Escultura e indianismo(s) no Brasil oitocentista

Alberto Martín Chillón [1]

CHILLÓN, Alberto Martín. Escultura e indianismo(s) no Brasil oitocentista. 19&20, Rio de Janeiro, v. X, n. 1, jan./jun. 2015. https://www.doi.org/10.52913/19e20.X1.07a [English]

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Introdução

Que povos eram aqueles que os portugueses acharam na terra de Santa Cruz, quando estes aproveitaram e estenderam a descoberta do Cabral?[2]

1.      A pergunta que Friedrich von Martius se fez em 1845 na hora de pensar como se deveria escrever a história do Brasil, num momento-chave para a construção da nova nação, permaneceu na consciência coletiva como uma questão a se resolver durante todo o Império; não se trata apenas de saber que povos eram aqueles, mas saber, em um plano real, qual era seu papel no novo Estado e, num plano simbólico, como iriam ser representados e com que finalidade. No fundo, é a mesma pergunta: o que fazer com aqueles povos achados na terra de Santa Cruz numa sociedade totalmente alheia à sua e qual seria a relação a ser estabelecida com eles? Em outras palavras, ocupa lugar central nesse cenário a pergunta de como o índio vai entrar na sociedade ocidental trasladada aos trópicos não só físicamente, mas imageticamente. O índio e sua imagem vão se converter num problema, entendido como desafio, a se resolver - e nem sempre estarão conectados.

2.      Nesse sentido, trataremos de entender, aqui, como as belas artes se confrontam com a difícil tarefa de representar o outro, o índio, que linguagens são selecionadas, que características são ressaltadas, quais são suas preocupações fundamentais e quais suas escolhas. É de escolhas que se trata, talvez mais do que incapacidade ou desconhecimento, visão que permite procurar maior intencionalidade nas obras, prescindindo de etiquetas restritivas como “academismo.” Assim, seguiremos essa linha, ao contrário da que escolheram autores como Bardi, que afirmava que os artistas:

3.                                    ignorantes de etnografia, não dispunham de contato com os indígenas, nem eram leitores crédulos de A Confederação dos Tamoios, de Domingos José Gonçalves de Magalhães, confluíam suas especulações indigenísticas para um maneirismo decaído [...]. Autêntica pintura indianista é a dos desenhistas que integravam as comitivas de explorações, pois eles observam o aborígene com curiosidade e interesse científico.[3]

4.      Não tomaremos, aqui, como um critério classificatório positivo a maior proximidade a “uma realidade” indígena, priorizando assim como mais perfeitas e importantes aquelas que tratam o índio de um ponto de vista mais “realista.” Devemos pensar até que ponto iria esse realismo quando sabemos que artistas viajantes puderam não ver de primeira mão tudo aquilo que retrataram nos seus desenhos, tomados até hoje como o protótipo de representação, e tomados depois por outros artistas, em maior ou menor medida, como Louis Rochet, paradigma de observação etnográfica, para se confrontar com a tarefa de esculpir o índio. Esse caráter “realista”, como “moderno,” entendido quase como uma evolução natural, não pressupõe neste estudo um fato que torne superior esse tipo de obras, indicando um caminho a seguir para todas as outras, como uma espécie de parâmetro de julgamento.

5.      Assim, prescindindo das limitações impostas pelo termo “academismo,” que teoricamente lastrava a produção com suas férreas cadeias, e não considerando o “realismo” ou o interesse “etnográfico” um ponto a ser alcançado, pensando nas obras que não seguem esse caminho como obras falidas, enfrentamos a imagem do índio nas belas artes.

6.      O termo indianismo tem suscitado múltiplos estudos, coincidindo a maioria deles em associar esse movimento ao romantismo e à busca de um herói nacional. A falta de tradições medievais, diante da impossibilidade de recorrer à história portuguesa e à figura do negro, deixava o índio como o único recurso, “o romantismo europeu dava o molde para uma estereotipação: os nativos eram estilizados como aristocracia autóctone. A idealização da nacionalidade tinha por epicentro a fusão de um colonizador épico com um bom selvagem.”[4]

7.      A partir da ideia principalmente tomada da literatura, em que índios como Peri representam “o índio como mito heroico do povo brasileiro [...] apresentado com atributos sobre-humanos desde sua primeira aparição no romance,”[5] tentaremos estabelecer se é do mesmo modo que as artes plásticas percebem o índio, e se utilizam precisamente a literatura como fonte de inspiração. Procuraremos, no entanto, tratar o indianismo, entendido como as representações plásticas que têm como protagonista principal ou coadjuvante o índio, como um fato contínuo, de longa tradição, no qual é difícil marcar o início de uma intencionalidade romântica para deixar atrás um outro indianismo, fato ainda mais forte na escultura. Focaremos principalmente nas representações plásticas produzidas após a obra dos grandes artistas viajantes e os membros da chamada Missão Francesa, e daremos especial destaque às obras escultóricas.

8.      No entanto, uma pergunta se coloca: por que focar precisamente na escultura na hora de enfrentar o indianismo? Numa primeira aproximação às obras indianistas, ainda que necessariamente incompleta pelas amplas lacunas que existem na sua reconstrução, podemos apreciar que, entre 1841, quando Carlos Custódio de Azevedo modela a medalha comemorativa da coroação de Dom Pedro II, e 1889, quando o Império desaparece, são muitas as obras com temática indígena, sobre as quais podemos fazer algumas apreciações. Naturalmente, na hora de abordar o indianismo, tem-se focado principalmente na pintura, e, ainda mais, depois da obra inaugural de Victor Meirelles, A primeira Missa do Brasil, nas representações femininas como Marabá, Lindoia, Moema, Atalá, Iracema etc. Coincidentemente, quase todas elas, excetuando Moema, de Victor Meirelles, 1866, foram pintadas na década de 70 e principalmente de 80. Por isso, lançando um olhar sobre as décadas de 40, 50, 60 e 70, que serão nosso foco principal, percebemos que, nos anos iniciais da década de 40, se produzem várias obras pictóricas com temática alusiva ao religioso, e com visos históricos, como a Elevação da cruz pelos selvagens, de Rafael Mendes de Carvalho, 1842, Nóbrega e seus companheiros, de Manuel Joaquim de Melo Corte Real, 1843, ou A primeira missa celebrada em São Vicente no ano de 1532, de Johann Moritz Rugendas, 1845. Auguste François Biard e Claude Joseph Barandier também realizam algumas pinturas indianistas: no caso do primeiro Cena de selvagens, em 1842, e Dois índios numa canoa e Índios adorando o sol, entre 1858 e 1860; no caso do segundo, Indígenas e Paisagem do Brasil, presentes na Exposição Nacional de 1861. Também em 1847, Louis Auguste Moreau expõe duas cenas da vida selvagem: A luta e O descanso. Fuga de Atalá e As exéquias de Atalá foram os temas escolhidos por Frederico Tirone par duas pinturas expostas em 1860.

9.      Desde finais da década de 50, na década de 60 e na primeira metade da de 70, produz-se uma importante série de esculturas de temática indianista. Assim, o campo escultórico passa a ter uma presença maior. As representações serão quase sempre masculinas, e com nomes genéricos, longe do que acontecerá com as índias de décadas posteriores. Esta tradição de obras escultóricas se pretende aqui reconstrui dentro do possível, analisando qual foi a sua importância, suas características próprias e seu papel dentro do indianismo, levando em consideração que é produzida antes da maioria das consideradas como grandes obras indianistas.

A escultura indianista

10.    Nesta genealogia escultórica indianista, situaremos o sempre necessário ponto de partida, ainda que nos remontemos aos inícios do século XIX, em 1845, quando Ferdinand Pettrich ofereceu uma escultura (mesmo que perdida) simbólica no indianismo, uma efígie de um índio simbolizando o Brasil.[6]

11.    Já em 1850 parece que Francisco Elídio Pânfiro, no momento de sua morte, estava modelando uma série de baixos-relevos alusivos à obra Caramurú, de Santa Rita Durão, e em 1857 encontramos uma das grandes obras indianistas, ainda que pouco conhecida, o frontão do antigo Cassino Fluminense, de 1857, realizada por João Duarte Morais, Severo da Silva Quaresma e Quirino Antônio Vieira, onde a figura do índio ocupa pela primeira vez o lugar principal numa obra de semelhante importância.[7]

12.    A década de 60 foi especialmente prolífica em esculturas indianistas. Assim, em 1861, na Exposição Nacional, foi apresentado um relevo em madeira do país, de I. G. W. Steffens, Desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro. Em 1862, se inaugura o grande monumento a Dom Pedro I de Louis Rochet e também Leon Despres de Cluny realizara Família de selvagens atacados por uma serpente. Em 1866, Cândido Caetano de Almeida Reis enviou de Paris seu primeiro trabalho como pensionado da Academia de Belas Artes, O Paraíba. Dois anos depois, Karl Linde apresentou um relevo em cera na Exposição Geral de Belas Artes, Combate de dois índios. Na década de 70 encontramos a medalha comemorativa da Lei do Ventre Livre, Índio em repouso e À espreita, de Rodolfo Bernardelli, e Alegoria do Império Brasileiro de Francisco Manuel Chaves Pinheiro. Por fim, na década de 80 se reduz bastante o número de esculturas de temática indígena, destacando A Faceira de Rodolfo Bernardelli e as seis representações fluviais no pavilhão brasileiro da Exposição Universal de Paris de 1889.

Formas e usos da imagem indígena

13.    À diferença da pintura, poucas serão as ocasiões em que a escultura indianista vai procurar sua fonte de inspiração na literatura. Só conhecemos um caso deste tipo, lamentavelmente perdido: a referida série de relevos que Francisco Elídio Pânfiro, professor da Academia de Belas Artes, estaria modelando no momento de sua morte precoce em 1852 sobre o romance Caramurú, de Frey José de Santa Rita Durão, romance que também escolheram Jules Le Chevrel, em 1862, e Victor Meirelles, em 1866, para pintar Paraguassú e Diogo Alvares Correa e Moema. 

