Monumento à Independência: uma obra de Bibiano Silva em Natal
(RN)
Fabíola
Cristina Alves
ALVES, Fabíola Cristina. Monumento à
Independência: uma obra de Bibiano Silva em Natal (RN). 19&20, Rio de Janeiro, v.
XVI, n. 2, jul.-dez. 2021. https://doi.org/10.52913/19e20.xvi2.05
*
* *
O 1º Centenário da
Independência e contexto norte-rio-grandense
1. A
Independência do Brasil ocorreu no ano de 1822, e o dia 7 de setembro foi
estabelecido como o dia do grito “Independência ou Morte” proclamado por Dom
Pedro I, quando foi instituído o Brasil Império. Sabe-se que a estrutura e os
processos políticos que provocaram a separação do país com relação a Portugal
são mais complexos.[1]
Contudo, neste estudo,[2]
destaca-se a eleição dessa data como marco que celebra esse evento da história
nacional. No primeiro centenário da Independência do Brasil, o Império já era
passado e o país vivia a experiência da República. Doravante, foi dentro das
intenções do novo regime que as comemorações do centenário foram concedidas.
2. A
relação entre a memória imperial e republicana obteve então aproximações e
afastamentos. O historiador José Murilo de Carvalho sugere que, no contexto
inicial do novo regime político, uma nova visualidade foi requerida para
fortalecer uma identidade nacional ligada ao imaginário republicano.[3] Essa
nova visualidade era imprescindível para a afirmação do novo regime. Para
tanto, as artes foram fundamentais nesse processo, assim, a eleição da memória
da Independência Nacional, embora fosse um evento ligado à história imperial,
igualmente, foi incluído no repertório da nova visualidade em construção como
parte de uma visão que destacava eventos históricos que abriram os caminhos à
Proclamação da República. O historiador Carlos Rogério Lima Júnior (2020) na
tese Marianne à brasileira - Imagens republicanas e os dilemas do passado
imperial destaca, justamente, a sobrevivência de referenciais do antigo
regime político na esfera da nova visualidade desejada pelo governo
republicano, configurando “(re)significações de modelos do passado que pudessem
atender ao presente.”[4] Ademais, observa-se que
3.
No início do século XX,
intelectuais e políticos brasileiros situados nas maiores cidades do país, como
Rio, São Paulo, Salvador e Recife, estavam empenhados na construção de versões
narrativas que fixassem a primazia de seus estados na liderança da construção
de uma identidade nacional. Estava também em pauta a reformulação da memória
política, agora pautada em valores republicanos, tendo em vista que em 1889 a
Monarquia havia sido deposta por militares e a República fora instalada como
regime.[5]
4. Nesse
escopo, ocorreu um movimento nacional em comemoração ao 1º Centenário da
Independência. Celebrações foram realizadas em todo o território nacional,
festividades populares e monumentos foram erguidos com o objetivo de dar
visibilidade aos heróis nacionais e locais, bem como aos eventos históricos
dentro da composição de uma narrativa que colaborasse para com a construção de
uma identidade nacional. Valéria Salgueiro explica que, durante a 1ª República,
os governos estaduais promoveram a produção artística ligada à nova visualidade
que estava em construção, sobretudo através de encomendas públicas, as quais
elegeram temas que pudessem promover uma identidade regional integrada ao
imaginário nacional.[6] Esse
movimento ganhou significativa dimensão no ano das celebrações do 1º Centenário
da Independência. No contexto paulista, por exemplo, destaca-se a formação de
um acervo especial para o Museu Paulista a partir de um programa iconográfico
elaborado por Affonso d'Escragnolle Taunay, além do concurso internacional para
a seleção e criação do Monumento da Independência Nacional, executado
pelo artista vencedor Ettore Ximenes.[7]
5. Seguindo
a tendência nacional, as lideranças do Estado do Rio Grande Norte e sua
sociedade procuraram igualmente honrar a memória nacional com celebrações
locais:
6.
Nesse processo de
construção da memória republicana na cidade de Natal, uma experiência assinala
o surgimento de um novo sentido: a construção da praça Sete de Setembro e do
Monumento da Independência para os festejos do Centenário da Independência do
país. A praça e seu monumento, construídos em frente ao Palácio do Governo, assinalam
o compromisso da elite dirigente local com o regime federativo [...].[8]
7. Nota-se
que a cidade de Natal passou por um processo de modernização ao longo da
primeira metade do século XX, incluindo, reformas urbanas, construção de
edifícios e a criação de espaços públicos para o lazer e a sociabilidade da
população, como, por exemplo, a referida Praça Sete de Setembro [Figura 1].
