Trechos das Atas das sessões do Corpo Acadêmico da Academia
Imperial de Belas Artes entre 1883 e 1885
organização
de Ana Maria Tavares Cavalcanti
CAVALCANTI, Ana Maria
Tavares.
Trechos das Atas das sessões do Corpo Acadêmico da Academia Imperial de
Belas Artes entre 1883 e 1885. 19&20,
Rio de Janeiro, v. XI, n. 2, jul.-dez. 2016. https://www.doi.org/10.52913/19e20.XI2.01
* * *
Esta é
uma transcrição de trechos das Atas das sessões do Corpo Acadêmico da Academia
Imperial de Belas Artes entre 1883 e 1885. Foi feita a partir dos documentos
originais do acervo do Museu D. João VI da Escola de Belas Artes da UFRJ. As
reticências entre parênteses indicam trechos que não foram transcritos. As observações entre colchetes são de autoria
da pesquisadora. Alguns assuntos se destacam: (1) Ofício do Barão de Javary relatando sua visita ao ateliê de Rodolpho
Bernardelli na Itália em 19 de dezembro de 1882; (2) § Parecer da Seção de
Pintura sobre os envios do então pensionista Rodolpho Amoêdo; (3) Parecer da
comissão incumbida de julgar as obras da Exposição Geral de 1884; (4) Lista de
quadros a serem comprados (fevereiro de 1885); (5) D.Pedro
II visita a Academia e “examina” os trabalhos que Rodolpho Bernardelli realizou
na Europa; (6) A nomeação de Rodolpho Bernardelli como professor da Academia em
24 de outubro de 1885.
*
Atas -
Sessões da Presidência do Diretor - 1882 - 1890
Há de
este livro servir para nele se lançarem as atas das sessões do Corpo Acadêmico
[...] Academia das Belas Artes, 22 de Dezembro de 1882
(assinatura)
A. N. Tolentino
*
(p.1 -
verso)
[...]
Ata da Sessão em 15 de Fevereiro de 1883 [...] Consta
o expediente de um aviso [...]; e outro de 30 de janeiro, remetendo cópia do
seguinte ofício do Barão de Javary: = “Legação
Imperial do Brasil na Itália - Roma, 19 de Dezembro de 1882. Illmo Exmo Snr. - Por convite do
pensionista da Academia das Belas Artes Sr. Rodolpho Bernardelli,
concorri ao seu atelier para ver a reprodução que ele concluiu e vai remeter
para o Rio de Janeiro, da Vênus Calipígea do Museu de
Nápoles [Imagem].
Quanto me é possível julgar, o jovem escultor brasileiro reproduziu com muito
bom êxito essa magnífica estátua, tão admirável pela beleza estética das
formas, como pela harmonia artística da roupagem. - Nesta minha visita ao
atelier do (p.2) Sr. Bernardelli, também vi o modelo primitivo que ele fez em
greda, para esculpir o grupo de mármore destinado à nossa Academia das Belas
Artes: - Jesus Cristo amparando a mulher adúltera contra os que a queriam
lapidar [Imagem].
Este assunto, apto sem dúvida a inspirar o artista, já por vezes tem sido magistralmente
tratado em pintura, mas não me consta que o tenha sido pela escultura. -
Incompetente como sou para formular juízo sobre este trabalho artístico de
grandiosas proporções, limitar-me-ei a dar conta da impressão que ele me
produziu - a impressão que o belo absoluto sói produzir ainda nos menos
iniciados nos segredos da arte. - O Sr. Bernardelli, a par do mérito especial
da iniciativa da composição, soube comunicar a essa sua obra o belo absoluto de
que falo, e que a todos impressiona. A cabeça de Cristo pareceu-me mui bem
modelada. Na atitude da figura e na majestade do gesto ressumbra essa expressão
de soberana preeminência, qual devera ser a do Divino Mestre ao fulminar a
turba dos agressores com as famosas palavras, que são uma maravilhosa síntese e
alta filosofia moral e de caridade evangélica. - Completa o grupo a bela figura
da mulher adúltera, prostrada aos pés do Redentor, e, temerosa e pudibunda,
acoitando o rosto por entre as largas pregas da túnica de Jesus Cristo; o que
dá ao grupo um conjunto que impressiona a vista, e define bem a situação. - Não
posso furtar-me ao desejo de referir a V. Excia [sic]
o que então a um distinto escultor italiano que presente estava e que, depois
de analisar esta produção do Sr. Bernardelli como eu não posso fazê-lo,
disse-me que esse grupo fazia muita honra ao artista brasileiro e à sua pátria,