14.    O viés histórico, frequente na pintura para a representação do descobrimento e evangelização do território, também é raramente representado na escultura.  Na pintura, entretanto, na década do 40, há vários representantes, como Rafael Mendes de Carvalho, que em 1842 pintou Elevação da cruz pelos selvagens; Manuel Joaquim de Melo Corte Real, com Nóbrega e seus companheiros, de 1843; ou A primeira missa celebrada em São Vicente no ano de 1532, de Rugendas; assim como a paradigmática obra A primeiro missa no Brasil, de Victor Meireles, cujo esboço foi exposto na Exposição Geral de Belas Artes de 1859. Só um relevo, apresentado na Exposição Nacional de 1861, representou este momento: um desconhecido I. G. W. Steffens realizou em madeira do país um relevo em que plasmou o Desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro. A cena é claramente dividia em duas partes: na direita, a expedição chegando; e a esquerda reservada à floresta e aos indígenas, que observam a cena. Na parte central, em primeiro plano, um grupo de três portugueses com o estandarte real, e um deles eleva a mão ao céu. Justamente sobre eles se encontram indígenas ajudados por portugueses que estão erguendo uma grande cruz de madeira. O tratamento das figuras indígenas é muito parecido ao de Victor Meireles, mas a gravura através da qual conhecemos a obra nos impede realizar maiores apreciações sobre as figuras individualmente.

15.    Caso excepcional é o de um grupo tradicionalmente atribuído ao escultor Francisco Manoel Chaves Pinheiro, identificado com sua obra Ubirajara[8], no hall do Museu da República do Rio de Janeiro. No entanto, a aparição na imprensa de uma resenha sobre a obra ganhadora da medalha de ouro na Exposição Geral de Belas Artes de 1862, nos faz repensar esta atribuição:

16.                                  O grupo do Sr. Desprez é imponente. O indio, em pé, inclinado sobre o quadril esquerdo é surprehendido pela apparição de uma cascavel que se ergue e ameaça mordel-o. Tem na mão uma flexa; muito proximo porém para poder servir-se do arco, o indio prepara-se para defender-se, por assim dizer corpo a corpo. Esta lucta manifestada com clareza, encheria de terror o espirito do espectador se a mulher, abrigada atraz do indio e trazendo um filho em seus braços, não respirasse tanta confiança.[9]

17.    O escultor francês Leon Despres de Cluny aparece ativo no Rio de Janeiro desde, pelo menos, 1861; permanece ativo durante mais de 25 anos e mereceu o reconhecimento artístico em várias ocasiões. Parece que seria ele o artista escolhido pelo barão de Nova Friburgo, António Clemente Pinto, para realizar o presente grupo. Pouco sabemos sobre esta encomenda e o nível de responsabilidade do cliente no resultado final, mas já na época é destacada pelo seu classicismo, pelo amor à escola antiga, que afastou o escultor do caráter do assunto, não representando bem o tipo indígena.[10] Assim, a preocupação pelo tipo indígena foi, já em 1863, um dos principais pontos de preocupação da crítica, que se repetirá em outras representações, como O Paraíba, de Cândido Caetano de Almeida Reis, de 1866.

18.    A construção da imagem indígena feita pelo francês destaca-se por seu sincretismo. Os referentes tomados são da mais variada procedência. Dentro de uma composição piramidal, o artista reúne os atributos mais típicos do índio: saia de penas e flechas, acompanhados de vegetação, ainda que estereotipada, e os animais advindos da caça - animais e vegetação que, à diferença de Rochet, carecem de um estudo pormenorizado das características locais.

19.    Por outro lado, chama a atenção a ausência do cocar, e mais ainda o penteado escolhido por Despres, que remete a penteados mais próprios dos índios norte-americanos, do mesmo modo que a pele de animal que o índio carrega nos ombros, atributo alheio ao índio brasileiro. O forte sabor clássico é percebido pela crítica  especialmente na figura feminina, que é percebida mais como uma figura da Fé, bela e imutável. Assim, se cria uma representação totalmente original no panorama artístico brasileiro, que dadas suas referências norte-americanas, nos leva a pensar no pouco conhecido labor do escultor Ferdinand Pettrich, presente no Brasil desde a década de 40, e que realizou uma série de bustos de índios norte-americanos a partir dos esboços tomados nos Estados Unidos e que devem ter tido grande repercussão no panorama artístico. Não podemos olvidar que uma das primeiras obras de temática indianista, uma alegoria do Brasil como um índio, foi oferecida pelo escultor em 1845. Levando em consideração a coleção de Pettrich presente nos Museus Vaticanos, na qual existe uma preocupação por plasmar os traços faciais e as peculiaridades de cada indivíduo, podemos pensar que, talvez, essa mesma preocupação dirigiu a criação da sua imagem do índio brasileiro. Esta tentativa - se é que foi o caso - terá seu ponto culminante na obra de outro escultor europeu, neste caso francês, Louis Rochet.

A proposta etnográfica. Um caminho descontínuo

20.    Sem dúvida, a obra mais conhecida de Louis Rochet[11] é o monumento a Dom Pedro I, 1862, feito sob projeto inicial de João Maximiano Mafra, cujo modelo foi apresentado no Salão de 1861 em Paris. Em L’Artiste, Francis Aubert qualificou Rochet como o primeiro escultor que enfrentou a tarefa de representar índios e que resolveu bem o tema apesar da falta de tradição. Neles, predominava uma dignidade firme mesclada com a melancolia que é peculiar à etnia representada e, finalmente, arrematava: “ils sont vrais, et pourtant ils sont beaux,”[12] pondo de manifesto o traço mais destacado pela crítica, a verossimilitude dos traços faciais indígenas, que Rochet estudou, direita ou indiretamente através de gravuras na sua estância no Rio de Janeiro em 1856, estudo do que se conservam vários bustos no Museu do Homem de Paris, retratando diversas etnias.

21.    Com um caráter novo, O Paraíba, obra produzida em Paris por Candido Caetano de Almeida Reis, um discípulo brasileiro de Rochet, apenas quatro anos depois da inauguração do monumento a Dom Pedro I, é considerado como o início na escultura de um “indianismo de caráter mais intencional, filiado ao Romantismo.”[13] O índio proposto por Almeida Reis é reconhecível como índio sem necessidade de qualquer tipo de atributo, uma vez que o escultor “coloca a figura do indígena como essência mais naturalista do que simbólica.”[14]

22.    O Paraíba se encontra fora dos usos da época da imagem do índio: não é o mito fundador da nação, a imagem do Império, ou representação do território; não está dentro da inspiração literária, nem com uma face mais decorativa. Seguindo o caminho aberto por Rochet, o artista vai além da obra do seu mestre, que se preocupou com os traços individualizados dos diferentes grupos indígenas para modelar seus grupos dos rios. Como bem explica Paulo Knauss,[15] Rochet ilustra o interesse antropológico que estava acontecendo na Europa nesses momentos. Outros escultores, como Carpeaux, estavam também se preocupando em traduzir nas suas obras os traços estudados com um caráter mais antropológico, fato que se vê marcado com mais força nos esboços em madeira desta obra de Almeida Reis,[16] onde a postura e o tratamento são mais livres.  

23.    A proposta audaz do escultor consistiu em despojar a figura do índio de todos os seus atributos tradicionais, apresentando-o como obra individual, fora de qualquer grupo artístico ou programa iconográfico, como as representações do Gênio do Brasil no Cassino Fluminense, de 1857, onde o índio ainda é um conceito e a tradução de uma longa tradição com uma grande carga de significados; ou no monumento já citado de Dom Pedro I, em que os índios são a representação territorial do Brasil. Precisamente num dos bustos para o estudo do monumento parece basear-se Almeida Reis para conceber o rosto do seu Paraíba. O índio se vê representado como alegoria, como reflexo de uma ideia ou de um conceito; porém, O Paraíba tem uma inspiração nova e diferente, ainda que entendido como alegoria na sua recepção, já que perde esse caráter, apresentando um índio que é definido como “o molde mais correcto e typo do índio Americano,”[17] desvelando assim a preocupação de parte da crítica de representar levando em consideração os traços de um índio, ainda que genérico.

