A marcha da civilização no Brasil em três imagens de Debret
sobre a escravidão [1]
Anderson
Ricardo Trevisan [2]
TREVISAN, Anderson Ricardo. A marcha da
civilização no Brasil em três imagens de Debret sobre a escravidão. 19&20, Rio de Janeiro, v.
XVI, n. 1, jan.-jun. 2021. https://doi.org/10.52913/19e20.xvi1.08
*
* *
Introdução
Possa este rápido progresso
da civilização não alterar nunca a antiga hospitalidade brasileira, que
caracterizou durante séculos esse povo naturalmente bom e digno de figurar em
primeiro plano entre as nações generosas de que a Europa se pode vangloriar! (Debret, 2015, p. 330)
1.
Durante os quinze anos em que permaneceu no
Brasil, entre 1816 e 1831, o pintor Jean-Baptiste
Debret (1768-1848), antigo aluno de Jacques-Louis David (1748-1825),
realizou não apenas pinturas históricas sob a encomenda da corte, como havia
aprendido com seu mestre na França, mas também desenhos e pinturas sobre a vida
cotidiana no Rio de Janeiro.[3] Tendo
permanecido quase dez anos sem possibilidades de exercer a atividade para a
qual fora contratado (professor de pintura de história na Academia),[4] e com
poucas encomendas da monarquia,[5]
Debret teve tempo para realizar um projeto paralelo, onde tentou, através de
desenhos e aquarelas, retratar a vida cotidiana no Rio de Janeiro. Podemos,
apenas para contrapor às obras de pintura histórica, chamar esses trabalhos de
pinturas prosaicas, já que tratam de temas pouco valorizados pelo gênero
histórico (cenas de rua, escravos de ganho, interiores de casas de pessoas
comuns, ciganos, crianças brincando etc.).
2.
Este artigo propõe-se a analisar, dentro dos
pressupostos da sociologia histórica da arte de Pierre Francastel (1993),
algumas imagens criadas nesse contexto, problematizando-as em relação aos
textos que as acompanham e aos ideais de “progresso” e “civilização”
recorrentes nas proposições do artista. Segundo Francastel, um duplo erro pode
acometer estudos sociológicos da arte: o primeiro reside na pressuposição do
conhecimento das estruturas sociais, o que faz com que a arte seja olhada como
um “ornamento, um acessório, uma superestrutura social, em vez de se interrogar
e analisar como uma função fundamental” (FRANCASTEL, 1990, p. 91), ignorando a
ideia de que a obra de arte possa ter uma significação própria, irredutível a
todas as outras linguagens (1970, p.09). Em segundo lugar, erra-se ao se
esquivar de ver a arte como uma das principais intérpretes dos sistemas míticos
de explicação do universo (FRANCASTEL, 1990, p. 91), ou seja, como algo que se
realiza a partir do imaginário, tanto na sua produção quanto na sua percepção.
Por essa razão, é a partir das imagens de Debret, ou melhor, dos sentidos que a
análise sociológica constrói a partir delas, que a questão da escravidão e da
“civilização” serão discutidas. Nesse sentido, optou-se por imagens criadas
pelo artista francês em que os personagens caminham em fila, o que sugere a
ideia de “marcha.”
3.
As análises que seguem evidenciam os contrastes
de um meio social, marcado e sustentado pela escravidão. No entanto, esse
contraste dá ênfase à presença de pessoas negras, diferentemente das suas
pinturas de temas oficiais, nas quais pessoas escravizadas aparecem diminutas
em meio à paisagem, como em Aceitação Provisória da Constituição de Lisboa
[Figura 1],
por exemplo.
4.
Nas aquarelas e litografias com temas prosaicos
ou cotidianos, as figuras humanas ganham destaque e podem ser observadas em
seus detalhes. O ambiente, nesses casos, perde sua preponderância,
convertendo-se em mero espaço a ser ocupado pelos personagens, que sustentam e
dão forma a esse espaço visual. As imagens escolhidas para esse exercício
interpretativo foram: Um funcionário a passeio com a sua família; Mulata
a caminho do sítio para as festas de Natal (ambas litografias presentes no
livro Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, publicado entre 1834 e
1839, na França e em 1940 no Brasil) e Meninos brincando de soldados ou O
primeiro ímpeto da virtude guerreira, aquarela de 1827 (imagem que não
compôs seu livro).
5.
Pretende-se, com essas reflexões, avançar na
investigação minuciosa[6]
acerca deste importante artista, que, através de seu “pensamento visual,”[7]
realizou uma interpretação específica de Brasil, que convém ser sempre
problematizada.
IMAGENS
DE UMA SOCIEDADE EM MARCHA
I. Um
funcionário a passeio com sua família.
6.
Em Um funcionário a passeio com sua família
[Figura 2],
vemos uma cena simples construída a partir de pouco elementos visuais. No lado
direito da composição, nota-se apenas parte da fachada de uma residência, com
uma janela fechada e uma porta aberta, que tem imediatamente acima o número
“1820,” sugerindo a data em que a casa foi construída, sua numeração ou, mais
provavelmente, a data da realização da aquarela original, Empregado do
governo saindo a passeio [Figura 3].[8] Ao
fundo nota-se uma discreta paisagem com montes acinzentados e algumas
construções logo abaixo, tudo muito claro e com pouca definição - paisagem esta
que só é perceptível na litografia, pois na aquarela original, pertencente à
Fundação Castro Maya, essa paisagem de fundo praticamente não se nota.[9]
7.
No solo da parte externa dessa residência,
percebe-se uma espécie de calçamento. Pela porta da casa, saem pessoas em fila.
Bem à frente vemos um homem branco, com traje oficial, ligeiramente afastado da
fila que o segue. Ele está localizado no lado esquerdo da composição, mais
próximo à base da gravura que os demais personagens, seja pelo declive do solo
à medida que se avança para o lado esquerdo da composição, seja pela
perspectiva aplicada. Tudo realça esse personagem e o aproxima do observador.
De início, uma hierarquia é sugerida. No restante da imagem, vemos ainda outros
dez personagens. Imediatamente atrás do homem de uniforme está uma menina de
vestido branco e longo que deixa apenas os pés à mostra, uma vez que até os
braços estão encobertos. Tem um lenço azul no pescoço e o cabelo preso em forma
de coque. Sua estatura é aproximadamente equivalente à metade da altura do
homem de uniforme a sua frente. Depois vemos outra menina, um pouco mais alta,
com a indumentária bem parecida com a da primeira, mas com detalhes diferentes:
não usa lenço, mas tem um cinto. Em seguida vemos uma senhora branca, com
vestido branco em forma de balão, com listras amarelas, e algumas rosas
vermelhas estampadas na bainha da saia. Seu cabelo é preso e possui um lenço
que sai de seu coque e recobre quase todo o vestido. Esse personagem chama
atenção tanto pela roupa, que é bem colorida, quando pelo seu tamanho, já que
Debret repetiu sua fórmula e a representou mais corpulenta que todos os demais
personagens (a posteriori, graças à descrição de Debret, saberemos que
suas proporções revelam, também, um estado de gestação). Atrás dela uma mulher
negra, mais magra, veste-se de forma bastante elegante em comparação com outras
escravas representadas por Debret. Usa um vestido branco e uma capa amarela,
além de estar calçada. Sua pele é mais clara que a de outras escravas da
composição, que a seguem. Depois das mulheres nota-se um homem negro carregando
um guarda-chuva fechado, vestido de forma elegante, usando inclusive chapéu,
apesar de também estar descalço. Os dois últimos da fila são crianças negras,
bem magras, que pela posição estática parecem pouco interessadas em seguir o
“cortejo,” - talvez estejam apenas aguardando a sua partida para então
retornarem para dentro da residência, onde se nota o vulto de outro personagem
negro.
