Estatutos da Imperial Academia e Escola das Bellas Artes, 1820
Contribuição de Alberto Cipiniuk
Em 23 de novembro de 1820, um decreto criava no Rio de Janeiro a Imperial Academia e Escola das Bellas Artes e aprovava os seus estatutos. Seis anos depois, o prédio da Academia estava para ser inaugurado, mas os Estatutos de 1820 haviam se extraviado. Como existia uma cópia devidamente documentada - assinada por Teodoro José Biancardi, oficial maior da Secretaria do Estado dos Negócios do Império -, o Decreto 135 de 30 de setembro de 1826 determinou que esses estatutos fossem adotados integralmente, até a aprovação de um novo regulamento. A presente transcrição foi feita pelo prof. Alberto Cipiniuk, a partir de um documento localizado no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, Caixa 6283.
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Estatutos da Imperial Academia e Escola das Bellas Artes, estabelecida no Rio de Janeiro por Decreto de 23 de Novembro de 1820.
(página 1)
Organisação do Corpo Acadêmico.
O Corpo Académico será composto de um Presidente, um Diretor, um Secretario, e um Professor para cada uma das Classes dos estudos das Bellas Artes distribuídos pela ordem seguinte.
1º Presidente da Imperial Academia, será o Ministro dos Negocios do Imperio.
2º Diretor da Academia, será o primeiro Pintor da Imperial Camara, o qual occupará a Cadeira da Aula de Desenho, por ser este estudo essencial nas Artes de Pintura e Esculptura.
3º Secretario da Academia.
4º Professor de Pintura Historica.
5º Professor de Esculptura.
6° Professor de Architectura Civil.
7º Professor de Gravura.
8º Professor de Mechanica.
Haverá também titulos de Académicos Honorários, que serão dados ao Corpo da Nobreza, e Sábios da Nação; o Corpo academico poderá convidar para Socios Honorários os Sábios e Artistas Estrangeiros.
(página 2)
Os Estudos da Imperial Academia e Escola das Bellas Artes serão divididos em seis Classes, pelas seguintes Aulas.
1.ª
Desenho de figura, paisagem e ornamentos.
2.ª
Pintura histórica, retratos, paizagem, e ornamentos.
3.ª
Esculptura de figuras e ornamentos.
4.ª
Architectura Civil, Perspectiva, e Geometria pratica.
5.ª
Gravura em diversos géneros.
6.ª
Mechanica.
(página 3)
Para todas as Classes haverão Salas separadas, e com a decoração própria para o ensino publico das mesmas Artes, observando-se ali exactamente o que se determina nos Artigos seguintes, de cuja observância resultará o seu progresso.
Artigo. I.º
§.1.º
Cada uma das Classes terá o Professor respectivo o qual he obrigado a fazer observar escrupulosamente a seus Discípulos as condiçoens impostas nestes Estatutos.
§.2.º
O estudo das differentes Aulas, será dividido; de manhaã haverá Aulas, de Desenho, Pintura e Esculptura: de tarde, Architetura Civil, Gravura e Mechanica: estarão abertas, excepto os dias Santos, e os de Grande Galla.
§.3.º
No Verão principiará o estudo de manhaã as nove horas, e finalizará ao meio dia, e de tarde das trêz até á seis, excepto nas tardes de inverno que principiará as duas, e finalizará as cinco.
§.4.º
Como seja da maior importância para o adiantamento, e progresso, dos que se applição, á Pintura , e Escuptura, o estudo do Modelo vivo, haverá todos os dias de manhaã uma hora deste estudo o qual principiará ás oito horas, e acabara ás nove, os Professores de Desenho, Pintura, e Esculptura, presidirão por seu turno, um cada mêz, em cujo tempo lhe compete a composição da actitude do Modelo, e corrigir o desenho á todos, que para esse fim o consultarem, pertence-lhe igualmente no seu mêz o governo interno desta Sala, que terá o título, de Aula do Nú, ordenando tudo que for necessário para manter a boa ordem.
