O estudo dos estados da alma durante a formação do pintor na Academia Imperial das Belas Artes
Reginaldo da Rocha Leite *
LEITE, Reginaldo da Rocha. O estudo dos estados da alma durante a formação do pintor na Academia Imperial das Belas Artes. 19&20, Rio de Janeiro, v. V, n. 4, out./dez. 2010. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/ensino_artistico/alma_rrl.htm>.
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Os estudos dos gestos na figura humana e, por conseguinte, dos estados da alma foram fundamentais para a assimilação da retórica visual e dos tipos ideais de representação durante a formação artística oitocentista no Brasil. Este artigo equaciona um raciocínio circunstanciado nesse pensamento, tendo como estudos de caso os exercícios pictóricos produzidos por alunos da Academia Imperial das Belas Artes do Rio de Janeiro e localizados, atualmente, no Museu D. João VI/EBA/UFRJ.
Nos últimos anos de vida, Rafael pinta a Transfiguração [Figura 1], em 1517, morrendo pouco tempo depois, em 1520. Na obra, da qual a Academia Imperial possuía uma cópia com autoria ignorada, vemos uma arquitetura formada por corpos, por personagens em planos delimitados. No primeiro plano há a exaltação e movimentação cênica dos presentes. No segundo, Tiago, João e Pedro na interlocução com Jesus, numa área intermediária entre Elias e Moisés, com Cristo ao centro pairando no ar. Os dois planos representados apresentam com clareza a ideia de dois espaços cênicos: o terrenal e o espiritual externando uma atmosfera fantástica e de sublimação. Dessa maneira o pintor, ao estruturar a composição, liga dois universos conjuntos numa mesma tela.
O assunto explorado no quadro versa sobre o momento da Transfiguração de Cristo que foi relatada por três dos quatro Evangelistas: Mateus 17:19, Marcos 9:2-13 e Lucas 9:28-36[1]. O mais impressionante na obra, além da relação entre os planos e os diferentes mundos, é a coerência da síntese da cena. Rafael segue os Evangelhos bíblicos dosando os movimentos, as posturas cênicas das personagens envolvidas e também o pathos fisionômico do menino enfermo, os olhos arregalados e o expressionismo corporal causado pelas convulsões. O gesto como forma de linguagem é instaurado na composição como recurso fundamental ao episódio; os homens apontando diretamente ao menino, os olhos que se voltam para a dramaticidade do acontecimento e a ação da mulher que levanta os braços mostrando o achacado para que alguém pudesse curá-lo.
Numa primeira observação, “uma descrição que fosse puramente formal não poderia sequer empregar expressões como ‘pedra’, ‘homem’ ou ‘rochas’, mas deveria se limitar fundamentalmente a descrever as cores como elementos formadores completamente destituídos de sentido e inclusive espacialmente ambíguos, cores que contrastam entre si com nuanças variadas e que, no melhor dos casos, se agrupam conjuntamente em complexos formais quase ornamentais ou quase tectônicos.”[2]. Se denominássemos o plano escuro na área superior do quadro como um céu noturno ou a indescritível luminosidade no alto da obra identificando um corpo humano em seu centro, e ulteriormente se designássemos este corpo masculino como o de Jesus Cristo estaríamos indo além de um olhar restritivamente formalista no âmbito da linha e da cor[3].
A iconografia “trata do conteúdo temático ou significado das obras de arte, enquanto algo de diferente da sua forma.”[4] Ao designar o elemento localizado em meio ao clarão que se abre no trabalho como um indivíduo que paira no ar, estaremos afastando-nos da seara do que Panofsky classifica como os motivos artísticos ou meramente o estilo da pintura, pelo menos entendendo sua definição a partir da explicitada por Wölfflin[5], ou, mais conveniente ao nosso estudo, como história das configurações. No entanto, se nomeamos esse indivíduo que paira no ar como Jesus Cristo, teremos invadido o campo semântico da tela, precisando buscar o auxílio dos Evangelhos bíblicos, ou seja, na literatura. Todavia, é imprescindível, primeiramente, abordar os sentidos que caracterizam a atmosfera da cena, o objetivo e o expressivo, ambos formadores do sentido fenomênico[6].