8.
O que se percebe nessa prosaica cena de um
funcionário que passeia com a família é o estabelecimento de uma hierarquia. O homem,
chefe da casa, está na frente e tem grande destaque, não apenas por ser o
primeiro da fila, mas ainda por estar a uma distância maior do segundo membro
do que todos os outros da sequência, que se espremem para ocupar o pequeno
espaço da aquarela. Outro fator decisivo para seu destaque é a maior
proximidade com a base da composição, e consequentemente, com o espectador da
obra, além do vestuário negro, com botas brilhantes, chapéu aprumado e casaco
imponente. A isso se soma o bastão de comando que segura com a mão direita,
repousado sobre o ombro - uma construção patriarcal de organização social.[10] As
crianças brancas são construídas de forma desproporcional, pois suas cabeças
são pequenas demais em relação aos corpos que as sustentam, o que também
acontece com as crianças negras. Se a sugestão é de que a inteligência é
proporcional ao tamanho das cabeças, as crianças, brancas ou negras, são
representadas como seres menos inteligentes, e, de alguma forma, ainda
“bárbaros.” Nada estranho vindo de um francês da época: lembremos rapidamente
que, para a sociedade francesa, até o século XIX as crianças, assim como os
bárbaros, necessitariam da “polidez” para se tornarem seres “civilizados”
(STAROBINSKI, 2001, p.28).
9.
Seguindo essa lógica, tendo como motivação uma
evidência empírica visual (o tamanho das cabeças em relação ao tamanho dos
corpos infantis), as crianças seriam consideradas seres bárbaros, tanto as
brancas como as negras, mas talvez em diferentes proporções, se levarmos em
consideração suas respectivas posições na fila (as crianças brancas estão na
frente, enquanto as negras são as últimas). A mulher branca está no meio do
grupo e é o último personagem branco desse pequeno cortejo. Logo atrás dela vem
a mulher negra vestida elegantemente e, depois os demais personagens negros, já
trajando roupas simples. Tudo nessa imagem revela uma tentativa de
hierarquização da sociedade e a necessidade de seguir aquele que é o modelo: um
homem branco vestindo roupas europeias. Com isso, Debret reorganiza a sociedade
em uma de suas obras, colocando cada personagem em um local determinado,
sugerindo um movimento linear a partir da fila que constituem.
10.
Como essa obra foi escolhida para compor o
álbum Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, vamos ao texto de Debret.
O pintor inicia sua descrição com um comentário geral sobre a (má) influência
da moda anglo-portuguesa nas vestimentas das senhoras brasileiras, e sobre a
(boa) influência exercida pela moda francesa no gosto dos brasileiros, sobretudo
pelo comércio da Rua do Ouvidor:
11.
Após dois meses de travessia, percorrendo
pela primeira vez as ruas do Rio de Janeiro, obstruídas por uma turba agitada
de negros carregadores e de negras vendedoras de frutas, sentimo-nos, nós,
franceses, estranhamente impressionados com o fato de não ver nenhuma senhora,
nem nos balcões nem nos passeios. Tivemos, entretanto, que nos resignar e
esperar até o dia seguinte, dia de festa, para observar inúmeras nas igrejas.
Aí as encontramos com efeito, vestidas de um modo estranhamente rebuscado, com
as cores mais alegres e brilhantes, porém obedecendo a uma moda
anglo-portuguesa, muito pouco graciosa, importada pela Corte de Lisboa e na
qual há oito anos nada se mudara, como que por apego demasiado respeitoso à sua
mãe pátria. Fiz imediatamente um desenho, mas o resultado, pela sua exatidão,
foi uma verdadeira caricatura inútil de reproduzir, porque não exprime em
absoluto o caráter e o temperamento brasileiros, pois o habitante do Brasil
tem-se mostrado, desde então, tão entusiástico apreciador da elegância e da
moda francesa que, por ocasião de minha partida, em fins de 1831, a rua do
Ouvidor (rua Vivienne, de Paris no Rio) era quase inteiramente constituída de
lojas francesas de todo o tipo, mantidas pela prosperidade de seu comércio.
(DEBRET, 2015, p.187)
12.
É interessante perceber que, nessa primeira
parte, Debret aponta o fato de as mulheres serem pouco acessíveis como
“modelos” para suas obras. No caso dessa obra, até havia tal possibilidade, uma
vez que, com a influência estrangeira, sobretudo a partir de 1815, a mulher
carioca, como aponta Adolofo Morales de los Rios Filho, pôs enfim “o pé na
rua.” Debret mostra, efetivamente, as senhoras brancas todas devidamente
calçadas, o que não acontece com as mulheres escravizadas. Afinal, como aponta
Rios Filho (2000, p. 331), para uma mulher daquela época, o fato de estar ou
não calçada podia ser decisivo na formação de sua imagem pública: “Com o
aumento do número de senhoras estrangeiras residentes na cidade, a mulher
carioca põe o pé na rua. Mas, como acontecia desde priscas eras, não podia
mostrá-lo a quem quer que fosse, nem deixar que, mesmo sem querer, fosse visto.
Pé, visto ou mostrado, era imoral...”
13.
Logo, figurar os escravos descalços
(especialmente a mulher) acentua sua valoração negativa em relação ao
comportamento “civilizado” dos brancos. Para Rodrigo Naves (2001, p. 75), além
de ajudar a lembrar de sua real condição, os pés descalços dos escravizados nos
vários trabalhos de Debret “têm lá seu encanto, bem plantados que estão no
solo, num contato rude e vigoroso com a terra.” Isso de certo seria mais
pertinente se estivéssemos nos referindo às pessoas escravizadas das fazendas,
o que não é o caso, pois a grande maioria dos trabalhos de Debret é sobre os
escravos urbanos, um ambiente, teoricamente, avesso à “graciosidade” de estar
com os pés plantados no solo. Peter Burke explica que, na história da arte,
representar um indivíduo com os pés descalços poderia ser um modo aproximá-lo a
um deus, como acontecia nos tempos do Imperador Augusto, na Roma de 63 a.C a 14
d.C. (BURKE, 2017, p.104). No Brasil de meados do século XIX, esclarece o
autor, sapatos de couro eram muito caros e os afro-brasileiros os compravam
como símbolo de status; porém, prefeririam não os usar, carregando-os
nas mãos quando caminhavam nas ruas (BURKE, 2017, p.283). Nas imagens
oferecidas por Debret, porém, não vemos sapatos nos pés e tampouco nas mãos dos
personagens negros figurados. Marca-se, simbolicamente, diferentes posições
sociais, organizadas de forma patriarcal.