8. As
celebrações no Rio Grande do Norte foram promovidas pelo governador do período,
o Senhor Antônio José de Melo e Sousa, contando com a colaboração do Instituto
Histórico Geográfico do Rio Grande do Norte (IHGRN) e de membros da elite
natalense da época. Considerando os recursos disponíveis do Estado, foram
realizados festejos na cidade de Natal e nas cidades do interior durante toda a
semana comemorativa do centenário, foi quando o Monumento à Independência
da autoria do escultor Bibiano da Silva foi inaugurado na praça Sete de Setembro
na capital do Estado [Figura 2, Figura 3 e Figura 4]. Nas palavras do governador: “[...] o Rio
Grande do Norte celebrou com regozijo o primeiro centenario da Independencia
Nacional. Da capital ás fronteiras, conforme os meios materiais de que
dispunhamos, todos festejámos com egual ardor o dia 7 de setembro.”[9]
9. O
governador Antônio José de Melo e Sousa expressou essas palavras no discurso
proclamado junto ao Congresso Legislativo em novembro de 1922, no qual relatou
a participação de vários grupos sociais nas comemorações cívicas. Sua fala
destacou os esforços locais para dar o valor simbólico necessário ao evento
comemorativo, embora, os recursos financeiros do Estado fossem modestos.
Durante o discurso, o governador enalteceu as comemorações locais e a
participação de todas as classes sociais na demonstração de um sentimento
nacionalista, destacando os heróis norte-rio-grandenses que fazem parte da
história:
10.
A magistratura, o clero,
os representantes do exercito e da marinha nacionaes nesta capital, as forças
estaduaes, as escolas, o magisterio, o commercio, o operario, a industria, a
imprensa, o funcionalismo, as corporações mais diversas, todos collaboram com
enthusiasmo nessas manifestações de patriotismo. E si quizerdes que vos aponte
um exemplo desse enthusiasmo, em que todos se harmonizaram e nivelaram para
honrar a Patria, honrando-se a si próprios, ahi tendes essa admiravel jornada,
quasi inacreditavel pela grandeza do heroismo, de pobre pescadores, sem nenhum
interesse de qualquer natureza, indo levar á metropole, nos seus frageis barcos
de trabalho quotidiano, a mil e tresentas milhas de distancia, sobre mares para
elles desconhecidos, sem auxilio de navios para os perigos maiores, sem bussola
e tambem sem trombetas nem preconicios, indo levar ou indo lembrar á capitas
cheio de festas, de luzes e de grandezas o nome do pequeno, mas intemerato Rio
Grande do Norte, onde se soffre, mas onde se sabe, desde Miguelinho e Augusto
Severo, dar a vida para engrandecer a Patria.[10]
11. Nesse
discurso, Antônio José de Melo e Sousa também informa dados sobre a encomenda
do monumento erguido na Praça Sete de Setembro e a escolha de Bibiano da Silva,
artista que vivia e atuava na capital do Estado vizinho de Pernambuco, a cidade
de Recife.
12.