Panofsky define o sentido objetivo como um elemento representacional característico de uma determinada temática, isto é, na crucificação de Cristo há um homem preso à cruz independente do estilo da pintura ou do período histórico cujo à imagem pertence. No caso da cópia de Rafael o sentido objetivo seria engendrado pelo homem que paira no ar, ponto alicerçante para se equacionar a Transfiguração. O teórico apresenta também o sentido expressivo, pilar da Retórica Visual. Na Transfiguração, esse sentido é identificado nos gestos, poses e pathos evidenciados pelas personagens. No entanto, mesmo com todos esses dados não nos é permitido um aprofundamento do assunto. Por que essa representação é assim? Por que é necessário um homem pairar no ar? Por que a multidão está sublevada na área inferior do quadro? Para responder a estas perguntas faz-se necessário percebermos a semântica da obra indo ao encontro da tipologia, identificada por Panofsky como história dos tipos[7]. Nesse momento, para compreendermos o quadro de Rafael, é necessário cruzar as fontes, literatura e pintura, pois, “sem determinados conhecimentos literários prévios não podemos saber o que ele apresenta do ponto de vista do sentido semântico.”[8].
Depois de toda essa digressão é preciso aqui justificar a importância desse longo processo de estudo imagético para o âmbito do ensino acadêmico brasileiro. Tudo nos leva a crer que ao confeccionar uma cópia, o aluno da Academia Imperial deve apreender as configurações e os tipos que caracterizam aquela Escola Europeia e aquela determinada temática, ou seja, a contribuição dos mestres e a resolução das problemáticas visuais que o tema exige e que, por conseguinte, consolidam-se na história da tradição. Acreditamos que o aluno precisa, ao estudar o sentido fenomênico (objetivo e expressivo), assimilar as necessidades retóricas da atmosfera temática e que para estruturar a composição como um todo, o aluno necessita legitimar a relação entre forma e tema, caracterizando assim a presença das tipologias pictóricas evidenciadas pela história dos tipos[9].
Oscar Pereira da Silva, enquanto aluno da Academia Imperial das Belas Artes, executou a reprodução da Excomunhão de Roberto, O Piedoso de Jean Paul Laurens [Figura 2], em seu período de estudos em Paris (1890 a 1896). O quadro versa sobre a maldição de Roberto, Rei da França, que esposa uma das suas sobrinhas; os esposos não são bem recebidos pelos representantes da Igreja, que os amaldiçoam por este crime. Um clima insólito e de extrema sutileza preenche o enorme vazio da composição. Roberto encontra-se sentado em seu trono no momento da saída do grupo clerical. Nenhum movimento ríspido é percebido, há, entretanto a insinuação da decepção no semblante da personagem central e a transparente tristeza da sua sobrinha evidenciada por seu contristado pranto. Para o pintor francês, a cena histórica, o clímax do acontecimento, nada disso importa. O artista dilui a tradicional estrutura compositiva de um quadro histórico, no qual o protagonista do enredo deve estar em destaque sendo posicionado ou no centro da tela ou numa área próxima ao observador de maneira altiva, imponente. Na obra de Laurens essa proposta não se consolida, pois Roberto encontra-se deslocado para o campo esquerdo, sentado, sem apresentar a excelência do brio de um monarca. Portanto, a idéia da persuasão narrativa se dá pela compreensão cênica do infortúnio, da postura do rei, do estado de ânimo externado. O recurso utilizado é o desfecho do fato, a conclusão, a Igreja pondo-se de costas ao poder oficial. A postura cênica, materializada por um sutil conjunto gestual, é suficiente para caracterizar a intensa desolação do Piedoso e, por sua vez, transparece como elemento cenográfico catalisador da cena.