§.5.º
Serão admitidos ao estudo do Nú os Discípulos das Aulas, que seus respectivos Professores acharem, que estão mais adiantados; também serão admittidos os Artistas de fora, inda que sejão Estrangeiros, contanto que se habilitem com huma licença por escrito passada pelo Diretor da Imperial Academia.
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Artigo. II.º
§.6.º
Classe de Desenho.
Nesta Aula se ensinará o Desenho de Figura, Paizagem, e Ornamentos, conforme a inclinação e vontade que cada um dos Estudantes quizerem seguir nos diversos ramos de que se compõem as Artes de imitação, devendo-se applicar a este estudo por tempo de três annos, findos os quaes devera faser o seu Exame, para o que fará um desenho de qualquer objecto natural, isto he, se for de Figura fará um desenho copia do Modelo vivo, se de Paizagem, fará uma vista de qualquer sitio conhecido nos diversos contornos desta Cidade, se de Flores ou Passaros igualmente serão copias do natural, e não de estampas ou exemplares de outros artistas, pela razão de que a copia do natural se conhece melhor o gráo de adiantamento dos que se applição.
Artigo. III.º
Classe de Pintura.
§.7.º
O estudo de Pintura se dividirá em cursos particulares, e publicos, estes se farão de dois em dois annos no tempo, em que durar o concurso.
§.8.º
Pintura historica.
Os cursos particulares serão praticados diariamente; o Professor desta Aula ensinará a fazer a applicação por princípios da theoria á pratica, fará conhecer ao Discípulo os trêz principaes pontos a que se reduz a sciencia desta Arte, que vera a ser: Composição, Desenho, e Colorido; que em todos os generos de Pintura he necessária a invenção para a escolha dos assumptos que são proprios de cada genero, e as três espécies de invenção, isto he, a histórica, que consiste não só nos assumptos tirados da historia, mas também na representação de todos os objetos verdadeiros, e reaes, do mesmo modo q a natureza os apresenta, como, Animaés, Flores, Fructos, Paisagens, H.Allegorica, que consiste na escolha dos assumptos que servem para expor por inteiro, ou em parte, diversa couzas (página 5) do que elles realmente são, taes como, as Virtudes, as Paixões, a Fortuna, a Disgraca, H. A mystica que consiste na escolha dos assumptos relativos á Religião, que serve para representar, de baixo de figura, ou imagens senciveis algum dogma ou mistério; alem destes preceitos geraes da invenção applicaveis a todas as Bellas Artes, ensinará as regras peculiares da Pintura, isto he, a composição que se pode dividir em três partes, 1.ª na ordem sabia e engenhosa dos objetos que cada assumpto offerece, 2.ª na distribuição, na qual se deve observar religiosamente o custume, 3.ª , os grupos, que consistem na reunião de muitas personagens ou outras quaesquer figuras em um mesmo lugar, cuja reunião de todos os grupos particulares deve produzir um grupo geral, que se chama o todo, no qual todo consiste a perfeição; ou o sublime da composição poética de um Quadro, fundado sobre a bella harmonia de todas as partes entre si.
Depois passará ao Colorido por ser uma parte muito necessaria da Pintura, a qual comprehende os Artigos seguintes, 1.º O conhecimento das cores simples e naturaes. 2.º A simphathia e antipathia natural, que se acha entre estas cores. 3.° A mistura das cores simples, e primordiaes para produzir cores mixtas, e outras graduações de quaesquer côres. 4.° O conhecimento das côres locaes, ou das que tomão os objectos, cada um em particular, relativamente a sua collocação ou lugar que elles ocupãoo. 5.º A maneira de empregar habilmente todas as côres, e suas diversas misturas. 6.° O conhecimento do Claro-escuro, ou os effeitos da sombra, e da luz, formão um ponto capital em toda a pintura, finalmente, a expressão das paixões, e dos movimentos da alma he também outra parte muito importante da pintura; sem ella tudo em um Quadro vem a ficar frio, sem graça e desanimado.
§.9.º
Retrato.