e que era digno de figurar nas melhores Academias europeias. - Como se vê o
estudioso pensionista da nossa Academia tem-se iniciado com proveito na fase de
progresso em que a escultura atualmente se acha neste país; pois, como V. Excia sabe, os escultores italianos tem
constantemente tido a primazia mas recentes Exposições artísticas. - Não
encerrarei este ofício sem confirmar o que por vezes tenho dito relativamente ao
Sr. Rodolpho Bernardelli, isto é, que por suas boas qualidades, e pelos hábitos
modestos de sua vida toda consagrada ao trabalho, ele tem granjeado a estima
dos seus colegas; (p.2 – verso) e que pelo seu excelente procedimento, bem como
pelo constante esmero com que se aplica ao estudo da arte a que se dedicou e na
qual já tem dado bastantes provas de aptidão, ele se torna digno de inspirar
interesse ao Ilustre Instituto do qual é pensionista. - Deus guarde a V. Excia – Illmo Exmo
Snr. Conselheiro Pedro Leão Velloso. - Ministro e Secretário de Estado dos
negócios do Império – Barão de Javary.” - Fica a
Congregação inteirada - Sobre os últimos trabalhos remetidos pelo pensionista
Rodolpho Amoêdo, é lido o seguinte – Parecer da Seção de Pintura: - “Tendo a Seção
de Pintura examinado os trabalhos do 3o ano do Pensionista do Estado Rodolpho Amoêdo, que se
acha em Paris, constantes de 3 quadros, sendo: - Uma figura de mulher, tamanho
natural, intitulada - Marabá [Imagem]
- Um tronco também de mulher e um meio-corpo de menina (costume de camponesa
italiana) [Imagem],
é de parecer: - Quanto à Marabá -, ser uma figura bem composta, largamente
feita e de colorido agradável, mas, quanto ao desenho, deixa ainda alguma coisa
a desejar; pois sendo esta qualidade estudada com cuidado desde a cabeça até a
região peitoral, não acontece o mesmo desta região até às pernas , que é um
tanto descurada. - No estudo do tronco de mulher (de costas) foi o Sr. Amoêdo
mais feliz, tanto no desenho, como no modelado. - Quanto ao 3o e
último - meio corpo de menina, (costume de camponesa italiana) - é este um
estudo inteiramente diferente dos dois primeiros; enquanto
que aqueles são largamente feitos, este é minucioso e escrupulosamente
desenhado. Isto porém só prova que o pensionista, ou
ainda não fixou uma maneira, ou é capaz de executar os seus trabalhos por mais
de um modo. - Em conclusão; julgando-se estes trabalhos de confronto com os da
anterior remessa, é incontestável que o Sr. Amoêdo vai satisfatoriamente
progredindo nos seus estudos e por consequência, tornando-se cada vez mais
digno de louvores, e da proteção da nossa Academia e do Governo Imperial. - Rio
de Janeiro, 15 de Fevereiro de 1883. (assinado) J. Zeferino da Costa - José M. de Medeiros.”[...]
Academia das Belas Artes, 15 de Fevereiro de 1883.
*
(p.3)
Ata da Sessão em 22 de Dezembro de 1883 [...] Consta o
expediente dos seguintes avisos da Secretaria d’Estado dos Negócios do Império:
[...] (p.3 - verso) [...]; de 15 de Dezembro: prorrogando por 18 meses o prazo
do aprendizado do pensionista desta Academia Rodolpho Bernardelli, que se acha
em Roma, afim de que possa concluir o trabalho que está executando, e visitar
na Europa, os museus e galerias existentes nos países ricos de monumentos
d’arte; [...].
*
(p.4 -
verso) [...] Ata da Sessão em 15 de Fevereiro de 1884.
[...] Consta o expediente de dois avisos da Secretaria d’Estado dos Negócios do
Império, a saber: de 5 de janeiro declarando que logo que sejam concluídas as
obras a que se está procedendo no edifício desta Academia, pode efetuar-se uma
exposição geral de Belas-Artes, contanto (p.5) que esta se realize sem prejuízo
das aulas; e de 23 de janeiro comunicando haver-se providenciado afim de que
pela Delegacia do Tesouro Nacional em Londres, seja posta à disposição do
pensionista Rodolpho Bernardelli a quantia de seis mil francos, a fim de
ocorrer as despesas com a execução de uma cópia em mármore da estátua da “Vênus
de Medicis” [Imagem].