Segundo Micheal Baxandall[10], encontramos no caráter gestual a pista fundamental para decifrar as pinturas e, isso não passava despercebido aos olhos observadores dos mestres europeus. Assim, era importante estudar, visualizar, conhecer profundamente a maneira com que eles interpretavam e representavam os estados da alma, traduziam visualmente os sentimentos concedendo vida a suas personagens. Essa tarefa, motivada pela AIBA só teria êxito a partir da aproximação entre aluno e mestre, processo esse consolidado pela prática da cópia.
O pensionista brasileiro Victor Meireles de Lima, durante sua estada na Itália reproduziu uma das obras de Tintoretto (1518-1594) O Milagre de São Marcos de 1548 [Figura 3], e que já era revolucionária para a época. O pintor veneziano se distingue de vários artistas contemporâneos pela carga energética empregada na tela e a sua capacidade de tornar plausível e concreto o visionário. Ele não faz pintura, produz um teatro pictórico que prima pela comunicação e pela persuasão[11]. O drama, o movimento, a encenação e o gesto são pilares da obra de Tintoretto. Um espetáculo mudo, no entanto, ensurdecedor para muitos em seus detalhes vigorosos e nas cores vibrantes, cores essas que tanto chamam atenção de Manuel de Araújo Porto-alegre, grande defensor dos coloristas da Escola Veneziana. Certamente, a cena reproduzida por Meirelles, um teatro sobre tela, foi uma das obras impulsionadoras das atmosferas estampadas em suas telas históricas oitocentistas, para isso servia a cópia; preparar o aluno não somente para a estruturação de um quadro, como também para incitar futuros artistas, alimentando-os de variegadas demonstrações de recursos para resolver e atender às necessidades e aos problemas temáticos. Assim, a cópia não enclausurava o pintor na tradição do passado, ela nutria o artista com a riqueza de informações que a tradição foi capaz de propagar, difundir e de que os museus e as igrejas da Europa se achavam abarrotados.
A excelência da representação dos gestos e das diversas manifestações do pathos no processo da cópia ou da invenção artística pelo aluno oitocentista dependia da extrema assimilação do conteúdo da disciplina Fisiologia das Paixões. Fazendo parte dos programas pedagógicos para a formação do artista já em 1831 na Reforma Lino Coutinho, a disciplina Osteologia, Miologia e Fisiologia das Paixões encontrava-se no ciclo básico de estudos não só do pintor de paisagem ou de história, era disciplina obrigatória para os cursos de arquitetura e escultura. Entretanto, com o Decreto de 20/07/1837, é criada a disciplina Anatomia e Fisiologia das Paixões que passa a substituir a já existente[12]. Ela continua vigorando durante toda a existência da Academia Imperial, mas com a implantação do Novo Estatuto para o surgimento da Escola Nacional de Belas Artes em 18/11/1890, pelo Decreto nº983[13], nova modificação na nomenclatura é percebida passando então a ser Anatomia e Fisiologia Artística. Tais disciplinas abordavam desde a construção e compreensão da anatomia humana em suas partes (ossos e músculos) até o estudo aprofundado da caracterização dos sentimentos humanos e sua identificação gestual ou fisionômica. O material didático variava partindo da observação e cópia dos modelos planos estabelecidos pela instituição (gravuras, desenhos dos professores) até manequins estruturados em escala natural apresentando os órgãos internos, ossos, músculos, veias e artérias do corpo humano.
A apavorante personificação do horror ou a incontrolável materialização da dor em seu estágio máximo, por exemplo, eram pontos estudados durante o curso de pintura da AIBA, não só por manuais que descreviam tais estados da alma[14], mas também pela visualização dos recursos gestuais, imagéticos, que os mestres europeus denotavam. O acervo da Pinacoteca tornava-se, então, uma importante fonte de consulta e pesquisa para o aprimoramento do aluno no campo da representação narrativa do sentimento por meio da imagem, consolidando assim, o enriquecimento do seu repertório semântico pela Retórica Visual.
