A origem da arte segundo Karl von den Steinen *
Pierre Déléage **
DÉLÉAGE, Pierre. A
origem da arte segundo Karl von den Steinen. 19&20,
v. XIII, n. 2, jul.-dez. 2018. https://doi.org/10.52913/19e20.xiii2.01
* * *
1. Em Tristes
Tropiques, Claude Lévi-Strauss aludiu brevemente a uma técnica etnográfica
que hoje provavelmente acharíamos desconcertante: ele notou que os Nambikwara
do Brasil "não sabem desenhar;" ainda assim, de modo natural,
entregou-lhes folhas de papel e lápis.[1] Em 1938, o ano da expedição de Lévi-Strauss,
essa técnica havia se tornado uma tradição, um hábito que remontava aos
primeiros passos da etnologia na Amazônia no final do século XIX, que ele
seguiu sem pensar duas vezes. Lévi-Strauss não se sentia obrigado a explicar as
razões para aplicar esse método de pesquisa e menos ainda o que esperava
conseguir com ele. Na verdade, ele apenas mencionou o método porque ficou
surpreso com o que os Nambikwara fizeram com o papel e lápis. Então, o que ele
estava esperando? A resposta está na redescoberta de um contexto intelectual
amplamente esquecido, um breve período em que os etnólogos, e particularmente
Karl von den Steinen,
estavam na vanguarda das teorias sobre a arte: um fragmento da história
intelectual que se desintegrou por volta da Primeira Guerra Mundial.[2]
2. Na
origem desta história encontramos dois eventos fortuitos. O primeiro ocorreu em
25 de setembro de 1878, quando o explorador Jules Crevaux,
subindo o rio Oiapoque, na Guiana, parou para descansar na aldeia do chefe Kinero, dos Wayãpi:
3.
Eu me
distraia reproduzindo as figuras e arabescos que cobriam os corpos das pessoas
da aldeia. Tive então a ideia de esculpir um pedaço de carvão e entregá-lo ao
capitão Jean-Louis [seu guia Wayãpi] e pedir-lhe que
desenhasse em meu caderno, que ele chamava de caréta,
enquanto chamava os desenhos que produzia de coussiouar.
Jean-Louis mal conseguia desenhar. No entanto, o jovem Yami
rapidamente desenhou imagens de um homem, de um cachorro, de um tigre e de todos
os animais e demônios da localidade, não com o carvão, mas com um lápis [Figura 1]. Outro índio reproduziu todos os tipos de arabescos que ele estava
acostumado a pintar com jenipapo.
4.
Tendo
dado algumas agulhas para meus desenhistas, elas ficaram livres para me pedir
um lápis para desenhar no papel. Vi que esses selvagens, que são acusados de
ignorar completamente as belas artes, desenham com extraordinária facilidade;
até as mulheres, que os viajantes geralmente descrevem como bestas de carga,
também me pediam lápis para que pudessem ganhar algumas agulhas, reproduzindo
os desenhos que costumavam fazer em sua cerâmica.[3]
5. O
segundo evento ocorreu alguns anos depois, na noite de 5 de setembro de 1884. O
explorador alemão Karl von den Steinen,
em sua primeira expedição ao Brasil central, tomava notas sobre a língua dos Suyá às margens do rio Xingu. Ciente de que a paciência de
seus anfitriões estava se esgotando, ele fechou seu caderno. Um “médico
feiticeiro” surpreendeu-o, pedindo-lhe papel e lápis. O explorador concordou e
em uma das páginas o pajé começou a desenhar alguns dos padrões que tradicionalmente
decoravam as cabaças do Suyá. Wilhelm, primo de Karl
von den Steinen e artista
da expedição, passou seu caderno de desenhos para outro Suyá
[Figura 2], que
também cobriu as páginas com desenhos decorativos [Figura 3].[4]
6. Parece
que Von den Steinen não
havia lido Crevaux e, em ambos os casos, nota-se que
foram os próprios nativos americanos que “espontaneamente” quiseram tentar
desenhar com um lápis, transpondo assim para folhas de papel os desenhos de seu
repertório gráfico tradicional: arabescos usualmente pintados em seus corpos ou
cabaças. Richard Andree, um então famoso geógrafo
alemão, filho do fundador da revista Globus,
imediatamente viu a analogia entre essas duas anedotas sobre os desenhos Wayãpi e Suyá, publicadas com
alguns anos de diferença. Ele escreveu um breve artigo, Das Zeichnen bei den
Naturvoelkern, para “mostrar que homens
aparentemente subdesenvolvidos culturalmente podiam ter grande talento gráfico”
- o que confirmava a tese da unidade da mente humana, defendida na época pelo
diretor do Museu Etnográfico de Berlim, Adolf Bastian.[5]
7. Karl
von den Steinen, ele próprio aluno e amigo de Bastian,
provavelmente estava ciente desde muito cedo do artigo de Andree,
que recomendou mais pesquisas sobre os “desenhos dos povos primitivos.” Em
1887, durante sua segunda estada no Xingu, von den Steinen estudou o assunto em profundidade. O trabalho
resultante, o décimo capítulo de seu muito popular relato de expedição, Unter
den Naturvölkern Zentral-Brasiliens, imediatamente se tornou uma pedra
de toque da reflexão europeia sobre a arte, como veremos abaixo.[6]
A origem dos ornamentos
8. O pajé
de 1884 chamou a atenção de von den Steinen e Andree para o
repertório de ornamentos dos nativos americanos do Xingu. A nova expedição
tomou estes ornamentos como objeto de estudo e fez uma descoberta importante.
Von den Steinen levou sete
anos para publicar seu livro, mas a descoberta foi relatada por um de seus
companheiros de viagem, Paul Ehrenreich, com as
seguintes palavras:
9.
Na casa
do chefe dos Bakairi, estendendo-se como um friso ao longo da parede,
encontram-se tábuas de casca pretas pintadas de terra branca com figuras de
peixes e desenhos característicos de todos os ornamentos usados pelos Bakairi,
cujo significado próprio poderíamos facilmente descobrir. Um importante fato na
história da civilização pôde então ser estabelecido: todas essas figuras que
parecem ser desenhos geométricos são na realidade representações abreviadas,
parcialmente convencionalizadas, de objetos concretos, principalmente de
animais. Assim, uma linha ondulante com pontos alternados representa a
gigantesca serpente, a anaconda, que é marcada por grandes manchas escuras; um
losango, com seu ângulo preenchido em preto, indica um peixe de lagoa; já um
triângulo não representa aquela figura geométrica simples, mas a pequena
vestimenta de três pontas das mulheres.[7]
10. Cada
motivo do repertório ornamental dos nativos do Xingu tinha um nome particular e
os dois exploradores imediatamente consideraram que esses nomes se referiam a
entidades que os nativos queriam reproduzir quando desenhavam motivos
convencionais em tábuas, cabaças e máscaras. O repertório aparentemente
abstrato dos nativos americanos do Xingu tinha, portanto, uma origem
figurativa.
11. A
configuração em losango com cantos negros, mencionada por Ehrenreich,
já havia sido desenhada pelo pajé Suyá durante a
expedição de 1884. Karl von den Steinen
encontrou-a entre todos os nativos americanos do Xingu, que se referiam a ela
pelo nome mereshu, um peixe parecido com a
piranha. Como Ehrenreich, von den
Steinen deduziu desse nome que a forma geométrica,
totalmente abstrata na aparência, tinha originalmente sido uma representação de
um modelo real, o peixe mereshu, e que esse
desenho figurativo foi gradualmente estilizado através da cópia ou devido às
restrições da gravação em uma cabaça - onde os ângulos eram mais fáceis de
configurar do que as curvas -, a ponto de se tornarem irreconhecíveis. A ideia
era apoiada pelas explicações dos próprios nativos, que interpretavam os cantos
negros do losango como a cabeça, a cauda e as barbatanas do peixe. Uma análise
semelhante poderia ser feita de todos os padrões nos repertórios gráficos dos
nativos do Xingu e dos Karajá, com quem Paul Ehrenreich
brevemente se hospedou após a partida de von den Steinen [Figura 4].[8]
12. De que
modo essa descoberta podia ser “importante para a história da civilização’? O
que os dois exploradores deixaram de mencionar em seus respectivos textos foi
que eles deram uma contribuição decisiva para os debates então em andamento
sobre a origem dos ornamentos.[9] Duas teses eram correntes na época: ou
os ornamentos deviam sua forma exclusivamente às restrições do material originalmente
usado; ou resultavam de um processo de deturpação e convencionalização
linear de um protótipo figurativo.