24.    Precisamente as representações de rios serão um dos temas especialmente prolíficos na arte brasileira, e também uma iconografia muito relacionada com as representações indígenas. Este tipo de uso das alegorias fluviais aparece já em 1817, nos festejos para a chegada da princesa Leopoldina de Áustria,[18] quando os comerciantes da cidade erigiram um arco na Rua dos Pescadores, sob a direção de Grandjean de Montigny e Debret, e representaram em dois pedestais as figuras do Rio Janeiro, apresentando as armas do Reino Unido de Portugal, e o rio Danúbio, apresentando as águias do Império, com as inscrições Januarium e Danubios, representação dos dois impérios. Em 1818, nas festas de aclamação de Dom João VI no Rio de Janeiro, a Junta do Comércio financiou e iluminou um arco de triunfo realizado por Debret e Montigny: no meio do arco apareciam os rios Tejo e Janeiro com as armas do Reino Unido sustentadas por uma coroa.[19] Também o Amazonas aparece num baixo-relevo que se situava no tímpano do Templo à Minerva, na coroação de Dom João VI, no qual apareciam “Neptuno e os principais rios do Universo: Danubio, Eufrates, Nilo e Amazonas, oferecendo aos reis os produtos das regiões por eles percorridas.”[20]

25.    Durante o Império, vários seriam os projetos que contemplariam estas figuras fluviais, em muitos casos sem mais especificações sobre sua aparência, como um dos mais importantes projetos públicos imperiais, porém sem realização, que esteve a cargo de Grandjean de Montigny: esse artista idealizou então um amplo conjunto de monumentos que se estenderia pelo campo de Aclamação, onde “seriam erguidas nove fontes, decoradas com emblemas ou representações dos principais rios do Brasil.”[21] Fazendo parte de um grande projeto para comemorar a Guerra de Paraguai apareceram no pedestal “oito estatuas differentes em grupos de duas, representando os principais rios do Império,”[22] obra de F. de A. Caminhoá e P. Bernard.[23]

26.    Mas, em que momento estas alegorias começaram a se vestir com penas?  Num desenho conservado na coleção do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro,[24] projeto para erigir um monumento no Campo da Honra em memória do dia 7 de abril de 1831, aparecem, na base, três alegorias fluviais; segundo Morales de los Rios, este monumento seria coroado por uma figura de índio simbolizando o Brasil.[25]

27.    Sem dúvida, uma das representações aonde o rio vai se aproximando senão do índio ao menos dos atributos tradicionais das representações da América, vestida de penas, será a varanda efêmera idealizada por Manuel de Araújo Porto-alegre para a coroação de Dom Pedro II, que se rematava com um ático “coroado por uma quadriga, em cujo carro triunfante está o Gênio do Brasil, tendo na mão esquerda as rédeas dos ginetes, e na direita o cetro Imperial;”[26] “do lado norte ve-se a estatua collosal do Amazonas sentado e recostado sobre hum jacaré, tendo na mão esquerda a pá e na direita huma cornucopia cheia de fructos do Brasil: do lado do sul corresponde-lhe a estatua do Prata com iguais attributos.”[27] Os atributos escolhidos vão se repetir, ampliados e reforçados com traços faciais indígenas na obra de Rochet, de novo acompanhando o Imperador; segundo Migliaccio, já na varanda de coroação estariam caracterizados como índios, representando o “papel histórico destes povos no processo histórico desde a evangelização até a proclamação da independência, assim como o papel dos rios no processo de colonização e unificação política do Brasil”.[28]

28.    Segundo Lilia Moritz, a “coroação de Dom Pedro II, em 1841, constituiu uma das maiores festas do Império, onde as alegorias foram criadas com o propósito de representar os anseios da elite política do país e o perfil que o jovem Pedro deveria simbolizar diante da nação e, paralelamente, aos súditos do Império.”[29] Assim, a presença dos rios Amazonas e Prata serve para delimitar, por uma parte, o vasto território brasileiro, e, por outro, para engrandecer o monarca capaz de reger semelhante império. Além de caracterizar o novo território perante o mundo, o rio, que já foi usado como recurso em 1823 na varanda de coroação de Dom Pedro I no Pará, onde a América, ao lado do Brasil, do Rio Amazonas e do Prata, proclamava o novo soberano.[30]

A longa tradição: a imagem do Brasil e do Império  

29.    O rio Amazonas e o rio da Prata, imagem da nação enquanto território, faziam parte de um dos aparatos mais importantes e representativos do Império: a varanda de coroação de Dom Pedro II, em 1841. Neste momento, segundo Migliaccio:

30.                                  a política cultural da corte brasileira, orientada pelas escolhas do jovem soberano e do seu círculo, adquire um caráter nacionalista e americanista. A imagem do país e da monarquia se separa do passado vinculado à herança portuguesa, ainda presente no Primeiro Reinado, e passa a afirmar a inspiração católica e o caráter americano do império constitucional fundado nos trópicos. A imagem do índio, antes utilizada como alegoria do novo estado, adquire uma nova consistência histórica como fundador da nacionalidade e da identidade americana do Brasil.[31]

31.    A ideia de Brasil, desde o descobrimento, se vê associada à sua natureza exuberante e a seu exotismo, ideia que aparece frequentemente ligada à figura do índio como seu habitante primordial. Como assinala Knauss, “ainda que a imagem alegórica dos índios fosse usada desde o período colonial para identificar a terra do Brasil, é na segunda metade do século XIX que as artes plásticas vão participar do movimento de promoção do índio como ícone do Império do Brasil.”[32]

32.    A relação da imagem do índio com a construção da imagem do Império, em suas diversas manifestações, se constitui como um fato recorrente. Os grandes eventos monárquicos - entradas reais, casamentos, coroações - formam um campo onde os índios aparecem com certa frequência. Obras como Cenário para o Bailado Histórico para a apoteose de Dom João VI no Teatro Real de São João, em 13 de maio de 1818, e Pano de boca executado para a representação extraordinária dada no Teatro da corte por ocasião da Coroação do imperador Dom Pedro I, 1822,[33] realizados por Jean-BaptisteDebret, ilustram o papel do índio na imagética nacional. No primeiro é o pilar em que o rei se sustenta, a ilustração de um dos territórios do grande imperio português, junto com as personificações de outros diferentes territórios. no pano, a figura central do imperador é substituída por uma alegoria da nação, rodeada por diferentes formadores da nacionalidade, entre eles os indígenas no seu lado esquerdo, mas não embaixo, senão do lado. antes da Missão Francesa, é recorrente o uso do indígena no aparato monárquico. Na cidade mineira de São João Del Rei, “dois gênios vestidos com capacetes e cocares de plumas[34] sustentavam uma coroa e um cetro, sob o trono oferecido pelos negociantes da Rua Direita por ocasião da coroação de Dom Pedro.

33.    Num dos principais destes eventos, a coroação de Dom Pedro II, foi acunhada uma medalha comemorativa, com o lema Ordo et felicitas, onde um indígena, nos moldes tradicionais, coroa e legitima o imperador, sentado no trono. Segundo Schwarcz,[35] seria uma indígena quem coroa Dom Pedro e pisa no dragão, sendo a coroa símbolo de civilização e o dragão símbolo da barbárie. A figura nos remete às representações da alegoria do Brasil, que coroa o novo imperador, fato comumente associado a ela. Mas no caso brasileiro, é importante destacar uma outra figura, quase um desdobramento destas alegorias: o Gênio do Brasil. A Semana Ilustrada, em 1865,[36]oferece um canto heroico dedicado ao Imperador, escrito pelo doutor Tito Nabuco de Araujo, acompanhando a poesia uma litografia representando o Imperador coroado pelo Gênio do Brasil. O Gênio aparecerá como uma figura masculina, às vezes indígena, com um caráter bem diferenciado da alegoria do Brasil.[37]

34.    Desde os inícios da presença da corte portuguesa, a figura do Gênio do Brasil e da Alegoria, tanto no Brasil, quanto na América, teve um papel e uma personalidade diferenciada. Na festa de casamento de Dom Pedro Carlos de Bourbon e Maria Teresa de Bragança em 1810, o padre Luís Gonçalves narra a presença do Gênio de Brasil, um índio a cavalo, como figura diferenciada, e também descreve um carro alegórico dessa festa: “A composição, artificial e intricadamente decorada, era a maqueta de uma montanha no cimo da qual se erguia a ‘América,’ de aljava ao ombro e arco na mão, carregando um toucado de penas de muitas cores e uma tanga igualmente decorada,” aludindo, ainda, a falsos índios - europeus fantasiados - executando danças rituais.[38]

35.    A alegoria da América ou Brasil é fruto de uma longa tradição. No Brasil aceita e coroa o imperador, e é protegida por ele, dado seu caráter indefeso e feminino. No entanto, o Gênio aparece com caráter masculino, guerreiro e protetor, pisando a hidra da anarquia e desunião, ainda que também apareça coroando o imperador. Assim, às vezes se misturam as funções da alegoria e o Gênio numa só representação. Na medalha de coroação de Dom Pedro II, a figura indígena, aparentemente feminina, coroa o imperador, mas também pisa a hidra da anarquia. Em algumas ocasiões, o Gênio é representado por mulheres, pelo que não há sempre uma distinção clara, mas comumente a imagem do Gênio é masculina e aparece muito relacionada com o imperador e suas funções. Tanto o Gênio quanto o imperador são os protetores do Brasil, os anjos tutelares; ambos os dois são nomeados como gênios do Brasil e suas funções se misturam, formando uma unidade simbólica que tenta unificar em torno dela a nação.

36.    No fundo estamos tratando da construção de uma imagem do Império, do Imperador e da nação identificada com o modelo monárquico, e o Gênio é parte importante deste processo. Num princípio representa o território, a peculiaridade da colônia no conjunto do Império português, com funções e com a concepção própria da tradicional alegoria da América. Mas, aos poucos, a personalidade do território vai se definindo, e vai se afastando do português, para estabelecer um laço da monarquia com o Brasil:

37.                                  A aliança entre a América e D. Pedro, que surgiu frequentemente nas quadras, nas iluminações, nos arcos de triunfo, instaurava uma descontinuidade entre esse príncipe e a monarquia portuguesa, esvanecendo lentamente sua ascendência de Afonso Henrique, sua devida fidelidade a Portugal, a fim de estabelecer um laço irreversível entre o príncipe e o Brasil.[39]

38.    Território e governante aparecem definidos com as peculiaridades próprias, individualizadas, diferenciadas da nova nação. Um dos pontos de diferenciação e união, porém não isento de críticas, foi o símbolo indígena, que o Império adota com presteza num projeto nacionalista, tendo um ponto importante numa obra pouco conhecida: o frontão do Cassino Fluminense, primeira grande criação artística pública de caráter definitivo onde o índio aparece como figura principal e protagonista, fato que não voltaremos a ver até quase 20 anos depois, na obra Alegoria do Império brasileiro, de 1874, de Francisco Manoel Chaves Pinheiro.

