Um Mefistófeles afro-brasileiro? Considerações sobre uma extinta imagem de “Exu” do Museu da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro *

Arthur Valle

VALLE, ArthurUm Mefistófeles afro-brasileiro? Considerações sobre uma extinta imagem de “Exu” do Museu da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro.  19&20, Rio de Janeiro, v. XI, n. 1, jan./jun. 2016. https://doi.org/10.52913/19e20.XI1.04a [English]

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1. O ponto de partida do presente texto é uma obra de arte que não mais existe. Trata-se de uma impressionante imagem de “Exu” que pertencia ao Museu da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro [ Figura 1a e Figura 1b ]. Exu é o orixá mensageiro do povo iorubá, sem a participação do qual “não existe movimento, mudança ou reprodução, nem trocas mercantis, nem fecundação biológica.”[1] Todavia, a iconografia do “Exu” do Museu da Polícia se afasta das tradições iorubás, aproximando-se, antes, de representações do Diabo cristão, mais precisamente da sua moderna encarnação como Mefistófeles.[2] Como um orixá de origem africana pôde assumir uma aparência tão europeizada? A resposta para essa questão deve ser buscada no processo de sincretismo que se iniciou na época dos primeiros contatos europeus com o culto a Exu na África: desde então, esse orixá, por seu caráter contraditório e irascível, foi grosseiramente identificado com o Diabo.[3] Analisando a aparência da imagem em questão, bem como a maneira como ela foi adquirida e exibida no Museu da Polícia, discutiremos a capacidade de reinvenção das culturas de origem africana no Brasil, mas também como estas mesmas culturas foram  marginalizadas pelo racismo que estruturou a sociedade brasileira durante sua história colonial e pós-colonial.

2. O “Exu” do Museu da Polícia foi discutido de forma pioneira em alguns estudos da antropóloga Yvonne Maggie,[4] que são ilustrados por fotografias tiradas em fins dos anos 1970 pelo fotógrafo Luiz Alphonsus. Essas fotos provavelmente são os últimos vestígios existentes da imagem, que foi destruída em um incêndio ocorrido em 1989, quando o acervo do Museu da Polícia estava instalado na Rua Frei Caneca 162, no centro do Rio de Janeiro.[5] Consequentemente, o presente texto se situa dentro do marco metodológico da Cripto-História da Arte, como definida pelo historiador de arte Victor Serrão. A Cripto-História da Arte é uma vertente da história da arte ”atenta no papel que as obras já desaparecidas na voragem dos séculos possam ter assumido em determinadas circunstâncias [...] Não se trata de um edifício conceptual a erigir à margem da História da Arte, antes de uma vertente que lhe é complementar e insubstituível.”[6] Nesse sentido e de modo mais específico, o presente texto se encontra embasado em uma análise iconológica, que, como destaca Serrão, se interliga e complementa a Cripto-História da Arte.[7]

3. Além de ser um excelente objeto de estudo para verificar o potencial da Cripto-História da Arte, cremos que o “Exu” do Museu da Polícia merece atenção por duas outras razões. Em primeiro lugar, o estudo dessa imagem lança luz sobre a arte e a cultura visual usadas pelas religiões afro-brasileiras nas primeiras décadas da República no Brasil - um vasto campo de investigação que ainda aguarda a devida atenção por parte dos historiadores de arte.[8] Em segundo lugar, o estudo do “Exu” exige uma abordagem interdisciplinar de cuja falta a história da arte no Brasil de fins do século XIX e início do XX ainda se ressente:[9] com efeito, a imagem em questão levanta problemas que só podem ser tratados se aplicarmos métodos de várias disciplinas além da história da arte, como os estudos jurídicos, os estudos de religião, a antropologia, a etnografia e os estudos literários.

4. Uma análise do “Exu” deve partir de uma discussão do contexto museográfico em que ele estava inserido quando foi destruído, ou seja, a coleção do Museu da Polícia Civil do Rio de Janeiro. O núcleo dessa coleção[10] é formado por objetos apreendidos no começo do século XX pela polícia, que tinha a incumbência de perseguir aquilo que era então chamado baixo espiritismo[11] - termo que, com frequência, foi encarado como sinônimo de práticas religiosas afro-brasileiras. Essa violenta repressão parece, a princípio, contradizer a primeira Constituição republicana, promulgada em 24 de fevereiro de 1891, que, diferente das legislações dos períodos colonial e imperial,[12] estabelecia uma rigorosa separação entre estado e religião e teoricamente assegurava ampla liberdade de culto.[13] É necessário recordar, porém, que o primeiro código penal republicano, promulgado em 11 de outubro de 1890 - ou seja, ainda antes da Constituição de 1891 - ratificava a imposição de valores culturais que potencialmente restringiam as práticas religiosas não-católicas. Nesse sentido, são particularmente significativos os artigos do código que puniam, como “crimes contra a saúde pública,” o exercício ilegal da medicina (Art. 156),[14] o espiritismo, a magia, os sortilégios (Art. 157)[15] e o curandeirismo (Art. 158).[16] Pesquisando julgamentos de curandeirismo e charlatanismo no Brasil entre 1900 e 1990, a antropóloga do direito Ana Lúcia Schritzmeyer demonstrou que esses “crimes” foram usualmente associados a práticas religiosas afro-brasileiras.[17]

