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PEDRO AMÉRICO (Areia, Paraíba 1843 - Florença, Itália 1905) Por Vladimir Machado Uma brevíssima nota autobiográfica, em carta enviada por Pedro Américo ao Barão do Rio Branco, o qual iniciava a colaborar no governo de Rodrigues Alves, em 1902: [...] Como o presidente da Nação [Rodrigues Alves], talvez não me conheça, o Barão poderá dizer que além de ter emancipado a pintura brasileira compondo os grandes painéis de Campo Grande, Avahí, Proclamação da Independência e muitíssimos outros (entre os quais a grande alegoria - Pax et Concordia - que apenas esboçada foi exposta em Paris) sou autor de uns 12 ou 14 trabalhos literários de História, Filosofia Natural, Belas Artes, Romances, Discursos etc; que no passado regime fui grande dignatário da Rosa (sem falar de outras recompensas estrangeiras); e ainda no atual, fui membro da Constituinte e deputado pela Paraíba. Não representei em política papel saliente; porém a coleção dos meus discursos prova, que muito trabalhei nessa nova e alta atmosfera, embora sem entrar nas lutas partidárias e todo preocupado da ciência, da literatura, do teatro Nacional e das Belas Artes [...]. Carta ao Barão do Rio Branco. Florença, 25 de Novembro de 1902 (Arquivo do Itamaraty, L.-812, M-4. P-14) O principal biógrafo de Pedro Américo foi o escritor Luis Guimarães Jr. que escreveu um livro de bolso sobre o artista, editado por H. Brown e J. de Almeida em 1871. Este livro foi a fonte da qual se serviram os seus biógrafos posteriores. A biografia precoce fazia parte de uma campanha publicitária em jornais liberais e republicanos, inédita no Brasil, para construir a imagem de Pedro Américo como o novo gênio nacional, o criador de uma 'nova escola de pintura brasileira'. O livro foi enviado às principais redações dos jornais por todo o Brasil, em Lisboa e para o jornal 'Novo Mundo' editado em Nova York desde 1870, em língua portuguesa. A trajetória do artista é fascinante. Era tido como uma criança prodígio por desenhar com perfeição. Aos nove anos foi contratado pelo naturalista francês Brunet, para fazer os desenhos científicos da flora nordestina. Aos onze anos era enviado ao Rio de Janeiro para estudar no Colégio Pedro II. Em 1854, aos treze anos, entrava para a Academia Imperial de Belas Artes, em um momento de grandes mudanças. A Reforma Pedreira de 1855, conduzida por Araújo Porto-Alegre na Academia Imperial, consistia em uma reatualização radical dos objetivos da Missão Francesa de 1816: as belas artes aplicadas aos ofícios. Pedro Américo, matriculou-se somente no curso de desenho Industrial onde nos concursos anuais da Academia, ganhou várias medalhas em desenho, geometria e modelo-vivo. Em 1859, antes de terminar o curso, conseguiu uma pequena quantia de 400 francos da verba particular do Imperador para custear bolsas na Europa. O adolescente Pedro Américo chegava à Paris em meio ao amplo debate cultural da época, com a célebre crítica do poeta Baudelaire ao Salon de 1859, sobre se a fotografia devia ser considerada obra de arte ou não. Pedro Américo era a favor da fotografia e da arte aplicada à industria, e por extensão, radicalmente contrário aos métodos das academias neoclássicas. Ele não fez os concursos máximos dos acadêmicos para viajar à Roma e considerava os premiados do Salon, um 'pálido reflexo' da civilização. Em1862 viajou à Bélgica, onde a pintura de história havia se modernizado com o uso de fotografias como modelo. Em 1863, manifestou-se publicamente a favor das reformas de Napoleão III e visitou o Salão dos Recusados, considerado um divisor de águas do modernismo iniciante, onde estava exposto a pintura Almoço na relva de Édouard Manet (1832-1883). Pedro Américo pintou um sensual nú segundo as novas tendências artísticas vistas em Paris, cujo título era