[...], é lida e aprovada, depois e discutida a seguinte “tabela das horas das
aulas” [...]. “Desenho Figurado; - Paisagem, flores e animais; - Pintura
histórica; - e Estatuária; todos os dias das 9 às 11 horas; - Arquitetura todos
os dias da 11 horas às 1; Modelo vivo todos os dias da 1 às 3 horas; 4 Desenho
Geométrico - às 2as , 4as e 6as feiras de meio-dia à 1 ½ hora; Matemáticas
aplicadas nos mesmos dias da 1 ½ às 2 ½ horas; Anatomia e Fisiologia das
paixões às 3as feiras e sábados do meio-dia à 1 hora; e História das Belas
Artes, Estética e Arqueologia às 2as e 6as feiras às mesmas horas. O professor
de Desenho figurado deverá comparecer na aula todos os dias, os de Pintura
histórica, e Paisagem, flores e animais, obrigatoriamente, só às 2as , 4as e 6as feiras; e os de Estatuária, Desenho de
Ornatos, e Arquitetura, pela mesma forma, só às 3as , 5as feiras e sábados.”
[...] Academia das Belas Artes, 15 de Fevereiro de
1884.
*
(p.7 -
verso) - Ata da Sessão em 5 de Agosto de 1884 [...].
Consta o expediente de 9 avisos da Secretaria d’Estado dos Negócios do Império,
a saber: [...] de 28 de junho comunicando haver-se mandado adiantar ao aluno
desta Academia Rodolpho Amoêdo, na qualidade de pensionista do Estado, a
quantia de 575$000$, correspondente à importância de um trimestre contado de 15
de Maio a 14 de Agosto do corrente ano, da pensão anual de 2:300$000; que
percebia, devendo ser levado em conta este tempo na prorrogação por dois anos,
se for concedida ao mesmo aluno, do prazo de seu aprendizado [...].
*
(p.9 -
verso) [...] Ata da sessão em 13 de Setembro de 1884.
[...] É lido um requerimento do pensionista Rodolpho Amoêdo pedindo prorrogação
do seu prazo por mais dois anos conforme o permitem as Instruções dos
pensionistas: este requerimento foi acompanhado do esboceto do quadro de grande
máquina que se propõe ele executar, (p.10) e representa = Jesus Cristo em
Cafarnaum =, com este vieram mais três trabalhos que se acham expostos. Este
requerimento é deferido depois de ouvido o “parecer” da Seção de Pintura. [...]
“A Comissão encarregada de dar parecer sobre os trabalhos do pensionista
Rodolpho Amoêdo, tendo examinado as quatro telas, que constituem a nova
remessa, vê nesses estudos que representam: 1o - A partida de Jacob
[Imagem].
2o - Esboceto do seu quadro - Cristo em Cafarnaum. [Imagem].
3o - Uma cópia - Esboceto de Tiepolo
(existente no Louvre). 4o - grande estudo de mulher - figura nua
vista de dorso [Imagem].
Que estes trabalhos revelam grande aproveitamento, deixando antever o resultado final de seus esforços, que por certo atingirão;
libertando-se mais tarde, da situação transitória e dependente, que o estudo, a
prática e os preceitos da Escola francesa contemporânea, tanto influem e o
induzem a sentir desse modo. - O esboceto representando Jesus Cristo em
Cafarnaum é uma boa composição que para executá-lo requer o dito pensionista -
prorrogação por dois anos do prazo de sua pensão - na forma do art.o 9o das Instruções
dos pensionistas. Esse quadro devendo ser bem executado e de modo que a figura
do protagonista adquira mais importância nessa composição, constituirá
certamente um dos trabalhos mais valiosos do jovem artista. Por isso parece à
Comissão ser justo o pedido a que ele tem direito: - Academia Imperial das
Belas Artes - 3 de Setembro de 1884”- Victor Meirelles - José
Maria de Medeiros.” [...] Academia das Belas Artes, 13 de Setembro
de 1884.
*
(p. 10
- verso) Ata da Sessão em 6 de Novembro de 1884 [...] tendo o Sr. Dr. Américo, em sua volta
da Europa, assumido no dia 20 de Setembro o exercício de sua cadeira, Sua Excia o designou para fazer parte da Comissão incumbida de
julgar os trabalhos da atual Exposição geral, e propor as respectivas
recompensas. [...]