5. Diversos objetos ligados a tais práticas, apreendidos em batidas policiais, foram incorporados ao Museu da Polícia Civil, que, junto com a Escola de Polícia, foi criado em 1912 com a finalidade de auxiliar nas aulas práticas para a formação de novos policiais. Em 1940, os objetos religiosos afro-brasileiros do Museu da Polícia foram listados no inventário do “Museu de Magia Negra da seção de Tóxicos, Entorpecentes e Mistificações da Primeira Delegacia Auxiliar da Polícia Civil do Distrito Federal.¨[18] Segundo Cyro Advincula da Silva, atual diretor do Museu da Polícia, foi o reconhecimento do valor histórico, etnográfico e religioso do “Museu de Magia Negra” que “fundament[ou] o pedido de preservação e tombamento feito pelo Delegado Silvio Terra ao recém criado Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN).”[19] Com efeito, o processo de tombamento do acervo do “Museu de Magia Negra” é a primeira inscrição no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico do SPHAN, datada de 5 de maio de 1938.[20]

6. Em 1945, os objetos religiosos afro-brasileiros do Museu da Polícia foram incorporados ao Museu do Departamento Federal de Segurança Pública.[21] Em 1972, junto com outros itens apreendidos pela polícia durante o chamado Estado Novo, o museu foi instalado no referido prédio na Rua Frei Caneca. Foi nesse local que, em fins dos anos 1970, o “Exu” foi fotografado por Luiz Alphonsus, no âmbito de uma pesquisa financiada pela FUNARTE e conduzida por Yvonne Maggie, Márcia Contins e Patrícia Monte-Mór. Uma das fotos de Luiz Alphonsus tirada na ocasião [ Figura 2 ] deixa entrever a instalação dos objetos do Museu da Polícia, que o sociólogo Alexandre Fernandes Corrêa recentemente qualificou como “assombrosa,” retomando a descrição feita por Maggie, Contins e Monte-Mór:

7. Entrar no Museu da Polícia é uma experiência extremamente angustiante. A sensação é de estar em um filme de terror ou tendo uma visão surrealista. A sala, mal iluminada, e as peças empoeiradas concorrem para essa sensação. Os objetos mais diversos se confundem: Exu com estoques, tóxicos com fetos, objetos rituais com armas, bandeiras nazistas com fotos de crimes famosos na imprensa.[22]

8. Em um de seus estudos, Corrêa apresenta um diagrama da instalação das peças no prédio na Rua Frei Caneca [ Figura 3 ]:[23] em meio a itens muito heterogêneos - objetos usados em falsificação, tráfico de drogas e jogo do bicho; um manequim; armas de fogo; bandeiras nazistas etc. -, a coleção de objetos religiosos afro-brasileiros do Museu da Polícia, segundo Maggie, “esta[va] disposta como num terreiro, as imagens dos exus separadas das dos outros orixás, os atabaques separados das imagens e os trabalhos para fechar caminhos em estante separada dos trabalhos para abrir caminhos.”[24]

9. Na primeira foto de Alphonsus que mostra o “Exu” de corpo inteiro nesse espaço expositivo [ Figura 1a ], o personagem tem a cabeça curvada em direção ao peito e está envolto por um manto negro, aparentemente de veludo, tendo uma corda em torno do pescoço. Ele é mostrado através de um dramático contre-plongée e é iluminado por uma fonte de luz localizada à sua esquerda, que projeta na parede e no teto sombras medonhas, dignas de um filme expressionista alemão dos anos 1920. É difícil estimar o tamanho da imagem apenas a partir dessa foto, mas a sua descrição no inventário do “Museu de Magia Negra” de 1940 informa que ela era uma “estatueta,” o que nos leva a crer que tivesse dimensões reduzidas.

10. Dentro de uma caixa de vidro colocada sobre um pedestal, o “Exu” era exibido como que encarcerado[25] - de modo bem adequado, poder-se-ia dizer, para um objeto que foi confiscado pela polícia. Essa forma de exibição é usualmente imposta a objetos tidos como maléficos, capazes de, por sua agência própria, causar dano às pessoas que os possuem e/ou com eles entram em contato. O exemplo talvez mais conhecido é o da boneca de pano Annabelle [ Figura 4 ], hoje preservada no Warren's Occult Museum em Connecticut, USA,[26] que se tornou célebre como personagem de filmes recentes.[27] Annabelle se encontra encarcerada em uma caixa de madeira em forma de casa, em torno da qual vemos cartazes com dizeres como “WARNING, POSITEVELY DO NOT OPEN,” alertando para a suposta ameaça que a boneca representa.