O Retrato cujo pincel goza da vantagem de recommendar á posteridade os homens Illustres de todas as Classes,e de que que resulta tanto bem á sociedade, deve patentear nos seus Quadrs um exacto desenho, e um colorido rival da Natureza, tendo sempre em vista as regras da Perspectiva enriquecendo as suas composições com accessorios (página 6) próprios da pessoa retratada; são estas regras que o Professor deverá transmittir a seus Discípulos exemplificando a maneira de pintar os diversos vestuários, como veludos, sedas, corpos d'Armas, h. pois todos estes objectos tem diverso estilo a seguir.
He evidente que a theoria, e a pratica formão o bom Artista; porem he indubitável que a pratica he preferencial nas Artes de imitação, por que a theoria ensina os conhecimentos especulativos, se porem se lhe ajunta a pratica, começa-se então a ver com os próprios olhos, marcha-se com confiança, e consegue-se a exactidão, por que a pratica he o complemento de toda a sciencia, destroe oa prejuisos, dá regras seguras, fornece recursos abundantes, e produz no Pintor a firmesa de pincel, que faz achar facil, e praticavel, o que os outros só versados nas liçoens theoricas julgarão impossivel: finalmente da pratica nasce a prudencia e perfeição das Bellas Artes.
§.10.º
Paizage.
Este género de pintura he um dos mais agradaveis da Arte e o vastissimo terreno do Brasil offerece vantagens aos Artistas que viajarem pelas Províncias, fizerem uma collecção de Vistas locaes terrestres como maritimas: o Professor desta Classe ensinará a theoria e a pratica, explicando os preceitos da perspectiva Aeria, e o effeito da luz nas diversas horas do dia conforme a altura do Sol; par serem mui distintos os quatro tempos do dia; alem do estudo dos reinos Animal e Vegetal muito necessarios ao Pintor de Paizagem, exemplificará aos Discipulos a maneira de pintar as Nuvens, Arvores, Agoas, Edifficios, Embarcaçoens, e todos os mais objectos que entrão na composição de uma Vista terrrestre, ou Marinha.
§.11.º
Flores.
He muito agradável, e interessante o estudo das flores particularmente no Brasil onde a Natureza he tão pródiga na variedade de flores, fructos, e plantas muitas ainda desconhecidas; os que se applcarem a este ramo de pintura, o Professor lhe fará copiar alguns quadros da Escola flamenga para adquirirem o bom estilo, e depois o fará copiar (página 7) do natural, para que o Director do Jardim Botânico lhe prestará gratuitamente, flores ou plantas que lhe forem pedidas para este fim.
§.12.º
Animaes.
Para conseguir a perfeição nesta parte da Pintura he necessário o estudo do natural; porem como se torna quasi imposivel que os Animaes vivos se prestem com a precíza quietação para se copiarem, ha o recurso de se estudar pelos mortos preparados pela arte para as colleções dos Muzeos, neste caso o Director do Muzeo, e Historia Natural prestará aos Alumnos da Imperial Academia os Animaes e productos que lhe forem requisitados pelo professor de pintura, para se copiarem, e logo que acabem as ditas copias se restituirão, tendo toda cautella em não se danificarem. Destas Copias se podem formar uma colleção, e serem gravadas na mesma Academia, adquirindo por esta forma a seus Autores, e extracção a seus trabalhos.
§.13.º
Decoração.
Os que se applicarem a este genero devem estudar a figura, flores, fructos, animaes, H. por que todos estes objectos se compõem as Decoraçoes, que se tornão tão necessárias em uma Côrte onde o Luxo he menos arbitrário do que se pensa; toda a Decoração deve reunir um objecto de utilidade por isso aperfeiçoar o gosto nas decorações he muito proveito; cuja perfeição reside no simples e bem feito, apesar de todos os caprichos da moda ella volta sempre a estes dois pontos essenciaes, ainda que as formas do uzo variã de continuo (?), por que não repousão nas ideas de um bello imaginario; para que o discípulo adquira a perfeição de fantasiar, o Professor lhe fará copiar os Arabescos das Logeas do Vaticano, compostas pelo grande Rafael d’Urbino.
Artigo. IV.º
§.14.º
Classe de Esculptura.