Com o intuito de abastecer a AIBA com um acervo variado de cópias para serem usadas durante as aulas como material didático, além dos envios de pensionista, são encomendados alguns lotes de peças aos museus da Itália e da França. Além da compra[15], as cópias de telas europeias também chegavam à instituição por meio de doações de particulares ou de membros honorários, como é o caso da reprodução do quadro intitulado Danae, de autoria ignorada. Produzida com base no original do pintor Antonio Allegri, mais conhecido por Correggio, foi doada pela Baronesa de Itamby ao acervo da Academia brasileira em 24/02/1881[16].
Passamos a tela Tarquínio e Lucrécia, de autoria do aluno catarinense Victor Meirelles de Lima [Figura 4]. Essa obra é uma cópia à base do original composto por Guido Caniassi, mais conhecido por Guido Cagnacci. A cena, envolvendo personagens históricos, é composta por diagonais e um certo confronto entre luz e sombra. O assunto é dramático, entretanto o clima criado pelo pintor para materializar o episódio não o é. Lucrécia, esposa de Tarquínio Colatino, deitada com o corpo seminu sobre a cama, luta tentando defender-se de Sexto, filho de Tarquínio, o Soberbo (sétimo e último rei de Roma). A pintura trata do momento exato em que Sexto tenta violentar Lucrécia ameaçando-a com uma arma. Apesar da ausência de pathos na cena, o rosto impassível de Sexto e a delicada expressão da vítima são contrabalançados com os gestos firmes e precisos que garantem a transparência narrativa do fato. Após o acontecimento, Lucrecia se suicida motivando a revolta de seu marido (Colatino) que se une a Junio Bruto para expulsar Sexto e seu pai (o Soberbo) de Roma dando início ao processo de abolição da monarquia.
É importante lembrar que a Academia Imperial das Belas Artes possuía duas telas bastante semelhantes sobre a cena descrita. Uma, pintada por Meirelles como parte de seus envios obrigatórios durante o pensionato e outra, doada juntamente à Danae pela Baronesa de Itamby em 1881. Com a divisão do acervo da Pinacoteca em 1979 para a formação do Museu D. João VI/EBA/UFRJ uma das telas ficou no Museu Nacional de Belas Artes e a outra passou a integrar a coleção de cópias didáticas do Museu da Escola de Belas Artes. Contudo, uma questão faz-se relevante: o quadro que hoje se encontra localizado no Museu D. João VI é o envio confeccionado pelo pintor catarinense, ou será a cópia doada pela Baronesa? Essa é uma problemática de caráter bastante complexo, pois a tela doada pela baronesa foi adquirida na Itália pelo seu marido e só chegou à AIBA em 1881. A cópia confeccionada por Meirelles chegou à instituição brasileira quase trinta anos antes. Se compararmos as duas obras notaremos diferenças em suas dimensões. O quadro de Meirelles é um pouco menor que o situado no Museu Nacional de Belas Artes. Também, ao verificarmos nos Arquivos do Museu D. João VI/EBA/UFRJ documentos que pudessem iluminar tal dúvida, encontramos algumas citações de Manuel de Araújo Porto-alegre dando instruções em relação ao tipo de tela e suas dimensões ao pensionista. Portanto, a conclusão que se impõe é que o envio de Meirelles hoje está localizado no Museu D. João VI, fazendo parte da coleção de cópias didáticas da antiga Pinacoteca da AIBA. A tela pertencente ao Museu Nacional de Belas Artes é a adquirida na Itália e doada pela Baronesa de Itamby juntamente à Danae.
Na tela Sagrada Família entre os santos e São João Batista, cópia de Veronese pintada por Meirelles [Figura 5], vemos uma estrutura piramidal numa composição que se divide em níveis: os santos e São João Batista, que aparece sobre um pedestal, encontram-se no primeiro nível; a Sagrada Família eleva-se num patamar superior. A divisão hierárquica é transparente na distribuição dos grupos de personagens que compõem a obra. Maria não é somente a principal personagem por ser a Imaculada Mãe do Filho de Deus, mas forma o ápice da estrutura piramidal sendo dessa forma a figura mais evidente do quadro. Não há pathos, porém os gestos são visivelmente relevantes, direcionando as atenções para o ápice da pirâmide. Na área inferior direita da tela encontra-se a representação de São Francisco de Assis à frente da palma do martírio. Os braços abertos do franciscano e estendidos em direção a São João Batista formam uma diagonal que conduz diretamente o olhar do observador ao Menino Jesus. O pintor ainda se preocupa com o fundo da cena exibindo uma série de motivos decorativos no paramento do templo. Esse tipo de interpretação para a Sagrada Família entre Santos é bastante comum, caracterizando, ainda, uma das vertentes da representação da iconografia mariana, a Virgem e o Menino. Maria sentada no trono com o Menino Jesus em seu colo com o acréscimo de santos e José para equilibrarem a composição tornam-se tradicionais na Itália, no campo tipológico para a materialização do tema proposto.