*
(p.11) [...] Ata da Sessão em 17 de Dezembro de 1884 [...] convida a Comissão nomeada a
apresentar o “parecer” sobre os trabalhos da Exposição, e correspondente
proposta de prêmios. O secretário lê então o seguinte: - “A Comissão incumbida
de julgar do merecimento das obras exibidas na Exposição Geral das Belas Artes,
que se inaugurou no dia 23 de Agosto do corrente ano, (p.11 – verso) e propor
os prêmios que devem ser conferidos a seus autores, tem a honra de submeter ao
juízo da Congregação dos professores o seguinte = Parecer = A presente
exposição geral é, sem nenhuma dúvida, a mais abundante, mais variada, e talvez
mesmo mais importante de quantas se tem feito na Academia das Belas Artes.
Setenta e cinco artistas concorreram a ela, expondo 399 trabalhos, dos quais,
368 constam do catálogo impresso, e 31 foram admitidos depois da publicação
dele. Além destes 399 trabalhos próprios só da exposição anual, havia na
galeria ocidental, também em exposição 98 produções da nossa Escola. [...].
Folga a Comissão em reconhecer que os expositores em geral são dignos de
louvor; porque não é sem grande esforço, sem sacrifício de tempo e de dinheiro,
sem abnegação mesmo, que se trabalha para uma Exposição de Belas Artes, a que
infelizmente não corresponde o apreço do público. E com efeito, com mágoa aqui
ficará consignado o fato incrível da mesquinha concorrência de visitantes à
atual exposição; a qual durante cem dias, em uma cidade capital, ponto terminal
de importante estrada de ferro, e porto de mar onde entram diariamente muitos
navios 6 procedentes de todo o mundo, com uma população de mais de trezentos
mil habitantes, apenas foi visitada por 20154 pessoas que pagaram entrada, não
se exigindo por esta senão uma mais que módica retribuição, cujo produto, como
era público e notório se destinava à aquisição das obras expostas, que fossem
mais dignas desta distinção [...]. Este incentivo de animação, pois, esta
recompensa ao merecimento dos trabalhos superiores foi negada pelo público aos
artistas; porque só ao pagamento da entrada se pode atribuir uma tal deserção,
considerando que a última exposição geral, em 1879, que não foi mais
interessante que a atual, mas cuja entrada era de todo gratuita, foi concorrida
em 62 dias que esteve aberta por 292.296 visitantes. [...] [nota de Ana Cavalcanti:
a seguir são citados em ordem alfabética alguns expositores e faz-se a crítica
dos quadros. Observo que a “paisagem” é reconhecida em pé de igualdade com a
pintura de história. São citados: Garcia y Vasquez; (p.12-verso) “O Snr.
Domingos Garcia y Vasquez expôs cinco paisagens bem desenhadas e pintadas com
talento e observação conscienciosa do natural [...] = Restinga em Niterói =, e
a segunda = Pesca = tem merecimento superior às outras três: é seu autor um
aluno da Academia, que deve continuar a cultivar a pintura de paisagem, para a
qual tem reconhecida aptidão, aprendendo a escolher o melhor na observação do
natural, e estudando a composição, que é a parte mais difícil da arte, e que
lhe dá toda a superioridade, pois que do contrário, ela ficaria suplantada pela
fotografia. [...]”; França Junior: (p.13) “O Snr. Dr. França Junior é um
ilustre amador que estreou na atual Exposição com seis pequenos estudos do
natural, que revelam em seu autor felizes disposições para a pintura de
paisagem; talento cuja cultura não deve desprezar.” [Também se elogia a pintura
histórica:] (p.13) Aurélio Figueiredo – “a sua obra
porém mais importante é a = Francisca de Rimini =, quadro histórico de figura
de grandeza natural, marcado no catálogo com o no. 122. Nesta composição
revela-se o Sr. Aurélio de Figueiredo artista capaz de produzir obras valiosas
na dificuldade da pintura histórica.” = “A composição deste quadro está bem
ordenada, o colorido vigoroso e cheio de harmonia, e os acessórios
sofrivelmente estudados: seu autor merece certamente encômios pela coragem de
haver empreendido tão colossal trabalho, num país onde quase tudo falta ao