Os Alumnos desta classe frequentarão a Aula de Desenho trez annos findos os quaes passarão á de Esculptura (página 8) aprendendo até o maquinismo próprio desta Arte, cujos estudos se farão copiando em barro pessas de baixo-relevo e de relevo inteiro; preparado assim o Disciplo passará á pratica de esculpir em madeira, e aprenderá os preceitos relativos á composição do baixo-relevo, e dos grupos, deverão igualmente aplicar-se ao conhecimento das regras das cinco Ordens de Architectura, Toscana, Dorica, Jonica, Corinthia, e Composita, assim como as da composição da Esculptura para ornar os Monumentos.
§.15.º
Esculptura em Medalha, e Gravura.
Os que se applicarem a estas Artes terão o mesmo tempo d’estudo de Desenho, passando á execução em baixo-relevo no barro ou em cêra indo gradualmente passando ao estudo da Gravura sobre metaes, forjas, temperar os cunhos; ao maquinismo dos cunhos; e os que se dedicarem a Gravadores de Estampas hirão gradualmente applicando-se a gravar em cobre nos trêz diversos estilos, isto he, Boril, Agua-forte, e Pontilhé.
§.16.º
Esculptura de Ornatos ou Entalhador.
Depois do estudo do desenho desta Arte passará o Estudante a por em execução na Classe de Esculptura o mesmo estudo em barro, geço ou cêra, finalisando com conhecimento theorico, e practico da composição deste genero de ornatos Architecturaes.
Artigo. V.º
§.17.º
Classe de Architectura Civil.
O estudo d'Architectura, ou sciencia da Arte de Edificar segundo as regras e proporções determinadas, será theorico e pratico, o Professor ensinará chronologicamente a mudança de gostos ou estilos, que tem experimentado a Architectura desde a sua mais antiga origem, até o seu estado florescente, tendo sempre em vista o conhecimento dos diversos modos de Architectura adoptados pêlos Gregos, e Romanos, dos quaes vários Mestres dos séculos XV e XVI, a exemplo de Vítruvio e segundo a sua doutrina composerão as differentes Ordens (página 9) de Architectura; mas para evitar todo o systema a este respeito fará conhecer donde elle as tem colligido, dando somente aos Discipulos exemplos extrahidos dos monumentos existentes na Grécia, e na Itália, e as cinco Ordens de Architectura do Vignola.
§.18.º
Passar-se-ha depois a applicacao destes defferentes modos ás partes dos Edificios, seguindo-se o estudo da construção, considerado debaixo de todas as suas relações, isto he, das partes que pertencem á composição, assim como á Disposição, Proporção, e a Decoração dos Edifícios em geral, e por isso he de grande importância que os Discipulos da Classe de Architectura se appliquem ao desenho de figura e ornatos, para se dirigirem com boa escolha na parte decorativa das suas composiçoens: destes conhecimentos reunidos á theoria desta Arte, resulta o bom gosto da Architectura, observando sempre as regras do referido Vignola.
Artigo. VI.º
§.19.º
Classe de Mechanica
Esta Classe trabalhará com a reunião de trêz indivíduos somente, a saber, dois officiaes Marcineiros habeis, dos quaes um saiba tornear e um forjador torneiro.
§.20.º
Estes tres Discípulos adquirirão na Classe de Architectura o estudo respectivo para complemento desta profissão; ao mesmo tempo o Professor de Mechanica os occupará em executar differentes modelos em relevo, redusidos a um ponto conviniente, para depois utilisar-se passando-se a grande. Este estudo será dividido progressivamente conforme as difficuldades.
§.21.º
Estas differntes pessas ainda na sua maior simplicidade, serão sempre correspondentes á conviniencia particular do território. Se entre os primeiros modelos estabelecidos se acharem algumas entre nós desconhecidas para a utilidade de qualquer Provincia; neste caso o Professor de Mechanica as fará copiar pêlos Discipulos, e as entregara a disposição do Governo para este lhe dar a sua divida e útil applicação.
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§.22.º
Logo qu a Academia julgar os Discípulos habeis, poderão ser inviados provisoriamente aonde convier para dirigirem os Estabelecimentos das diversas pessas de mechanica, e pela theoría poderão remediar os incovinientes que possão provir da localidade; neste caso os Proprietários que os exigirem, os endenizarão do seu respectivo trabalho.