13. A
primeira tese foi atribuída ao arquiteto Gottfried Semper,
que via tapeçarias trançadas de portas e mais tarde têxteis como o primeiro medium para ornamentos da história
da humanidade. Os elementos formais desses ornamentos originais,
portanto, obedeciam às restrições técnicas do trançar e do tecer. Os motivos
foram subsequentemente transferidos para outras media - cabaças,
máscaras, corpos humanos - e foram adaptados sem perder seus elementos formais,
sendo, portanto, relíquias das restrições materiais originais que os geraram.[10]
14. A
segunda tese foi veementemente defendida pelo sueco Hjalmar Stolpe.[11]
Diante do silêncio dos ornamentos que ele reproduziu incansavelmente nos museus
europeus, Stolpe estava determinado a encontrar seu
significado original. Ele considerou os ornamentos como “criptográficos” que
apenas uma elite formada por sacerdotes e eruditos conseguia decifrar. Stolpe achava que era capaz de identificar protótipos
antropomórficos ou zoomórficos por trás do conjunto de padrões gráficos que
decoravam as clavas coletadas na Guiana [Figura 5]. Seu
trabalho obteve certa popularidade na década de 1890 e a ideia de uma origem
figurativa dos ornamentos foi adotada por Henry Colley-March,
Charles H. Read, Henry Balfour e Alfred C. Haddon.[12] Note-se que, todavia, no debate, todos
esses autores britânicos, aos quais podemos acrescentar o americano William H.
Holmes,[13] assumiram uma posição mais nuançada do
que a de Stolpe. Eles argumentavam que, embora certos
ornamentos pudessem ter tido uma origem figurativa, outros eram claramente
derivados de restrições técnicas e materiais (Colley-March
chamou tais motivos de “esquemorfos”). Disso
concluía-se que a origem dos ornamentos tinha que ser determinada caso a caso.
15. O
método de Stolpe era baseado quase inteiramente em
sua intuição e suas identificações de protótipos antropomórficos, zoomórficos
ou filomorfos (i.e., tendo forma de folha) hoje
parecem completamente fantasiosas. Por outra via, Karl von den
Steinen - que, como bom discípulo de Bastian, considerava legítimas apenas as teorias baseadas
em dados empíricos detalhados - adotou uma posição próxima à de Stolpe. É claro, no entanto, que von den
Steinen tinha pouca consideração pelas ideias do
sueco sobre os ornamentos guianenses. O comentário a seguir pode ser
interpretado como uma crítica implícita:
16.
Seria
impossível interpretar esses motivos ornamentais apenas com nossos arrazoados;
temos que ouvir as explicações dos próprios nativos ou desistir de tentar
compreendê-los.[14]
17. Em seu
livro Die Anfänge der Kunst,
Ernst Grosse enfatizou a importância de descobrir os
nomes atribuídos aos motivos nos repertórios gráficos da Amazônia. Ele
desenvolveu uma estratégia argumentativa correspondente:
18.
De fato,
nem sempre é fácil descobrir a forma original de um ornamento primitivo. Quando
contemplamos um padrão em ziguezague ou o losango em um escudo australiano,
nossa teoria de que ele é derivado de formas animais, sem dúvida, pode ser
perigosa; e pode ser duplamente perigosa quando reconhecemos que, na maioria
dos casos, não podemos comprovar diretamente a teoria. Certamente seria uma
maravilha se pudéssemos. A ornamentação australiana nunca foi estudada
sistematicamente. Mesmo no abrangente trabalho de Brough
Smyth, ela é descartada com algumas observações muito
gerais e superficiais. Com efeito, ninguém se deu ao trabalho de questionar os
aborígines sobre o significado de seus diversos desenhos. Nessas
circunstâncias, o que existe então para justificar nossa explicação? Em
primeiro lugar, o fato de que na maior parte dos ornamentos dos povos
inferiores que foram estudados - como os ornamentos australianos deveriam ter
sido estudados - descobriu-se que eles eram a imitação de formas animais ou
humanas. Em nenhum lugar existe uma ornamentação de caráter “geométrico” tão
distintiva como entre as tribos brasileiras. Seus padrões retilíneos em nada
sugerem formas naturais para um europeu que as aprecia em um museu. Mas Ehrenreich, que estudou esses padrões in loco, demonstrou de forma
irrefutável que eles nada mais são do que animais ou partes de animais.[15]
19. Ernst Grosse estava totalmente familiarizado com o trabalho de
William Holmes e Hjalmar Stolpe. No entanto, suas
interpretações arqueológicas, baseadas sobretudo na imaginação e no sentido
estético, não eram convincentes se comparadas aos dados etnográficos de Paul Ehrenreich e, posteriormente, de Karl von den Steinen. O núcleo do debate
sobre a origem dos ornamentos passou então para o campo dos etnólogos na
Amazônia e na América do Norte.
20. Em
1900, por ocasião de uma nova expedição ao Xingu, Max Schmidt, discípulo de von
den Steinen, revisou a
análise do motivo do peixe mereshu. Ele viu a
onipresente forma em lodango como um motivo que foi
tirado de uma das técnicas de cestaria e, portanto, ela era de origem “plectogênica”[16] (i.e., derivada de técnicas de
tecelagem).[17] Logo, aparentemente de forma
inadvertida, Schmidt adotou a mesma posição materialista que Semper. Assim, o nome dado ao motivo só poderia ser uma
elaboração secundária, uma analogia percebida entre a forma de um ornamento e a
de um peixe: um mnemônico destinado a diferenciar este motivo dos demais do
repertório e a perpetuar sua transmissão. O raciocínio foi endossado por Karl
von den Steinen[18]
e por Fritz Krause que, após Ehrenreich, retornou aos
Karajá em 1908.[19]
21. Paralelamente
ao trabalho de Max Schmidt na Amazônia, toda a primeira geração de estudantes
de Franz Boas foi instada a copiar os motivos gráficos dos nativos americanos
entre os quais eles pesquisavam e a anotar seus nomes. Boas tinha sido
influenciado pelo trabalho de Stolpe, Ehrenreich e von den Steinen, e particularmente por este último, que era um
amigo íntimo seu.[20] Assim, o estudo dos ornamentos ganhou um
lugar de destaque no programa de pesquisa que Boas preparou para as várias
expedições entre os índios norte-americanos, financiadas por Morris K. Jesup, em 1899.[21] Roland B. Dixon, Livingston Farrand, Alfred L. Kroeber, Carl Lumhotlz, Clark Wissler, Samuel
A. Barrett (o primeiro aluno de Kroeber) e Robert H. Lowie, contribuíram para o debate sobre a origem dos
ornamentos. Eles coletivamente chegaram à conclusão - provavelmente sugerida
por Boas - de que os nomes dos motivos decorativos eram secundários:[22]
a forma da maioria dos motivos provinha de restrições materiais, técnicas e
psicológicas, o que explicava a similaridade de suas formas em culturas
amplamente diversas e distantes. De igual modo, isso também explicava a
considerável variabilidade de seus nomes, que se originava do “simbolismo
secundário,” isto é, de uma analogia percebida a posteriori entre o
motivo e uma entidade; certamente não de uma intenção figurativa e muito menos
da deturpação de um antigo protótipo biomórfico.
22. Os
etnólogos na Amazônia e na América do Norte invalidaram, portanto, a hipótese
de uma origem figurativa dos ornamentos. O debate teórico sobre a questão das
origens desapareceu gradualmente com a eclosão da Primeira Guerra Mundial, as
posições foram definidas e não houve mais desenvolvimentos verdadeiramente
interessantes. Quando Franz Boas publicou a síntese de suas ideias em 1927, em Primitive Art, os
debates tinham a muito perdido sua força inovadora e controversa. A crítica de
Boas ao simbolismo figurativo que Stolpe e seus
sucessores atribuíram às tradições ornamentais teve duas consequências
importantes.