39.    O frontão do Cassino Fluminense, obra de Severo da Silva Quaresma, Quirino Antonio Vieira e João Duarte Morais, inaugurado em 1860, mas realizado - pelo menos o modelo - em 1857,  é um exemplo maduro e durável da representação nacional do Brasil, onde se unem as ideias de território, nação em construção, projeto civilizatório e Império. Nele se representa o Gênio do Brasil que se encontra dentro de uma forte corrente indianista, já desde seus inícios, porque parece que a imagem do Gênio era recorrente em festejos e representações, especialmente na data da festa da independência nacional, normalmente representado como um índio, como aparece no seguinte texto: “o selvagem, posto que bravo e audacioso, não apparecerá de cocar e plumas, nos trajes com que o gênio do Brasil se mostrava em todos os elogios dramáticos com que outr’ora se solemnisavão os dias de festa nacional.”[40] A ideia do Gênio como índio era bastante frequente, mais do que em representações plásticas, em atos políticos, representações teatrais e comemorações ligadas ao soberano e sua família, atos de ampla repercussão, representados não por índios autênticos senão por europeus fantasiados, que se apropriavam dos atributos indígenas.

40.    A primeira menção encontrada sobre o Gênio do Brasil remonta ao ano de 1810, já representado como indígena, quando o comerciante inglês John Luccock, ao narrar as festividades do casamento da Infanta D. Maria Teresa e Dom Pedro Carlos, explicita: “O gênio do Brasil fez sua aparição, representado por um índio a cavalo [...].”[41]

41.    Apesar de não serem muitas as testemunhas plásticas conservadas do Gênio, artistas como Auguste Taunay, no Grupo alegórico da Restauração da Bahia,[42] o entendem como um guerreiro clássico carregando o escudo com a cabeça da Gorgona; Manuel de Araujo Porto-Alegre o entende como um ser alado coroado de louro, na varanda de coroação de Dom Pedro II, e já como um índio alado carregando uma vara especial, no frontão do Cassino Fluminense. Só o frontão entende o Gênio como um índio, apesar de que, fora das artes plásticas, como no teatro, especialmente nos elogios dramáticos, e na imprensa, são, sim, representados frequentemente como indígenas. No teatro reforçando a ideia da representação indígena do Gênio, se produz um debate, precisamente sobre o modo em que este deveria se vestir. Sua representação com roupas clássicas gera o seguinte comentário: “Esta referencia à cultura clássica seria escusável na Rússia ou na China, mas todo mundo sabe no Brasil que os caboclos não vestem assim.”[43] Assim, o Gênio é entendido como caboclo, já não como índio “selvagem” senão como índio mestiço e civilizado. Outras vestimentas se referem mais à interpretação do índio como selvagem, símbolo do atraso da civilização. “O gênio do Brasil durante o canto da Harmonia sahe também da sua gruta, e em trajes e com armas que symbolizão o estado selvagem e o da civilisação.”[44] Inclusive em celebrações cívicas patrióticas, o Gênio se figura numa jovem vestida de índio:

42.                                  Ás 9 horas da manhã 24 de março, os voluntários da pátria, partindo da casa do sócio Pedro de Azevedo, dirigirão-se debaixo de fórma á igreja do Rosario. Em sua frente caminhava a galante jovem Rosinha de Azevedo, vestida de índio, symbolisando o gênio do Brasil, levando a bandeira dos voluntários.[45]

43.    O Gênio do Brasil se insere, assim, numa genealogia de representação indígena, ao mesmo tempo em que é símbolo do Império e do Imperador. Assistimos ao esforço imperial para criar sua própria imagem:

44.                                  Assim, a mensagem do frontão é um manifesto complexo das preocupações políticas, culturais e artísticas do Império, como uma materialização do seu projeto civilizatório. A preocupação nacional é o eixo principal do conjunto. O nacional enquanto a arte, o nacional enquanto modelo de pátria que o Império propunha, e o nacional enquanto a tentativa de criar uma imagem própria para a jovem nação, que culminará na obra de Chaves Pinheiro, Alegoria do Império brasileiro, em que um índio ocupa o lugar do imperador e porta seus emblemas.[46]

45.    Alegoria do Império Brasileiro ou Cabloco em barro, symbolisando o Brasil, modelada em terracota por Francisco Manuel Chaves Pinheiro em 1874,[47] de tamanho natural e conservada no Museu de Belas Artes de Rio de Janeiro,[48] outorga ao índio o papel protagonista na sua composição. O índio e o Império se fundem numa mesma figura destinada a uma representação pública do Império concebida “para ser exposta em praça pública, em bronze, em tamanho três vezes maior que o atual,”[49] embora depois fosse colocada na escadaria do prédio do Tesouro Nacional até a chegada da República.[50] Uma representação diante dos próprios cidadãos, em forma de escultura pública, legitima e continua os modelos indianistas surgidos nas páginas da imprensa.[51]

46.                                  Chaves produziu o documento mais emblemático de sua geração ao embutir no título da sua obra a intenção do projeto indianista. Com uma postura corporal idêntica à do imperador em sua imagem oficial elaborada por Pedro Américo, que o retrata na Fala do Trono, o indígena de Chaves carrega o cetro da monarquia em vez da sua arma, um escudo com o brasão imperial em lugar de sua borduna. O cocar está na cabeça, mas é o manto do rei que cobre a “nudez natural” desse “símbolo nobre e puro de nossa origem.”[52]

47.    A imagem do índio proposta por Pinheiro é definida como “uma das mais idealizadas do indígena representante do país,”[53] “como se tivesse travestido uma estátua de Apolo com os aparatos indígenas,”[54] “uma estátua grega vestida de tanga.”[55] Parece claro, como assinala Knauss, que define a obra como um “evidente exercício classicizante na construção da imagem do indígena,”[56] que o classicismo foi a escolha do artista, que cria um nu masculino, estático, que remete fortemente à arte greco-romana.  Apesar do geral reconhecimento do classicismo da figura, uma visão direta da obra, da face do índio representado, ainda que não se constituindo como um estudo detalhado dos traços étnicos do indígena brasileiro, também não encaixa com os cânones clássicos. Os olhos levemente rasgados, os pômulos altos e marcados, o nariz grande ou o queixo proeminente, fogem do classicismo, mas sem chegar ao estudo etnográfico.

48.    O caráter simbólico desta representação foi sublinhado diante da evidente semelhança com representações do imperador, como a de Pedro Américo,[57] Dom Pedro II na Abertura da Assembleia Geral, de 1873, só um ano anterior à obra de Chaves Pinheiro. Devemos agregar algumas representações escultóricas que devem ter influenciado as escolhas do escultor. Em 1844 foi apresentada a grande efígie pedestre em mármore de Pedro II, realizada pelo escultor dinamarquês Ferdinand Pettrich, que parece ser, apesar de algumas variantes, semelhante a que foi fundida em bronze e apresentada na primeira Exposição Nacional de 1861. Em ambas, a postura do imperador é muito semelhante à Alegoria do Império Brasileiro, substituindo a espada pelo escudo com o brasão imperial.

49.    Assim, nesta dilatada relação entre o índio e a imagem imperial podemos traçar um paralelismo entre a obra de Chaves Pinheiro e o frontão, que consideramos frutos de um mesmo desejo. Se nesta última o Gênio, como representação do Império, ainda está mais preocupado com a estabilidade política do Império, a Alegoria do Império, uma vez consolidado o âmbito político, se preocupa com o campo artístico, realizando o mesmo processo. As duas são imagens do Império, duas representações dos anseios imperiais.

50.    Nesta procura pelas representações indígenas, parece claro que a grande maioria não se produziu nas artes plásticas, senão em "criações efêmeras", como teatro, celebrações cidadãs, literatura, imprensa, entradas e celebrações imperiais que moldavam a imagem do índio. O papel destas representações resulta mais difícil de valorizar devido a seu próprio caráter, mas resulta chave na construção e produção de imagens e protótipos e seu conhecimento resulta extremadamente importante para uma melhor compreensão de fenômenos e produções mais amplas, bem como para entender qual foi o papel dessas representações e o grau de responsabilidade nas conformações imagéticas.

51.    Um interessante desenho de Miguel Dutra nos oferece a visão de um arco triunfal rematado por uma alegoria fluvial como um índio que, por sua vez, segura uma bandeira do Império Brasileiro, unindo assim a representação fluvial com as intenções representativas do Império. Lamentavelmente não aparece data nem lugar onde este arco pudesse haver estado situado, o que nos ofereceria valiosas informações para entender o indianismo. Apesar disso, um desenho de outro arco, com algumas caraterísticas similares aparece datado em 1848, para a chegada de Dom Pedro II; assim, este exemplo se constitui como um antecedente às alegorias fluviais de Rochet e testemunha de uma tradição mais antiga.

52.    Continuando com as representações efêmeras ou menos oficiais, por exemplo, a Alegoria do Império Brasileiro estabelece interessantes relações com uma série de representações simbólicas aparecidas na imprensa nos anos 1860, onde a pátria, a nação, o país e as diversas províncias são representadas como indígenas, homens, mulheres e, às vezes, representações bastante indefinidas, que não deixam claro o sexo representado. Especialmente uma delas, de Henrique Fleuiss, um dos principais agentes nessa popularização da imagem da pátria como índio, publicada na Semana Ilustrada, em 16 de abril de 1865, apresenta uma alegoria do Império que corresponde de uma maneira quase idêntica, mas em posição sedente, à obra de Chaves Pinheiro. Temos que considerar, assim, que é durante a Guerra de Paraguai, quando os sentimentos de pátria se intensificam e a imagem do índio representa frequentemente a nação. Segundo a opinião de Murilo de Carvalho, a representação do país como índio tornou-se comum durante o Império;[58] estudando a imprensa ilustrada durante a Guerra de Paraguai, o autor mostra que o imperador ou a coroa eram raramente representados, substituídos pela figura do índio. É neste momento quando se produz uma mudança substancial na concepção de pátria. A Guerra do Paraguai supõe um fato marcante, já que une aos brasileiros como uma nação ao confrontar-se com o inimigo comum e na imprensa começam a aparecer com maior frequência as representações da pátria, da nação ou do Império. 

