988.
[4] Inspirado no sofrimento derradeiro de Jesus.
[5] “Misericórdia, meu Deus” - tradução de D. Mauro
Fragoso, OSB.
[6] “O Espírito do Senhor veio sobre eles” - tradução de
Dom Mauro Fragoso, OSB.
[7] Constituições da Bahía - 1720 - Livro III, título
XIII, p. 199
[8] JANSON, 2001.
[9] OLIVEIRA, 2000, p. 41.
[10] WEISBACH, 1948. Pág. 312.
[11] SANTA MARIA, 1723, p. 17.
[12] AVILA, 1994, p. 33.
[13] Estamos aqui considerando o Senhor Morto como imagem
de vestir pelo hábito de mantê-lo envolto em pano roxo na Quaresma, ou coberto
com lençol.
[14] Sobre o assunto, ver “Meninos Deus”, Lúcia Marques,
São Paulo, 2006.
[15]ACRJ - Ordens Régias. E248, 1681-1809, NT. 1124,
08/01/1689
[16] “Precisamente em 1683 o jesuíta Padre Bêncio, para
evitar a subida do morro (do Castelo), sobretudo aos de idade, fundou uma
paróquia na cidade baixa, a confraria de Nossa Senhora da Boa Morte.” LEITE,
Vol. VI, p. 14.
[17] ACRJ - Ordens Régias. E 248, 1681-1809, Nt. 1124 p.
187, 03/02/1750. Cópia da representação da carta que fez a Mag. a Câmera (...)
deirem todas) as (...) acompanharem a procissão de corpo de M. e a vem maix
todas as Confrarias e Irmandade. Rio de Janeiro, 3 de Fevereiro de 1750.
[18] Arquivo Nacional - inventário de Bonifácio José da
Trindade - 1815 - Caixa 1130,n 9600. In BONNET, 1995, p. 194
[19] Arquivo Nacional. Inventário de Antonio da Conceição
Portugal - 1849 - Caixa 280, n 3271. In BONNET, 1995.
[20] MATTOS. 1880. Memória histórica e descritiva
da Ordem Terceira de S. Francisco no Porto. p. 33.
[21] “Esta procissão, que tem a reputação aliás justa de
apresentar aos fiéis o maior número de imagens esculpidas, dura quatro horas;
regressa noite fechada e o seu percurso se enche, sem descontinuar, de uma
multidão de espectadores nacionais e estrangeiros”. DEBRET, 1839, p. 373-374.
[22] MATHIAS, 1961, p. 15
[23] Debret inicia por denominá-la “Procissão de Santo
Antônio”, quando na verdade o nome correto era Procissão das Cinzas, organizada
pela Ordem Terceira de São Francisco da Penitência, que ficava ao lado da
Igreja do Convento de Santo Antônio. Comete outros deslizes que demonstram o
seu desconhecimento em relação às denominações hagiográficas: refere-se a São
Francisco como Santo Antônio, Santo Antônio de Noto é confundido com São
Benedito, Santa Margarida de Cartona é chamada de Madalena arrependida, São
Roque é denominado São Tiago e os santos casados (Santo Lúcio e Santa Bona, e
Santo Elzeário e Santa Delfina) são interpretados como reis e rainhas. P.
372-373
[26] BARATA, 1975, p. 51
[27] DEBRET, 1839, p. 372
[28] Agradecemos a ajuda de Dom Mauro Fragoso, OSB., pela
tradução das citações em latim.
[29] À exceção do Cristo seráfico, que é do século XVIII,
e do São Francisco, que é do século XX: estas esculturas diferem técnica e
estilisticamente das demais esculturas de vestir.
[30] MATTOS, 1880, p. 30-33.
[31] IPHAN - RJ Livro de Termos da Ordem Terceira da
Penitencia do Rio de Janeiro - 1756 - 1795 f. 277, 283, 287 RJ -2029 -cx
530.
[32] Segundo MACHADO (1922), as vestes da Virgem foram
importadas do Porto, em 1836.
[33] LE BRUN, Charles. L’Expression des Passions &
autres conferénces. Correspondence. Paris: Éditions Dédale, Maisonneuve et
Larose. 1994. P. 79
[34] LE BRUN, op. cit. A Estima. P. 68
[35] DEBRET, op. cit., p. 373.
[36] LE BRUN, op.
cit, p. 66
[37] TAVARES, Dicionário de santos. 2004, p. 70
[38] LE BRUN, p.
72.
[39] LE BRUN, op.
cit, p. 92
[40] QUITES,
2006, p. 106
[41] LE BRUN, op.
cit, p. 82
[42] TAVARES, op.
cit, p.104
[43] LE BRUN - op
cit, p. 90
[44] LE BRUN, op.
cit, p. 94
[45] DE VARAZZE, p. 841.
[46] LE GOFF, 2001, p. 74.
[47] OLIVEIRA, 2000, p. 41.