23. A
primeira foi que o estudo dos repertórios ornamentais dos chamados dos povos
primitivos passou a se concentrar nos aspectos mais formais, analisando
sobretudo as relações de duplicação, distorção e simetria dos padrões gráficos.[23]
Ao fazê-lo, a escola de Boas abandonou permanentemente o estudo semiótico das
diferentes formas de escrita-imagem, apesar destas serem muito difundidas nas
sociedades indígenas americanas. Esta perda de interesse era patente na resenha
de James Mooney sobre The Arapaho,
de Alfred Kroeber.[24] Enquanto
Kroeber afirmava que os nomes dos motivos gráficos
não seguiam um padrão regular e que as interpretações desses motivos eram
puramente pessoais e arbitrárias, Mooney - que
pertencia a uma tradição antropológica estadunidense que havia trabalhado
extensivamente na escrita-imagem dos ameríndios[25]
- criticou veementemente o que ele considerou ser uma generalização excessiva.
Ele viu o argumento de Kroeber como uma afirmação da
natureza aleatória de todos os repertórios gráficos nativos americanos, incluindo
aqueles mais evidentemente dotados de significados padronizados. Mas como Mooney representava o passado e Kroeber
incorporava o futuro da antropologia estadunidense, a reação ofendida do
primeiro permaneceu como letra morta.[26] O estudo da escrita-imagem foi
consequentemente deixado para os historiadores da escrita e da arte e para
amadores, todos os quais consideravam, de um modo ou de outro, a escrita-imagem
como uma escrita falhada, como técnicas de inscrição incapazes de se tornar
alfabetos, o cume de um processo evolutivo tido como unidirecional.[27]
24. A
segunda consequência das orientações teóricas da escola de Boas foi a perda
mais geral de interesse nos procedimentos indígenas de nomeação dos motivos
encontrados nos repertórios gráficos decorativos. Uma das poucas pessoas a
conduzir trabalho nesse sentido foi Samuel Barrett, que realizou um refinado
estudo dos nomes atribuídos aos motivos em cestos tecidos pelos Pomo na
Califórnia. Em particular, ele mostrou a complexidade desses motivos de
cestaria, que podiam ser analisados a partir de motivos mais simples que
formavam as unidades mínimas do repertório gráfico dos Pomo. Cada unidade, até
a menor, era nomeada com precisão, de modo que os motivos complexos finais,
aqueles que podiam ser vistos nas cestas, podiam ser denotados por meio de um
nome complexo composto dos nomes simples de cada unidade menor, como por
exemplo: “sobrancelha de batata / em ambos os lados / ponta de seta.”[28]
Desse modo, Barrett compilou uma gramática dos nomes que denotavam motivos
gráficos dos Pomo. Esse interesse pelos nomes dos repertórios ornamentais, no
entanto, permaneceu marginal e a escola de Franz Boas, juntamente com Max
Schmidt e os etnólogos alemães, falharam ao não ver a estranha recorrência dos mesmos
nomes associados aos mesmos motivos, de uma sociedade nativa americana
para as outras próximas. É certo que esse aspecto era infinitamente mais
aparente na Amazônia do que na América do Norte, e demorou muito para que os
dados etnográficos sobre as tradições ornamentais fora dos povos do Xingu
fossem estudados e publicados.[29]
25. Ao
invés de gastar mais tempo com a história das teorias etnológicas sobre a
origem dos ornamentos, gostaria de considerar a tese de Karl von den Steinen sobre a origem da
figuração. O décimo capítulo de seu livro Unter den
Naturvölkern Zentral-Brasiliens
era mais do que uma teoria da origem figurativa dos ornamentos. Baseava-se, de
maneira mais geral, na ideia de uma antecedência da figuração comunicativa em
comparação com a figuração artística:
26.
Entre os
povos primitivos, desenhar, assim como fazer gestos, serve para comunicar uma
ideia e não para reproduzir a beleza de uma forma. Eu creio que, na medida em
que o desenho explicativo tem algo de imediato, ele é anterior ao desenho
ornamental e artístico [...]. O desenho comunicativo surgiu, portanto, primeiro.[30]
27. O
explorador alemão baseou essa ideia nos raros desenhos figurativos que os
nativos americanos do Xingu costumavam fazer, geralmente na areia. O primeiro
exemplo que ele reproduziu foi um mapa destinado a comunicar à sua expedição a
ordem e as características distintivas do sistema fluvial local [Figura 6]. O
mapa foi desenhado por um Baikiri no caderno de
desenhos de Wilhelm von den Steinen.
28. Durante
sua segunda expedição na região do Xingu, Karl von den
Steinen ansiava por mais do que esses desenhos raros.
Seguindo o conselho de Richard Andree, ele se baseou
em tudo o que aprendeu em sua breve interação com o pajé Suyá
em 1884: ele não apenas reproduziu todos os motivos ornamentais que viu, mas
também pediu aos Bakairi, Nahuqa, Apiaká e Bororo que
usassem lápis para desenhar todo tipo de coisas em seus cadernos de esboços,
especialmente animais e figuras humanas [Figura 7, Figura 8, Figura 9
e
Figura 10]. Os
eventos fortuitos de 1878 e 1884 tornaram-se um método: os desenhos obtidos talvez
fornecessem dados cruciais para os fundamentos de uma teoria psicológica da
origem da arte.
29. O
significado pleno do corpus de desenhos que ele colecionou só se tornou
evidente para Karl von den Steinen
quando ele os comparou com aqueles feitos por crianças italianas, publicados e
analisados em 1887 por Corrado Ricci, um pioneiro no estudo de desenhos
infantis [Figura 11, Figura 12
e
Figura 13].
Ricci também inventou uma teoria da antecedência do “desenho comunicativo,” a
qual von den Steinen se
referiu:
30.
A
crianças descreve o homem e as coisas, em vez de representá-las artisticamente.
Ela tenta reproduzi-los em sua integridade literal e não de acordo com a
impressão visual. Ela faz, em suma, uma descrição em desenho tal como faria em
palavras.[31]
31. Karl
von den Steinen ficou
impressionado com as semelhanças que existiam entre os desenhos que ele sugeriu
que os nativos do Xingu fizessem e aqueles que crianças de três a oito anos
fizeram para Corrado Ricci. Essa analogia foi o ponto de partida para a sua
teoria da origem da representação figurativa. É importante aqui, porém, não
simplificar o argumento de von den Steinen. O explorador não tinha a intenção de comparar os
nativos americanos a crianças de quatro anos de idade ou de lhes atribuir o
mesmo nível de desenvolvimento psicológico. Além disso, seu capítulo prossegue
com uma longa análise das máscaras do Xingu e ele aponta regularmente para a
qualidade excelente do trabalho de penas dos Bororo. De maneira alguma ele
reduz a arte amazônica a alguns desenhos que os nativos concordaram em fazer em
seu caderno ou no de seu primo. O que interessava a den
Steinen, além das semelhanças formais entre os
desenhos infantis e os dos nativos americanos, era que, em ambos os casos, tratavam-se de desenhos “amadores,” no sentido de terem sido
desenhados antes de qualquer aprendizado ou transmissão cultural. Os nativos
americanos, como as crianças europeias, estavam descobrindo o papel e lápis;
era a primeira vez que eles tentavam representar algo figurativamente.
32. Karl
von den Steinen sabia muito
bem que quando os nativos americanos desenhavam “espontaneamente” nos cadernos
dos etnólogos, eles simplesmente transpunham a forma de seus motivos
tradicionais para um novo material usando uma nova ferramenta, como os Wayãpi haviam feito em 1878 e os Suyá
em 1884. Se os nativos deviam desenhar os contornos de animais e humanos,
similares aos dos desenhos das crianças europeias, era necessária uma dose
adicional de artificialidade e pedir-lhes explicitamente que realizassem uma
nova atividade para a qual não tinham conhecimento prévio, tal como as
crianças.
33. Por
isso, Franz Boas fez o seguinte comentário:
34.