artista = bons modelos, atelier, conselhos de mestres,
e principalmente = o apreço e a animação do público. =” [...] “Apresenta-se
agora o Sr. Henrique Bernardelli, aluno da Academia, estudando atualmente em
Roma, sem auxílio (p.13-verso) algum da parte de seu país, e que pelos
trabalhos expostos se torna digno de especial menção, e credor da produção da 7
Academia das Belas Artes, e do Governo Imperial. A sua aquarela no 174 = Depois
do sahimento = é um quadro cheio de sentimento, bem
composto, e corretamente desenhado. As duas = Vistas de Roma = recebidas muito
tempo depois da abertura da Exposição, são duas paisagens bem desenhadas, pintadas
sem hesitação, com mão firme, toque franco, e gracioso, pincel fácil, e
colorido verdadeiro e cheio de harmonia. A obra, porém, mais importante deste
jovem artista é a grande cópia à encáustica moderna da = Missa de Bolsena = de Raphael d’Urbino; importante e valiosa não só
pelas suas dimensões, e correspondente labor e despesas; mas também pela
fidelidade com que traduz aquele afamado = a fresco = do príncipe dos
pintores.” [Ainda sobre paisagem:] “O Sr. Hippolyto
Boaventura Caron é um distinto aluno da Academia que expôs quatro paisagens,
merecendo especial menção as de n. 176 e 177; e ao qual se aplica inteiramente
o juízo emitido sobre o seu colega Domingos Garcia y Vasquez. Os Srs. João
Baptista Castagnetto, e João Baptista Pagani são dois filhos da Academia que honram a escola em
que estudaram. O primeiro expôs quatro marinhas, gênero para que mostra
pronunciada vocação, e que não deve deixar de cultivar; [...]. O Sr. Jorge
Grimm expôs quatro vistas tomadas do natural, em que se nota como qualidade
principal – grande correção de desenho, e facilidade de execução, a de n. 194,
intitulada = Vista do Cavalão – que àquelas qualidades reúne a de um colorido
mais harmonioso, tem superior merecimento.” “Do Sr. José Ferraz d’Almeida
Junior, ex-aluno da Academia, se admiram quatro quadros históricos; em todos os
quais se revela o talento com que nasceu aquele jovem artista, e a aplicação
com que estudou, não só na nossa (p.14) Academia durante o tempo de pensionista
da Província de S. Paulo, que lhe deu o berço; mas também durante aquele em
que, a expensas do Imperial Bolsinho, esteve em Paris sob as lições do
professor Alexandre Cabanel. Os quatro quadros
expostos pertencem todos à Academia, tendo sido o n. 126 = Fugida da Sacra
Família para o Egito = magnanimamente oferecido por Sua Majestade o Imperador,
a quem o artista o dedicara, e os outros três comprados pelo governo Imperial
[...]. Destes 4 quadros, o primeiro já citado, que pertence à escola idealista,
e o de n. 197, denominado = Descanso da modelo = , que
se aproxima da moderna escola francesa, tem superior merecimento, e colocam seu
autor no número dos nossos melhores pintores. – Sem que seja movida pela
natural simpatia entre colegas que se estimam, não pode a Comissão deixar de
assinalar o quadro do Sr. professor José Maria de Medeiros, intitulado =
Iracema = , como um dos melhores da atual exposição,
não tanto pela protagonista do 8 drama, como principalmente pelo teatro em que
se passa aquela cena que com tanto talento descreveu José de Alencar. É uma
paisagem pintada por mão de mestre: desenho correto, colorido brilhante e
harmonioso, perfeita observação dos efeitos de perspectiva
aérea dão a essa paisagem, verdadeiramente tropical, um céu luminoso e
profundo, uma vegetação luxuriosa e cheia de vida, e águas da mais límpida
transparência, especialmente naquela onda que arrebenta no primeiro plano do
quadro. [...] (p.14- verso) [...]. Não tendo a comissão de consignar neste
julgamento, as produções enviadas da Europa (p.15) pelos pensionistas da Academia,
deixa de falar nos quinze trabalhos do Snr. Rodolpho Amoêdo. [...] O Sr. Pedro Weingartner, pensionista de Sua Majestade o Imperador, em
Roma, que expôs alguns estudos, nos quais se nota talento e aplicação. [...]