11. Uma mensagem semelhante era vinculada pela instalação do “Exu” no prédio da Rua Frei Caneca. Ao fundo da foto que estamos analisando, é possível ver bandeiras e flâmulas nazistas; além disso, na extrema direita da foto, podem ser vistas as afiadas pontas de um tridente - um atributo usual de “Exu” no Brasil, mas também do Diabo na iconografia cristã. De maneira deliberada, a constelação desses elementos em volta do “Exu” enfatizava a sua natureza supostamente maléfica. Como recorda Maggie, quando realizava sua investigação no Museu da Polícia “não faltaram informantes para dizer que [objetos como o “Exu” eram] perigosos, estavam carregados, pesados e era arriscado desvendar sua origem.”[28] Tais advertências derivavam, em última análise, da crença em que “os objetos carregam o feitiço, ou seja, o próprio objeto tem o poder de produzir o mal pretendido pelo feiticeiro. É bom não tocar neles, pois podem provocar danos incalculáveis.”[29] Porém, mesmo encarcerado em sua caixa de vidro, o poder do “Exu” não havia se extinguido: em fins dos anos 1970, “as pessoas iam ao museu fazer a sua ‘fezinha’ e depositavam moedas e flores ao pé das imagens. Para os visitantes do Museu aquelas imagens [...] ganhavam ainda mais poder e força por ter pertencido a poderosos feiticeiros.”[30]

12. A segunda foto tirada por Luis Alphonsus do “Exu” nos mostra um close-up de sua cabeça [ Figura 1b ]. Embora a policromia da imagem apresentasse então sinais de desgaste, é possível afirmar que o “Exu” do Museu da Polícia era caucasiano e tinha olhos azuis, aparentemente feitos de contas de vidro. Ele possuía um nariz aquilino, bigodes, uma barba bifurcada negra e esboçava um sorriso sarcástico; um capuz negro cobria a sua cabeça, atrás da qual é possível ver uma protuberância vermelha - muito provavelmente uma pena. Nessa foto, é também possível ver melhor a corda que envolvia o pescoço da imagem.

13. Em nossa opinião, seria difícil estabelecer uma relação entre o aspecto da imagem do Museu da Polícia e a suposta aparência de um orixá de origem africana. Isso nos reconduz aos problemas levantados pelo “Exu,” o que torna importante que passemos a apresentar agora a iconografia do Exu iorubá, a fim de melhor entender o quanto o “Exu” do Museu da Polícia dele se afasta. Além disso, cremos que essa apresentação é aqui relevante porque, fora do círculo dos especialistas, a iconografia do Exu iorubá permanece pouco discutida no Brasil.

14. O acesso à mitologia iorubá é, todavia, em grande medida indireto. Ela se baseava na tradição oral e somente a partir do século XIX começou a ser compilada em forma escrita; na maioria das vezes, isso foi feito por europeus e americanos, não somente na África, mas também em locais afetados pela diáspora, como Brasil e Cuba.[31] Em 2001, o sociólogo Reginaldo Prandi publicou uma das maiores coletâneas de mitos sobre Exu até hoje reunida, que conta com apenas trinta itens. Nessa coletânea, alguns objetos são diretamente associados ao orixá, o principal sendo seu ogó, um poderoso porrete,[32] usualmente de madeira e com duas cabaças, evocando a anatomia do pênis. Nos mitos, outros atributos associados a Exu são: o ecodidé (pena vermelha de papagaio),[33] um símbolo de respeito que levou Olorum[34] a promover Exu à posição de mensageiro e decano dos orixás; um boné pontudo, de um lado branco e do outro vermelho, com o qual Exu provoca a discórdia entre dois amigos;[35] uma panela, que se transforma na cabeça (ori) de Exu;[36] um gorro branco de babalaô, que Exu usa quando cura Olofim;[37] uma faca, com a qual Exu fere a mão de todos os habitantes de uma cidade, a fim de ajudar seu amigo Orunmilá;[38] além disso, inhame, uma cabra e cocos também aparecem associados a Exu.

15. No que diz respeito às esculturas relacionadas a Exu produzidas pelos iorubás, um bom ponto de partida continua sendo o estudo de Joan Wescott sobre as imagens relacionadas a Exu-Elegba.[39] Alguns atributos - como o porrete, as cabaças e a faca - são os mesmos referidos nos mitos sobre Exu, mas diversos outros aparecem nas esculturas, como búzios, moedas, espelhos, pentes, colheres, apitos e cachimbos [ Figura 5 ]. Todavia, o traço distintivo e mais proeminente das esculturas iorubá relacionadas a Exu é o seu penteado em forma de rabo de cavalo, que se projeta a partir do topo de sua cabeça [ Figura 6 e Figura 7 ] e por vezes adquire a forma de um pênis [ Figura 8 ]. Wescott oferece interpretações para todos esses atributos,[40] justificando a maioria deles como símbolos das qualidades fálicas de Exú, de sua “energia instintiva, força masculina e potencialidade”[41] - interpretação que, cumpre dizer, foi questionada como redutiva por estudos mais recentes.[42] Para o presente texto, todavia, o que importa constatar é que nenhum dos atributos listados por Wescott é evidente nas fotos do “Exu” do Museu da Polícia. O mesmo se dá com os atributos listados nos mitos: apenas a protuberância vermelha sobre a cabeça do “Exu” poderia ser relacionada ao ecodidé.