Quando
ao homem primitivo é dado um lápis e papel e se pede a ele para desenhar um
objeto na natureza, ele tem que usar ferramentas desconhecidas e uma técnica
que nunca tentou. Ele deve romper com seus métodos comuns de trabalho e
resolver um novo problema. O resultado não pode ser uma obra de arte - exceto
talvez em circunstâncias muito incomuns. Assim como a criança, o aspirante a
artista é confrontado com uma tarefa para a qual carece de preparação técnica,
e muitas das dificuldades que afligem a criança também o assediam. Daí a
aparente semelhança entre os desenhos infantis e os do homem primitivo. As tentativas
de ambos são feitas em situações semelhantes.[32]
35. Karl
von den Steinen estava
plenamente ciente disso; foi precisamente a natureza experimental da situação
que o interessou e que lhe permitiu formular uma teoria da origem da figuração
baseada não na arte tradicional dos nativos americanos, mas na comparação de
duas práticas amadoras, a dos nativos americanos e a das crianças.
36. Von den Steinem indicou que os
nativos americanos, como as crianças, preferiam desenhar animais e seres
humanos em vez de plantas e do ambiente em geral, que era sistematicamente
omitido. Ele notou que todos os desenhos convergiam para formas típicas,
fundamentalmente incompletas e quase geométricas; algumas linhas simples em
torno de uma silhueta. Desse ponto de vista, a semelhança entre os
homens-palitos ("girinos" ou não) das crianças e dos nativos
americanos era impressionante. Essas imagens típicas excluíam toda
singularidade e todos os acidentes. Elas sempre apareciam do mesmo ponto de
vista: humanos eram desenhados de frente e animais de perfil (ou vistos de
cima).
37. Enquanto
as diferenças entre as espécies animais eram fáceis de configurar a partir de
um perfil, as diferenças entre os humanos eram mais difíceis de caracterizar. É
por isso que os nativos americanos - como as crianças - completavam os
contornos humanos típicos com atributos que também eram altamente estilizados:
atributos relacionados ao gênero (órgãos genitais, comprimento do cabelo,
roupas) e atributos sociais mais gerais, como bigode, barba, chapéu, cachimbo, etc., que caracterizavam, respectivamente, os
adultos para as crianças e os europeus para os nativos americanos (que
desenvolveram uma verdadeira repulsa cultural pelos cabelos do corpo).
38. A
composição dessas formas típicas também aderia a princípios recorrentes. Os
desenhos reproduziam partes normalmente invisíveis (por exemplo, o umbigo, os
genitais e até mesmo o ânus de Karl von den Steinen), gerando fenômenos de transparência (por isso
vemos as duas pernas de um cavaleiro sobre um cavalo de perfil [Figura 14]). As
proporções naturais não eram respeitadas: por exemplo, o líder da expedição ao
Xingu era representado maior do que seu tenente, refletindo a realidade
hierárquica e não física. Mais estranhamente, o bigode dos europeus às vezes
era desenhado na vertical e às vezes colocado na testa. Eu entendo isso como um
problema de comunicação (talvez os índios quisessem indicar sombrancelhas)
ou, segundo von den Steinen,
como uma maneira de destacar um atributo em particular.
39. Karl
von den Steinen explicou
essas semelhanças entre os desenhos de crianças e dos nativos americanos
amadores em termos da essência “comunicacional” da figuração. O objetivo,
argumentou ele, não era desenhar uma bela imagem, fonte de prazer estético, mas
transmitir um conceito da maneira mais eficaz possível. É por isso que apenas
uma imagem típica era selecionada entre muitas outras possíveis, pela
facilidade com que ela podia ser diferenciada de outras imagens típicas. Ela
era, portanto, não apenas a mais fácil de produzir mas
também de reconhecer, adotando o ponto de vista mais completo (perfil, face,
vista do alto), incluindo as características mais distintas (visíveis ou não do
ponto de vista escolhido) e posicionando-as da maneira mais clara e mais
saliente (ignorando, assim, as leis da perspectiva e optando por várias formas
de transparência ou redução). As figuras originárias, de crianças ou de
amadores (na Amazônia ou em outro lugar), obedeciam às leis psicológicas
aplicáveis a todas as formas de comunicação: o objetivo era ser o mais claro
possível e minimizar os esforços do transmissor e do receptor.
40. O
calcanhar de Aquiles dos argumentos de von den Steinen estava, no entanto, em seu ponto de partida, pois
considerar as crianças e os nativos americanos como livres de qualquer
influência artística era arriscado. Talvez eles fossem, no que concerne à
figuração, se tudo mais fosse igual. Por exemplo, nos homens-palitos desenhados
pelos Nahuqa [Figura 15], vemos
uma forma bastante padronizada (um busto triangular) que é encontrada em várias
gravuras tradicionais feitas de casca de árvore, que Max Schmidt ainda
encontraria no Xingu doze anos depois.
41. Assim,
os desenhos dos nativos americanos apresentavam certas tipologias estilísticas
importados de outras técnicas. Além disso, Von den Steinen lamentou não ter encontrado entre os nativos
americanos o famoso “perfil misto” que Ricci havia encontrado ao longo de seu corpus
italiano: a representação de um perfil humano com dois olhos - uma mistura
típica de dois pontos de vista distintos [Figura 16].
Hoje sabemos que esse perfil misto foi apenas uma moda passageira desapareceu
logo depois dos corpora de desenhos infantis. Daí a conclusão de que
mesmo os desenhos infantis eram sujeitos a variações e que estas precisavam ser
explicadas não apenas em relação às leis psicológicas universais (embora as
causas da referida moda e seu desaparecimento permanecem controversas até
hoje).[33]
42. Apesar
desses senões, a teoria de Karl von den Steinen foi amplamente adotada pela comunidade científica
no século XX. Todos os principais estudos sobre desenhos infantis se referiam
ao seu trabalho e, em particular, à distinção conceitual entre a figuração
esquemática destinada à comunicação e a figuração naturalista em busca da
“beleza estética.” Encontramos referências a von den Steinen nos estudos fundadores de James Sully,
na Inglaterra; de Siegfried Levinstein, na Alemanha;
de Georges Rouma, na Bélgica; e de Georges-Henri Luquet, na França.[34] Destes autores, Sully
e Rouma compreenderam as sutilezas da teoria de von den Steinen, enquanto Levinstein (sob a influência de Lamprecht)
e Luquet (sob a influência de Lévy-Bruhl) buscaram na analogia entre os desenhos das crianças
e dos nativos americanos evidências da teoria de que o desenvolvimento mental
da criança era uma recapitulação da evolução cultural das sociedades - uma
evolução que, se dizia, levava dos homens-palitos das crianças e dos selvagens
à pintura acadêmica dos adultos civilizados. Essas ideias, no entanto, estavam
ultrapassadas no momento de sua publicação. Isto fica evidente na resenha que
Georges Bataille fez, em 1930, do livro de Luquet: “hoje a comparação entre crianças e selvagens é um
clichê desgastado.”[35]
43. Em
termos mais gerais, através da disseminação das várias vanguardas artísticas do
início do século XX, tomou-se consciência de que a diferença entre desenho
comunicativo e desenho naturalista, entre a figuração do que se pensa e a do
que se vê, entre representação ideoplástica e
fisioplástica, e entre o realismo intelectual e visual (todos os quais denotavam
a mesma dicotomia), era tanto um fenômeno universal quanto uma questão de grau.
Seguindo Karl von den Steinen,
geralmente de modo declarado, Emanuel Löwy, Max Verworn, Wilhelm Wundt, Franz
Boas, Georges Bataille e Ernst Gombrich
reconheceram a importância dos desenhos das crianças. Mas cada um deles
mostrou, à sua própria maneira, que qualquer figuração era pelo menos em parte ideoplástica e que a arte que buscava criar a ilusão da
realidade era simplesmente uma exceção, um caso limítrofe na história e na
geografia humanas dos modos de figuração.[36]
44. O
livro de Karl von den Steinen
e os desenhos dos nativos americanos do Xingu tiveram, portanto, uma influência
profunda, embora invisível, na psicologia do desenvolvimento e na história da
teoria da arte. Eles também estiveram na origem de outra tradição menos teórica
e mais prática: a partir do final do século XIX, etnólogos que estagiaram nas
terras mais baixas da América do Sul começaram a imitar seu mestre,
distribuindo folhas de papel e lápis para os nativos americanos com os quais
entraram em contato. Em ordem cronológica, e até onde sei, pode-se citar Max
Schmidt, Theodor Koch-Grünberg, Robert Lehman-Nitsche, Fritz Krause, Erland Nordenskiöld, Wilhelm Kissenberth,
Willem Ahlbrinck, Herbert Baldus,
Alfred Métraux, Ana Biró de
Stern e Claude Lévi-Strauss.