§.23.º
Completando os Discipulos desta Classe o curso de seus estudos receberão um Certificado do seu respectivo Professor, que lhe servirá de titulo para serem empregados na direção dos trabalhos do Governo.
Artigo. VII.º
§.24.º
Das obrigações a que esão responsáveis os professores da Imperial Academia das Bellas Artes.
Para conservação da perfeita harmonia que deve haver entre os Professores, são estes obrigados a se dirigirem ao Director todas as vezes que julgarem necessário providenciar algum melhoramento relativo aos estudos, ou outro qualquer objecto do qual dependa o progresso, a boa ordem, e regularidade que deve haver nas Aulas, e o Director participará ao Ex.mo Presidente tudo o que lhe for inquisitado pelos Professores afim de não deliberar sem sua expressa ordem; são igualmente obrigados a presidir nas suas respectivas Aulas todo o tempo determinado no Art I.° §§.2.º e 3.º, devem com toda a complacência instruir seus Discípulos nos segredos mais importantes de sua Arte, e olhar esta instrucção como um dever a respeito da sociedade, e do lugar que occupão, não sahindo das Aulas sem terem mandado sahir os Discípulos, ter todo o cuiodado em que se conserve o socego durante as horas lectivas, não consentindo conversaçoens, ou distraçoens, que todos estejam nos seus lugares com applicação, e decencia; no cazo porem de haver algum Alumno cuja conduta seja eacandelosa não se conduzindo como deve, ou for preguiçoso, será reprehendido pela primeira, e segunda vêz o professor (página 11) poderá expulsar, fazendo sciente do facto ao Director para este imediatamente o participar ao Ex.mo Presidente, e não será admittido sem nova ordem; o Director cuidará escrupulosamente na exacta observancia deste artigo, por ser da sobordinação e decoro, que depende a estabilidade das Corporações.
Artigo. VIII.º
§.25.º
Do que respeita aos Discipulos, da sua recepção, Obrigaçoens, e Diplomas.
Haverá duas Classes de Discipulos, uma das Classes será de Effectivos, por terem estes a obrigação de frequentarem todo o curso dos estudos a que se quiserem applicar, a segunda Classe será de Discipulos Extraordinarios; os primeiros serão matriculados, porem os segundos serão exemptos desta clausula por não terem obrigação de frequentar; estes lugares são destinados ás pessoas adultas, e deleitantes que desejarem instruirem-se, e só para recreio cultivão as Bellas Artes; mas devem igualmente requerer para serem admitidos.
§.26.º
Todos aquelles que pretenderem entrar para Discipulos devem requerer a Sua Magestade Imperial pelo Ex.mo Presidente declarando no requerimento a Arte que se quer applicar, e depois de obter Despacho se appresentará ao Director da Academia para ser admttido, frequentará um méz a Aula de Desenho, informando depois o Director da habilidade de que fôr dotado; de cuja informação se seguirá o ser ou não admittido effectivamente; por que he sem duvida que não havendo natural desposição não se consegue ser bom Artista, e por isso ha tantos medíocres cujas obras destro [...] o bom gosto; e para que se evite de aluma sorte este prejuizo que sofrem as Bellas Artes, deve-se fazer boa escolha nos que se applicam a ellas.
§.27.º
A Matricula dos Discípulos da Academia será feita pelo Secretário, e se assentará, a filiação, idade, naturalidade, (página 12) e habitação, e será assignada pelo Director, e Secretario; não se admittindo para Discipulos Effectivos senão os de idade de doze atá quinze annos, o que se verificará pela certidão da idade que devem apresentar no acto da matricula.
§.28.º
Os Discipulos effectivos que se distinarem á Pintura, Esculptura, e Architectura, farão curso de cinco annos, a saber, nos trêz primeiros annos frequentarão as Aulas de Desenho de figura, e Architectura Civil, e nos dois últimos, praticarão só a Arte que se didicarem; acontecendo porem que no fim deste tempo não tiverem adquirido os precisos conhecimentos práticos para essercer as referidas Artes se lhes concederá mais um ou dous annos para se aperfeiçoarem.
