Monumento à Independência: uma obra de Bibiano Silva em Natal (RN)

Fabíola Cristina Alves

ALVES, Fabíola Cristina. Monumento à Independência: uma obra de Bibiano Silva em Natal (RN). 19&20, Rio de Janeiro, v. XVI, n. 2, jul.-dez. 2021. https://doi.org/10.52913/19e20.xvi2.05

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O 1º Centenário da Independência e contexto norte-rio-grandense 

1.     A Independência do Brasil ocorreu no ano de 1822, e o dia 7 de setembro foi estabelecido como o dia do grito “Independência ou Morte” proclamado por Dom Pedro I, quando foi instituído o Brasil Império. Sabe-se que a estrutura e os processos políticos que provocaram a separação do país com relação a Portugal são mais complexos.[1] Contudo, neste estudo,[2] destaca-se a eleição dessa data como marco que celebra esse evento da história nacional. No primeiro centenário da Independência do Brasil, o Império já era passado e o país vivia a experiência da República. Doravante, foi dentro das intenções do novo regime que as comemorações do centenário foram concedidas.

2.     A relação entre a memória imperial e republicana obteve então aproximações e afastamentos. O historiador José Murilo de Carvalho sugere que, no contexto inicial do novo regime político, uma nova visualidade foi requerida para fortalecer uma identidade nacional ligada ao imaginário republicano.[3] Essa nova visualidade era imprescindível para a afirmação do novo regime. Para tanto, as artes foram fundamentais nesse processo, assim, a eleição da memória da Independência Nacional, embora fosse um evento ligado à história imperial, igualmente, foi incluído no repertório da nova visualidade em construção como parte de uma visão que destacava eventos históricos que abriram os caminhos à Proclamação da República. O historiador Carlos Rogério Lima Júnior (2020) na tese Marianne à brasileira - Imagens republicanas e os dilemas do passado imperial destaca, justamente, a sobrevivência de referenciais do antigo regime político na esfera da nova visualidade desejada pelo governo republicano, configurando “(re)significações de modelos do passado que pudessem atender ao presente.”[4] Ademais, observa-se que

3.                                   No início do século XX, intelectuais e políticos brasileiros situados nas maiores cidades do país, como Rio, São Paulo, Salvador e Recife, estavam empenhados na construção de versões narrativas que fixassem a primazia de seus estados na liderança da construção de uma identidade nacional. Estava também em pauta a reformulação da memória política, agora pautada em valores republicanos, tendo em vista que em 1889 a Monarquia havia sido deposta por militares e a República fora instalada como regime.[5]  

4.     Nesse escopo, ocorreu um movimento nacional em comemoração ao 1º Centenário da Independência. Celebrações foram realizadas em todo o território nacional, festividades populares e monumentos foram erguidos com o objetivo de dar visibilidade aos heróis nacionais e locais, bem como aos eventos históricos dentro da composição de uma narrativa que colaborasse para com a construção de uma identidade nacional. Valéria Salgueiro explica que, durante a 1ª República, os governos estaduais promoveram a produção artística ligada à nova visualidade que estava em construção, sobretudo através de encomendas públicas, as quais elegeram temas que pudessem promover uma identidade regional integrada ao imaginário nacional.[6] Esse movimento ganhou significativa dimensão no ano das celebrações do 1º Centenário da Independência. No contexto paulista, por exemplo, destaca-se a formação de um acervo especial para o Museu Paulista a partir de um programa iconográfico elaborado por Affonso d'Escragnolle Taunay, além do concurso internacional para a seleção e criação do Monumento da Independência Nacional, executado pelo artista vencedor Ettore Ximenes.[7] 

5.     Seguindo a tendência nacional, as lideranças do Estado do Rio Grande Norte e sua sociedade procuraram igualmente honrar a memória nacional com celebrações locais:

6.                                   Nesse processo de construção da memória republicana na cidade de Natal, uma experiência assinala o surgimento de um novo sentido: a construção da praça Sete de Setembro e do Monumento da Independência para os festejos do Centenário da Independência do país. A praça e seu monumento, construídos em frente ao Palácio do Governo, assinalam o compromisso da elite dirigente local com o regime federativo [...].[8]  

7.     Nota-se que a cidade de Natal passou por um processo de modernização ao longo da primeira metade do século XX, incluindo, reformas urbanas, construção de edifícios e a criação de espaços públicos para o lazer e a sociabilidade da população, como, por exemplo, a referida Praça Sete de Setembro [Figura 1].