Entretanto, há outra tipologia também utilizada para a representação da Sagrada Família, nesse caso, sem a presença dos santos e Maria não estando mais em um trono com o Menino. A Academia brasileira possuía um exemplar de cada interpretação da cena, uma copiada por Meirelles e descrita acima e uma reprodução do original de Bartolomé Esteban Murillo [Figura 6]. Na tela “Sagrada Família” de Murillo, a força do claro-escuro é nítida, o apelo ao popular numa representação de uma família simples ambientada em uma casa modesta segue a convencional ideia da virtude cristã que prima pela humildade, simplicidade e o amor. Essa pintura é a única cópia, ainda com autoria desconhecida, da Escola Espanhola, que hoje pertence ao Museu D. João VI/EBA/UFRJ. Por ser, então, exclusiva torna-se referência destacando-se de todo o acervo de reproduções que o Museu possui, confeccionadas a partir dos originais italianos e franceses em sua grande maioria. Não podemos precisar com segurança a data da aquisição dessa obra, no entanto, no arquivo do Museu D. João VI/EBA/UFRJ encontramos o registro da compra não só de uma cópia de Murillo como também da reprodução de um quadro de Correggio[17].
Após analisarmos um grupo de cópias de pinturas europeias localizadas no Museu D. João VI/EBA/UFRJ, sob o ponto de vista do estudo e da observação dos estados da alma, dos gestos e ações da figura humana, verifica-se a necessidade e a relevância de tal estudo na formação do pintor, principalmente, para a assimilação das Retóricas Visuais e das tipologias consolidadas pela tradição.
* Reginaldo da Rocha Leite é Doutor em Artes Visuais e professor no Centro Universitário Metodista Bennett e na Universidade Veiga de Almeida.
[1] “Seis dias depois, Jesus tomou a Pedro, e a Tiago, e a João, irmão deste, e levou-os à parte, a um alto monte. E ele foi transfigurado diante deles, e o seu rosto brilhava como o sol, e a sua roupagem exterior tornou-se brilhante como a luz. E eis que lhe apareceram Moisés e Elias, conversando com ele. Como resposta, Pedro disse a Jesus: ‘Senhor, é excelente que estejamos aqui. Se desejares, armarei aqui três tendas, uma para ti, e uma para Moisés, e uma para Elias.’. Enquanto ele ainda falava, eis que uma nuvem luminosa os encobriu, e eis uma voz vinda da nuvem, dizendo: ‘Este é meu Filho, o amado, a quem tenho aprovado; escutai-o’. Ouvindo isso, os discípulos prostraram-se com os seus rostos 9em terra0 e ficaram com muito medo. Jesus aproximou-se, então, e tocando-os, disse: ‘Levantai-vos e não temais.’ Ao levantarem os olhos, não viram mais ninguém a não ser Jesus sozinho. E, ao descerem do monte, Jesus ordenou-lhes, dizendo: ‘A ninguém conteis esta visão, até que o Filho do homem seja levantado dentre os mortos.’ [...] E ao se chegarem à multidão, aproximou-se-lhe um homem que se ajoelhou diante dele e disse: ‘Senhor, tem misericórdia de meu filho, porque ele é epilético e está enfermo, pois cai muitas vezes no fogo e muitas vezes na água; e eu o trouxe aos teus discípulos, mas eles não o puderam curar.’. Jesus disse, em resposta: ‘Ó geração sem fé e deturpada, até quando terei de continuar convosco? Até quando terei de suportar-vos? Trazei-mo aqui.’. Jesus censurou então o demônio e este saiu dele; e o menino ficou curado daquela hora em diante.”. Mateus 17:19. Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas. São Paulo: Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, 1984.