§.29.º
Os Discipulos são obrigados a frequentarem todos os dias, e applicarem com diligencia, e actividade respeitando a seus Professores e ouvir com sisudeza suas liçoens, e conselhos, não desencaminharem a seus condiscipulos, para fins indecorosos, não fazerem conversação de gritaria, e algasárra á porta da Academia na occasião da sahida ou entrada das Aulas, conservarem todo silencio durante as horas lectivas, para não pertubar aos que se applicao com gosto, e desejo de seu adiantamento, não sahirem antes das horas determinadas, sem licença de seu Professor, pois he da sobordinaçao, e decoro que depende o caracter do bom Discipulo; finalmente praticarem com todas as regras da decência, e civilidade; no cazo porem de delinquirem, ou se apartarem destes preceitos, serão castigados conforme se acha determinado no artigo VII.º §.24.º
Artigo. IX.º
§.30.º
Dos Concursos, e destribuição dos premios.
Para promover a emulação tão louvável e necessária ao progresso, e adiantamento das Bellas Artes haverá no fim de cada anno dois premios em cada uma das Aulas.
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§.31.º
Serão os premios uma medalha de ouro, e terá de pezo uma onça, e outra que terá, pendente de uma fita verde, a maior será para o primeiro prémio, e a menor para o segundo; estas medalhas terão de um lado a Effige de S. M. I. e no reverso estarão representados os atributos das Artes coroadas de Loiro com esta inscripção = AO MÉRITO =
§.32.º
Os concurentes da primeira Aula farão um desenho copiado, ficando á sua eleição a escolha do original que quizerem copiar; os da Aula de Pintura farão a copia de um Quadro do genero a que se tiverem applicado; os da Aula de Esculptura faraó o modelo de uma Estatua, ou um grupo de trêz figuras; ou um baixo-relevo, e os de Architectura farão um desenho de qualquer Edifficio, cujo desenho deverá constar de Planta, Corte e Alçada.
§.33.º
Os Discipulos que nestas Artes se distinguirem completando o curso academico com approvação de seus Professores, terão alem dos mencionados premios uma penção para viajar por cinco annos (findo?) quaes voltando da Europa apresentará alguma producção pela qual mostre o seu aproveitamento, e inclusivamente se occupará em fazer ura Quadro histórico de sua invenção, que apresentará ao corpo academico para a sua approvação, a qual se fará pela pluralidade de votos, por escrito, e o Painel se depositará na Academia ou Muzeo Imperial das Bellas Artes como Monumento Nacional; esta formalidade se seguirá nas Classes de Pintura, Esculptura, e Architectura. Estes Artistas gozarão do titulo de Socios da Imperial Academia das Bellas-Artes, e terão a preferencia nas Cadeiras das Aulas de Desenho que se estabelecerem nas Províncias do Império.
§.34.º
O papel em que se fiserem os desenho do concurso, e os paineis, serão rubricados pelo Director da Academia, e (página 14) pelo Professor respectivo da Aula do concurrente, o prazo do tempo concedido para estes trabalhos será de trêz mezes, que principiarão no 1.º de Setembro, em cujo tempo os Professores terão o cuidado, que as obras dos concurrentes sejão feitas pela mão de cada um delles, e não consistirá que algum emende, ou trabalhe na obra do outro; e para que haja todo cuidado a este respeito, serao guardados os paineis, e desenhos, diariamente em um armario cuja chave ficará na mão do Professor respectivo; acabados pois nesta conformidade ficarão em arrecadação até o dia do concurso.
§.35.º
O Director da Academia participara ao Ex.mo Ministro Presidente que se acchão concluidos os trabalhos dos concurrentes, para que lhe seja determinado o dia do concurso, e logo que for dado avizará aos Vogaes, que serão os mesmos Professores, os quaes reunidos votarão imparcialmente, e o Secretario os escreverá, e assignará juntamente com os Professores, e serão remettidos os Votos em carta feichada juntamente com obras premiadas ao Ex.mo Presidente, e por elle subirão a Imperial Presença de S.M. o Imperador para examinarem a Sua Imperial Appravação.