8.     As celebrações no Rio Grande do Norte foram promovidas pelo governador do período, o Senhor Antônio José de Melo e Sousa, contando com a colaboração do Instituto Histórico Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN) e de membros da elite natalense da época. Considerando os recursos disponíveis do Estado, foram realizados festejos na cidade de Natal e nas cidades do interior durante toda a semana comemorativa do centenário, foi quando o Monumento à Independência da autoria do escultor Bibiano da Silva foi inaugurado na praça Sete de Setembro na capital do Estado [Figura 2, Figura 3 e Figura 4]. Nas palavras do governador: “[...] o Rio Grande do Norte celebrou com regozijo o primeiro centenario da Independencia Nacional. Da capital ás fronteiras, conforme os meios materiais de que dispunhamos, todos festejámos com egual ardor o dia 7 de setembro.[9]   

9.     O governador Antônio José de Melo e Sousa expressou essas palavras no discurso proclamado junto ao Congresso Legislativo em novembro de 1922, no qual relatou a participação de vários grupos sociais nas comemorações cívicas. Sua fala destacou os esforços locais para dar o valor simbólico necessário ao evento comemorativo, embora, os recursos financeiros do Estado fossem modestos. Durante o discurso, o governador enalteceu as comemorações locais e a participação de todas as classes sociais na demonstração de um sentimento nacionalista, destacando os heróis norte-rio-grandenses que fazem parte da história:  

10.                                 A magistratura, o clero, os representantes do exercito e da marinha nacionaes nesta capital, as forças estaduaes, as escolas, o magisterio, o commercio, o operario, a industria, a imprensa, o funcionalismo, as corporações mais diversas, todos collaboram com enthusiasmo nessas manifestações de patriotismo. E si quizerdes que vos aponte um exemplo desse enthusiasmo, em que todos se harmonizaram e nivelaram para honrar a Patria, honrando-se a si próprios, ahi tendes essa admiravel jornada, quasi inacreditavel pela grandeza do heroismo, de pobre pescadores, sem nenhum interesse de qualquer natureza, indo levar á metropole, nos seus frageis barcos de trabalho quotidiano, a mil e tresentas milhas de distancia, sobre mares para elles desconhecidos, sem auxilio de navios para os perigos maiores, sem bussola e tambem sem trombetas nem preconicios, indo levar ou indo lembrar á capitas cheio de festas, de luzes e de grandezas o nome do pequeno, mas intemerato Rio Grande do Norte, onde se soffre, mas onde se sabe, desde Miguelinho e Augusto Severo, dar a vida para engrandecer a Patria.[10] 

11.   Nesse discurso, Antônio José de Melo e Sousa também informa dados sobre a encomenda do monumento erguido na Praça Sete de Setembro e a escolha de Bibiano da Silva, artista que vivia e atuava na capital do Estado vizinho de Pernambuco, a cidade de Recife.

12.                                 Embora um tanto receioso, pela deficiencia das rendas no ultimo anno, - de algum modo podendo contraindicar despesas, que a outros talvez parecessem dispensaveis, - procurei desde logo obter propostas de nossos meios, alem da belleza, désse a expressão symbolica do grande facto a commemorar. Depois de varias indagações e algumas propostas que, ou não exprimiam, com sufficiente vigor e propriedade, aquillo que estava no nosso animo, ou excediam de muito aquelles meios, escolhi o esboço de um talentoso esculptor nacional, Bibiano Silva, que se promptificou a vir, como effectivamente veio, a esta capital apresentar o seu projecto. Feitas pequenas modificações, foi este approvado, assignando o artista contracto para entregar o monumento prompto no dia 7 de setembro. pela quantia de 45:000 $, posteriormente elevada a 49:250 $ pela encommenda de tres placas votivas sotopostas aos medalhões de Miguelinho, José Bonifacio e Pedro I, e augmento da altura do pedestal. O monumento ahi está, na sua luminosa e expressiva allegoria, para dizer aos vindouros o pensamento e o sentimento do Rio Grande do Norte em 1922.[11]