14.
Além de ressaltar, com seu texto, a dificuldade
de observar mulheres em cenas públicas, Debret menciona com desprezo a
persistente influência anglo-portuguesa, “muito pouco graciosa” ao longo dos
anos em seu comportamento e suas roupas, advertindo ainda que tais modos de se
comportar e de se vestir não seriam uma expressão fiel do caráter do
brasileiro. Ele finaliza o parágrafo acentuando a importância do crescente
comércio francês na Rua do Ouvidor e como isso seria, sim, uma verdadeira
expressão do gosto do brasileiro. Após esse longo parágrafo introdutório é que
Debret efetivamente inicia os comentários sobre a cena figurada:
15.
A cena aqui desenhada representa a
partida, para o passeio, de uma família de fortuna média, cujo chefe é
funcionário. Segundo o antigo hábito observado nessa classe, o chefe de família
abre a marcha, seguido, imediatamente, por seus filhos, colocados em fila por
ordem de idade, indo o mais moço sempre na frente; vem a seguir a mãe, ainda
grávida; atrás dela sua criada de quarto, escrava mulata, muito mais apreciada
no serviço do que as negras; seguem-se a ama negra, a escrava da ama, o criado
negro do senhor, um jovem escravo em fase de aprendizado, o novo negro
recém-comprado, escravo de todos os outros e cuja inteligência natural mais ou
menos viva vai desenvolver-se a chicotadas. O cozinheiro é o guarda da casa.
(DEBRET, 2015, p. 187)
16.
Com esse pequeno parágrafo, Debret trata de
descrever sua gravura, em um texto tão econômico quanto o desenho. Através
dele, podemos perceber quem é quem: o chefe da família é o primeiro da fila,
seguido pelos filhos e a esposa, cuja aparência robusta se justifica pela sua
gravidez. A mulher negra vestida de forma elegante e de pele mais clara tem tal
distinção por ser uma criada de quarto, já que, segundo Debret, a escrava
mulata era “mais apreciada no serviço do que as negras.”
17.
Sem maiores surpresas, sabemos que os últimos
da fila são também escravos. Com esta descrição. Debret apenas reforça a
proposta de hierarquização sugerida pela gravura, estabelecida inclusive entre
os próprios escravos. Contudo, vale frisar que em sua obra sobre o Rio de
Janeiro Imperial, Rios Filho comenta o velho hábito português de andar em fila
indiana, mas inverte a proposta visual de Debret, dizendo que tal costume,
havendo persistido até 1815, obedecia a seguinte ordem: na frente iam as
crianças, depois as mucamas com as criancinhas; a seguir vinham as moças e os
moços, tias solteironas e em seguida a dona da casa; no final, vinha o chefe da
casa (RIOS FILHO, 2000, p.331). A opção de Debret quanto a essa ordenação da
cena revela uma sugestão visual para a graduação do nível de “civilização,” que
aumentaria conforme a cor da pele, tendo como elemento de “transição” a ama de
quarto. Não sendo negra, mas “mulata,” ela mesma tinha uma escrava à disposição
(outro vestígio de sugestão hierárquica baseada no critério de tom da pele).
Isso não é casual. Debret entendia o chamado “mulato” como uma raça marginal,
mal-vista pelos negros e oprimida pelos brancos, sendo ela, contudo, a única
capaz de realizar alguma mudança social no Brasil. Vejamos o que pintor diz
sobre o caráter do “mulato,” em uma citação que, apesar, de longa, faz-se
importante:
18.
É o mulato, no Rio de Janeiro, o homem
cuja organização pode ser considerada mais robusta: esse indígena,
semiafricano, dono de um temperamento em harmonia com o clima, resiste ao
grande calor.
19.
Ele tem mais energia do que o negro e a
parcela de inteligência que lhe vem da raça branca serve-lhe para orientar mais
racionalmente as vantagens físicas e morais que o colocam acima do negro.
20.
É naturalmente presunçoso e libidinoso,
e também irascível e rancoroso, oprimido, por causa da cor, pela raça branca
que o despreza e pela negra que detesta a superioridade de que ele se
prevalece.
21.
O negro, com efeito, afirma que o
mulato é um monstro, uma raça maldita, porque, na sua crença, Deus a princípio
criou apenas o homem branco e o homem negro. Este raciocínio,
completamente material, repercute, entretanto, na sociedade política do Brasil,
onde o mulato mais ou menos civilizado tende sempre a libertar-se da posição
indecisa que o branco lhe assina na ordem social.
22.
A cisão provocada pelo orgulho
americano do mulato, de um lado, e a altivez portuguesa do brasileiro branco,
de outro, é motivo de uma guerra de morte que se manifestará durante muito
tempo ainda, nas perturbações políticas, entre essas duas raças rivais por
vaidade.
23.
Uma terceira razão de desentendimento
contribui ainda para desunir os homens brancos no Brasil: é a presunção
nacional do português da Europa, envaidecido de seu país, que não sabe
compreender a diferença de cor da geração brasileira, que a trata ironicamente
de mulata, sem distinção de origem. Foi o abuso da expressão pouco política que
serviu de pretexto aos movimentos revolucionários que precederam a abdicação de
D. Pedro I.
24.
Somente a civilização poderá destruir
esses elementos de desordem: materialmente, pela mistura mais frequente dos
dois sangues, e moralmente, pelo progresso da educação que retifica a opinião
política e a induz a respeitar o verdadeiro mérito onde quer que se encontre.
25.
A classe dos mulatos, muito acima da
dos negros pelas suas possibilidades naturais, encontra, por isso mesmo,
maiores oportunidades para libertar-se da escravidão; ela é que fornece com
efeito a maior parte dos operários qualificados; é ela também a mais turbulenta
e, por conseguinte a mais fácil de influenciar a fim de se fomentarem essas
agitações populares em que um dia ela deixará de ser um simples instrumento,
pois examinando-se esses mestiços no seu estado de perfeita civilização,
particularmente nas principais cidades do Império, já se encontram inúmeros
gozando da estima geral que conquistaram com seu êxito nas ciências e nas
artes, na medicina ou na música, nas matemáticas ou na poesia, na cirurgia ou
na pintura, êxitos cuja utilidade ou encanto deveriam constituir um título a
mais em prol do esquecimento futuro dessa linha de demarcação, que o
amor-próprio traçou mas que a razão deverá apagar um dia. (DEBRET, 2015,
p.168-169)
26.
A longa descrição de Debret sobre esse tipo
social revela o sentido máximo de sua colocação entre os brancos e negros na
“marcha” representada na gravura aqui analisada. Debret apostava no “mulato” como
uma “classe” naturalmente mais “capaz” de se libertar da escravidão, por ter em
sua formação biológica aspectos da inteligência dos brancos. Além disso, ele
antecipa as teorias de branqueamento através da miscigenação que seriam
dominantes no início do século XX.[11]
Pensada nesse sentido, a fila figurada na gravura é emblemática: ao fundo,
dentro da casa, mal se nota o negro que é o “guarda da casa,” de tão escuro que
o ambiente é mostrado, de modo que esse personagem se dissolve na penumbra. No
entanto, a partir da “criada de quarto” “mulata,” os tons de pele se clareiam.