O índio e sua imagem: frente e verso

53.    Como duas caras de uma mesma moeda, os índios foram visto como “decadentes” e ‘grosseiros” ou como  “belos’ e “inocentes,”[59] como símbolo possível da nação ou como um problema para o desenvolvimento da mesma. E isso ocorreu desde época muito antiga, já que, na década de 1850, o historiador Varnaghen opunha-se à corrente dos que afirmavam, ou pelo menos criam, “que os nossos antigos índios são os verdadeiros Brazileiros puritanos, e os mais legítimos representantes, no passado, da nacionalidade actual,”[60] e conclui, depois de um longo texto dedicado a desmentir esta ideia, que:

54.                                  os índios não eram donos do Brazil, nem lhes é applicavel como selvagens o nome de Brazileiros: não podiam civilisar-se sem a presença da força, da qual não se abusou tanto como se assoalha; e finalmente de modo algum podem elles ser tomados para nossos guias no presente e no passado em sentimentos de patriotismo ou em representação da nacionalidade.[61]

55.    O aspecto simbólico e o real, o símbolo e o homem, vão ser dois aspectos de difícil conjugação, uma dicotomia que acompanharia o indianismo como um companheiro inseparável.

Índios selvagens e civilizados: a civilização como finalidade

56.    A questão da civilização do índio foi uma constante e uma ideia fundamental durante o Império. Seguindo as teorias sobre a perfectibilidade do homem, “quando o ser humano é colocado no mundo pela primeira vez para viver no estado natural, irrompe nele um sentimento intrínseco de aperfeiçoar-se que o impele ao domínio do mundo físico, ao melhoramento material e à elevação moral.”[62] Assim, o índio devia se introduzir na sociedade civilizada ocidental, abandonando seus costumes e crenças. Este processo teve uma grande importância para o Império, que desejava a incorporação desta população, não só por interesses filantrópicos, senão também pelo desejo de aumentar a população e, portanto, o desenvolvimento do país. Em 1847, se propõem dois grandes recursos para estes fins. Um é a chamada de população estrangeira, e o outro é “o de chamar ao grêmio da população as hordas indígenas que vagueão errantes pelas nossas matas.”[63] Por este meio deixarão de ser hordas, índios bravos,[64] selvícolas ou índios não domesticados - por volta de 800.000 em 1847 - para se tornarem índios civilizados, mansos ou domésticos - aproximadamente 200.000 no mesmo ano:[65]O aldeamento de S. Pedro em Cabo Frio era outr´ora composto de Indios Goyatacases, cujos descendentes já em terceira ou quarta geração, e confundidos hoje na massa da população, não pode actualmente ser contados para uma estatística especial.[66]

57.    Neste empenho, muitos foram os investimentos de capital. Este registro e a dotação de recursos para esta tarefa mostram como ela foi uma preocupação constante dos governantes. Na despesa geral do ano 1848-1849, por exemplo, destinaram-se 32.000 contos de reis para “a catequese e civilização dos índios,” expressado nestes termos orçamento maior que o da Academia Imperial de Belas Artes, 20.096 contos de reis, e quase igual ao orçamento da Secretaria de Estado, 33.200 contos de reis.

58.    Portanto, com esta política efetiva conseguia-se que os índios perdessem a sua condição e passassem a fazer parte da população sem diferenças específicas. Os meios para conseguir este objetivo foram, em primeiro lugar, as missões religiosas, que catequizavam os indígenas para aceitá-los na sociedade e depois poder ensinar os costumes e princípios morais do homem civilizado, para poder acessar ao segundo meio de civilização, o trabalho, que vemos já desde século XVII como distintivo do bom e mau selvagem, quando o pintor holandês Albert Eckhout, entre 1641 e 1643, pintou Homem tapuia,  Mulher tapuia, Homem tupi e Mulher tupi, que são umas das primeiras obras centradas na observação do indivíduo, mais do que as anteriores representações indígenas que respondiam a tópicos, generalidades e construções sobre os nativos sul-americanos  como uma categoria única, como um outro diferente e desconhecido, canibal e exótico, seguindo as representações tradicionais da América, como a de Cesare Rippa, que regulamentou a imagem da América como uma índia armada. No caso de Eckhout, suas obras

59.                                  encerram uma alegoria baseada no senso comum da época: a domesticação possível dos Tupi e a ferocidade irredutível dos Tapuia. Assim o homem e a mulher tupi são aqui mostrados com sua produção (redes e cestos), trabalhando para os estabelecimentos coloniais, enquanto os tapuia (que não eram, contrariamente aos tupi, canibais) aparecem carregando pés e mãos decepados, e ladeados de animais peçonhentos.[67]

60.    Esta ideia perdurará no tempo e, já em 1874, o general Couto de Magalhães, acreditando na ideia da raça predestinada à extinção, no seu discurso de Região e Raças selvagens, lido no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, propõe de novo o aproveitamento dos indígenas através do trabalho, como meio para integrá-los na civilização, através do estudo da língua e costumes destes povos.[68] Relação esta, selvageria-civilização, que se pode ver também nos EUA, onde “o indígena poderia no máximo enquadrar-se à história, com duas alternativas: morrer ou se adaptar.[69]

61.    Tanta era a fé na mudança de estado de evolução dos índios, que um estudo das características craniais, ao modo da frenologia, poderia revelar os benefícios da civilização refletidos na mudança da conformação do próprio crânio, que introduz na teoria das raças um quarto grupo. Além do branco, do negro e do índio, o índio civilizado se converte numa categoria própria e diferenciada:

62.                                  Convém igualmente colligir craneos de todas as raças dos naturaes do paiz, e moldar no vivo algumas cabeças, para á vista de certos dados Moraes poder verificar conjuctamente o que há de mais positivo no systema de Gall: se há verdade nesta doutrina, a craneoscopia deverá encontrar notáveis modificações entre as diversas protuberâncias do craneo do Indio sellvagem e as do Indio civilisado ou do mestiço, conforme a raça predominante.[70]

63.    Entretanto, alguns autores inclusive chegaram a negar a capacidade dos índios, como seres inferiores, à compatibilidade com a civilização, estando, portanto, destinados à extinção total. Entre eles, o historiador Varnaghem afirma que “no Reino Animal há raças perdidas; parece que a raça índia, por um efeito de sua organização física, não podendo progredir no meio da civilização, está condenada a esse fatal desfecho.”[71] Mas não todas as opiniões seguiam esses caminhos,[72] senão que, em algumas ocasiões, tenta-se aproximar o índio ao europeu, afirmando que, “não dúvida alguma, que elles pertencem á raça Caucasica. Os indios tem uma cara nobre algum pouco effeminada, um profil distincto, quasi grego, as formas do corpo delgadas, um bello andar, as extremidades finas.”[73]

64.    Para outros autores, como Sílvio Romero, o símbolo nacional estaria no mestiço: “Sílvio demonstra o engano em se celebrar o índio como símbolo nacional do nativismo brasileiro, em detrimento daquele que seria, de fato, a afirmação da diferença cultural, a afirmação do Volksgeist brasileiro: o mestiço.”[74]

65.    Uma obra de arte, atendendo a sua descrição, parece aludir a esta situação dos índios civilizados, convertendo-se em um dos poucos exemplos que podemos considerar em certa forma baseada na realidade circundante. O artista Rodolfo Bernardelli se inspira na vida que o rodeia para criar Índio em repouso, ou também chamado Saudade da Tribo, modelado em 1874:

66.                                  É um índio; tem concluído a tarefa; sentado em uma pedra, repousa os membros fatigados, empunha ainda o alvião, e lembra-se da patria, e tem saudades da sua tribu, donde o afastou a cathechese para admittil-o á communhão dos homens civilisados: o trabalho.[75]

67.    Reflete as preocupações civilizatórias do Império, mas o olhar do artista ou, pelo menos, a recepção da obra,[76] perpassa essas ideias, se preocupando com o outro, com os efeitos que a pretendida melhora estava provocando nesse sujeito ou grupo, e que foi estudada na época também de maneira científica, se preocupando com os efeitos que a nostalgia produzia nos índios civilizados: 

68.                                   [...] A nostalgia dos selvagens bruscamente arredrados da vastidão e do aldeamento é acompanhada de phenomenos menos alarmantes na apparencia, porém physiolgicamente mais graves: perda de appetite, perturbações de secreções, desordens visceraes, allucinações, hepatites, tristeza misturada de melancolia sombría, edemas, calma seguida de aspecto taciturno; recusam o que se lhes offerece, incommodam-se sem causa, obstinam-se no silencio…  Se alguem lhes fala na linguagem das suas selvas, respiram largamente, sentem-se felices. [...] A este estado mental, cuja phosphorescencia se colora das paizagens grandiosas das solidões brazileiras, debalde procuraremos oppôr agente mais activo; primogénitos da natureza, tamanhas são as influencias physicas e moraes que os assaltam, submettidos á civilisação, que o corolario desta superexcitabilidade provocada é a nostalgia, o mais bello apanagio de uma franqueza tão intima e tão generosa.[77]

69.    O escultor se apresenta, como afirma Silva, como um artista inovador, seguindo alinha das obras de Almeida Reis e Rochet. A crítica da época elogia a “fidelidade do tipo apresentado, com as características da raça, mas sem mesquinhez que prejudique a grandeza do assunto, sem exageração que o torne absurdo.[78] E o crítico percebe a carga ideológica e crítica que a peça tem, o problema que está refletindo. Aquele índio, com o instrumento de trabalho e a cruz no pescoço, civilizado, portanto, sente falta da sua terra, da sua identidade. “Está só, mas é uma composição, representa uma Idea, conta uma historia, exprime um poema inteiro aquella figura solitária.[79] Bernardelli se constitui, ou, pelo menos, a crítica recebe a obra do artista, como a de um artista mais próximo aos artistas viajantes da primeira metade do século, que testemunhavam suas experiências, não sempre reais, através de desenhos e pinturas com certo caráter documental. Uma experiência artística diferente, e que refletia um objetivo importante para o Império e a nação civilizada.