13.   A elaboração de um monumento pelas mãos de uma artista da região do Nordeste também significou a valorização da produção artística regional. Vale notar que Bibiano da Silva possuía à época notória representatividade regional no contexto nacional, tendo participado do concurso internacional para seleção do Monumento da Independência do Brasil no contexto paulista,[12] um dos mais célebres do período.  Sobre o concurso internacional para esse monumento nacional erguido na cidade de São Paulo, no marco da proclamação da Independência, Michelli Cristine Scapol Monteiro explica: “Foram apresentados à Comissão do Concurso 27 projetos, dos quais [...] somente seis eram provenientes do Brasil. Um deles era o do escultor pernambucano Bibiano Silva. os demais eram de provenientes de São Paulo e, em todos eles, havia a participação de pelo menos um artista imigrante já fixado no Brasil.[13]  

14.   Além disso, Bibiano da Silva foi no período considerado pela imprensa da época o único concorrente realmente brasileiro, tanto por ser natural de Pernambuco quanto por ser discípulo de Rodolfo Bernardelli.[14] Destaca-se que o escultor pernambucano “apresentou projeto para o concurso para a execução do Monumento do Ipiranga, em São Paulo, onde foi classificado em 3º lugar.”[15]  Embora Bibiano da Silva não tenha vencido esse grande concurso internacional, a boa classificação repercutiu nacionalmente, sobretudo, no contexto do nordeste brasileiro. Nesse sentido, a contração desse escultor para a produção do Monumento à Independência em Natal, apesar dos modestos recursos do Estado - como informou o governador no discurso mencionado - foi uma valorosa expressão para o fomento à produção artística regional considerando a visibilidade nacional deste artista. Doravante, significou uma escolha qualificada de um monumento dedicado à celebração e um digno presente à população norte-rio-grandense. 

Bibiano Silva: um escultor no Nordeste e o Monumento à Independência em Natal

15.   Bibiano Antão da Silva (1889-1969) foi um escultor pernambucano que atuou no contexto brasileiro, sobretudo, na região do Nordeste. Ele estudou na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro (ENBA), onde foi aluno de Rodolfo Bernardelli, com quem manteve trocas de correspondências e apreço.[16] Ele viveu em Recife e trabalhou como escultor, atuando no contexto das encomendas públicas e participando de diversos salões na época, inclusive das Exposições Gerais promovidas pela ENBA no Rio de Janeiro.[17] No caso do mercado estatal, Bibiano da Silva atuou, sobretudo, com a produção e criação de monumentos ligados à celebração de eventos históricos e à homenagem de homens ilustres da história nacional e regional.

16.                                 É autor de todos os grupos que figuram na fachada do Palácio da Justiça, em Recife, como também do busto do Presidente Getúlio Vargas (1934), sendo o único escultor para quem o presidente pousou. Entre muitos trabalhos é autor da figura “Libertus” com que concorreu a prêmio de viagem [sic]. Tem várias medalhas de ouro e de prata adquiridas em vários salões. É autor de diversos bustos, inclusive o do Ministro Valdemar Falcão, encomenda do Governo do Ceará, para ser colocado em uma das praças de Fortaleza.[18]

17.   Além de trabalhar como artista, Bibiano da Silva também exerceu a docência em colégios e escolas profissionais na cidade de Recife e na Escola de Belas Artes de Pernambuco (EBAP), fundada em 1932, tendo experienciado a gestão desta por um curto período.[19] Nota-se que o escultor também foi um dos artistas mentores responsáveis pela criação da referida escola pioneira na formação profissional do artista no contexto pernambucano. Essa instituição de formação destinada aos jovens naturais de Recifeb obteve impacto local e regional, pois também acolheu jovens aspirantes pela profissionalização artística oriundos das cidades vizinhas da capital pernambucana e de outros Estados da região do Nordeste.

18.   As obras de Bibiano da Silva estão localizadas nos Estados do Pará, Piauí, Maranhão, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Rio de Janeiro e Pernambuco, sendo neste último que onde encontramos a maior parte da produção do artista.[20] Em Natal, o Monumento à Independência apresenta claro diálogo entre os modelos artísticos do estilo Neoclássico e do Romantismo à brasileira, expresso no Indianismo. Na composição central do monumento, vemos duas figuras humanas uma alegoria, representada por uma mulher à moda clássica, configurando dignidade à imagem,[21] e uma figura heroica, encarnada no corpo masculino.