45. Muito
rapidamente, porém, o valor teórico desses desenhos amadores desapareceu;
essencialmente, o mestre tinha dito tudo. Os estudos bastante aprofundados de
Koch-Grünberg, de Lehman-Nitsche
e de Biró de Stern não foram além dos de von den Steinen.[37]
No entanto, a prática perdurou e gerou uma tradição artística singular. Muitos
etnólogos, seguindo von den Steinen,
publicaram seus próprios retratos desenhados pelos nativos americanos.[38]
Este era um modo de ser visto como parte de uma corrente intelectual claramente
identificável, a dos etnógrafos de campo, mais próxima de Bastian
do que da escola histórico-cultural de Viena na etnologia. Mas creio que era
também um modo de “autenticar” a estadia na Amazônia, algo como os turistas de
hoje que se fazem fotografar ao lado de um prédio histórico como se quisessem
dizer: “eu estive aqui.”
46. Max
Schmidt, um discípulo de von den Steinen,
foi, até onde sei, o primeiro a publicar quatro de seus retratos [Figura 17].
Eles foram desenhados pelos Bakairi quando Schmidt estava em sua expedição ao
Xingu em 1900.[39]
47. Theodor
Koch-Grünberg, também discípulo de von den Steinen, publicou seus
retratos em 1905, em uma excepcional coleção de desenhos de nativos americanos
- Ipuriná, Bakairí, Baníwa, Baré, Káua, Siusí, Uanána, Tukáno, Tuyúka, Kobéua, Umáua - coletados durante
duas expedições, a primeira em 1900 no Xingu, sob a liderança de Herrmann
Meyer, e a segunda entre 1903 e 1905 no noroeste da Amazônia. Seu livro Anfänge der Kunst im Urwald - um título tomado
de Ernst Grosse e também usado por Max Verworn - contém nada menos que onze retratos de seu autor
[Figura 18, Figura 19, Figura 20, Figura 21, Figura 22, Figura 23, Figura 24, Figura 25, Figura 26, Figura 27 e Figura 28].[40]
48. Vinte
anos depois, quando Koch-Grünberg publicou os
resultados de uma nova expedição realizada em 1911 no norte do Brasil e no sul
da Venezuela, ele incluiu apenas um retrato seu [Figura 29].
Isso pode ser visto como evidência de que o costume estava caindo em desuso.[41]
49. No
relato de sua expedição de 1908 entre os Karajá, Fritz Krause publicou três de
seus retratos [Figura 30, Figura 31
e
Figura 32].[42]
No primeiro ele aparece com um chapéu de palha e no terceiro é estranhamente
retratado com um tronco.
50. O
sueco Erland Nordenskiöld,
amigo íntimo de von den Steinen,
publicou um retrato minimalista que não mostrava nada além de seus óculos - uma
metonímia para o etnólogo [Figura 33]. O
desenho foi feito em 1908 no Chaco por uma jovem garota Choroti
chamada Ashlisi.[43]
51. Herbert
Baldus publicou dois de seus retratos. O primeiro foi
desenhado em 1928 por Belige, um jovem Chamacoco [Figura 34]. O
segundo, publicado posteriormente, foi obtido em 1935 entre os Tapirapé [Figura 35].[44]
52. O
etnólogo suíço Alfred Métraux, que provavelmente
seguiu o exemplo de Nordenskiöld e não o de von den Steinen, publicou um retrato
desenhado em 1929 por Consito, um chiriguano
de doze anos de idade [Figura 36].
Este é o único “perfil misto" do meu corpus. Métraux
descreveu-o da seguinte forma:
53.
O autor
dessas linhas, como visto por Consito. Seu chapéu de
abas largas é transformado em um boné de marinheiro dos EUA e seus óculos, que
obviamente impressionaram os índios, são mostrados de frente, embora o autor
seja desenhado de perfil, com a cabeça inclinada para trás. As partes
enegrecidas representam seu terno.
54. Métraux, um
amigo íntimo de Georges Bataille, também reproduziu o
excerto de Primitive Art
de Franz Boas que citei acima. Ele conclui esta galeria de retratos com uma
nota bastante desiludida:
55.
Na minha opinião, o
valor científico de tais desenhos é baixo e atesta apenas uma coisa: as
dificuldades que os índios têm em reproduzir objetos naturais com meios que não
lhes são familiares.[45]
56. A
tradição havia terminado. No entanto, ela não escapou ao olhar malicioso e
crítico de Julius Lips.[46]
Esse etnólogo alemão, forçado pelo regime nazista a se demitir por causa de sua
filiação ao Partido Social-Democrata, exilou-se com sua esposa nos EUA. Lá, ele
publicou um livro polêmico, The Savage Hits Back
(1937), no qual procurava reconstruir o ponto de vista dos “selvagens” sobre os
“brancos.” Embora o seu ângulo de abordagem fosse novo, a sua argumentação era,
infelizmente, sistematicamente tendenciosa. Lips via
todas as representações dos brancos como caricaturas ferozes, “retaliações”
contra o colonizador - o que às vezes era verdade, mas na maioria das vezes
falso. Lips desconsiderou toda a contextualização,
frequentemente elaborando interpretações completamente fantasiosas. A
verdadeira questão que sustentava o livro era, na verdade, o ódio que Lips nutria nazista alemão branco.
57. As
representações de Karl von den Steinen,
Theodor Koch-Grünberg e Fritz Krause foram, portanto,
o foco de sua atenção e ele foi particularmente irônico com relação a um
retrato do Krause (o primeiro que reproduzi, na Figura 30):
58.
O
explorador saxão, Krause, deve ter parecido ridículo até mesmo para os índios,
a julgar pelo seu retrato do Araguaia [na verdade, dos Karajá]. O que fez esses
índios representá-lo como um anfíbio (note as mãos e os pés) não está claro,
nem se eles pretenderam representa-lo om um capacete
de safari ou com enormes orelhas de burro, ansiosas para captar cada pedacinho
de fofoca.
59. O
leitor deve ter imaginado que nesse meio tempo Krause se tornou um membro
entusiasta do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães.
60. Podemos,
no entanto, como Lips, ver todos esses retratos de
etnólogos como caricaturas irônicas? Há pelo menos um caso em que isso era
definitivamente verdade: foi quando Ualí, um Kobéua, representou Koch-Grünberg
na forma de um demônio com um falo gigante [Figura 37]. A
esse respeito, Koch-Grünberg relata:[47]
61.
O
artista nos caricaturou abertamente, nós, os dois europeus, em dois desenhos
deliciosos. O demônio Popáli possui um cavanhaque e
um grande bigode; o demônio Makátxikö apenas uma
barba pequena, já que [Otto] Schmidt não tinha bigode. Vendo esses desenhos,
todos os Kobéua imediatamente entenderam a piada e
começaram a rir.[48]
62. Os
nativos americanos devem, de fato, ter ridicularizado seus etnólogos mais ou
menos abertamente muitas vezes. Parece-me que a representação do ânus de Karl
von den Steinen é um
exemplo bastante explícito disso. Suas primeiras figurações dos brancos eram,
portanto, às vezes caricaturas, e o fenômeno era definido de forma mais ampla
no contexto das piadas que acompanhavam a aclimatação dos brancos na paisagem
mental ameríndia.[49]
63. Note-se,
no entanto, que os atributos estilizados que singularizavam os europeus parecem
ter se tornado surpreendentemente padronizados ao longo dos anos: bigodes,
barbas e cavanhaques, chapéus, cachimbos, roupas, sapatos, óculos, até livros e
lápis. Segundo Pierre Centlivres, os nativos
americanos “integraram o colonizador em seu mundo artístico e simbólico.”[50]
E o que eles fizeram de forma ainda desajeitada com papel e lápis, eles
desenvolveram muito mais profundamente, com os mesmos ingredientes, usando seus
próprios meios de expressão.[51] Suas mitologias logo incluíram os
brancos em relatos das origens da humanidade, roupas, objetos metálicos e
livros, enquanto visões rituais permitiram aos xamãs e profetas explorar um
novo horizonte habitado por brancos que lhes ensinaram o conhecimento contido
nos livros.[52] A galeria de retratos de etnólogos aqui
apresentada deve, portanto, ser considerada apenas como um esboço das
concepções em formação dos ameríndios sobre os brancos e seu mundo econômico,
intelectual e político.