Passando à Escultura sente a comissão ter de consignar a escassez de trabalhos
neste ramo das belas-artes, que entretanto nada teria que invejar à pintura, se
neste julgamento pudessem ser compreendidos os trabalhos enviados de Roma pelo
talentoso pensionista Rodolpho Bernardelli. [...] (p.16) Terminando esta
resumida análise da Exposição geral das belas-artes de 1884, a Comissão propõe:
= 1o – Que sejam levados à presença do Governo Imperial, como merecedores de
recompensas superiores pelas suas produções da atual Exposição os nomes dos Srs.
José Maria de Medeiros, José Ferraz d’Almeida Junior, Pedro José Pinto Peres,
Augusto Rodrigues Duarte, Antonio Firmino Monteiro,
Francisco Aurélio de Figueiredo e Mello, Leopoldo Heck
e Marco Ferrez; = 2o = Que sejam premiados com as
medalhas seguintes: Primeira de ouro = os Snrs.
Thomas Driendl, João Baptista Castagnetto,
D. Abigail d’Andrade, e Jorge Grimm” = Segunda de ouro = Os Snrs.
Henrique Bernardelli, Oscar Pereira da Silva, Hippolyto
Boaventura Caron, Domingos Garcia e Vasquez, Estevão Roberto da Silva, Antonio Alves do Valle Souza Pinto, Francisco da Cruz
Antunes, Modesto Ribeiro e Carneiro Tavares = Medalha de prata = os Srs.
Belmiro Barbosa de Almeida Junior, (p.16-verso) João Pagani,
... = 3o – Que sejam concedidas menções honrosas aos Snrs.
Dr. França Junior, [etc.]”. Academia das Belas Artes, 13 de Dezembro
de 1884. (assinados) – João Maximiniano Mafra -
Victor Meirelles de Lima - Pedro Américo de Figueiredo.” – “Vencido quanto aos
prêmios – F. J. Bethencourt da Silva.” O Sr. Conselheiro Dr. Vice-Diretor manda
então ler o seguinte ofício do Sr. professor Bethencourt da Silva: - “Rio de
Janeiro 17 de Dezembro de 1884.” Il.mo Exmo Snr. = Assinei vencido a proposta para prêmios aos
artistas que concorreram à última Exposição Geral de Belas Artes, e o fiz
embora a meu pesar, convencido de injusta condescendência e bonomia com que
foram julgados algumas obras e os seus autores. – 9 Na arte, sempre me pareceu
que é cousa de somenos importância e valor, a cópia de uma estampa gravada ou
litografada, e que ainda menos valor tinha a ampliação de uma fotografia muitas
vezes realizada pela máquina solar. – A originalidade, a composição são quase
tudo; e esse poderoso contingente da arte é a melhor revelação do gênio e da
instrução do artista. – A Congregação ilustrada como é, me dispensará
comentários talvez mal cabidos, direi, mesmo inúteis, e por isso desprezando o
que ora faço por desencargo de consciência, substituirá os erros de minha
ignorância pelo acerto de suas resoluções. – Julgando com benevolência no
intuito de animar, de dar valor à classe artística, parecia-me, peço desculpa
aos mestres, que já era muito benigno e complacente a concessão de prêmios que
indico e que teria a honra de apresentar à competência da Ilustrada Comissão se
motivos superiores me não tivessem impedido de o fazer. Deus guarde a V. Excia. Il.mo Exmo. Snr. Diretor da Academia das Belas Artes
(assinado) “O professor Francisco Joaquim Bethencourt da Silva. “Exposição
Geral de Belas Artes – Distinção a José Maria de Medeiros, Ferraz d’Almeida
Jr., Pedro José Pinto Peres, Augusto Duarte e Thomas Driendl:
- 1a medalha de ouro a Jorge Grimm, Henrique Bernardelli, Aurélio de
Figueiredo, (p.17) Firmino Monteiro e J. B. Castagnetto
- “2a medalha de ouro a Da Abigail d’Andrade, Garcia y Vasquez, Caron, Oscar
Pereira da Silva, Estevão, Generoso Frate e Alexandre
Siglieri” – “Medalha de prata a Valle, Belmiro,
Antunes, Pagani, Petit, Hilarião
e Dotte – Menção honrosa a Dr. França, Pereira de
Carvalho, Novak e Sá [..., etc.] = F. J. Bethencourt da Silva.” Postos em
discussão o “parecer” da Comissão, e o voto divergente do membro dela o Sr.