Indianismo após indianismo: invenções e reinvenções

70.    Ao longo deste texto, não ultrapassamos na nossa análise a década de 1870 e dito limite não é casual, já que, ainda que não possamos marcar um ponto exato de mudança, uma data concreta onde situar o começo ou o final de alguma coisa, podemos observar que durante a década de 70 se produzem câmbios substanciais no entendimento e uso do indianismo. Assim, podemos dizer que ao longo dessa década a ideia do bom selvagem já não tinha mais sentido, sendo vista como um símbolo caduco, uma construção dos tempos da independência.[80] Aos poucos, a “evidência material da ‘realidade’ da vida indígena exigia uma reavaliação da utilidade do índio como representante da nação moderna.”[81] O ano de 1874 aparece como um ano interessante desde nosso ponto de vista, reunindo nele três grandes produções: no campo escultórico Alegoria do Império Brasileiro e Índio em repouso, e no literário, Ubirajara, de José de Alencar, que se constituem em três faces de um mesmo fenômeno.

71.    Alegoria do Império Brasileiro é o ponto culminante de um longo processo de relação entre o Império e a imagem indígena, que afunda suas raízes nas tradicionais representações da América de moldes europeus e que se vê impulsionada também pela maneira de entender a pátria e a nação, conceito que deve muito ao período da Guerra do Paraguai, com uma ampla difusão de imagens indígenas da pátria, Império, províncias, país etc.; por outro lado, Índio em repouso supõe um olhar desde um viés diferente, desde um ponto de vista já não histórico, nem alegórico, nem simbólico ou representativo. Um olhar ao índio enquanto indivíduo e não enquanto conceito.

72.    Rodolpho Bernardelli conseguiu achar, talvez, um ponto médio na representação do indígena, respeitando “a fidelidade do tipo apresentado, com as características da raça, mas sem mesquinhez que prejudique a grandeza do assunto, sem exageração que o torne absurdo,”[82] fato que Almeida Reis não conseguiria, com sua obra que, apesar de ser catalogada como o “molde mais correcto e typo do índio Americano,[83] ou precisamente por isso, não teve o sucesso e aceitação no momento de sua criação, oito anos antes, do que gozou a obra de Bernardelli, escolhida pela Academia Imperial para ser enviada à Exposição Universal de Philadelphia de 1876 como representação da arte brasileira. Poderia ter sido importante o fato de esta obra de Bernardelli representar não um índio selvagem, senão um índio civilizado, um caboclo, um mestiço, porque precisamente o Império promoveu:

73.                                  uma política de confraternização e irmandade a partir da mestiçagem. Este tipo de política racial tornou-se uma das fórmulas ideológico-estéticas próprias ao "ser" brasileiro. A mestiçagem como gesta diferenciadora, e portanto nacional.[84]

74.    Infelizmente, a obra de Bernardelli se perdeu, nos privando de uma fonte de informação essencial, e deixando lugar a suposições. Parece que foi uma obra que conseguiu convencer tanto a Academia Imperial quanto a crítica mais ávida por renovações, se convertendo em um espelho onde os diferentes grupos podiam observar seus anelos e desejos.

75.    No mesmo ano, José de Alencar publicou sua obra Ubirajara, entendida “como um protesto de Alencar contra os que anunciavam a morte do indianismo e como o refinamento de um programa estético-ideológico que havia começado com O Guarani.”[85] Alencar então está defendendo um programa iniciado em 1857 - justamente a data em que o modelo do frontão do Cassino Fluminense estava finalizado e aparecia na imprensa -, diante dos que  afirmavam a morte do indianismo.

76.    Essa morte do indianismo, tendo em conta as obras produzidas, se entende mais como uma continua reinvenção, uma vez que supõe uma mudança de direção. Após a metade da década de 70, se retoma a primazia da pintura. Entre 1878 e 1884 se criam as grandes composições pictóricas de temática indianista: Exéquias de Atalá de Rodrigues Duarte; Exéquias de Camorim de Antônio Firmino Monteiro; A elevação da cruz de Pedro Peres; Lindóia e Iracema de Jose Maria de Medeiros; Marabá, A morte de Atalá e O último Tamoio de Rodolfo Amoedo, entre outros. Esta profusão pictórica contrasta com a escassez de esculturas, praticamente reduzida a A faceira, de Rodolpho Bernardelli, com uma inspiração nova, fora dos moldes vistos para a escultura até o momento, e em relação, segundo Cavalcanti, com o desejo de agradar ao público com vistas a uma melhor venda.[86]

77.    Assim,  a escultura, que predomina no indianismo entre começos dos anos 60 e finais dos 70, se encontra entre dois períodos dominados pela pintura, num primeiro momento focado no histórico e evangelização dos índios, e também na literatura, e depois com uma presença massiva de inspiração literária. Mas, aos poucos, o indígena vai saindo do campo literário e simbólico, para intensificar-se, já que sempre existiu uma preocupação de entendê-lo desde um ponto de vista antropológico, interesse que tem um dos seus momentos mais importantes na Exposição Antropológica de 1882 no Rio de Janeiro. Neste momento as telas pintadas por Décio Villares são retratos individuais, com nomes próprios, de índios selvagens e civilizados que, quando nomeados, passam a existir. Também as esculturas colecionadas destes índios têm um caráter bem diferente, já que são moldes em papier-maché realizados por Leon Despres de Cluny, quem já realizara, quase 20 anos, antes Família de índios atacados por uma serpente. A comparação entre as duas obras não deixa lugar a dúvida de que os tempos estavam mudando. Estas efígies, conservadas em parte no Museu Histórico Nacional do Rio de Janeiro e também pela lente do fotógrafo Marc Ferrez, responderiam a interesses bem diferentes:

78.                                  O colecionismo do final do século XIX buscava evitar a perda não só da cultura dos povos indígenas, na época compreendidos como fadados a extinção, como também do que se poderia encontrar nesses artefatos sobre a origem e a evolução do homem. Assim, em grande parte, o valor atribuído a esse objetos era a sua capacidade de testemunhar a respeito de estágios primitivos da cultura humana, assim como de um passado comum que confirmava o triunfo e a superioridade europeia.[87]

79.    A história e a antropologia, envolvidas no processo indígena, não podiam compartilhar a imagem simbólica e alegórica do índio. Essa origem comum buscada com intensidade não chegou a convencer nem a unir a população, despertando fortes críticas, precisamente pelo seu caráter literário e alheio a qualquer realidade. Cria-se uma situação totalmente descompensada entre o que a arte estava propondo e o que, por exemplo, a história, pelo menos em certos setores, defendia, do mesmo modo que os positivistas, que também não compartilhavam a visão idealizada e propunham uma regeneração das “tribos fetichistas” através do positivismo.[88] A idealização do indígena como símbolo do nacional, para eles, suponha um caminho errado:

80.                                  Cumpre sobretudo combater essa mania para a qual concorreu poderosamente o Gonçalves Dias, que quer reduzir o nosso movimento estético atual e futuro às idealizações da vida selvagem. Nós não somos tapuias, somos portugueses, europeus ocidentais, as nossas tradições têm as suas raízes no Velho Continente. O índio na nossa tradição só representa um elemento modificador apenas pela alguma mistura que houve com a raça branca e negra.[89]

81.    Assim, o panorama indígena, a partir da década de 70, adquire uma complexidade maior, com a entrada forte de correntes científicas, antropológicas, visões mais modernas, ligadas a movimentos políticos e sociais, que em certa maneira fazem com que se anunicie, como assinalava Alencar, a morte do indianismo - ou, pelo menos, de um indianismo.

Considerações finais

82.    Indianismo e indianismos, múltiplas visões, elaborações, apropriações e usos da imagem do habitante primordial da terra brasileira, do símbolo do puramente nacional, da imagem do Império, do país, pátria ou nação, do selvagem e bárbaro, do mestiço e civilizado, da raça decadente, do objeto do fascínio do cidadão civilizado, do objeto de museu, de  estudo científico, dos mil e um usos e concepções do índio.

83.    Desde a chegada dos europeus à América, o índio se constitui como um símbolo ligado à terra americana e, por conseqüência, à terra brasileira, tanto como colônia quanto como território independente. As alegorias da América e Brasil, o Gênio do Brasil, as representações fluviais, se constituem em temas privilegiados na representação do indígena, mas também são utilizados para composições históricas, decorativas, e é tanta a repercussão que alcançam que se convertem em ilustrações de anúncios publicitários de diversos produtos e povoam as criações literárias, as páginas da imprensa, as obras de arte. Mas qual é o papel da escultura neste indianismo e suas representações?

84.    raçando uma genealogia das obras de arte  que se ocupam da representação do indígena, podemos diferenciar várias linhas principais: o retrato do índio no seu espaço natural, como habitante e por sua vez parte integrante da exuberância natural brasileira; as obras de inspiração histórica e as representações da catequização; as obras de inspiração literária e as obras que apresentam o índio como símbolo e representação. Estas diferentes inspirações vão variar quanto ao nível de “naturalismo” outorgado ao índio, oscilando entre as observações minuciosas dos traços das diferentes etnias, como Louis Rochet ou Almeida Reis, e a idealização do índio, apresentado nos moldes das alegorias da América europeias.