Essa gravura, portanto, simboliza o plano de Debret para a “civilização” no
Brasil: a percepção das diferenças entre negros e mulatos, e a possibilidade de
uma mistura cada vez maior com o sangue dos brancos, cuja consequência seria o
aumento das capacidades intelectuais do mulato e, por conseguinte, uma
possibilidade efetiva de término para a escravidão no país.
27.
Alguns autores atribuem a essa obra uma atmosfera
caricatural. Em um parecer sobre o lançamento do segundo volume de Viagem
pitoresca e histórica ao Brasil na França, os membros do Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) foram severos na observação dessa
gravura em especial, dizendo que com tal estampa Debret parecia querer fazer
uma “verdadeira caricatura” dos brasileiros.[12] Referindo-se aos costumes da época, os membros
mostram indignação ao declarar que não tinham lembrança de que os empregados
públicos costumassem levar suas esposas para passear em um estágio tão avançado
de gravidez.[13]
Contudo, a falta de “realismo” na representação de um costume, apontada pelos
membros do IHGB, não seria justificativa suficiente para chamar a obra de
caricatural. Será que se a mulher não estivesse grávida isso mudaria o aspecto
geral da gravura? Na verdade, se observarmos o conjunto dos elementos da
imagem, o fato de vários personagens andarem em fila, guiados por um “mestre,”
soa um tanto caricatural, o que dá à obra um certo tom de ironia,[14]
independentemente de a mulher estar grávida ou apenas com sobrepeso.
28.
No entanto, trata-se de uma leitura
relativamente parcial da obra, muito influenciada pelo texto de Debret, como
veremos adiante. Se nos reportarmos ao tempo em que a obra foi realizada, e
sobretudo à posição de Debret como pintor desse cotidiano, podemos perceber que
a imagem não revela apenas uma cena “irônica,” mas o impasse de um artista
liberal, de orientação neoclássica, em meio a uma sociedade cuja economia era
baseada no trabalho escravo. O que Debret realiza, portanto, não é uma mera
caricatura, por mais que seja tentador fazer tal leitura, mas uma sugestão,
apontando, ainda que de forma latente, as possibilidades de mudança social, que
no seu ver seriam através da “civilização” dos negros com uma mistura cada vez
maior com o sangue dos brancos, formando uma espécie de “classe operária,” os
“mulatos” (no excerto acima ele diz: “a classe dos mulatos [...] fornece com
efeito a maior parte dos operários qualificados”). Subentende-se, com isso, que
a possibilidade de transformação para a condição servil desse grupo não se
daria através de revoltas, mas sim pela sua aproximação com o branco. Como se
percebe no final da citação, Debret se apraz em discorrer sobre o sucesso dos
“mulatos civilizados” nas ciências e nas artes, e faz suas apostas para um
futuro em que a razão cuidaria de apagar a linha demarcatória entre o branco e
o mulato. Portanto, na progressiva “civilização” do “mulato” é que a escravidão
encontraria seu fim. Como metáfora para essa “marcha,” Debret se aproveita do
antigo hábito português de andar em fila, que ele se alegra em dizer que aos
poucos era substituído pelo hábito francês de andar em pares, onde duas moças
poderiam, finalmente “manter uma conversação antes feita sem se olharem”
(DEBRET, 2015: 187).
29.
Rios Filho comenta que após 1815 houve, de
fato, uma mudança no comportamento dos casais em público, que a partir de então
passariam a caminhar lado a lado, e seus filhos, da mesma forma, formando pares
e caminhando à sua frente. Antes, o homem sequer lhe oferecia o braço sem
ressalvas, pois o mantinha esticado a fim de que a mulher apenas se segurasse
nele. Apenas com a moda francesa é que o homem passou a oferecer o braço de
forma menos rígida (RIOS FILHO, 2000: 331). Porém Debret não utiliza esse
modelo para representar visualmente um passeio em família, o que é curioso, uma
vez que poderia aproveitar tal exemplo para demonstrar o sucesso da influência
francesa no comportamento do brasileiro. A persistência da “fila indiana” nessa
imagem revela o peso do passado colonial na cultura brasileira da época, e a
dificuldade de Debret para representar visualmente uma “marcha progressiva da
civilização” que não estivesse, de fato, ainda muito arraigada a esse passado.
Talvez a metáfora visual da “fila” estivesse mais próxima do ideal de progresso
que norteava o pensamento de Debret do que o “caminhar em pares” herdado da
cultura francesa.
30.
Contudo, ainda que se valendo de aspectos
inerentes àquela sociedade, ou seja, aos hábitos lusitanos que tanto criticava,
e à escravidão, em tudo contrária aos pressupostos de um “progresso da
civilização,” Debret consegue, a seu modo e de forma muito subliminar, apontar
uma possibilidade de transformação, que estaria personificada pela metáfora da
“marcha” e do “mulato” como agente transformador, ainda que graças ao
branqueamento. De qualquer forma, ele abre espaço, ainda que estreito, para
pensar mudanças para aquela realidade. Mas isso Debret lançou como uma
“profecia” para as futuras gerações.
II. Mulata
a caminho do sítio para as festas de Natal
31.
Em Mulata a caminho do sítio para as festas
de Natal [Figura
4], encontramos o mesmo esquema da imagem anterior: todos os
personagens caminham enfileirados. Só que a construção aqui é mais simples.
Oito mulheres negras atravessam a litografia, da extremidade direita à
esquerda, ocupando todo o seu espaço longitudinal. Ao fundo, nota-se apenas um
esboço de paisagem, com tons acinzentados sugerindo a existência de morros; e
no primeiro plano, onde a cena acontece, há vestígios de relva. No mais, todo o
destaque é dado às mulheres que percorrem o espaço plástico da imagem a caminho
do campo, para comemorar o Natal, como sugere de saída o título da obra.
32.