16. Mas essa protuberância vermelha poderia também ser explicada sem referência à iconografia iorubá. Nesse sentido, é necessário reafirmar o quanto a imagem do “Exu” do Museu da Polícia se aproxima da iconografia cristã, em particular da do Diabo. Essa aproximação já estava claramente referida na ficha de identificação que acompanhava o “Exu” quando ele estava exposto na Rua Frei Caneca e que continha os seguintes dizeres: “Essa representação de Exu é típica da influência do Cristianismo nos cultos afro-brasileiros. Todavia, a assimilação é algo oblíqua. Enquanto o Satã do Cristianismo é descrito como uma entidade indesejável, que foi expulsa do Paraíso, nos cultos afro-brasileiros Exu é descrito como uma espécie de embaixador da humanidade junto à corte dos orixás.”[43]

17. A imagem de “Exu” do Museu da Polícia é, portanto, fruto de um processo sincrético que começou a tomar forma ainda no século XIX, nos escritos de viajantes europeus (em especial de religiosos cristãos) que entraram em contato com o culto de Exu na África. Em 1857, por exemplo, o pastor estadunidense Thomas J. Bowen afirmou: “Além de seus outros ídolos, normalmente chamados de demônios pelos ingleses instalados na costa, os iorubás veneram o próprio Satã, sob o nome de Exu, que parece significar ‘o excluído,’ de shu, que significa expulsar.”[44] Em seu livro de 1885, o abade Pierre Bouche apresentou uma ideia similar: “Os negros reconhecem os poderes de possessão de Satã; pois eles o chamam usualmente Elegbara,[45] que quer dizer aquele que se apodera de nós.”[46] No primeiro livro europeu a tratar sistematicamente da religião iorubá, o padre francês R. P. Baudin também apresentou uma interpretação muito negativa de Exu.[47] A gravura que acompanha o trecho do livro dedicado ao orixá é particularmente emblemática [ Figura 9 ]: nela vemos um homem sacrificando uma ave a Exu, que é representado por uma estatueta com chifres dentro de uma casinhola; na legenda da gravura, pode-se ler: “ELEGBA O ESPÍRITO MALÉFICO OU O DEMÔNIO.”

18. No Brasil do começo do século XX, Raimundo Nina Rodrigues[48] e João do Rio[49] também identificaram Exu com o Diabo cristão. Tal identificação atingiria a sua mais completa realização com o sincretismo religioso verificado em locais afetados pela diáspora africana, como o Brasil. Vale a pena sintetizar aqui a tese de Prandi sobre esse sincretismo e suas consequências para a demonização de Exu:

19. O sincretismo não é, como se pensa, uma simples tábua de correspondência entre orixás e santos católicos [...] O sincretismo representa a captura da religião dos orixás dentro de um modelo que pressupõe, antes de mais nada, a existência de dois pólos antagônicos que presidem todas as ações humanas: o bem e o mal; de um lado a virtude, do outro o pecado. Essa concepção, que é judaico-cristã, não existia na África. [...]

20. O lado do bem, digamos, foi assim preenchido pelos orixás, exceto Exu, ganhando Oxalá, o orixá criador da humanidade, o papel de Jesus Cristo, o deus Filho, mantendo-se Oxalá no topo da hierarquia, posição que já ocupava na África [...]

21. Foi sem dúvida o processo de cristianização de Oxalá e outros orixás que empurrou Exu para o domínio do inferno católico, como um contraponto requerido pelo molde sincrético. Pois, ao se ajustar a religião dos orixás ao modelo da religião cristã, faltava evidentemente preencher o lado satânico do esquema deus-diabo, bem-mal, salvação-perdição, céu-inferno, e quem melhor que Exu para o papel do demônio?[50]

22. A identificação de Exu com o “senhor dos infernos” cristão alcançou seu ápice no primeiro quartel do século XX,[51] em modalidades de culto como “macumba, quimbanda e umbanda [que] representam um sistema unificado e coerente que se articula em torno do que [o sociólogo David J. Hess] chama um ‘dinamismo sincrético’.”[52] Até onde pudemos apurar, foi no contexto desses cultos sincréticos, especialmente em cidades como o Rio de Janeiro, que atributos iconográficos como chifres, tridente, rabo e cascos passaram a ser associados de maneira explícita a Exu [ Figura 10a e 10b ]. Esses atributos permanecem até os dias de hoje caracterizando boa parte das imagens de culto do orixá usadas no Brasil, como se pode comprovar facilmente na visita a lojas de artigos religiosos afro-brasileiros, cuja predileção por exibir estátuas de Exu em suas entradas possui uma dimensão ritualística [ Figura 11a e 11b ].[53]

23. Porém, o “Exu” do Museu da Polícia também se distancia dessa tipologia mais conhecida de representações do Diabo. Ele certamente recorda figurações atuais do chamado “Exu Capa Preta” [ Figura 12a e 12b ], [54a] mas sobretudo um outro tipo de representação do Diabo, mais moderna e refinada: o Diabo como Mefistófeles.  Em um de seus livros sobre o “Príncipe das Trevas,” o historiador Jeffrey Burton Russell reproduziu a fotografia de uma estátua oitocentista de Mefistófeles, feita de bronze e marfim [ Figura 13 ] (possivelmente, se trata de uma versão de uma conhecida escultura de Mefistófeles criada pelo francês Jacques-Louis Gautier em meados do século XIX [ Figura 14 ]): são notáveis as afinidades com o “Exu” do Museu da Polícia, como o “capuz de erudito, barba bifurcada e sorriso sinistro.”[54b] Além disso, o Mefistófeles reproduzido no livro de Russel usa uma longa pena na cabeça, o que reforça a hipótese de que a protuberância análoga visível no “Exu” seja também uma pena.