§.36.º
As obras premiadas serão collocadas nas paredes da Aula da sua respectiva Classe para constar a todo tempo os benemeritos que forão premiados: restituir-se-ão as que não obtiverem premios, aos seus proprietarios.
Artigo. X.º
§.37.º
Das ferias, e dos privilegios concedidos aos Professores, e Discipulos da Imperial Academia das Bellas-Artes.
Haverá todos os annos três mezes de ferias, que serão nos mezes de Dezembro, Janeiro, e Fevereiro, e os dias de Grande Galla: Os Professores e Discipulos da Imperial Academia das Bellas-Artes gozarão dos Privilegios, e exempçoens que são concedidos aos Lentes e Discipulos das outras Academias do Imperio.
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Artigo. XI.º
§.38.º
Dos Pencionistas, e suas obrigações.
Em cada uma das Classes haverá um Pensionista que terá a obrigação de frequentar o estudo da Arte a que pertencer, e substituirá a cadeira respectiva no impedimento ligitimo do Professor.
§.39.º
Os Artistas que pertenderem o lugar de Pensionista farão um requerimento a S.M. o Imperador pelo Ex.mo Presidente da Academia, cujo requerimento deve hir documentado para justificação da sua pericia, e farão o seu exame perante os Professores da Academia.
Artigo. XII.º
§.40.º
Do Porteiro e suas obrigaçoens.
A Academia e Escola imperial das Bellas Artes terá um Porteiro, o qual será obrigado a entrar meia hora antes da que está determinado para a abertura das Aulas, e neste espasso de tempo terá a seu cuidado fazer limpar o pó das Mezas, e arrumar os bancas, e as cousas que estiverem fora dos seus lugares, e á hora do estilo abrirá as Aulas, e estará ali todo o tempo que durarem os estudos, e executarem as ordens do Director em tudo que for relativo á Academia.
Artigo. XIII.º
§.40.º
Como se hão de prover as Cadeiras vagas.
Logo que vagar a Cadeira de alguma das Aulas se affixarão Editaes para Concurso, que será franco para todos os Artistas que quiserem ser opositores, e se dará o prazo de dous mezes findos os quaes, os concurrentes se apresentarão na Academia com seus Desenhos, ou pinturas comforme a Classe que pertencer a Cadeira; estas obras devem vir acompanhadas de um requerimento a S.M. o Imperador, e se entregará ao Ex.mo Presidente para ser determinada o dia do Concurso, para o qual serão avisados os Concurrentes, (página 16) que comparecerão no dito dia na academia, honde se reunirão os Professores que hão de ser os Vogues; dar-se-ha a cada um dos concurrentes papel, e aprestes necessarios para improvisarem em duas horas um desenho ou esbouço de sua composição, cujo assumpto lhe será dado naquelle momento pelos ditos Professores; estes programas serão escriptos e embrulhadas á maneira de sortes, e baralhados se deitarão em uma Urna, cada concurente tirará a sua, e a levará para o lugar onde fizer o desenho, que será feito em Sala separada, daquella em que estiverem os Professores, por que estes não devem saber o assumpto que sahio a cada um dos concurrentes. e por isso estes não desembrulharão suas sortes senão no lugar que lhe for destinado para os desenhos, os quaes depois de concluidos o Porteiro os levará á Sala onde estiverem os Professores, os quaes estando sós votarão imparcialmente no que for melhor, e mais capaz de occupar a Cadeira, tendo sempre em vista, que se houver nos concurrentes algum que tenha sido Discipulo da Academia sendo edenticas as circunstancias ás de outro que o não tenha sido, preferirá por ser filho da Academia, e o mesmo se entenderá a respeito de Artistas Estrangeiros, e Nacionaes, pois estes devem ter preferencia em iguaes circunstancias de merecimento: Os votos e pareceres dos Vogaes irão em carta feichada remettidos ao EX.mo Presidente, para por sua mão subirem á Augusta Presença de Sua Magestade Imperial que Mandará o que for do seu Imperial Agrado.
Secretaria d'Estado dos Negocios do Imperio em 30 de setembro de 1826. = Theodoro José Biancardi.=
Esta em forma
Theodoro Jozé Biancardi.