[2] PANOFSKY, Erwin. Sobre o problema da descrição e interpretação do conteúdo de obras das artes plásticas. In: LICHTENSTEIN, Jacqueline (org.) A Pintura/textos essenciais. vol. 8, São Paulo: Editora 34, 2005, p. 88.
[3] “[...] o que constitui o objeto da descrição imagética é na verdade não apenas a forma [...], mas também o sentido da forma. Com a diferença apenas - e isso é decisivo - de que o ‘sentido’ nesse caso se encontra numa outra camada - mais primitiva, se se quiser, do que aquele outro sentido, com o qual se ocupa a investigação assim chamada ‘iconográfica’.”. PANOFSKY, Erwin. “Sobre o problema da descrição e interpretação do conteúdo de obras das artes plásticas”. In: LICHTENSTEIN, Jacqueline (org.) A Pintura/textos essenciais. vol. 8, São Paulo: Editora 34, 2005, p. 88-89.
[4] PANOFSKY, Erwin. Estudos de Iconologia. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p. 19.
[5] Wölfflin, ao mergulhar na problemática do estilo das obras de arte, especificou que “ao lado do estilo pessoal, deve-se considerar o estilo da escola, o estilo do país, o estilo da raça.”. WÖLFFLIN, Heinrich. Conceitos Fundamentais da História da Arte. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 9. A partir desses pontos o teórico formula cinco pares antitéticos de análise da imagem, tendo o conceito estilo como eixo. São eles: Linear e pictórico, forma fechada e forma aberta, plano e profundidade, pluralidade e unidade, clareza e obscuridade (clareza absoluta e clareza relativa).
[6] “Gostaríamos de designar aquela camada de sentido primária, na qual podemos penetrar graças à nossa experiência existencial vital, como a região do sentido fenomênico, o qual, se quisermos, podemos dividir em sentido objetivo e sentido expressivo (pois é sem dúvida uma diferença importante se o signo imagético nos apresenta como a exposição de um indivíduo ‘belo’, ‘feio’, ‘triste’, ‘feliz’, ‘expressivo’ ou ‘apático’). Aquela outra camada de sentido, ao contrário, que nos é acessível apenas graças a um conhecimento transmitido literariamente, gostaríamos de denominar como a região do sentido semântico.”. PANOFSKY, Erwin. Sobre o problema da descrição e interpretação do conteúdo de obras das artes plásticas. In: LICHTENSTEIN, Jacqueline (org.). A Pintura/textos essenciais. vol. 8, São Paulo: Editora 34, 2005, p. 89.
[7] “[...] a história dos tipos nos instrui sobre as modalidades sob as quais, no curso das mudanças do desenvolvimento histórico, os sentidos objetivos e expressivos se conectam a determinados sentidos semânticos.”. PANOFSKY, Erwin. Sobre o problema da descrição e interpretação do conteúdo de obras das artes plásticas. In: LICHTENSTEIN, Jacqueline. A Pintura/textos essenciais. São Paulo: Editora 34, 2005, p. 107.
[8] PANOFSKY, Erwin. “Sobre os problemas da descrição e interpretação do conteúdo de obras das artes plásticas”. In: LICHTENSTEIN, Jacqueline (org.). A Pintura/textos essenciais. vol. 8, São Paulo: Editora 34, 2005, p. 90.