Traduzido do inglês por Arthur Valle
______________________________
* Artigo
originalmente publicado como: DÉLÉAGE, Pierre. The origin of art according to Karl
von den Steinen. The Journal of Art Historiography,
n. 12, jun. 2015.
** Laboratoire d’anthropologie
sociale, Collège de France, Paris. Site: http://las.ehess.fr/index.php?2347
[1] LÉVI-STRAUSS, Claude. Tristes Tropiques. Paris: Gallimard, Bibliothèque de la Pléiade, 1955,
p.296.
[2] Para um estudo muito
útil dos debates sobre a origem da arte na Alemanha do final do século XIX e
início do XX, ver: JAHODA, Gustav. Dessins primitifs, dessins d’enfants et la question de l’évolution. Gradhiva, 10,
1991. Para uma visão geral da vertente africanista da corrente intelectual
discutida neste artigo, ver: JAHODA, Gustav. Erich
Franke on Culture and Cognitive Development: a
Forgotten Pioneer. Psychologie und Geschichte, 7: 4, 1997. Ver também:
MACK, John. Drawing Degree Zero: the Indigenous
Encounter with Pencil and Paper. World Art, 2: 1, 2012.
[3] CREVAUX, Jules. De
Cayenne aux Andes. Le tour du monde, 40, 1880, p.76-77. A propósito, 130 anos
depois, os tradicionais motivos kusiwa dos Wayãpi foram incluídos como parte do patrimônio cultural
imaterial da UNESCO.
[4] VON DEN STEINEN, Karl.
Durch Central-Brasilien.
Expedition zur
Erforschung des Schingú im Jahre
1884.
Leipzig: F. A. Brockhaus, 1886; Tradução em
português: O Brasil central : expedição em 1884
para a exploração do rio Xingú. São Paulo: Companhia Editora Nacional,
1942, p.249-256. A principal referência sobre os etnólogos alemães na Amazônia
é: KRAUS, Michael. Bildungsbürger im Urwald. Die Deutsche Ethnologische Amazonienforschung,
1884-1929. Marburg: Reihe
Curupira Band 19, Förderverein Völkerkunde
in Marburg, 2004.
[5] ANDREE, Richard, Das Zeichnen bei den Naturvoelkern. Mitteilungen der Anthropologischen
Gesellschaft in Wien, 17, 1887. Para uma boa
síntese sobre os primórdios da antropologia alemã, ver: GINGICH, Andre. “The German-Speaking
Countries”, One Discipline, Four Ways: British, German, French, and American
Anthropology. Chicago: University of Chicago Press, 2005.
[6] VON DEN STEINEN, Karl.
Unter den Naturvölkern
Zentral-Brasiliens. Reiseschilderung und
Ergebnisse der Zweiten Schingú-Expedition, 1887-1888. Berlin: Diertrich Reimer, 2004; Tradução
em português: Entre os aborígenes do Brasil central. São Paulo:
Companhia Editora Nacional, 1940, capítulo 10.
[7] EHRENREICH, Paul. Mittheilungen über die Zweite Xingu-Expedition in Brasilien. Zeitschrift für Ethnologie, 22, 1890,
p.89. (Cito uma tradução encontrada no livro de Ernst Grosse);
GROSSE, Ernst. Die Anfänge
der Kunst. Freiburg: J.C.B. Mohr, 1894; Tradução
em inglês: The Beginnings
of Art. New
York: D. Appleton, 1897, p.119-20. (“Nós nunca nos
incomodamos em perguntar aos nativos o significado de seus desenhos,” continua
a citação de Ehrenreich). On
Ernst Grosse, ver: VAN DAMME, Wilfried. Ernst Grosse
and the Birth of the Anthropology of Aesthetics. Anthropos, 107: 2,
2012.
[8] EHRENREICH, Paul. Beiträge zur Völkerkunde
Brasiliens. Berlin: W. Spemann, 1891, p.24-26.
[9] Para uma introdução
parcial às teorias sobre a origem dos ornamentos, ver: GERBRANDS, Adrian
Alexander. Art as an Element of Culture, Especially in
Negro-Africa. Leiden: Brill, 1957, p.26-52.
[10] SEMPER, Gottfried. The
Four Elements of Architecture and Other Writings. Cambridge: Cambridge
University Press, 1989.
[11] STOLPE, Hjalmar. De l’art ornementaire des peuples américains. Congrès international des américanistes,
Compte-rendu de la cinquième
session, Copenhague, 1884, p.320-323; STOLPE,
Hjalmar. Collected Essays in Ornamental Art. Stockholm: Aftonbladets tryckeri, 1927.
[12] COLLEY-MARCH, Henry.
Polynesian Ornament: a Mythography or a Symbolism of
Origin and Descent. The Journal of the Anthropological Institute of Great
Britain and Ireland, 22, 1893; COLLEY-MARCH, Henry. Evolution and
Psychology in Art. Mind, 5: 20, 1896; READ, Charles H..
On the Origin and Sacred Character of Certain Ornaments of the S. E. Pacific. The
Journal of the Anthropological Institute of Great Britain and Ireland, 21,
1892; BALFOUR, Henry. The Evolution of Decorative Art. New York:
Rivington, Percival & Co., 1893; HADDON, Alfred C..
Evolution in Art as Illustrated by the Life-Histories of Designs.
London: W. Scott, 1895.
[13] HOLMES, William H.. On the Evolution of Ornament - An American Lesson. American
Anthropologist, 3: 2, 1890; HOLMES, William H..
Decorative Art of the Aborigines of Northern America. Boas Anniversary
Volume. Anthropological Papers written in honor of
Franz Boas, New York: G.E. Stechert & Co.,
1906 (este artigo posterior
relata a crítica da escola
de Boas); MELTZER, Dunnell; DAVID J. and Robert C.
(eds.). The Archaeology of William Henry Holmes. Washington D.C.,
Smithsonian Institution Press, 1992.
[14] VON DEN STEINEN, Unter
den Naturvölkern;
Tradução em português: Entre os aborígenes, p.341.
[15] GROSSE, Die Anfänge; Tradução em inglês: The Beginning of
Arts, p.118-119.
[16] SCHMIDT, Max. Indianerstudien in Zentralbrasilien:
Erlebnisse und Ethnologische
Ergebnisse einer Reise in den Jahren 1900 bis 1901. Berlin: Dietrich Reimer, 1905; Tradução em português: Estudos de
etnologia brasileira: peripécias de uma viagem entre 1900 e 1901. São
Paulo: Companhia Editora Nacional, 1942, capítulo 15. Sobre a teoria dos
ornamentos de Max Schmidt, ver: RIBEIRO, Berta G.. Os
padrões ornamentais de traçado e a arte decorativa dos Indios
do Alto Xingu. In: COELHO, Vera Penteado (ed.). Karl von den
Steinen: um século de antropologia no Xingu. São
Paulo: EDUSP, FADESP, 1993.
[17] VON DEN STEINEN, Karl. Die
Marquesaner und ihre Kunst: Studien
über die Entwicklung primitiver Südseeornamentik nach eigenen Reiseergebnissen
und dem Material der Museen. Berlin: Reimer, 1925-1928; Tradução em francês: VON DEN STEINEN,
Karl. Les Marquisiens
et leur art.
L’ornementation primitive des mers du sud.
Volume 1: Tatouage.