Professor Bethencourt da Silva, falam discutindo os Srs. Conso
Vice-Diretor, Conso Dr. Luiz Carlos, Conso Dr. Domingos, Dr. Américo, Victor Meirelles, e o
Secretário. Encerrada a discussão é o “parecer” unanimemente aprovado;
votando-se sobre o voto divergente do Sr. Bethencourt, a proposta substitutiva
de prêmios por ele enviada, é ela unanimemente rejeitada. O Secretário [...]
apresenta à Congregação o resultado do pagamento das entradas na Exposição
geral, e da venda dos catálogos, e bem assim as despesas feitas por ordem do
Snr. Conso Diretor, ficando um saldo de cinco contos
duzentos e oitenta e nove mil duzentos e oitenta e oito reis (5:289$288r) [...].
(p.17- verso) [...] Tratando-se da escolha dos trabalhos de que se deve fazer a
aquisição pelo seu merecimento, ou como incentivo de animação, e
reconhecendo-se a dificuldade de resolver com justiça à vista da exiguidade da
soma arrecadada (5:289$288r) delibera a Congregação que se escolham os
trabalhos que devem ser comprados sem ter-se em conta a soma disponível, e que
seja essa escolha levada ao conhecimento do Governo 10 para que resolva como
for justo. [...]. É lido então o requerimento do Snr. Cândido Caetano d’Almeida
Reis pedindo para ser nomeado, sem concurso, professor d’Estatuária, e resolve
unanimemente a Congregação dos professores: primo = que se informe ao Governo
que o peticionário não está no caso de ser nomeado [...] sem exibir novas provas
satisfatórias da sua aptidão; pois que os prêmios que obteve não provam mérito
absoluto; mas sim relativo, e que o principal e mais importante desses prêmios,
que o foi o de “pensionista” longe de o recomendar, tornou-se em seu
descrédito, por ter-lhe sido cassado pelo Governo Imperial por aviso de 29 de
Agosto de 1868, em conseqüência de sua falta de
aplicação aos estudos, do pouco caso que fazia dos trabalhos que enviava à
Academia, e do nenhum mérito deles; = secundo = que seja nomeado professor d’Estatuária
o pensionista Rodolpho Bernardelli; fazendo o Snr. Conselheiro Diretor, em nome
da Congregação, a respectiva proposta, a qual plenamente justificam os valiosos
estudos que tem mandado de Roma, e as informações sempre muito lisonjeiras que
por diversas vezes tem a Academia recebido sobre ele quer de seu mestre o
talentoso professor Giulio Achilles Monteverde, que é
um dos primeiros estatuários italianos, quer da Legação Imperial. [...].
*
(p.19-verso)
Ata da Sessão em 7 de Fevereiro de 1885 [compra de quadros] [...] O Snr.
Diretor expõe que [...] para haver uma base para discussão, nomeou uma Comissão
composta dos professores Victor, Dr. Américo, e Mafra, afim de que ela
indicasse quais os quadros que deveriam comprar; mas que informado que a Comissão
não podia chegar a acordo, ele Diretor convidava cada um [Diretor é Tolentino]
dos membros dela a dar “parecer” separado, [...]: é lido, primeiro, o “parecer”
do professor Mafra, o qual conclui dizendo que, não se podendo comprar com a
quantia de (p.20) oito contos duzentos e oitenta e nove mil duzentos e oitenta
e oito reis (8:289$288 r) os quadros mais dignos pelo seu merecimento,
incluindo os dos Srs. professores Victor Meirelles e Américo, é de parecer que,
ou se represente ao Governo neste sentido, ou resolva a Congregação que não
sejam compreendidos na escolha os trabalhos daqueles Srs. professores; o Sr.
Dr. Américo diz que não lavrou “parecer” porque entende que com a pequena
quantia concedida pelo Governo, não se pode fazer uma escolha justa [...]; é
lido então o “parecer” do Sr. professor Victor, o qual, depois de indicar os
motivos da divergência entre os membros da Comissão, conclui oferecendo a
seguinte
“Relação
dos quadros que podem ser comprados pela quantia de 8:289$288r =
Total: 8:289$288
Depois
de longa discussão [...] declararam os Snrs.
Professores Victor, e Dr. Américo que, para superar a perplexidade em que se vê
embaraçada a Congregação, não sejam considerados na ordenada aquisição os
trabalhos que haviam eles exposto. Recebida esta declaração é aprovada sem mais
discussão, a relação de (p.20-verso) quadros que, com seu parecer, apresentara
o Sr. Victor. [...] Academia das Belas Artes, 7 de Fevereiro
de 1885.