Novamente percebemos uma hierarquia na imagem
através da utilização da metáfora da marcha. No entanto, ainda que se trate de
uma fila, não é o mesmo assunto da gravura anterior. Primeiro porque aqui não
há nenhum representante do sexo masculino, de modo que, se existe uma sugestão
de hierarquia, ela se apresenta por outros caminhos. As primeiras da fila são
duas crianças, que curiosamente não estão posicionadas como as demais
personagens, pois andam de mãos dadas, fugindo ao costume lusitano criticado
por Debret no texto referente à gravura anterior, e aproximando-se do costume
francês, onde, andando em par, duas moças podiam conversar mais livremente
(DEBRET, 2015, p. 187). Contudo, existe uma diferença entre essas duas
crianças: a maior, notoriamente uma menina, tem pele mais clara, veste-se de
forma elegante e muito diferente da criança menor - que pode ser tanto um
menino ou uma menina, dúvida instilada pela indefinição no traço de Debret
nesse personagem, além do fato de estar quase escondido atrás da criança maior
-, que se traja de forma simples, ainda que seja possível perceber que ela
utiliza sapatos, o que é, em si, um sinal de distinção em relação às
quatro últimas escravas da cena, que estão descalças. Outro detalhe
interessante é que elas não estão propriamente de mãos dadas: a criança maior
segura a pequena pelo braço, como se estivesse ensinando-a a andar. Na
sequência, vemos uma mulher negra, de pele mais clara, tratando-se da
personagem principal da gravura, que é a “mulata” (mulatresse) que segue
para o campo. Ela é mais robusta que todas as demais mulheres, o que, em se
tratando de uma constante em Debret, revela sua condição de mulher pertencente
à uma camada mais afortunada da sociedade. Está vestida de forma elegante, com
vestido claro bordado e um xale. Usa brincos grandes e cabelo preso em forma de
coque. Seus seios estão à mostra, o que não deixa de ser algo curioso, pois é a
única dentre todas que se encontra nessa condição. Atrás dela, vemos outra
escrava, provavelmente sua ama ou criada, pois está também vestida de forma
elegante, com vestido e um xale, usando cabelo preso e brincos. Carrega em suas
mãos uma gaiola com um pássaro dentro, o que denota sua condição servil. Porém,
muito mais servis são as demais escravas que as seguem: todas vestidas de forma
simples, com roupas em tons mais escuros. Carregam sobre as cabeças grandes
fardos, talvez alimentos, roupas ou demais apetrechos necessários para um
passeio no campo por ocasião de festas natalinas. É desnecessário dizer que
nenhuma delas utiliza calçados, o que, de acordo com sua recorrência nas obras
de Debret, denota sua condição inferior. A última escrava tem corpo pequeno e
esguio, cabelo curtíssimo, aparentando ser uma escrava mais jovem.
33.
Essa obra também foi escolhida por Debret para
seu livro Viagem pitoresca e histórica ao Brasil, o que significa que
existe a possibilidade de confrontar a imagem com o texto explicativo. Vejamos,
então, o que o pintor falou sobre sua obra, e o que isso significa para a
compreensão da imagem. Por se tratar de longa narrativa, selecionarei apenas
aquilo que for de maior relevância quantos aos elementos presentes na imagem.
Primeiramente, Debret faz um panorama geral do significado das festas de Natal e
Páscoa (Debret destacou também o feriado de Páscoa no texto, ainda que não se
refira a essa ocasião no título da litografia nem da aquarela):
34.
As festas de Natal e de Páscoa, sempre
favorecidas no Brasil por um tempo magnífico, constituem épocas de divertimentos
tanto mais generalizados quanto provocam mais de uma semana de
interrupção no trabalho das administrações e nos negócios do comércio; o
descanso é igualmente aproveitado pela classe média e pela classe alta, isto é,
dos diretores de repartições e dos ricos negociantes, todos proprietários
rurais e interessados, portanto, em fazer essa excursão em visita às suas
usinas de açúcar ou plantações de café a sete ou oito léguas da capital.
(DEBRET, 2015, p. 452)
35.
Nessa explicação geral do feriado, Debret
destaca sua importância, sobretudo pela interrupção de uma semana no trabalho.
Arrisca-se ainda em fazer distinção entre o que considera “classe média” e
“classe alta,” diferença que é minimizada na ocasião das festas natalinas,
quando todos comemoram, em geral, indo para o campo. Até aqui, contudo, não
notamos menção à sua gravura, pois a mulata representada não deve pertencer a
nenhuma das “classes” descritas por Debret no texto. Adiante ele introduz o
assunto que mais se aproxima do tema figurado:
36.
Quanto aos artífices, reunidos na casa
de seus parentes ou amigos, proprietários de sítios vizinhos da cidade,
aproveitam essas festas para gozar em liberdade os prazeres que essas curtas e
pouco dispendiosas excursões lhe permitem. Basta-lhes com efeito mandar levar
sua esteira e sua roupa pelo seu escravo. (DEBRET, 2015, p.452).
37.
Aqui já podemos perceber referências à imagem,
já que Debret fala da facilidade de tal excursão em razão da necessidade única
de se carregar roupas e esteiras através do uso de escravos, objetos que
podemos facilmente observar na imagem. Mas será que a mulata a que se refere o
título pertence a essa categoria de artífices? Numa frase posterior, Debret
dissolve tal dúvida, em uma citação direta à gravura:
38.
A mulata aqui representada é da classe
dos artífices abastados. Sua filhinha abre a marcha conduzindo pela mão um
negrinho, bode expiatório a seu serviço particular; vem em seguida a pesada
mulata, em lindo traje de viagem, que se dirige a pé para o sítio situado num
dos arrabaldes da cidade; a negra criada de quarto a acompanha carregando o
pássaro predileto. A mulata contenta-se com uma criada de quarto preta a fim de
não comprometer a própria cor.[15] Vem logo depois da primeira negra de
serviço, com o gongá, cesto em que se coloca a roupa branca. A terceira negra
carrega o leito da senhora, elegante travesseiro enrolado numa esteira de
Angola (bastante bem imitada na Bahia). A quarta, encarregada de trabalhos
grosseiros, lavadeira quase sempre grávida, carrega os trastes das outras
companheiras; e a negra nova acompanha humildemente o cortejo, carregando a
provisão de café torrado e a coberta de algodão com que se envolve à noite para
dormir. (DEBRET, 2015, p.452).
39.
Essa passagem explica (na verdade, impõe) o
sentido a ser percebido na imagem. Mas não se trata de uma explicação isenta de
juízos de valor, uma vez que ela eleva a condição das primeiras da fila, quando
fala, por exemplo, da beleza de seu traje, enquanto as últimas recebem
adjetivos que reforçam sua característica servil e pouco “civilizada,” seja
pelas funções que executam (“trabalhos grosseiros”) como pela sua condição
próxima ao mundo natural (“lavadeira quase sempre grávida”). Também pelo texto
sabemos que a criança menor, à frente, é na verdade um menino, e só está nessa
posição por ser também um escravo à disposição da menina, filha da “mulata,”
personagem que dá o título à obra. Debret não deixa de falar que a “mulata” era
uma mulher “pesada,” como se isso fosse necessário, haja vista as enormes
proporções com que ele a figurou. De qualquer forma, ainda que possa parecer um
comentário pejorativo, trata-se mais de um signo de distinção em relação às
escravas, em geral figuradas bem mais magras.
40.
Assim, pode-se tirar duas considerações
principais da análise dessa gravura. Primeiramente, a posição de destaque dada
ao “mulato” bem como sua proximidade com as pessoas da elite (aqueles a quem
Debret refere-se como classes “média” e “alta”), quando reproduz os hábitos
desses grupos da sociedade no feriado de Natal. Assim como na gravura analisada
anteriormente onde o “mulato” tinha certo destaque como elemento de
transição na hierarquia social, aqui ele assume uma importância extra:
estando na ponta da fila, seria figurado com uma evolução natural dos negros,
tendo, inclusive, uma superioridade em relação a eles, por sua mistura com o
sangue dos brancos e por seu sucesso material (percebemos sua distinção por
suas roupas, e por não carregar nada além de um lenço nas mãos). Essa gravura
ganha um sentido mais amplo quando a comparamos com a gravura anterior, bem
como com o texto descritivo de Debret, que mais do que simplesmente explicar as
imagens, atribui-lhes valor, nesse caso, necessário para delimitar sem sombra
de dúvidas as diferenças entre negros e mestiços (“mulatos”), estando esses
últimos mais próximos dos brancos na escala “civilizatória.” Outro aspecto
relevante é a disposição enfileirada dos personagens. Mais uma vez, Debret
serviu-se de tal esquema para ilustrar a ideia de uma sociedade rumo à
“civilização.”[16] Como
foi dito no final da análise da gravura anterior, Debret apostava no “mulato”
como agente de alguma transformação social, ou seja, na mistura entre brancos e
negros, mas lançava para o futuro as possibilidades efetivas de alguma mudança.