19.   Existem duas leituras acerca da representação simbólica dessas figuras. Segundo Michelli Cristine Scapol Monteiro,

20.                                 No Rio Grande do Norte, o escultor Bibiano da Silva realizou o Monumento à Independência, inaugurado em 1922, na praça sete de Setembro, em Natal. A obra possui placas em que se destacam Dom Pedro I e José Bonifácio e também Frei Miguelinho, um dos revolucionários pernambucanos de 1817, nascido em Natal, além de Antônio José de Melo e Souza, presidente daquele Estado entre 1920 e 1924. No topo, uma alegoria da República recebe um potiguar com um ramo na mão, simbolizando a integração do Estado à República Brasileira.[22]  

21.   Porém, para Helder Nascimento Viana:

22.                                 Fincado sobre um pedestal de granito no centro da praça, o monumento tinha como eixo duas figuras simbólicas: uma feminina, representando a Pátria; a outra masculina, representando o Povo. A Pátria, apontando para o Livro da História apoiado sobre um bloco de granito, indica as duas grandes datas que não se devem esquecer, o 7 de setembro de 1822, data da independência nacional, e o 7 de setembro de 1922, data da comemoração do centenário dessa independência. No bloco de granito que apoia o livro está gravado o escudo do Estado. O Povo aparece dirigindo-se à Pátria e oferecendo-lhe um ramo de louro. O louro simboliza a vitória e a paz conquistadas no país, conquistas estas garantidas pela força que a espada representa.[23] 

23.   Embora a identidade simbólica das figuras seja distinta para os autores, ambas são próximas, pois a alegoria da República faz menção à Pátria, assim como a representação do Povo em relação ao índio potiguar, o nativo que simboliza a origem da população norte-rio-grandense. Além disso, o monumento possui outras características e detalhes que expressam os valores republicanos do período. 

24.                                 Todo esse conjunto escultórico repousa sobre um pedestal de base quadrangular com 2,60 metros, com três degraus. Nas quatro faces desse pedestal se encontram quatro medalhões de bronze, sendo um deles dedicado ao Padre Miguelinho, com a inscrição “7 de setembro de 1822 – 7 de setembro de 1922. O Primeiro Centenário da Independência da Pátria. Aos que trabalharam e a fizeram”; e outro destinado ao Imperador Dom Pedro I. Na base do monumento aparecem gravadas as seguintes inscrições latinas: “Potyguarensium genus / Duras naturae vices perferendo / Fortins factum / Et filiórum robere fultum, / Erit semper termis sed indefessus / Patriae unitatis et magnifudinis / Factor…”

25.                                 Desenhos ornamentais espalham-se por toda a peça, simbolizando qualidades profundas do republicanismo, como a palma, símbolo do martírio; a oliveira, denotando o sacrifício; e o carvalho, representando a fortaleza.[24]

26.   O monumento marcou a celebração do 1º Centenário da Independência no território do Estado do Rio Grande do Norte, confrontando homens ilustres da história nacional e afirmando os heróis locais, sobretudo, no caso do retrato do Padre Miguelinho em um dos medalhões de bronze. Todavia, é ainda nas inscrições latinas e nos detalhes dos desenhos ornamentais que a força e a luta do cidadão do Estado norte-rio-grandense são engrandecidos. O monumento também apresentava expressões latinas que reforçavam o sentimento nacionalista corrente no contexto da obra. Essas podem ser assim traduzidas: 

27.                                 O Rio Grande do Norte fortalecido pela luta contra a natureza e amparado pelo vigor dos seus filhos, será sempre um pequeno, mas incansável operário da união e da grandeza da Pátria.

28.                                 [...]

29.                                 Sejam quais forem os seus cuidados, quer o infortúnio te atormente, quer a felicidade te eleve, terás sempre a Pátria entre os olhos: por ela darás a tua inteligência, as tuas forças e até a vida.[25] 

30.   Além dos sentidos nacionalistas destacados nas palavras grafadas em latim em diálogo com os medalhões de bronzes, percebe-se que o Monumento à Independência realizado por Bibiano da Silva foi concebido com os atributos esperados em relação ao simbolismo e aos modelos artísticos que circulavam à época, cumprindo, portanto, a função almejada de rememorar e marcar a participação norte-rio-grandense na festa nacional em prol do 1º Centenário da Independência Nacional. Contudo, apesar do valor histórico, artístico e patrimonial do monumento, este encontra-se atualmente com sua integridade parcialmente comprometida com a ausência dos medalhões e das placas [Figura 5a, Figura 5b e Figura 5c], carecendo de uma política de preservação e salvaguarda mais eficaz.