*
(p.23) Ata da Sessão em 18 de julho de 1885
[...] Consta o expediente dos seguintes avisos da Secretaria de Estado dos
negócios do Império, a saber: [...]; de 17 de junho, concedendo ao pensionista
Rodolpho Amoêdo a quantia de 6523$000,50, como auxílio para ocorrer às despesas
extraordinárias com (p.23-verso) a execução do quadro representando “Jesus
Cristo em Cafarnaum”; [...]; e de 23 de junho determinando que o Sr. Conso Diretor ouvindo a Congregação ou uma Comissão
especial de professores indique o = quantum = do prêmio pecuniário a que tem
direito o pensionista Rodolpho Bernardelli pelo seu grupo em mármore
representando “Jesus Cristo e a mulher adúltera” [...]. (p.24) [...]. Em
cumprimento do aviso da Secretaria d’Estado dos Negócios do Império de 23 de
junho passado, há pouco lido, consulta o Sr. Conso
Diretor a Congregação sobre o “quantum” do prêmio pecuniário a que tem direito
o pensionista Rodolpho (p.24-verso) Bernardelli; e resolve ela por unanimidade
de votos, e sob proposta dos Snrs. Conselheiro Dr.
Vice-Diretor, e Dr. Motta Maia, que se indique ao Governo a quantia 12 de dous contos de réis (2:000$000). Sobre a compra da cópia da
“Missa de Bolsena” feita em Roma pelo aluno Henrique
Bernardelli, cuja resolução a respeito de preço ficara adiada na sessão
passada, resolve a Congregação por unanimidade de votos, sob proposta do Sr. Conso Dr. Vice-Diretor que, se merecer a aprovação do
Governo se pague a quantia de dous contos de réis
(2:000$000); sendo um conto cento e sessenta mil réis (1:600$000) com a sobra
do produto das entradas na Exposição Geral, e oitocentos e quarenta mil réis
pelo Tesouro Nacional. [...]. Academia das Belas-Artes 18 de julho de 1885.
*
(p.25)
Ata da Sessão de 13 de Outubro de 1885 [Presidência de
Tolentino] [Achando-se reunidos os Conselheiro, à uma hora] o Snr. Conso Diretor abre a sessão. Anunciando-se a chegada de Sua
Majestade o Imperador à Academia, suspendese a
sessão, e a Congregação desce a receber o mesmo Augusto Senhor, o qual se
dirige à sala onde se acham os últimos trabalhos em mármore do ex-pensionista Rodolpho Bernardelli; que são a cópia da
“Vênus de Medicis”, e o grupo “Jesus Cristo e a adúltera”, e depois de as
examinar detidamente conversando com o mesmo Sr. Bernardelli, retira-se,
prometendo voltar à Academia. A Congregação torna à sala superior [...].
*
(p.26-verso)
Ata da Sessão em 24 de Outubro de 1885 [Presidência –
Sr. Conselheiro Diretor (Tolentino), Professores presentes – Maia, Pedro
Américo, Victor Meirelles, José Maria de Medeiros.] [...] O Snr. Conselheiro
Diretor diz que a presente sessão tem por único fim dar posse ao ex-pensionista Rodolpho Bernardelli da Cadeira de
Estatuária de que foi nomeado professor por Decreto de 17 do corrente, [...] [é
introduzido na sala o novo professor]. (p.27) [...] O Snr. Conselheiro Diretor
manifesta ao novo professor o sincero e cordial júbilo de que se acha possuída
toda a Congregação recebendo em seu seio o dileto aluno que sempre honrou a
Academia não só pela sua excelente e exemplar conduta, mas também pelos seus
constantes progressos no estudo da difícil arte estatuária a que atingiu um
talento notável [...]; termina dando-lhe um abraço fraternal em que é
acompanhado por todos os professores presentes. Então o Sr. Conselheiro Diretor
declara encerrada a sessão e desce com todos os Snrs.
Professores à sala onde se acham expostos os trabalhos do Sr. Bernardelli; e aí
apresenta aos alunos o jovem professor, que é recebido em estrondosa ovação,
com música, flores e palmas por todos os alunos da Academia e do Conservatório
de Música; e obtida permissão do Conselheiro Diretor, um dos alunos da Academia
em nome de seus colegas, lhe dirige um discurso congratulatório, e oferece um
ramo de flores.
Academia
das Belas Artes; 24 de Outubro de 1885.