24. Não por acaso, o “Exu” era referido no inventário do “Museu de Magia Negra” de 1940 como “uma estatueta representando Mefistófeles (Eixú) [sic], entidade máxima da linha de malei.”[55] Como é bem sabido, Mefistófeles é um personagem da lenda de Fausto, um erudito que vende sua alma ao senhor do inferno em troca de sabedoria e prazer. Segundo Russell, o nome Mefistófeles é “uma invenção puramente moderna, de origem incerta,”[56] e aparece pela primeira vez em um livro dedicado a Fausto publicado por um autor anônimo alemão em 1587.[57] Todavia, o protótipo de Mefistófeles que predominará na literatura europeia dos séculos seguintes pode ser encontrado ainda antes, no personagem Panurge dos livros protagonizados por Gargantua e Pantagruel, publicados por François Rabelais entre c. 1532 e 1564. Sem dúvida, uma representação de Mefistófeles análoga à de Panurge - “alto, charmoso, elegante e de descendência nobre, embora traços de sua origem demoníaca se revelem em sua palidez, suas imperfeições e sua grande idade”[58] - foi a favorecida na cultura europeia moderna.

25. Desde o século XIX, diversas obras de arte europeias dão prova da grande difusão dessa versão mefistofélica do Diabo, que no Brasil foi igualmente muito popular. Sabemos, por exemplo, que circulavam no Brasil cópias do Mefistófeles de Gautier.[59] Em 1883, o pintor Francisco Aurélio de Figueiredo e Mello expôs um “Mefistófeles de riso sardônico e olhar de serpente”[59] na galeria carioca Glace Elégante. Mefistófeles era presença frequente também nos periódicos ilustrados do Rio de Janeiro. Um deles, que circulou em meados dos anos 1870, era, inclusive, intitulado Mephistopheles e trazia o personagem em destaque, em diversas de suas capas [ Figura 15 ].[61] Em outro importante periódico dos anos 1870, O Besouro, o artista português Raphael Bordallo Pinheiro “inúmeras vezes evoc[ou] [em suas caricaturas] os personagens Fausto, o sábio erudito, e o demônio Mefistófeles. Na pele de Fausto, o caricaturista colocou o Imperador D. Pedro II e na de Mefistófeles o ministro do tesouro Gaspar da Silveira Martins” [ Figura 16 ].[62]

26. Seja vinculado à literatura ou criticando a política imperial, Mefistófeles era, portanto, figura bem conhecida das elites intelectuais brasileiras desde o século XIX. É perfeitamente compreensível, portanto, a sua adoção em contextos religiosos afro-brasileiros que, com seus Exus identificados com o Diabo, “exerc[iam] fascinação até sobre os membros considerados mais ‘evoluídos’ das classes burguesas, que sempre constituíram a clientela dos cultos afro-brasileiros. Na verdade, no Rio de Janeiro do fim do século XIX o satanismo já era largamente difundido, como mostram as reportagens de João do Rio publicadas pela primeira vez em 1904.”[63] Com efeito,  o “Exu” do Museu da Polícia bem poderia fazer parte da ambientação da Missa Negra descrita por João do Rio, com um requinte decadentista comparável ao dos escritos de Joris-Karl Huysmans.[64]

27. À guisa de considerações finais, podemos afirmar que a metamorfose de Exu em Mefistófeles discutida nesse texto é um fenômeno ambivalente. Por um lado, ela é um exemplo importante da capacidade de reconfiguração das culturas africanas transplantadas para o Brasil, pois foi justamente no contexto de cultos sincréticos que Exu manteve um de seus traços essenciais: a sua incessante capacidade de transformar a si mesmo. Até os dias atuais, como sintetiza a antropóloga Stefania Capone, é precisamente no seio desses cultos que “o deus da África ocidental, o deus dos iorubás e dos fon (em seu aspecto de Legba)[65], encontr[ou] espaço para existir e para se transformar - o que constitui um de seus traços característicos.”[66] Ao assumir a aparência de Mefistófeles - uma versão refinada do Diabo cristão, bem conhecida pelas elites brasileiras do início do século XX -, Exu demonstrou mais uma vez sua astúcia, esperteza e capacidade de  manipular o destino.

28. Por outro lado, cremos que tal metamorfose deve ser compreendida como um sintoma da imposição de valores culturais de origem europeia à custa de outros, de origem africana. Sob essa ótica, o sincretismo que deu origem ao “Exu” da Polícia Civil se revela, ele próprio, como um fenômeno ambivalente: simultaneamente, o sincretismo é um processo que potencializa a reinvenção de tradições, mas que também pode contribuir para a sua fragmentação e diluição. Isso ocorre especialmente em contextos marcados pela dominação colonial e pelo racismo, como é o caso da sociedade brasileira que durante toda a sua história literalmente criminalizou vários aspectos das culturas afro-brasileiras. A maioria dos fatos relacionados ao “Exu” remete, com efeito, a dominação e racismo: desde sua transformação em versão moderna do Diabo cristão, passando por sua captura pela polícia, até o modo aviltante como ele foi exposto ao público, antes de ser destruído.

