UMA MARIANNE NEGRA NO BRASIL DE JEAN BAPTISTE DEBRET?

Heloisa Pires Lima (Pinacoteca do Estado de São Paulo)

Resumo: Uma das imagens que compõem o retrato social disponível na obra Voyage pittoresque et historique au Brésil ou Séjour d'un artiste français au Brésil, depuis 1816 jusqu'en 1831 inclusivement (1834-1839) será o foco desta exposição. Trata-se da mulher negra na estampa Pano de Boca... (nº 49-vol. 3)[1].

Posicionada à esquerda do leitor da cena, a figura lembra o protótipo Marianne, símbolo da República francesa. A associação se deve, especialmente, ao adorno de cabeça. Seria um bonnet phrygien[2]? Na França, a peça significando Liberdade foi código de adesão ao novo regime durante a Revolução (1789) e presença na indumentária da alegoria feminina nacional. Numa perspectiva antropológica, a representação dos habitantes negros no livro referido fornece elementos para discutir a aproximação, ou não, ao ícone francês.

A imagem, isolada neste instante, é parte de um conjunto mais extenso de 155 estampas a identificar certo Brasil sob a autoridade de Jean Baptiste Debret que assina o título Oitocentista. Todavia, muitas das cenas, sobretudo as que se servem de figuras negras, permanecem assíduas a narrar o passado para os nossos dias. Esta presença impregnada de atemporalidade desafia para o seu inverso, ou seja, o contexto original da produção. Como o material resguarda uma rica memória da sociedade francesa acerca da brasileira, propomos o cotejo entre representações de Mariannes daquela época e a imagem recolhida na lógica interna do compêndio. Recuperar sentidos nativos visa contribuir para o debate a respeito de processos identitários elaborados no relacionamento França-Brasil do Oitocentos. Sobretudo, por meio dos livros de viagem.

Palavras-chave:

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[1] A tela (1822) saúda a coroação de d. Pedro I que dá continuidade ao regime monarquista na América.

[2] Simbolizando a Liberdade, foi código de adesão ao novo regime durante a Revolução (1789) sendo indumentária da figura alegórica de mulher que representa a República francesa. Bonnet da Liberdade, vermelho ou frígio são nomeações que acompanham polêmicas em relação a sua origem na Antiguidade.