Papeete: Musée de Tahiti et des îles,
2005, p.131.
[18] VON DEN STEINEN, Karl.
Dr. Max Schmidt: Indianerstudien
in Centralbrasilien. Zeitschrift
für Ethnologie, 1: 2, 1906.
[19] KRAUSE, Fritz. Die
Kunst der Karaja-Indianer (Staat
Goyaz, Brasilien). Baessler-Archiv, 2, 1912; Tradução
em inglês: The Art of the Caraja Indians (Goiás State,
Brazil). Human Relations Area Files, 1965.
[20] JONAITIS, Aldona (ed.). A Wealth of Thought. Franz Boas on Native
American Art. Seattle: University of Washington Press, 1995.
[21] THORENSEN, Timoty. Art, Evolution and History: A Case Study of
Paradigm Change in Anthropology. Journal of the History of Behavioral Sciences, 13, 1977; JACKNIS, Ira. The First
Boasian: Alfred Kroeber and Franz Boas, 1896-1905. American Anthropologist,
104: 2, 2002.
[22] BO AS, Franz. The Decorative Art of the Indians of the North Pacific
Coast. Science, 4: 82, 1896; BOAS, Franz. Facial Paintings of the
Indians of Northern British Columbia. Memoirs of the American Museum of
Natural History, 1898, vol. 2, Anthropology, vol. 1; DIXON, Roland B.. Basketry Designs of the Maidu Indians of California. American
Anthropologist, 2: 2, 1900; FARRAND, Livingston, Basketry Designs of the
Salish Indians. Memoirs of the American Museum of Natural History, 1900,
vol. 2, Anthropology, vol. 1; KROEBER, Alfred L..
Symbolism of the Arapaho Indians. Bulletin of the American Museum of Natural
History, 13, 1900; KROEBER, Alfred L.. Decorative
Symbolism of the Arapaho. American Anthropologist, 3: 2, 1901; DIXON,
Roland B.. Basketry Designs of the Indians of Northern
California. Bulletin of the American Museum of Natural History, 17,
1902; KROEBER, Alfred L.. The Arapaho. Bulletin of
the American Museum of Natural History, 18, 1902; BOAS, Franz. The Decorative
Art of the North American Indians. Popular Science Monthly, 63, 1903 (uma
análise detalhada mostra que este artigo é uma longa e implícita crítica das
ideias de Stolpe); LUMHOTLZ, Carl. Decorative Art of the Huichol Indians. Memoirs of the American Museum
of Natural History, 1904, vol. 3, Anthropology, vol. 2; WISSLER, Clark.
Decorative Art of the Sioux Indians. Bulletin of the American Museum of
Natural History, 18: 3, 1904; BARRETT, Samuel A..
Basket Designs of the Pomo Indians. American Anthropologist, 7: 4, 1905;
WISSLER, Clark. A Psycho-Physical Element in Primitive Art. Boas Anniversary
Volume. Anthropological Papers written in honor of
Franz Boas. New York: G.E. Stechert & Co.,
1906; BOAS, Franz. Decorative Designs of Alaskan Needlecases.
Proceedings of the United States Natural Museum, 34, 1908 (também uma crítica
implícita das ideias de Stolpe); LAUFER, Berthold. A Theory of the Origin of
Chinese Writing. American Anthropologist,
9: 3, 1907 (uma aplicação singular da teoria dos ornamentos da escola de Boas à
questão da origem da escrita); KROEBER, Alfred L.. Ethnology of the Gros Ventre. Anthropological
Papers of the American Museum of Natural History, 1: 4, 1908; BARRETT,
Samuel A.. Pomo Indian Basketry. University of
California Publications in American Archaeology and Ethnology, 7, 1908;
LOWIE, Robert. The Assiniboine. Anthropological Papers of the American
Museum of Natural History, 4: 1, 1909; KROEBER, Alfred L..
California Basketry and the Pomo. American Anthropologist, 11: 2, 1909;
BOAS, Franz. Review: A Study of Chiriquian
Antiquities by George Grant MacCurdy. Science,
34: 875, 1911; BOAS, Franz. Representative Art of Primitive People. Holmes
Anniversary Volume, Anthropological Essays presented to William Henry Holmes.
Washington D.C.: J.W. Bryan Press, 1916; LOWIE, Robert H..
Crow Indian Art. Anthropological Papers of the American Museum of Natural
History, 21: 4, 1922; BOAS, Franz. Primitive Art. Oslo: H. Aschehoug, 1927; LOWIE, Robert H. Review: Collected Essays
in Ornamental Art by Hjalmar Stolpe. American Anthropologist, 32: 2, 1930.
[23] A segunda escola de
Franz Boas (Herman K. Haeberlin, Lila M. O’Neal, Ruth
L. Bunzel, Gladys Reichard
e Anita Brenner) concentrou-se no aprendizado de técnicas e no virtuosismo
individual e eminentemente variável dos artistas. Ver:
JACKNIS, Ira, The Artist Himself. The Salish Basketry Monograph and the
Beginnings of a Boasian Paradigm. BERLO, Janet (ed.) The Early Years of
Native American Art History: Politics of Scholarship and Collecting.
Seattle: University of Washington Press, 1992.
[24] MOONEY, James.
Reviewed Work: The Arapaho by Alfred L. Kroeber. American Anthropologist,
5: 1, 1903.
[25] MOONEY, James. The Ghost-Dance
Religion and the Sioux Outbreak of 1890. Fourteenth Annual Report of the
Bureau of Ethnology, 1896; MOONEY, James. Calendar History of the Kiowa
Indians. Seventeenth Annual Report of the Bureau of American Ethnology,
1898; HOFFMAN, Walter J.. The Mide'wiwin
or Grand Medicine Society of the Ojibwa. Seventh Annual Report of the Bureau
of Ethnology, 1891; MALLERY, Garrick. Picture-Writing of the American
Indians. Tenth Annual Report of the Bureau of Ethnology, 1893.
[26] MOSES, Lester G.. The Indian Man: a Biography
of James Mooney. Lincoln:
University of Nebraska
Press, 1984.
[27] É por isso que demorou
tanto tempo para o Walam Olum,
um longo texto escrito, ser exposto como um falso; cf. Oestreicher,
David M.. The Anatomy of
the Walam Olum. The
Dissection of a 19th Century Anthropological Hoax.
Ph.D. Dissertation, Rutgers University, 1995.
[28] BARRETT, Samuel A.. Pomo Indian Basketry. Berkeley: Phoebe Hearst
Museum of Anthropology, 1996.
[29] Eu explorei em outros
lugares o fenômeno e sua possível explicação: DÉLÉAGE, Pierre Les répertoires graphiques amazoniens. Journal de
la Société des Américanistes,
93: 1, 2007; DÉLÉAGE, Pierre. La croix yekuana. Images re-vues, 4, 2007.
[30] VON DEN STEINEN, Unter
den Naturvölkern;
Tradução em português: Entre os aborígenes, 300.
[31] RICCI, Corrado. L’arte dei bambini. Bologna: Nicola Zanichelli, 1887. Tradução em inglês:
The Art of Little Children. Pedagogical Seminary, 3: 2, 1895, p.304.
[32] BOAS, Primitive Art,
p.65.
[33] Sobre o desaparecimento
de perfis mistos nos corpora de desenhos das crianças: Baldy, René. Dessine-moi un bonhomme. Universaux
et variantes culturelles. Gradhiva,
9, 2009, p.140-141. Mais geralmente, sobre a história do interesse em desenhos
de crianças: BOISSEL, Jessica. Quand les enfants se mirent à dessiner. 1880-1914: un fragment de l’histoire des idées. Les
cahiers du Musée national d’art moderne, 31, 1990; Emmanuel Pernoud,
L'invention du dessin d'enfant en France. Paris: Hazan, 2003; KELLY, Donna Darling. Uncovering the History of
Children's Drawing and Art. Westport: Praeger, 2004.
[34] SULLY, James. Studies in Childhood, London: Longmans, Freen & Co., 1894; LEVINSTEIN, Siegfried. Untersuchungen über das
Zeichnen der Kinder bis zum
14, Leipzig: R. Doigtländers Verlag, 1904;
HADDON, Alfred C.. Drawings by Natives of British New
Guinea. Man, 4, 1904; LAMPRECHT, Karl. De l’étude
comparée des dessins d’enfants.