29. O “Exu” foi destruído, mas - cumpre frisar - não esquecido: através dos registros documentais e fotográficos remanescentes, bem como dos estudos elaborados nas últimas décadas, a sua agência permanece em certa medida latente. Com base nisso, o presente texto pretendeu justamente contribuir para uma reconsideração da posição que obras como o “Exu” do Museu da Polícia ocupam no cânone da história da arte no Brasil. Estamos convictos de que a análise dessa imagem é hoje relevante e mesmo urgente, pois permanecem sem solução os dilemas da sociedade brasileira que ajudaram a moldar não somente o “Exu,” como também muitas outras obras ligadas à afro-descendência no Brasil.

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* Agradeço ao Prof. Dr. Roberto Conduru pela cuidadosa revisão do texto e pelas diversas sugestões.

[1] PRANDI, R. Mitologia dos Orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, p. 21. Para mais informações sobre Exu, ver: LOPES, N.. Enciclopédia brasileira da diáspora africana [recurso eletrônico]. 4ª. ed. São Paulo: Selo Negro, 2011, pos. 10198-10228; SILVA, V. G. da. Exu: o guardião da casa do futuro. Rio de Janeiro: Pallas, 2015.

[2] RUSSELL, J. B.. Mephistopheles: The Devil in the Modern World. Ithaca, NY: Cornell, 1986; RUSSELL, J. B.. The Prince of Darkness: Radical Evil and the Power of Good in History. Kindle edition. Ithaca, London: Cornell University Press, 1988, especialmente os capítulos 11-16.

[3] Pierre Verger assim sintetiza esse processo de identificação: “Exu é um orixá ou bọra de múltiplos e contraditórios aspectos, o que torna difícil defini-lo de maneira coerente. De caráter irascível, ele gosta de suscitar dissensões e disputas, de provocar acidentes e calamidades públicas e privadas. É astucioso, grosseiro, vaidoso, indecente, a tal ponto que os primeiros missionários, assustados com suas características, compararam-no ao Diabo, dele fazendo o símbolo de tudo o que é maldade, perversidade, abjeção, ódio, em oposição à bondade, à pureza, à elevação e ao amor de Deus.” VERGER, P. F.. Orixás deuses iorubás na África e no Novo Mundo. 6ª. ed. Salvador: Corrupio, 2002, p. 76.

[4] MAGGIE, Y. Medo do feitiço: relações entre magia e poder no Brasil. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1992, n. p. (documentário fotográfico); MAGGIE, Y.. O arsenal da macumba. Revista de História da Biblioteca Nacional, ano 1, n. 6, dez. 2005, p. 39; MAGGIE, Y.; RAFAEL, U. N.. Sorcery objects under institutional tutelage: magic and power in ethnographic collections. Vibrant, v. 10, n. 1, 2013, p. 305-306. Nesses estudos, a imagem que aqui discutiremos é designada como “Exu Sete-Capas.” Sem propriamente discordar de tal designação, optamos por não adotá-la aqui porque na documentação remanescente, como veremos, a imagem é referida apenas como “Exu” ou “Mefistófeles (Exu).”

[5] CORRÊA, A. F.. O Museu Mefistofélico e a distabuzação da magia: análise do tombamento do primeiro patrimônio etnográfico do Brasil. São Luís/MA: EDUFMA, 2009, p. 191.

[6] SERRÃO, V. Sobre o conceito de Cripto-História da Arte. In: SERRÃO, V. A Cripto-História da Arte. Análise de Obras de Arte Inexistentes. Lisboa: Livros Horizonte, 2001, p. 11, 13.

[7] Ibidem, p. 13.

[8] Uma exceção notável é Roberto Conduru e sua extensa produção sobre esse campo, que inclui livros como: CONDURU, R.. Arte Afro-Brasileira. Belo Horizonte: C/Arte, 2007; CONDURU, R.. Pérolas negras - primeiros fios. Experiências artísticas e culturais nos fluxos entre África e Brasil. Rio de Janeiro: Eduerj, 2013.

[9] CARDOSO, R.. Histories of nineteenth-century Brazilian art: a critical review of bibliography, 2000-2012. Perspective, 2 | 2013, p. 320-321. Disponível em: https://perspective.revues.org/3891 Acesso em 1 jun. 2016.

[10] A coleção de objetos religiosos afro-brasileiros do Museu da Polícia se encontra hoje na reserva técnica do prédio da Polícia Civil na Rua da Relação 42, acondicionada em 52 caixas. Agradeço ao Dr. Cyro Advincula da Silva por essa informação.

[11] MAGGIE, RAFAEL, op. cit., p. 278.

[12] Cfr. em especial as chamadas Ordenações Filipinas e a Constituição Politica do Imperio do Brazil (de 25 de março de 1824).

[13] Como reza o seu § 3º de seu Art. 71: “Todos os indivíduos e confissões religiosas podem exercer pública e livremente o seu culto, associando-se para esse fim e adquirindo bens, observadas as disposições do direito comum.”. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (de 24 de fevereiro de 1891). Disponível em: http://goo.gl/Dj8kTE Acesso em 1 mar. 2016.