A Carioca. Para pintar o rosto, usou como modelo uma fotografia da esposa de um funcionário do consulado brasileiro, em Paris. Ao retornar ao Brasil em 1864, o artista ofereceu a obra ao imperador, que a recusou por considera-la 'licenciosa'. A pintura causou escândalo e uma grande polêmica artística,quando exposta na Exposição Geral da Academia Imperial em 1865. Pedro Américo fez o Concurso público e passou a lecionar na Academia Imperial, no Curso de Desenho Industrial e não no Curso de Pintura de História. Em 1866 o pintor viajou à Europa e em 1868 defendia tese na Universidade Livre do Partido Liberal, na Bélgica. Em 1869 com o título de doutor em Ciências, retornou ao Brasil e em 1870, inaugurou as 'conferências públicas' a partir das aulas de História da Arte e Estética professada na Academia pela primeira vez no Brasil e iniciava a sua primeira pintura de história. Modernizou a Pintura de História brasileira, usando amplamente a fotografia como modelo nos retratos, uniformes e animais tanto na Batalha de Campo Grande (1870-71) quanto na Batalha do Avahí (1875-76) sobre a guerra do Paraguai, sempre com debates calorosos na imprensa. Famoso desde os 20 anos, Pedro Américo iniciou uma série de projetos, que incluía desde um jornal satírico 'A Comédia Social', ilustrado por ele e colaboradores, romances de costumes, retratos, até as pinturas de história dos grandes temas da época: a abolição da escravatura, os episódios da guerra do Paraguai e a memória da independência com O Brado do Ypiranga (1888). Em 1885, recebeu o título máximo de Grande Dignatário do Império o que, por ser um liberal, não o impediu, na República, de pintar imagens emblemáticas da nova ordem: Pax et Concórdia e Tiradentes esquartejado. Além disso, Pedro Américo foi eleito deputado pela Paraíba atuando na primeira Constituinte. Defendia com brilhantismo as artes, o teatro nacional, a criação de um Museu Nacional de Belas Artes, separado da Escola Nacional de Belas Artes, criado em 1937, com a maior parte do acervo de arte da Escola. Foi dele a ardorosa defesa da idéia (desde a Conjuração Mineira de 1789) de mudar a capital do Rio de Janeiro para o centro do país, só realizada em 1960 com a inauguração de Brasília, pelo Presidente mineiro Juscelino Kubitschek. As pinturas vendidas, lhe renderam boas economias que foram aplicadas em ações das 'sólidas e confiáveis empresas promovidas pelo novo regime republicano. Entre 1890 e 1892, houve a escandalosa fraude especulativa no mercado de ações, chamado 'encilhamento', o maior desastre financeiro jamais visto, uma espécie de versão brasileira antecipada do 'crack' da Bolsa de Valores de N.York, em 1929. Arruinado da noite para o dia, o artista se encontrava pobre. Residindo em Florença, cansado e amargurado, Pedro Américo agonizava com os tormentos que sofria desde os 16 anos com a doença do beribéri (ausência de vitamina B no organismo), e terminava a vida de maneira trágica para um pintor: estava quase cego. O artista viria a falecer aos 62 anos de idade, em 7 de outubro de 1905. Seu corpo foi transportado ao Brasil e homenageado no Rio de Janeiro e na Paraíba por autoridades, artistas e um grande público emocionado. Está enterrado em Areia, sua bela terra natal, na Serra da Borborema, onde hoje existe um pequeno monumento em sua homenagem. A sua casa foi transformada pelo Padre Ruy Vieira, na Casa Museu Pedro Américo. Suas pinturas, conservadas em museus importantes e reproduzidas nos milhares de livros didáticos, como documentos visuais da história do Brasil, fazem parte até hoje do imaginário da maioria dos brasileiros escolarizados. Fonte: MACHADO, Vladimir. 1871: A fotografia na pintura da Batalha de Campo Grande de Pedro Américo. Rio de Janeiro, 2006, v-vi (edição do autor). * Veja mais sobre Pedro Américo em DezenoveVinte |