85.    Entre 1840 e 1889 podemos diferenciar, dentro das Belas Artes, três momentos diferentes: um primeiro momento, entre as décadas de 40 e 60, dominado pela pintura, mas com ampla presença de produções escultóricas; um segundo momento, dominado pela escultura, entre os anos 60 e metade dos 70; e um terceiro momento, que compartilha dois caracteres diferentes: por uma parte a volta da supremacia pictórica, de inspiração quase em sua totalidade literária e, por outro, a aproximação “antropológica.”

86.    A escultura apresenta algumas características próprias que, em nossa opinião, a separam da pintura e da literatura, criando uma personalidade e finalidade próprias. Por uma parte, é muito significativo que a grande maioria de esculturas imperiais se situe dentro de um período cronológico muito preciso, entre 1845 e 1875, e com uma concentração de obras especialmente relevante entre 1857 e 1875: o frontão do Cassino Fluminense, 1857; Desembarque de Pedro Alvares Cabral em Porto Seguro, 1861; Monumento a Dom Pedro I; 1862, Família de selvagens atacados por uma serpente, 1862; O Paraíba, 1866; Combate de dois índios, 1868; Índio em repouso e Alegoria do Império Brasileiro, ambas as duas de1874; e À espreita, de1875.[90] Este “período escultórico” abre caminho, entre 1878 e 1884, ao pleno desenvolvimento do indianismo pictórico.

87.    Resulta interessante tentar aproximar algumas datas significativas para este período escultórico. Em 1856 se publicava o que era esperado, com apoio direto do Imperador, como a grande confirmação indianista, A confederação dos Tamoios, de Gonçalves de Magalhães, e em 1875, Ubirajara, de José de Alencar. O desenvolvimento do romance indianista produz-se, aproximadamente, nas mesmas datas que o “período escultórico;” mas decorrem quase como caminhos paralelos, com pouca influência da literatura na escultura, reforçando ainda mais a ideia de uma diferenciação clara. Essa diferenciação é ainda mais clara se observamos que a pintura nessa época está recorrendo a temas literários, baseados em Atalá, de François-René de Chateaubriand, no caso de Fuga de Atalá e Exéquias de Atalá, de Frederico Tirone, 1860, e em Caramurú, de Jose de Santa Rita Durão, assim como Paraguassú e Diogo Alvares Correa, de Jules Le Chevrel, 1861, ou Moema, de Victor Meirelles, 1866. Em muitas ocasiões as pinturas nas Exposições Gerais de Belas Artes se complementavam com um pequeno texto literário ou histórico, no caso de obras como A primeira missa no Brasil, que explicava a composição ou sua inspiração, e uniam ainda mais pintura e literatura ou pintura e história.

88.    Assim, a escultura raramente busca sua fonte de inspiração na literatura, na história ou em cenas costumeiras, e se centra mais nas representações simbólico-representativas. Brasil como um índio, oferecida por Pettrich, em 1845, é correspondida por uma composição parecida, Alegoria do Império Brasileiro, de 1874, marcando os limites do “período escultórico.” Esta última é concebida como monumento público, lugar onde aparecem as grandes representações indígenas. Pela primeira vez, em 1857, o protagonismo recai na figura do índio num monumento público, no Frontão do Cassino Fluminense, inaugurado em 1860, e depois, no grande monumento imperial, o grupo dedicado a Dom Pedro I, por Louis Rochet, inaugurado em 1862 - grandes iniciativas que têm o índio como protagonista ou como elemento coadjuvante. Louis Rochet e Leon Despres de Cluny, franceses, Almeida Reis produzindo sua obra em Paris, Ferdinand Petrich, dinamarquês, têm uma grande responsabilidade na construção da imagem escultórica indígena, do mesmo modo que outros artistas estrangeiros produzem também obras indianistas, como Karl Linde ou Steffens.

89.    Uma peculiaridade destas obras é a ausência de nomes próprios. As denominações que recebem aludem a alegorias: do Império, fluviais, Gênio do Brasil, representações genéricas do indígena, famílias de índios, cenas próprias do indígena de caça e pesca, de luta. Não encontramos figuras individuais caraterizadas, ainda que fictícias, como Lindoia, Moema ou qualquer outra personagem. Os índios escultóricos não tem nome, privando o índio de qualquer caráter individual, aproximando-o ao mito. Recorrendo à definição de mito - personagem, fato ou particularidade que, não tendo sido real, simboliza não obstante uma generalidade que se deve admitir - podemos entender como o índio é privado de individualidade em favor de uma construção mítica ou simbólica.

90.    A oscilação entre mito e realidade foi uma constante no indianismo, como podemos observar na última grande exposição do Império, a Exposição Universal de Paris de 1889, onde se apresentaram as últimas esculturas de temática indígena do Império: seis alegorias fluviais situadas nas portas de aceso ao pavilhão brasileiro. Já na Exposição Internacional de Philadelphia de 1876, entre as obras apresentadas pela Academia Imperial, foram selecionadas Recollection of the tribe e The indian peeping,[91] ou seja, Índio em repouso e À espreita, de Rodolpho Bernardelli. Em contrapartida, na seção de pintura foram escolhidos principalmente paisagens, cenas de guerra, um retrato do Imperador, além de outras cenas, e A primeira missa do Brasil, assunto histórico, onde o tema principal é o descobrimento e catequização, na linha de outras obras anteriores, como as de Mendes de Carvalho ou Rugendas. Segundo Schwarcz, “os indígenas passivos e idealizados compõem a cena sem alterá-la fundamentalmente: são quase um elemento colado à paisagem tropical.”[92] Figuras que não alteram a cena, figuras que não são o tema principal, como serão depois em outras composições como Brasil como um índio, de Pettrich, 1845, o frontão do Cassino Fluminense, 1857, Moema, de Victor Meireles, 1866, O Paraíba, de Almeida Reis, 1866, ou Índio em repouso, de Bernardelli e Alegoria do Império Brasileiro, 1874, entre outras.

91.    A Exposição de Paris aparece como um fim de ato para a política Imperial, exposições que ilustravam o progresso das nações, onde “o mundo ocidental representava o topo da civilização, e as culturas indígenas o passado da humanidade.”[93] Neste momento o pavilhão brasileiro orna-se com as alegorias dos rios[94] Amazonas, Tocantins, Madeira, São Francisco, Parnaíba e Paraná[95]. Velhos conhecidos, o indianismo e as alegorias fluviais se reúnem de novo para apresentar o Brasil ao mundo. Seis figuras clássicas, ataviadas com penas, armas, pás e frutos e vegetação da terra, convertem-se novamente em símbolo, em representação, retomando uma longa tradição.

92.    Esta ocasião será uma das últimas durante o Império em que o índio será utilizado na escultura, voltando, precisamente, aos velhos lugares do indígena, as alegorias fluviais como representação territorial, como representação do próprio brasileiro. Mas o índio vai aparecer de maneira contínua com múltiplas funções, e vai se converter em “uma espécie de massa moldável de acordo com os interesses dos diversos grupos constitutivos do país,”[96] provocando assim uma série de “projetos” ou finalidades distintas, uma multiplicidade de indianismos, abordados aqui desde uma de suas múltiplas faces, a escultura.

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_________________________

[1] Universidade do Estado do Rio de Janeiro/Fundação Biblioteca Nacional.

[2] MARTIUS, F. von. Como se deve escrever a história do Brasil. Jornal do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. n. 24, janeiro de 1845.

[3] BARDI, P. M. História da Arte Brasileira (pintura, escultura, arquitetura, outras artes). São Paulo: Edições Melhoramentos, 1975.

[4] SILVA, M. do C. C. da. A obra Cristo e a mulher adúltera e a formação italiana do escultor Rodolfo Bernardelli. Dissertação de mestrado. IFCS, UFRJ, 2005, p.12.

[5] GUTIÉRREZ, A. O Guarani e a construção do mito do herói. Revista de Letras - n. 29(2) - v. 1 - jan./jul. - 2009.

[6]Três estatuas colossaes em gesso representando o Brazil, Portugal e a França, feitas em 1845 por Fernando Petrich, e por elle offerecidas ao museu ; um indio personifica o Brazil, um guerreiro da idade media, Portugal, e Napoleão com uma águia aos pés, a França.” AZEVEDO, M. D. M. de. O Rio de Janeiro; sua história, monumentos, homens notáveis, usos e curiosidades. Rio de Janeiro: Liv. Brasiliana Ed, 1969, p. 238.

[7] CHILLÓN, A. M. O Gênio do Brasil e as musas. Um manifesto ideológico numa nação em construção. 19&20,  Rio de Janeiro, v. IX, n. 1, jan./jun. 2014. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/obras/obras_amc.htm>. Acesso em 4/04/2014.

[8] Consta assim na ficha catalográfica do próprio museu e em várias publicações: ALFREDO, M. F.. Diálogo neoclassicismo/romantismo na obra de Chaves Pinheiro. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-graduação em Artes Visuais, EBA, UFRJ, Rio de Janeiro, 2009; SILVA, M. do. C. C. da. Representações do índio na arte brasileira do século XIX. Revista de História da Arte e Arqueologia, n. 8, julho-dezembro 2007, pp. 63-71.

[9] A Actualidade, 19 de abril de 1863.

[10] Ibidem.

[11] KNAUSS, P.. Negro Horácio: Louis Rochet e a escultura antropológica no século XIX. Anais do XXVI Simpósio Nacional de História. São Paulo: ANPUH, 2011, p. 2.

[12] KNAUSS, P.. Jogo de olhares: índios e negros na escultura do século XIX entre a França e o Brasil. História, v. 32, n. 1, jan/jun 2013, p. 127.

[13] ZANINI, W.. História geral da arte no Brasil. São Paulo: Instituto Moreira Salles, 1983, p. 410.

[14] ZANINI, op. cit.

[15] KNAUSS, 2011, op. cit.