[14] “CAPITULO III DOS CRIMES CONTRA A SAUDE PUBLICA. Art. 156. Exercer a medicina em qualquer dos seus ramos, a arte dentaria ou a pharmacia; praticar a homeopathia, a dosimetria, o hypnotismo ou magnetismo animal, sem estar habilitado segundo as leis e regulamentos: Penas - de prisão cellular por um a seis mezes e multa de 100$ a 500$000. Paragrapho unico. Pelos abusos commettidos no exercicio ilegal da medicina em geral, os seus autores soffrerão, além das penas estabelecidas, as que forem impostas aos crimes a que derem causa.” DECRETO Nº 847, DE 11 DE OUTUBRO DE 1890 Promulga o Codigo Penal. Disponível em: http://goo.gl/pOaDu8 Acesso em 1 mar. 2016.

[15] “CAPITULO III DOS CRIMES CONTRA A SAUDE PUBLICA. [...] Art. 157 Praticar o espiritismo, a magia e seus sortilegios, usar de talismans e cartomancias para despertar sentimentos de odio ou amor, inculcar cura de molestias curaveis ou incuraveis, emfim, para fascinar e subjugar a credulidade publica: Penas - de prisão cellular por um a seis mezes e multa de 100$ a 500$000”. Idem.

[16] “CAPITULO III DOS CRIMES CONTRA A SAUDE PUBLICA. [...] Art. 158. Ministrar, ou simplesmente prescrever, como meio curativo para uso interno ou externo, e sob qualquer fórma preparada, substancia de qualquer dos reinos da natureza, fazendo, ou exercendo assim, o officio do denominado curandeiro: Penas - de prisão cellular por um a seis mezes e multa de 100$ a 500$000.” Idem.

[17] SCHRITZMEYER, A. L. P. . Sortilégio de Saberes: curandeiros e juízes nos tribunais brasileiros (1900-1990). São Paulo: IBCCRIM, 2004.

[18] MAGGIE, Medo do feitiço...,  p. 277-279; CORRÊA, op. cit., p. 171-174.

[19] Relicário multicor. A coleção de cultos afro-brasileiros do Museu da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Centro Cultural Municipal José Bonifácio; Museu da Polícia Civil do RJ; Instituto de Artes da UERJ, 2008, p. 3.

[20] A coleção do “Museu de Magia Negra” está registrada sob o n. 0035-T-38. Cfr. Livro dos Bens Culturais Inscritos nos Livros do Tombo. Rio de Janeiro, 2013, p. 120.

[21] MAGGIE, op. cit., p. 261.

[22] CORRÊA, op. cit., p. 150.

[23] Ibidem, p. 182.

[24] MAGGIE, op. cit., p. 262.

[25] BUONO, A.. Encarcerado: Crime e Visualidade no Museu da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro. In: Caderno de Resumos do XXXIII Colóquio do Comitê Brasileiro de História da Arte, Rio de Janeiro, 2013 - Territórios da Arte. Uberlândia: UFU, 2014, p. 236-237.

[26] O site oficial do museu, dirigido pelos investigadores Ed e Lorraine Warren, está disponível em: http://www.warrens.net/Occult-Museum-Tours.html Acesso em 1 mar. 2016. Nesse site, é também possível ler uma versão da história de Annabelle; cfr.: http://www.warrens.net/Annabelle.html Acesso em 1 mar. 2016

[27] The Conjuring (2013), dirigido por James Wan; Annabelle (2014), dirigido por John R. Leonetti.

[28] MAGGIE, op. cit., p. 261

[29] Ibidem, p. 264.

[30] MAGGIE, O arsenal da macumba,  p. 39.

[31] PRANDI, op. cit., p. 26-30.

[32] Ibidem, p. 41, 66.

[33] Ibidem, p. 42. O ecodidé é também atributo de outros orixás, nomeadamente Oxalá. Cfr., por exemplo: SANTOS, D. M. dos. Por que Oxalá usa ekodidé. Salvador: Fundação Cultural do Estado da Bahia; Cavaleiro da Lua, 1966.

[34] Olorum, “literalmente, Dono do Céu; nome pelo qual é denominado preferencialmente no Brasil o Deus Supremo” (Ibidem, p. 568).

[35] Ibidem, p. 50

[36] Ibidem, p. 48.

[37] Ibidem, p. 53. Olofim é “a denominação pela qual o Deus Supremo (Olodumare, Olorum) é chamado em Cuba” (Idem, p. 568).

[38] Ibidem, p. 69. “Orunmilá ou Ifá é o conhecedor do destino dos homens, o que detém o saber do oráculo, o que ensina a resolver toda sorte de problema e aflição” (Ibidem, p.23).

[39] WESCOTT, J. The Sculpture and Myths of Eshu-Elegba, the Yoruba Trickster. Definition and Interpretation in Yoruba Iconography. Africa: Journal of the International African Institute, Vol. 32, No. 4 (Oct., 1962), p. 336-354.

[40] Ibidem, p. 349.

[41] Ibidem, p. 348, tradução livre.