Considerações finais 

31.   Nosso estudo vem colaborando com o mapeamento de artistas que trabalharam no contexto nordestino no século XIX e início do XX, dando visibilidade às obras de arte localizadas no Estado do Rio Grande do Norte. Embora a investigação em curso enfrente os desafios da pesquisa no modelo remoto,[26] o qual impossibilita a busca por fontes em arquivos físicos que possam expandir a leitura, essas são almejadas e deverão ser incluídas de forma mais analítica no futuro.

32.   Apesar do desafio aqui mencionado, considera-se que o estudo é uma amostra das relações de trânsito de artistas no contexto nordestino do período e, sobretudo, das relações entre Recife (PE) e Natal (RN) e do estímulo à produção artística regional pela iniciativa do governo norte-rio-grandense em promover encomendas públicas, inclusive, observando a necessidade de uma participação ativa do Estado nas celebrações do 1º Centenário da Independência, evento ocorrido em consonância com as ideias e valores que circulavam na época do início da República Velha. Ademais, nota-se que a mentalidade do governo da época desejou 

33.                                 [...] essencialmente na erecção de um modesto mas expressivo monumento, que ficasse para attestar aos posteros o sentir do nosso tempo, e festas populares, em que a nossa gente pudesse expandir o seu regosijo, elevando o coração á Pátria e esquecendo assim, nalgumas dias rapidos, as contingencias da vida ordinaria. Aquelles, que aqui viveram a semana Commemorativa, certificarão si o conseguimos.[27]  

34.   Assim, entende-se que o Monumento à Independência da autoria de Bibiano da Silva é uma produção artística que carrega consigo a tarefa de expressar o nacionalismo entrelaçado à uma visão regionalista do evento comemorado e festejado.[28] É, portanto, fruto de um contexto específico da história do Brasil, o qual interferiu nas diretrizes da produção artística do escultor. Igualmente, considera-se que o mercado estatal do contexto priorizou a criação desse monumento localizado na capital Natal, estando envolto em estruturas políticas e simbólicas de um movimento mais abrangente de construção de uma identidade nacional construída com a participação de todos os Estados, unificados e singulares na sua participação na história do país. Esse sentido é destacado na presença de toda a composição do monumento, porém, principalmente nas expressões latinas que destacam o orgulho da população norte-rio-grandense da época e na eleição de personagens históricos nascidos no Estado, como no medalhão de bronze que retrata o Padre Miguelinho. Dessa forma, o monumento expressou, no contexto das celebrações do 1º Centenário da Independência, o sentimento de pertencimento nacional e local para a sociedade do período, estratégia política recorrente em períodos de afirmação de regimes políticos.

Referências bibliográficas 

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[1] Sobre o assunto, ver: COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo: Unesp, 2010.

[2] Este artigo é um estudo preliminar desenvolvido dentro do Projeto de Pesquisa “Pensar imagens: Cultura Visual e História das Artes Visuais no Rio Grande do Norte” (Processo 18598-2021), na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), coordenado e executado pela profa. Fabíola Cristina Alves.

[3] CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas. O imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.

[4] LIMA JUNIOR, Carlos Rogerio. Marianne à brasileira: imagens republicanas e os dilemas do passado imperial. 2020. Tese (Doutorado em Estética e História da Arte) - Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020, p. 43.

[5] MONTEIRO, Michelli Cristine Scapol. Mercado e Consagração: o Concurso Internacional do Monumento à Independência do Brasil. H-ART. Revista de historia, teoría y crítica de arte, n. 4 (2019), p. 84. Disponível em: http://dx.doi.org/10.25025/hart04.2019.05 Acesso em: 14 ago. 2021.

[6] SALGUEIRO, Valéria. De Pedra e Bronze: um estudo sobre monumentos. O Monumento a Benjamin Constant. Niterói: EdUFF, 2008.

[7] O monumento foi inaugurado em 1922, porém incompleto. A conclusão ocorreu em 1926.

[8] VIANA, H. do N. A construção do espaço cívico: monumentos e rituais de memória na Natal republicana (1902-1922). Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, [S. l.], v. 27, p. 1-44, 2019, p 22. DOI: 10.1590/1982-02672019v27e07. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/anaismp/article/view/138800 Acesso em: 14 ago. 14.