[9] “Assim como para a descoberta do sentido fenomênico, também para a descoberta do sentido semântico será preciso, de certo modo, que exista uma ‘instância superior’, diante de cujo tribunal, antes de mais nada, se justifique a associação entre a noção extra-artística (neste caso, portanto, um conteúdo fornecido pela literatura) e o fenômeno imagético dado. Tal ‘instância superior’, que para a descoberta do sentido fenomênico era o conhecimento estilístico, agora, para a descoberta do sentido semântico, é a tipologia, entendendo aí por ‘tipo’ aquela representação na qual um determinado sentido objetivo conectou-se tão firmemente a um determinado sentido semântico, que a representação, enquanto portadora desse sentido semântico, tornou-se tradicional, como, por exemplo, Hércules com pele de leão e clava ou O crucifixo entre Maria e João Batista.”. PANOFSKY, Erwin. Sobre o problema da descrição e interpretação do conteúdo de obras das artes plásticas. In: LICHTENSTEIN, Jacqueline. A Pintura/textos essenciais. São Paulo: Editora 34, 2005, p. 95-96.
[10] BAXANDALL, Michael. O Olhar Renascente. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
[11] “Se a arte nasce de um impulso moral, é um movimento do interior para o exterior que deve propagar-se e comunicar-se, solicitando nos outros o mesmo ímpeto de ascensão. Ao valor da emoção sucede o da comoção, cujos móveis são morais. Tintoretto não se propõe a reconstruir um fato histórico, mas a representá-lo de modo a produzir determinados efeitos no ânimo de quem observa. Sabe que faz teatro; mas o que conta para ele não é a verdade histórica, e sim a autenticidade do sentimento suscitado pela representação. Estuda a encenação: o fato miraculoso (o escravo condenado, o carrasco com os instrumentos do martírio partidos, o santo que desce voando, como um deus ex machina) ocupa uma pequena parte do quadro: o restante é preenchido por uma multidão atônita, aterrorizada, admirada que desborda, lateral e frontalmente, pelo espaço do quadro, ligando-o ao espaço externo e comunicando assim ao espectador o próprio movimento”. ARGAN, Giulio Carlo. História da Arte Italiana. vol. 3, São Paulo: Cosac & Naify, 2003, p. 195. É importante explicar o significado da expressão deus ex machina. Era um termo utilizado no teatro grego, durante a Antiguidade, para denominar um efeito cênico que consistia numa espécie de aparição do alto do cenário de uma personagem, como se estivesse vindo do céu. Para que isso fosse possível, o ator era elevado por um tipo de guindaste rudimentar que ficava atrás do cenário, sem ser visto pelo público.
[13] Arquivo do Museu D. João VI/EBA/UFRJ, Índice de Decretos.
[14] Podemos citar o conhecido manual Physiologia das Paixões, de Charles Le Brun.
[15] Documento 1328 - 26 de julho de 1877:
“Victorino José Leonardo vendeu para a Imperial Academia das Bellas-Artes = 1 copia da celebre ‘Antiope’ de Correggio (?) por seo genro Augusto Rodrigues Duarte”.
[16] Documento 1318 - 24 de fevereiro de 1881:
“Tenho a honra de levar ao conhecimento de V. Exa. que a Sra. Baroneza d’Itamby presenteou esta Academia com duas cópias pintadas a óleo, e emolduradas de que seo finado marido havia feito aquisição na Europa. Representão ellas a Danae de Correggio, e a Lucrecia de Guido Cagnacci. Acceitando-as, rogo a V. Exa. que se digne a autorizar-me a agradecer a aquella Sra. a sua graciosa offerta.
Deos Guarde V. Exa.
Barão Homem de Mello
Min. Secretário de Estado e dos Negócios do Império.”.
[17] Na Sessão Pública de 30/08/1850 é discutida a compra de dois quadros (cópias) um de Murillo, no valor de 60 mil réis, e outro de Correggio avaliado em 40 mil réis. Entretanto em nenhum momento é informado o tema de cada pintura, mas podemos afirmar que a reprodução da tela de Correggio a que se refere o documento não pertence ao Museu da Escola de Belas Artes, pois a única cópia do pintor italiano localizada nesse museu, intitulada “Danae”, não foi adquirida por compra e sim por doação da Baronesa de Itamby. Suspeitamos que o documento faz referência à compra da cópia da “Sagrada Família” de Murillo, contudo, não podemos afirmar tal especulação.