[42] Cfr. por exemplo: PARSONS, S. W.. Interpreting Projections, Projecting Interpretations: A Reconsideration of the “Phallus” in Esu Iconography. African Arts, Vol. 32, No. 2 (Summer, 1999), p. 36-45, p. 90-91

[43] MAGGIE, RAFAEL, op. cit., p. 305, tradução livre. Essa ficha foi elaborada por “um dos diretores do museu, membro de uma comunidade de umbanda e que, nos anos 1960, se especializou na decoração de altares para terreiros. O diretor do museu frequentemente cita livros de renomados antropólogos que estudaram essas crenças [como Arthur Ramos, Edson Carneiro e Roger Bastide]” (Ibidem, p. 303, tradução livre).

[44] BOWEN, T. J.. Central Africa. Adventures and missionary labors in several countries in the interior of Africa, from 1849 to 1856. Charleston: Southern Baptist Publication Society, 1857, p. 317, tradução livre.

[45] “ELEGBARA. No Brasil, um dos títulos de Exu; o mesmo que o cubano Eleguá.” LOPES, op. cit, pos. 9599.

[46] BOUCHE, P.. Sept ans en Afrique Occidentale. La Côte des Esclaves et le Dahomey. Paris: Librairie Plon, 1885, p. 120, tradução livre.

[47] BAUDIN, R. P.. Fétichisme  e  féticheurs. Lyon: Séminaire des Missions africaines, 1884, p. 49-53.

[48] RODRIGUES, R. N.. O Animismo Fetichista dos Negros Bahianos. Salvador, Reis & Comp., 1900. Reedição: São Paulo, Civilização Brasileira, 1935, p. 40, tradução livre.

[49] RIO, J. do. As religiões no Rio. 4ª. ed.. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 2015, p. 19 e 48.

[50] PRANDI, R.. Exu, de mensageiro a diabo: sincretismo católico e demonização do orixá Exu. Revista Usp, São Paulo, n. 50, 2001, p. 51.

[51] Ibidem, p. 52

[52] CAPONE, S.. A busca da África no candomblé: tradição e poder no Brasil. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria / Pallas, 2004, p. 22. Para uma discussão sobre macumba, quimbanda e umbanda, ver: Os espíritos das trevas: Exu e Pombagira na umbanda. Ibidem, p. 89-118.

[53] Como lembra o historiador da arte Tadeu Mourão, “As esculturas de Exu e Pombajira estão sempre entre os acessos aos espaços sagrados, estabelecendo os limites da ordem e do caos, fazendo mediações e impedindo o acesso do mal” (MOURÃO, T. M. de S.. Encruzilhadas da cultura: imagens de Exus e Pombajiras na Umbanda. Rio de Janeiro, 2010. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Artes/UERJ, p. 80). Nos terreiros de umbanda, por exemplo, “é quase unânime a concepção religiosa que afirma que os Exus e as Pombajiras são os guardiões das tendas Umbandistas. A localização de suas representações no espaço do terreiro corresponde à sua função mítica que, de certa maneira, dialoga com a função atribuída à representação do orixá Èsù. Na África, os nagô depositavam as imagens de Èsù nas encruzilhadas, nos centros comerciais, nas portas das casas e dos locais de culto para que os maus espíritos fossem afastados e pudesse, dessa maneira, manter a ordem social equilibrada, sem grandes desajustes” (Ibidem, p. 58, grifo nosso).

[54a] Post scriptum, 2022: ao que tudo indica, o aspecto geral da estátua do Museu da Polícia foi apropriado em representações mais recentes de Exu Mangueira [ver Imagem].

[54b] RUSSELL, The Prince of Darkness…, pos. 3686, tradução livre.

[55] MAGGIE, op. cit., p. 277; CORRÊA, op. cit., p. 172. “Malei” designaria aqui uma das sete “linhas” da quimbanda.

[56] RUSSELL, op. cit., pos. 3686, tradução livre.

[57] Historia von D. Johann Fausten (ed. Johann Spies). Frankfurt am Main, 1587

[58] RUSSELL, op. cit., pos. 2925, tradução livre.

[59] Cfr.: PRESTES, W.. Linha de Fogo. O Malho, Rio de Janeiro, ano XXVIII, n. 1411, 28 set. 1929, p. 38-39. 

[60] FERREIRA, F.. Belas Artes: Estudos e Apreciações. 2 ed. Porto Alegre, RS: Zouk, 2012, p. 144.

[61] Mephistopheles foi publicado entre 1874 e 1875 e contava com ilustrações de Cândido Aragonez de Faria, que posteriormente fez carreira de sucesso na França.

[62] SILVA, R. J. da. Quando a caricatura se explica: um exemplo português no Brasil oitocentista. In: VALLE, A.; DAZZI, C.; PORTELLA, I.. (Org.). Oitocentos - Tomo III: intercâmbios culturais entre Brasil e Portugal. 2ª.  ed. CEFET: Rio de Janeiro, 2014 , p. 462-463 (cfr. link).

[63] CAPONE, op. cit., p. 95-96.

[64] RIO, op. cit., p. 180-191.

[65] “LEGBÁ. Entidade dos cultos de origem jeje, correspondente, em alguns aspectos, ao Exu nagô.” LOPES, op. cit, pos. 14731.

[66] CAPONE, op. cit., p. 47.