[9] RIO Grande do Norte. Mensagem lida perante o Congresso Legislativo na abertura da Segunda Sessão da Undecima Legislativa em 1º de novembro de 1922, pelo governador Antonio J. de Melo e Souza. Typ. Commercial - J. Pinto & C. - Natal. Foi mantida a ortografia original. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/873330/2788 Acesso: 5 jul. 2021.

[10] Idem.

[11] Idem.

[12] Concurso vencido por Ettore Ximenes. O Monumento à Independência Nacional foi erguido no local onde foi proclamada a independência do Brasil por Dom Pedro I, no Ipiranga, São Paulo/SP.

[13] MONTEIRO, Michelli Cristine Scapol. São Paulo na disputa pelo passado: o Monumento à Independência, de Ettore Ximenes. Tese (Doutorado em História e Fundamentos da Arquitetura e do Urbanismo) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017, p. 104.

[14] Idem, p. 142.

[15] TORRES, Niedja Ferreira dos Santos. O ensino de desenho na Escola de Belas Artes de Pernambuco (1932 a 1946). Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) - Centro de Artes e Comunicação, Universidade de Pernambuco, Recife, 2015, p. 109. No estudo desenvolvido por Niedja Torres (2015) não é mencionado o nome da exposição na qual a obra “Libertus” concorreu ao prêmio. Sabe-se que Bibiano Silva concorreu ao Prêmio de Viagem na Exposição Geral de Belas do Rio de Janeiro. Contudo, segundo dados divulgados pelo Diário da Manhã de Recife em 10 ago. 1934, o artista participou do concurso apresentando um trabalho inspirado na novela de Franklin Tavora. A obra de Bibiano Silva recebeu o título “O cabeleira”. Ver: http://memoria.bn.br/DocReader/893722_02/15063

[16] Informações disponíveis em: http://bibianosilva.org/bibiano_pt/ Acesso em: 14 ago. 2021.

[17] Informação disponível em: http://www.dezenovevinte.net/egba/index.php?title=Especial:Páginas_afluentes/Bibiano_Silva Acesso em: 2021-08-10. Observa-se que o original em gesso do Monumento à Independência realizado para o projeto da cidade de Natal foi apreciado pelo público no Salão do Centenário. Ver: Illustração Brasileira, Rio de Janeiro, jan. 1923, n/p. disponível em: http://www.dezenovevinte.net/egba/index.php?title=CREMONA%2C_Ercole._O_Sal%C3%A3o_do_Centen%C3%A1rio._Illustra%C3%A7%C3%A3o_Brasileira%2C_ano_IV%2C_n._29%2C_jan._1923%2C_n/p.  Acesso em: 2021-08-12.

[18] TORRES, Niedja Ferreira dos Santos. O ensino de desenho na Escola de Belas Artes de Pernambuco (1932 a 1946). Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) - Centro de Artes e Comunicação, Universidade de Pernambuco, Recife, 2015, p. 109.

[19] Idem, p. 49.

[20] Informações disponíveis em: http://bibianosilva.org/bibiano_pt/ Acesso em: 14 ago. 2021.

[21] Em sentido semelhante ao pensado pelo historiador Peter Burke. Ver: BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Trad. Vera Maria Xavier dos Santos. São Paulo: Editora Unesp, 2017, p. 107.

[22] MONTEIRO, 2017, p. 18.

[23] VIANA, 2019, p 23.

[24] Idem.

[25] ONOFRE JR, Manoel. Monumento. Cidade de Natal (I). Jornal O Poti, 1981. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/031151_04/2351 Acesso: 13 set. 2021.

[26] Em função do contexto pandêmico referente à Covid 19.

[27] RIO Grande do Norte. Mensagem lida perante o Congresso Legislativo na abertura da Segunda Sessão da Undecima Legislativa em 1º de novembro de 1922, pelo governador Antonio J. de Melo e Souza. Typ. Commercial - J. Pinto & C. - Natal. Foi mantida a ortografia original. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/873330/2788 Acesso: 5 jul. 2021.

[28] Em sentido semelhante ao tratado por Burke quando ele discute o tema “Imagens de Ideias”. Ver:  BURKE, 2017, p.95-103.