Na gravura analisada a seguir, que finaliza este artigo, teremos uma imagem
emblemática a esse respeito.
III. Meninos
brincando de soldados ou O primeiro ímpeto da virtude guerreira
41.
Cinco meninos, vestidos de soldados, com
chapéus de papel, espadas de madeira e cavalos construídos a partir de um arco
e alguns chumaços de algodão, guiam um bando de outros garotos que se espremem
no lado direito de uma singela aquarela, de 15,3 por 21,6 cm [Figura 5]. Eles marcham
alegremente para o lado esquerdo da aquarela, guiados pelo ânimo do primeiro
menino, que olha para trás em um gesto de motivação, levantando sua espadinha e
empinando seu “alazão.” Apesar de este menino ser branco, não há grande
diferenciação social nesse grupo, todos brincam juntos. O único marcador
simbólico de diferença social observado é o fato de ele usar sapatos e todos os
demais estarem descalços, o que se justifica pelo fato de ele ser o chefe do
grupo, seu guia, e ninguém parece triste com isso; ao contrário, o clima é de
total diversão. Isso tudo acontece no primeiro plano da aquarela.
42.
No segundo plano é possível notar um outro
grupo, não de crianças, mas de adultos, que, indo em uma direção oposta à dos
meninos, parecem estar rumando para uma batalha de verdade. O plano em que se
encontram é abaixo do nível do solo onde as crianças brincam, e por isso é
possível ver apenas parte de seus corpos, e de suas armas. Direcionando o olhar
para os últimos planos da obra, nota-se uma paisagem limpa, com poucas árvores,
uma casa grande ao longe, morros e o pálido céu. A linha do horizonte não é
plana, mas inclina-se à medida que se aproxima do lado direito da obra. Todos
os demais planos seguem essa orientação, de modo que o chão em que os meninos brincam
também tem essa inclinação, e é nesse sentido que sua marcha segue. Os soldados
de verdade,[17] ao
fundo, seguem em direção contrária a todo o movimento desta aquarela, e, com
isso, ela ganha certo equilíbrio, haja visto que há um aglomerado de
personagens no lado direito, e apenas alguns no lado esquerdo.
43.
Uma árvore, que pode ser vista parcialmente,
serve como um apoio no lado esquerdo, como se ela fosse fadada a sustentar o
espaço de honra que é oferecido aos meninos, que podem, assim, brincar
despreocupadamente, não tendo sequer a responsabilidade de preencher todo o
espaço da obra.[18]
Afinal, se há algo realmente sério acontecendo, é para onde os homens do
segundo plano estão se dirigindo. E, definitivamente, não é para lá que os
soldadinhos pretendem ir: o que eles querem é continuar brincando.
44.
Essa aquarela apresenta uma leveza e
jovialidade em tudo diversa das obras neoclássicas de Debret, e até mesmo das
duas outras imagens analisadas anteriormente. Aqui não há uma preocupação em
mostrar os contrastes da sociedade, nem a violência contra o negro, e menos
ainda uma verdadeira cena de batalha ou de preparação para a guerra, como, por
exemplo, em uma pintura histórica realizada por Debret no Brasil chamada Embarque
na Praia Grande das tropas destinadas ao sítio de Montevidéu [Figura 6],
realizada em 1816.
45.
A aquarela com os meninos brincando não poderia
ser considerada uma obra neoclássica, pois ela é muito mais pictórica, no
sentido proposto por Wölfflin (1989, p. 21-78), do que linear; não há uma
definição precisa dos contornos, em razão da própria técnica; talvez seja uma
brincadeira com um tema tipicamente neoclássico, como as cenas de batalha que
Debret realizou na França durante o império napoleônico,[19] mas
as analogias cessam por aí. É como se Debret atestasse, com esse simples
desenho, sua crença de que o Brasil, país “ainda na infância,” estivesse aqui
brincando de ser adulto. Por outro lado, sugere seu papel como o artista que
lançou as sementes para a realização de uma pintura histórica de primeira
grandeza no futuro.[20]
46.
A aquarela de Debret não parece mesmo se preocupar
com o presente, ou seja, com a batalha verdadeira que se inicia no segundo
plano. Ela brinca com o futuro. Por esse motivo é que se percebe que, para
Debret, as mudanças necessárias para o Brasil, como a igualdade entre pessoas
de cor diferente ou esse ideal coletivo, que já é incipiente na brincadeira dos
meninos, era algo para o futuro. Isso já foi discutido nas obras anteriores,
mas essa aquarela é emblemática a esse respeito.
47.
Preocupado com a recepção do livro Viagem
pitoresca e histórica ao Brasil pelo seu público francês e interessado em
ingressar no mercado editorial da época, Debret colocou um texto explicativo em
cada uma das pranchas do livro, a fim de que uma linguagem complementasse a
outra. Como foi percebido na análise das gravuras, esse texto apenas amplia o
grau de construção da imagem, e força um sentido único para sua interpretação.
Só que, contrariamente ao que Debret gostaria, muitas vezes as imagens
desmentem aquilo que foi dito no texto, e isso é que as tornam ricas para um
estudo analítico. Do contrário, bastaria realizar uma leitura laudatória de seu
livro. Nesse sentido, seus textos têm uma grande importância, quando utilizados
para perceber as “intenções” manifestas do artista, sua reinterpretação de si
mesmo, o contexto por ele exposto, e confrontar todas essas informações com a
obra final. Mas tais informações nada têm de neutras. Ao contrário, elas
atribuem às gravuras uma outra dimensão, valorizando determinados elementos em
detrimento de outros. Se, como diz Pierre Francastel (1993, p. 40), “tendo
sempre por matéria o real, a arte lhe acrescenta sempre algo,” os textos de
Debret acrescentam ainda mais elementos a esse “real” que é figurado nas obras
e por meio delas.[21]
48.
Analisando as imagens prosaicas de Debret, em
geral destinadas ao público francês, notou-se uma preocupação com os contrastes
observados e a crítica de Debret aos costumes lusitanos. A crítica ao
escravismo pôde ser percebida em uma análise apurada das imagens onde o
escravizado ganha destaque, assumindo, por vezes, o papel principal das cenas
figuradas, da mesma forma que os monarcas em suas pinturas históricas. Tais
cenas, confrontadas com textos do autor que falam sobre a situação das pessoas
negras, as justificativas de sua servidão e a necessidade de um “branqueamento”
que lhes proporcionasse a liberdade, permitem perceber qual o sentido da
escravidão para Debret: apesar de biologicamente justificada, era uma violação
dos direitos do homem e do cidadão, como pregado durante a Revolução Francesa,
da qual Debret participou como jacobino, ao lado de David. Com isso, Debret dá
ao mestiço, por ele chamado “mulato,” um papel importante na transição entre o
homem servil e o livre, estabelecendo uma hierarquia social, utilizando a
imagem de personagens em fila para demonstrar como isso poderia acontecer. A
última aquarela, onde meninos brincam de soldados, “marchando,” percebemos uma
aposta do artista para o futuro do Brasil.