Revue de synthèse historique,
11: 1 / 31, 1905; BUSCHAN, Georg. Primitive Zeichnungen
von Kindern und von Wilden. Die
Umschau, 24, 9 June 1906;
RÉJA, Marcel (Paul Meunier). L'Art chez les fous. Le dessin, la prose, la poésie, Paris: Mercure de France, 1907, capítulo 2;
ROUMA, Georges. Le langage
graphique de l’enfant. Bruxelles: Misch & Thron,
1913; LUQUET, Georges-Henri. L’art primitive. Paris: G. Doin, 1930.
[35] BATAILLE, Georges. L’art primitive. Documents, 2e année, 7,
1930; esta é uma resenha do livro de Georges-Henri Luquet.
[36] LÖWY, Emanuel. Die Naturwiedergabe in der Alteren Griechischen Kunst. Rom: Verlag von Loescher,
1900; Tradução em inglês: The Rendering of Nature in Early Greek Art.
London: Duckworth & Co., 1907 (Sobre a fortuna crítica de Löwy: DONOHUE, Alice A., New Looks at Old Books: Emanuel Löwy, Die Naturwiedergabe in
der Alteren Griechischen
Kunst. Journal of Art Historiography, 5, 2011); VERWORN, Max. Zur Psychologie der Primitiven Kunst. Jena: Gustav Fischer, 1908; BOAS, Primitive
Art; BATAILLE, L’art primitif;
Gombrich, Ernst. L’art
et l’illusion. Psychologie
de la représentation picturale.
Paris: Gallimard, 1971.
[37] KOCH-GRÜNBERG,
Theodor. Anfänge der Kunst im Urwald. Indianer-Handzeichnungen auf
seinen Reisen in Brasilien Gesammelt. Berlin: Ernst Wasmuth, 1905; Tradução em português: Começos da arte na
selva: desenhos manuais de indígenas colecionados por Dr. Theodor Koch-Grünberg em suas viagens pelo Brasil. Manaus: EDUA,
FSDB, 2009 (Gostaria de agradecer a Michael Kraus por
me enviar uma cópia desta tradução); LEHMAN-NITSCHE, Robert. Dibujos primitives. Extension
universitaria, Universidad nacional de La Plata, 1909; STERN, Ana Biró de. Manifestações graficas dos primitivos
e das crianças. Revista do Arquivo Municipal, 60, 1939. Gostaria de
agradecer a Diego Villar pelas duas últimas referências.
[38] KRAUS, Michael. Comienzos
del arte en la selva: Reflexiones etnológicas sobre el arte indígena a
principios del siglo 20. Bulletin de la
Société suisse des Américanistes,
64-65, 2000/01.
[39] SCHMIDT, Max, Indianerstudien in Zentralbrasilien:
Erlebnisse und Ethnologische Ergebnisse einer Reise in den Jahren 1900 bis 1901. Berlin: Dietrich Reimer,
1905; Tradução em português: Estudos de etnologia brasileira: peripécias de
uma viagem entre 1900 e 1901. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1942,
capítulo 15.
[40] KOCH-GRÜNBERG, Anfänge der Kunst;
Tradução em português: Começos da arte; KOCH-GRÜNBERG, Theodor. Die
Xingu-Expedition (1898-1900). Ein Forschungstagebuch.
Köln & Weimar: Bölhau Verlag, 2004, p.279-285 (Estas notas de campo de Koch-Grünberg, editadas por Michael Kraus,
contêm cópias dos desenhos originais de Baikirí,
incluindo os retratos do etnólogo); KOCH-GRÜNBERG, Theodor. Zwei
Jahre unter den Indianern: Reisen in Nordwest-Brasilien
1903-1905. Stuttgart: Strecker & Schröder,
1909; Portuguese translation:
Dois anos entre os índios. Viagens no noroeste do Brasil, 1903-1905.
Manaus: EDUA, FSDB, 2005, p.148, p.470, p.494-495.
[41] KOCH-GRÜNBERG, Theodor.
Vom Roroima zum Orinoco: Ergebnisse
einer Reise in Nordbrasilien und Venezuela in den Jahren 1911-1913. Stuttgart:
Strecker & Schröder, 1923, volume 3, p.136 e
prancha 29; Tradução em espanhol: Del Roraima al Orinoco. Caracas: Ediciones del Banco Central de
Venezuela, 1982. Foi deste livro que Mário de Andrade tirou a ideia do seu
romance Macunaíma.
[42] KRAUSE, Fritz. Die
Kunst der Karaja-Indianer (Staat
Goyaz, Brasilien). Baessler-Archiv, 2, 1912, prancha
6; Tradução em inglês: The Art of the Caraja
Indians (Goiás State, Brazil). Human Relations
Area Files, 1965.
[43] Nordenskiöld, Erland. Indianlif i El Gran Chaco, Syd-Amerika. Stockholm: Albert Bonniers, 1910; Tradução em francês: La vie des Indiens dans le Chaco, Amérique
du Sud, Paris: Delagrave, 1912, p.110-117.
[44] BALDUS, Herbert. Tapirapé: Tribo tupí no Brasil Central. São Paulo: Companhia Editora Nacional,
1970, p.420.
[45] MÉTRAUX, Alfred. Étude sur la
civilisation des indiens Chiriguano. Revista del Instituto de etnología de la Universidad nacional de
Tucumán, 1: 3, 1930, p.476-480. Sobre as relações entre Nordenskiöld
e Métraux, ver: BOSSERT, Federico; VILLAR, Diego. La etnología chiriguano de Alfred Métraux. Journal de la société des américanistes,
93: 1, 2007.
[46] LIPS, Julius. The
Savage Hits Back. New Haven: Yale University
Press, 1937, p.211-213.
[47] KRAUS, Michael.
Comienzos del arte en la selva: Reflexiones etnológicas sobre el arte indígena
a principios del siglo 20. Bulletin de la
Société suisse des Américanistes, 64-65, 2000/01, p.184.
[48] KOCH-GRÜNBERG, Zwei Jahre; Tradução em
português: Dois anos, p.148, p.470, p.494-495.
[49] MONOD-BECQUELIN,
Aurore. La parole des Blancs nous fait rire: ethnographie de la citation. L’Homme,
106-107, 1988; BASSO, Keith. Portraits of the Whitemen.
Linguistic Play and Cultural Symbols among the Western Apache. Cambridge:
Cambridge University Press, 1979.
[50] Centlivres,
Pierre. Julius Lips et la riposte du sauvage. L’homme blanc à travers le regard
indigene. Terrain, 28, 1997; ver também: MENUT, Nicolas. L’Homme
blanc. Les représentations
de l’Occidental dans les arts non européens.
Paris: Éditions du Chêne, 2010, p.19.
[51] Na iconografia indígena
mais tradicional, os chapéus e sapatos aparecem como os atributos mais típicos
dos brancos, como, por exemplo entre os Kuna (SEVERI,
Carlo. Cosmology, Crisis and Paradox: On the image of White
Spirits in Kuna Shamanistic Tradition. In: ROTH, Michael S.; SALAS, Charles G.
(ed.). Disturbing Remains. Los Angeles: Getty Institute,
2001), os Otomí (SANDSTROM, Alan R.; SANDSTROM,
Pamela Effrein. Traditional
Papermaking and Paper Cult Figures of Mexico.
Norman: University of Oklahoma Press, 1986, p.295; GALINIER, Jacques. La complainte du Maître à tête de Vieux. In: MONOD-BECQUELIN,
Aurore; MOLINIÉ, Antoinette (ed.) Mémoire
de la tradition. Nanterre: Société d’ethnologie,
1993) and os Lakota (GREENE, Candace S., THORNTON,
Russell, (ed.). The Year the Stars Fell: Lakota Winter Counts at the Smithsonian.
Washington: Smithsonian National Museum, 2007, p.337).
[52] Ver: DÉLÉAGE, Pierre. Lettres mortes. Essai d’anthropologie inversée. Paris: Fayard,
2017.