[16] SANTOS, G, R. dos. O estatuário brasileiro C. C. Almeida Reis. v. VII de Espólio literário de Generino dos Santos: Humaniadas: o mundo, a humanidade, o homem. Rio de Janeiro, Editor Typ. do Jornal do commercio, 1938.

[17] MORAES, A. J. de M.. Jornal da tarde, 2 de novembro de 1871.

[18] RÍOS, A. M de los. Grandjean de Montigny e a evolução da arte brasileira. Rio de Janeiro: A Noite, 1941, p. 234.

[19] SOUZA, I. L. C. de S.. Pátria coroada: o Brasil como corpo politico autônomo, 1780-1831. São Paulo, Prismas, 1999, p. 219.

[20] RÍOS, op. cit., p. 236. Na medalha acunhada por Zephyrin Ferrez, onde representa o templo de Minerva, não aparecem os rios, senão um escudo com decoração vegetal.

[21] SOUZA, op. cit., pp. 300-301. Como em Versalhes, onde aparecem os principais rios da França.

[22] Monumento que no Campo de Sant´Anna vai ser levantado em honra dos bravos da campanha do Paraguay, Semana Ilustrada, 2 de fevereiro de 1873.

[23] A República, 20 de junho de 1872, p. 1.

[24] BANDEIRA, J.; XEXÉO, P. M.C..; CONDURU, R.. Missão Artística. Rio de Janeiro: Sextante Artes, 2003, p. 187.

[25] RÍOS, op. cit., p. 239.

[26] Jornal do Comercio, 2 de julho de 1841.

[27] O despertador, 12 de junho de 1841.

[28] MIGLIACCIO, L.. A Escultura monumental no Brasil do Século XIX. A criação de uma iconografia brasileira e as suas relações com a arte internacional. Anais do XXIII Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte. Rio de Janeiro, Editora do EBHA, 2004, v. 1, p. 240.

[29] SCHWARCZ, L. M.. O Império em procissão: ritos e símbolos do Segundo Reinado. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2001, p. 22.

[30] SOUZA, op. cit. p. 222.

[31] MIGLIACCIO, op. cit., p. 239.

[32] KNAUSS, 2011, op. cit. , p. 2

[33] TREVISAN, A. R. A Construção Visual da Monarquia Brasileira: Análise de Quatro Obras de Jean-Baptiste Debret. 19&20. Rio de Janeiro, v. IV, n. 3, jul. 2009. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/obras/obras_jbd_art.htm>. Acesso em 23/03/2014.

[34] SOUZA, op. cit. p. 245.

[35] SCHWARCZ, op. cit., 2001.

[36] No Correio Mercantil, 12 de novembro de 1865, afirma-se que foi publicado na Semana Ilustrada, n. 257.

[37] CHILLÓN, op. cit.

[38] GUTIÉRREZ, op. cit., p. 9.

[39] SOUZA, op. cit., p.  225.

[40] Correio Mercantil, 26 de fevereiro de 1855.

[41] GUTIÉRREZ, op. cit.,  p. 9. 

[42]  O Jornal do Brasil, 27 de agosto de 1941, afirma que este esboço foi feito para um monumento público a ser erigido na Bahia, mas na maioria da crítica aceita-se que foi um estudo para baixo-relevo. Dado encontrado na imprensa da época - Gazeta do Rio de Janeiro de 25 de maio de 1822 -  assinala que foi utilizado em forma de quadro numa homenagem fúnebre aos caídos na guerra da Bahia.

[43] A harmonia celestial no Brasil, 2 de maio de 1851. Libreto de Gioacchino Gianinni.

[44] Correio Comercial, 30 de novembro de 1851.

[45] Correio Mercantil, 16 de junho de 1865, p. 3.

[46] CHILLÓN, op. cit.

[47] Existe uma divergência na hora de estabelecer a datação da peça. Comumente aceita-se 1872, mas, como assinala Alfredo (2013), a peça foi executada em 1874 para ser apresentada na Exposição Geral de Belas Artes. Uma observação direta da peça confirma essa datação, que aparece na lateral da base da escultura.

[48] Nº de registro 2571. Doação de Élio Pederneiras em 1951. 192 x 75 x 31 cm.

[49] CHRISTO, M. de C. V. Indianismo na década de 1860: exposições e crítica de arte. Boletim Grupo de Estudos Arte & Fotografia - Anais do VI Seminário Arte, Cultura e Fotografia. São Paulo: CAP-ECA-USP, n. 5, 2012.

[50] ALFREDO, op. cit, 2009, s/p.

[51] Com anterioridade existíam representações indígenas, ainda que com menor difusão, como por exemplo o logotipo do periódico O grito nacional. A criação desta iconografia indianista e a formação da imagem visual da patria nas páginas da imprensa se constitui como um fato de grande importância, considerando-a como um momento-chave dentro de un proceso mais amplo.

[52] SCHWARCZ, L. M.. As barbas do imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 147.

[53] COSTA, R. S.. O corpo indígena ressignificado: Marabá e O último Tamoio de Rodolfo Amoedo e a retórica nacionalista do final do Segundo Império. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em História, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, 2013, p. 41.

[54] COSTA, op. cit., p. 42.

[55] COLI, J. Idealização do índio moldou a cultura nacional. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/imagens5.htm> Acesso em 10/06/2014.

[56] KNAUSS, Paulo. Jogo de olhares: índios e negros na escultura do século XIX entre a França e o Brasil. História (São Paulo), v. 32, n. 1, jan/jun 2013, p. 128.

[57] SCHWARCZ, op. cit., 2008, p. 147. CHRISTO, op. cit.

[58] CARVALHO, J. M.. de. Pontos e bordados: escritos de história e política. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999, pp. 243-244.

[59] ALEGRE, M. S. P.. Imagem e representação do índio no século XIX. In: GRUPIONI, L. D. B. (org.) Índios no Brasil. São Paulo: Ministério da Educação e do Desporto, 1992, p. 67.

[60] VARNHAGEM, F. A. História Geral do Brazil. v. 1. Rio de Janeiro: Laemmert, 1845, p. 15.

[61] VARCHAGEM. op. cit., p.28.

[62] PARRON, T. Cartas a favor da escravidão. São Paulo, Hedra, 2008  Apud MIYOSHI, A. Moema é morta. Tese de doutorado. Universidade Estadual de Campinas, 2010, p. 139.

[63] Annuario político, histórico e estatístico do Brazil, 1847, p. 37.

[64] CUNHA, M. C. da. História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2008, p. 136.

[65] Ibidem, p. 383.

[66] Ministério do Império, 1855.

[67] CUNHA, op. cit., s.p, (ilustração contida entre as páginas 110 e 111).

[68] MIYOSHI, op. cit., p. 141.

[69] Ibidem, p. 133.

[70] Ministério do Império, 1857.

[71] CUNHA, op. cit., p. 135.

[72] Para o conhecimento das diferentes teorías raciais no século XIX:  SCHWARCZ, L. M. O espetáculo das raças. cientistas, instituições e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

[73] Annaes de Medicina Brasiliense, agosto de 1848.

[74] CHIARETTO, M. O nativismo crítico e germanista de Sílvio Romero. O eixo e a roda. v. 21, n. 2, 2012.

[75] SILVA, op. cit., 2005, p.15.

[76] Seria interesante valorar até que ponto o artista conscientemente decidiu dar à sua obra ese caráter crítico ou foi a crítica que a entendeu desse modo.

[77] MORAES, A. J. de M. Jornal da tarde, 2 de novembro de 1871, p. 31.

[78] SILVA, op. cit., 2011, p. 64.

[79] DIAVOLINO, G. Bellas Artes. Mepistopheles. Rio de Janeiro: ano 1, n. 32, p. 6, janeiro de 1875.

[80] SILVA, 2007, p. 65.

[81] ANDERMANS, J. Espetáculos da diferença: a Exposição Antropológica Brasileira de 1882. Revista Topoi, v. 3, Jul/dez 2004.

[82] SILVA, op. cit., 2007, p. 64.

[83] MORAES, A. J. de M. op. cit.

[84] CARRIZO, S. Fronteiras da imaginação. Os románticos brasileiros: mestiçagem e nação. Niterói: Editora da Universidade Federal Fluminense, 2001, pp. 155-156.

[85] CARRIZO, op. cit., pp. 133-134.

[86] CAVALCANTI, A. M. T. Entre a Europa e o Brasil: a faceira, escultura de Rodolpho Bernardelli, e a necessidade de agradar ao público. In: CAVALCANTI, A. M T.; DAZZI. C; VALLE, A (Org.). Oitocentos. Arte Brasileira do Império à Primeira República. Rio de Janeiro: EBA-UFRJ, 2008, pp. 159-166.

[87] CUNHA, op. cit., p. 104.

[88] NASCIMENTO, F. R.. A imagem do índio na segunda metade do século XIX. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-graduação em Artes Visuais, EBA, UFRJ, Rio de Janeiro, 1991. p. 75.

[89] AZZI, R.. A concepção  da ordem social  segundo o positivismo ortodoxo brasileiro. São Paulo: Edições Loyola, 1980, p.111.

[90] Rodolpho Bernardelli modelará, em 1875, À espreita, também chamado Um índio surpreendido por um réptil, de inspiração temática muito próxima à obra de Despres. SILVA, op. cit., 2005, p. 17.

[91] International Exhibition, 1876. Official catalogue. Part II. Philadelphia: Centennial Catalogue Companyby John Nagle and company, 1876.

[92] SCHWARCZ, op. cit., 2008, p. 147.

[93] SCHWARCZ, op. cit., 2008, p. 389.

[94] O rio São Francisco apresenta interessantes semelhanças com o Gênio do Brasil, e também, quase como uma figura clássica ornada com penas, com o Doríforo, enlaçando a Antiguidade com o império tropical.

[95] SCHWARCZ, op. cit., 2008, p. 403.

[96] COSTA, op. cit., p. 72.