49.
Neste artigo, analisei apenas três imagens
criadas por Debret, mas a verdade é que há pessoas escravizadas figuradas em
quase todos os seus trabalhos (“Tudo se assenta pois, neste país, no escravo
negro,” diria ele em seu Viagem Pitoresca (DEBRET, 2015, p. 149). Essa
contradição, inerente ao Brasil oitocentista, enfraquece qualquer tentativa de
Debret de apresentar um país que estava em uma “marcha progressiva para a
civilização.” A escravidão era, mesmo em termos franceses, um empecilho para qualquer
ideia de “civilização” e “progresso.”
50.
Por isso, a obra de Debret, mais do que uma
representação fiel do Brasil escravista, é uma sugestão: ela aponta
contradições e vislumbra um futuro, onde esses problemas encontrariam
“naturalmente” uma solução. Mais do que um retrato do escravismo, o que Debret
nos oferece, entre imagens e textos, é uma leitura dele feita por um antigo
revolucionário francês, que enxergava no progresso da civilização a felicidade
e o bem comum. Nesse sentido, mais do que um reflexo da nossa sociedade
escravista, Debret aponta seus contrastes e contradições, e nos oferece uma
espécie de espelho, exigindo de nós um posicionamento. Em que pese toda sua
visada eurocêntrica, que não pode ser ignorada, ele nos oferece uma
oportunidade rica de problematização de nosso passado e nos instiga a pensar em
nosso presente e na luta constante que travamos a cada dia por uma sociedade
mais justa e democrática.
Referências Bibliográficas
BANDEIRA, Julio; LAGO, Pedro
Correia do. Debret e o Brasil: Obra completa 1816-1831. Prefácio de José
Murilo de Carvalho. Rio de Janeiro: Capivara Editora, 2007.
BURKE, Peter. O que é
história cultural? Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
BURKE, Peter. Testemunha
ocular: o uso de imagens como evidência histórica. São Paulo: Unesp, 2017.
CARDOSO, Rafael et al. Castro
Maya: colecionador de Debret. Rio de Janeiro, Editora Capivara, 2003.
DEBRET, Jean Baptiste. Viagem
Pitoresca e Histórica ao Brasil, aquarelas e desenhos que não foram
reproduzidos na edição de Firmin Didot - 1834. Belo Horizonte, Editora da
Universidade de São Paulo, Livraria Itatiaia Editora Ltda., 1989 (gravuras
coloridas).
DEBRET, Jean Baptiste. Viagem
Pitoresca e Histórica ao Brasil. Tomos I e II, Vol I, II e III, Belo
Horizonte, Editora da Universidade de São Paulo, Livraria Itatiaia Editora
Ltda., 1978.
DEBRET, Jean Baptiste. Voyage
pittoresque et historique au Brésil,ou Séjour d’un artiste français au Brésil,
depuis 1816 jusqu’en 1831 inclusivement... Par J. B. Debret. Paris,
Firmin Didot et Frères, 1834-39. Disponível em: https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/3813, https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/3802, https://digital.bbm.usp.br/handle/bbm/4716
Acesso
em 27 fev. 2019.
DEBRET, Jean-Baptiste. Viagem
pitoresca e histórica ao Brasil. Tradução de Sergio Milliet. Organização e
Prefácio de Jacques Leenhardt. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São
Paulo, 2015.
FRANCASTEL, Pierre. A
realidade figurativa. São Paulo: Perspectiva, Editora da Universidade de
São Paulo, 1993.
FRANCASTEL, Pierre. Études
de sociologie de l’art. Denoël/Gonthier, Paris, 1970.
FRANCASTEL, Pierre. Pintura
e sociedade. São Paulo, Martins Fontes, 1990.
GINZBURG, Carlo. De A. Warburg
a E. H. Gombrich: Notas sobre um problema de método. In: GINZBURG,
Carlo. Mitos, emblemas, sinais: Morfologia e história. São Paulo:
Companhia das Letras, 2003. p. 41-94
GOMES JUNIOR, Guilherme
Simões. Sobre quadros e livros: rotinas acadêmicas - Paris e Rio de
Janeiro, século XIX. Tese de Livre-Docência, 218p. Universidade de São
Paulo, Departamento de Sociologia, 2003.
LIMA, Valéria. J.-B Debret, historiador e
pintor. A Viagem pitoresca e histórica ao Brasil (1816-1839). Campinas:
Editora da UNICAMP, 2007.
LIMA, Valéria. Uma viagem
com Debret. São Paulo: Jorge Zahar Ed., 2004.
NAVES, Rodrigo. Debret, o
neoclassicismo e a escravidão. In: NAVES, Rodrigo. A Forma Difícil:
ensaios sobre a arte brasileira. São Paulo, Ática, 2001, p. 41-129.
PARECER da Comissão do IHGB
sobre o 2º volume de Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, de Jean
Baptiste Debret. Manuscrito, 1840, fls. 03. Acervo do IHGB.
PRADO, João Fernando de
Almeida. Jean-Baptiste Debret. Brasiliana, volume 352. São Paulo:
Companhia Editora Nacional, Editora da Universidade de São Paulo,1973.
RIOS FILHO, Adolfo Morales de
los. Grandjean de Montigny e a evolução da arte brasileira. Rio
de Janeiro, Empresa a Noite, 1941.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. Nem
preto nem branco, muito pelo contrário: cor e raça na intimidade. In:
SCHWARCZ, Lilia Moritz (org.). História da vida privada no Brasil. Vol.
4. Contrastes de intimidade contemporânea. São Paulo: Companhia das Letras,
1998, p. 173-244.
STAROBINSKI, Jean. As
máscaras da civilização: ensaios. São Paulo, Companhia das Letras, 2001.
TREVISAN, Anderson Ricardo. Debret a Missão
Artística de 1816: aspectos da constituição da arte acadêmica no Brasil. Plural.
Revista do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da USP, São Paulo, n,
14, p. 9-32, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.11606/issn.2176-8099.pcso.2007.75459
Acesso em 27 fev. 2019.
TREVISAN, Anderson Ricardo. Imagem, sociedade e
conhecimento: da História Cultural à Sociologia da Arte. Leitura: Teoria e
Prática, v. 37, p. 113-128, 2019.
TREVISAN, Anderson Ricardo. Imagens e textos
explicativos na investigação sociológica: apontamentos teóricos para ler a
Viagem pitoresca e histórica ao Brasil de Debret (1768-1848). Cadernos
CERU, 21(2), p. 153-169, 2010. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/ceru/article/view/11922
acesso em 02 nov. 2018.
TRINDADE, Jaelson Bitran. O fantasma de Debret.
Viajante imaginário. Revista de História da Biblioteca Nacional, n. 32,
mai. 2008.
WEBER, Max. Os tipos puros de
dominação legítima. In: Gabriel COHN
(org.). Weber. Sociologia. São Paulo: Ática, 2003, p. 128-141.
WÖLFFLIN, Henrich. Conceitos
fundamentais da História da Arte: o problema da evolução dos estilos na
arte mais recente. São Paulo: Martins Fontes, 1989.
______________________________
[1] Agradeço à FAPESP pelo
financiamento da pesquisa da qual este artigo é parte dos resultados.
[2] Professor do
Departamento de Ciências Sociais na Educação da Universidade Estadual de
Campinas (Unicamp). Contato: detrevis@unicamp.br.
[3] Debret realizou ainda uma
viagem ao sul do país, passando pela província de São Paulo, chegando até o Rio
Grande do Sul, onde realizou inúmeros trabalhos sobre a paisagem e as cidades.
Nem todos esses trabalhos compuseram o livro Viagem Pitoresca e Histórica ao
Brasil, mas podem ser encontradas nas seguintes obras: PRADO,1973;
BANDEIRA, 2003; BANDEIRA. LAGO, 2007; e DEBRET, 1989. Alguns pesquisadores
questionam a veracidade dessa viagem de Debret ao sul do país (cfr. TRINDADE,
2008).
[4] Lembrando que, durante
todo esse tempo, Debret lecionou, mas não com apoio governamental. Afinal,
sendo oficialmente inaugurada em 1826, a Academia só começaria a funcionar
efetivamente em 1827, e ainda assim movida pelo estatuto de Henrique
José da Silva, que impedia que os alunos frequentassem, de imediato, as
aulas de pintura histórica (cfr. TREVISAN, 2007).
[5] Segundo o artista,
pouco mais de uma dezena de telas a óleo, entre as quais vários estudos, além
dos cenários e decorações para as festas régias e imperiais (DEBRET, 2015, p.
430). Pesquisas mais recentes informam que Debret realizou cerca de 30 quadros
à óleo no Brasil, muitos dos quais ainda não foram localizados (BANDEIRA, LAGO,
2007, p. 68).
[6] Afinal, como dizia Aby
Warburg, “Deus está no detalhe” (BURKE, 2008, p. 21). Nessa célebre frase, o
mestre de Panofsky, Saxl e Cassirer estava sugerindo a importância de se fugir
dos grandes esquemas explicativos para as imagens, e buscar nelas os elementos
que nos ajudem a compreender aspectos da sociedade que as produziu. Sobre o
assunto, ver GINZBURG, 2003 e TREVISAN, 2019.
[7] O conceito vem de Pierre
Francastel e pressupõem um sistema coerente de pensamento que possui seu modo
de expressão próprio, que deve ser investigado em si mesmo (FRANCASTEL, 1993,
p. 6). Nesse sentido, esquiva-se de explicações fáceis ou exteriores às imagens
buscando, ao contrário disso, analisá-las em si mesmas, de modo a perceber os
sentidos que elas aludem e os possíveis significados dentro de um determinado
contexto.
[8] Os organizadores do
catálogo raisonné indicam que a aquarela foi realizada entre 1820 e 1825
(BANDEIRA, LAGO, 2007, p.169). As aquarelas que Debret realizou no Brasil foram
a base para as litografias que compuserem seu livro Voyage pitoresque et
historique au Brésil, publicado em três volumes nos anos de 1834, 1835 e
1839, na França.
[9] Em grande medida, isso
pode ter ocorrido pela degradação da obra, uma vez que a aquarela, por sua
natureza, não tem uma grande longevidade, como a pintura a óleo, por exemplo.
[10] Segundo Max Weber, “[a]
dominação patriarcal (do pai de família, do chefe da parentela ou do
‘soberano’) não é senão o tipo mais puro de dominação tradicional” (WEBER,
2003, p. 133). Não vem ao caso aqui aprofundar essa questão, que foi trabalhada
por clássicos do pensamento social brasileiro como Sérgio Buarque de Holanda,
Gilberto Freyre e Raymundo Faoro em suas interpretações do Brasil. Vale apenas
frisar que, no sentido weberiano, a dominação tradicional, da qual o
patriarcado é o tipo mais puro, difere da dominação legal, que se baseia não
mais em crenças e valores tradicionais, mas em um estatuto, sendo o tipo de
dominação predominante no capitalismo moderno, marcado sobretudo pela
burocracia (WEBER, p. 128-31).
[11] No I Congresso
Internacional das Raças, que aconteceu no Rio de Janeiro em 1911,
apostava-se que o negro desapareceria ao longo do tempo no Brasil. No I
Congresso de Eugenia, de 1929, o antropólogo Roquette-Pinto previa que em
2012 a população brasileira seria composta de 80% de brancos e 20% de mestiços.
A mestiçagem era entendida como “um grande e caudaloso rio em que se misturavam
- harmoniosamente - as três raças formadoras” (SCHWARCZ, 1998, p. 176-178).
[12] PARECER da Comissão
do IHGB sobre o 2º volume de Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, de
Jean Baptiste Debret. Manuscrito, 1840, fls. 3.
[13] Idem.
[14] Valéria Lima atribui à
maioria das gravuras de Debret sobre o brasileiro branco (português nascido no
Brasil), incluindo a obra ora analisada, esse “tratamento caricatural e
irônico” (LIMA, 2004, p. 52). Rodrigo Naves também destaca esse tom da gravura,
quando fala desse “funcionário que desfila suas posses” (NAVES, 2001, p. 82).
[15] O tradutor Sérgio
Milliet (1978, p.164) faz a seguinte observação sobre essa passagem: “Era
costume, entre as pessoas mais abastadas o emprego das mulatas no cargo da
criada de quarto ou camareira. Em se tratando entretanto de uma senhora mulata
naturalmente se impunha a escolha de uma negra para o cargo... et pour cause,
como frisa ironicamente o autor”.
[16] Valeria Lima (2007)
realiza uma análise primorosa do livro Viagem pitoresca e histórica ao
Brasil a partir dessa noção de “marcha” para a civilização de Debret,
inserindo o artista/autor numa chave de leitura iluminista.
[17] Percebe-se, com algum
esforço, que os homens estão armados e usam chapéus semelhantes aos de
soldados. Mas, de maneira geral, o que há é uma mancha sugerindo esse grupo. É
necessário, portanto, uma dose de imaginação para percebê-los como soldados.
[18] Rodrigo Naves fala
sobre a não-responsabilidade dos meninos em ocupar o espaço da aquarela (NAVES,
2001, p. 43).
[19] Debret realizou
pinturas nesse estilo tendo Napoleão Bonaparte como personagem, seguindo o
modelo do mestre Jaques-Louis David. Essas pinturas estão no Palácio de
Versalhes. Sobre o assunto, ver NAVES, 2001.
[20] Segundo Gomes Junior
(2003, p. 71), isso aconteceria apenas após 1850, nas obras de Pedro
Américo e Vitor Meirelles.
[21] Sobre a relação entre
texto e imagens no livro de Debret, ver TREVISAN, 2010.