Embora um tanto
receioso, pela deficiencia das rendas no ultimo anno, - de algum modo podendo
contraindicar despesas, que a outros talvez parecessem dispensaveis, - procurei
desde logo obter propostas de nossos meios, alem da belleza, désse a expressão
symbolica do grande facto a commemorar. Depois de varias indagações e algumas
propostas que, ou não exprimiam, com sufficiente vigor e propriedade, aquillo
que estava no nosso animo, ou excediam de muito aquelles meios, escolhi o
esboço de um talentoso esculptor nacional, Bibiano Silva, que se promptificou a
vir, como effectivamente veio, a esta capital apresentar o seu projecto. Feitas
pequenas modificações, foi este approvado, assignando o artista contracto para
entregar o monumento prompto no dia 7 de setembro. pela quantia de 45:000 $,
posteriormente elevada a 49:250 $ pela encommenda de tres placas votivas
sotopostas aos medalhões de Miguelinho, José Bonifacio e Pedro I, e augmento da
altura do pedestal. O monumento ahi está, na sua luminosa e expressiva
allegoria, para dizer aos vindouros o pensamento e o sentimento do Rio Grande
do Norte em 1922.[11]
13. A
elaboração de um monumento pelas mãos de uma artista da região do Nordeste
também significou a valorização da produção artística regional. Vale notar que
Bibiano da Silva possuía à época notória representatividade regional no
contexto nacional, tendo participado do concurso internacional para seleção do Monumento
da Independência do Brasil no contexto paulista,[12] um
dos mais célebres do período. Sobre o concurso internacional para esse
monumento nacional erguido na cidade de São Paulo, no marco da proclamação da Independência,
Michelli Cristine Scapol Monteiro explica: “Foram apresentados à Comissão
do Concurso 27 projetos, dos quais [...] somente seis eram provenientes do
Brasil. Um deles era o do escultor pernambucano Bibiano Silva. os demais eram
de provenientes de São Paulo e, em todos eles, havia a participação de pelo
menos um artista imigrante já fixado no Brasil.”[13]
14. Além
disso, Bibiano da Silva foi no período considerado pela imprensa da época o
único concorrente realmente brasileiro, tanto por ser natural de Pernambuco
quanto por ser discípulo de Rodolfo
Bernardelli.[14]
Destaca-se que o escultor pernambucano “apresentou projeto para o concurso para
a execução do Monumento do Ipiranga, em São Paulo, onde foi classificado em 3º
lugar.”[15]
Embora Bibiano da Silva não tenha vencido esse grande concurso internacional, a
boa classificação repercutiu nacionalmente, sobretudo, no contexto do nordeste
brasileiro. Nesse sentido, a contração desse escultor para a produção do Monumento
à Independência em Natal, apesar dos modestos recursos do Estado - como
informou o governador no discurso mencionado - foi uma valorosa expressão para
o fomento à produção artística regional considerando a visibilidade nacional
deste artista. Doravante, significou uma escolha qualificada de um monumento
dedicado à celebração e um digno presente à população norte-rio-grandense.
Bibiano
Silva: um escultor no Nordeste e o Monumento à Independência em Natal
15. Bibiano
Antão da Silva (1889-1969) foi um escultor pernambucano que atuou no contexto
brasileiro, sobretudo, na região do Nordeste. Ele estudou na Escola Nacional de
Belas Artes do Rio de Janeiro (ENBA), onde foi aluno de Rodolfo Bernardelli,
com quem manteve trocas de correspondências e apreço.[16] Ele
viveu em Recife e trabalhou como escultor, atuando no contexto das encomendas
públicas e participando de diversos salões na época, inclusive das Exposições
Gerais promovidas pela ENBA no Rio de Janeiro.[17] No
caso do mercado estatal, Bibiano da Silva atuou, sobretudo, com a produção e
criação de monumentos ligados à celebração de eventos históricos e à homenagem
de homens ilustres da história nacional e regional.
16.
É autor de todos os grupos que figuram na
fachada do Palácio da Justiça, em Recife, como também do busto do Presidente
Getúlio Vargas (1934), sendo o único escultor para quem o presidente pousou.
Entre muitos trabalhos é autor da figura “Libertus” com que concorreu a prêmio
de viagem [sic]. Tem várias medalhas de ouro e de prata adquiridas em vários
salões. É autor de diversos bustos, inclusive o do Ministro Valdemar Falcão,
encomenda do Governo do Ceará, para ser colocado em uma das praças de Fortaleza.[18]
17. Além
de trabalhar como artista, Bibiano da Silva também exerceu a docência em
colégios e escolas profissionais na cidade de Recife e na Escola de Belas Artes
de Pernambuco (EBAP), fundada em 1932, tendo experienciado a gestão desta por
um curto período.[19]
Nota-se que o escultor também foi um dos artistas mentores responsáveis pela
criação da referida escola pioneira na formação profissional do artista no
contexto pernambucano. Essa instituição de formação destinada aos jovens
naturais de Recifeb obteve impacto local e regional, pois também acolheu jovens
aspirantes pela profissionalização artística oriundos das cidades vizinhas da
capital pernambucana e de outros Estados da região do Nordeste.
18. As
obras de Bibiano da Silva estão localizadas nos Estados do Pará, Piauí,
Maranhão, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Rio de Janeiro e Pernambuco,
sendo neste último que onde encontramos a maior parte da produção do artista.[20] Em
Natal, o Monumento à Independência apresenta claro diálogo entre os
modelos artísticos do estilo Neoclássico e do Romantismo à brasileira, expresso
no Indianismo. Na composição central do monumento, vemos duas figuras humanas
uma alegoria, representada por uma mulher à moda clássica, configurando
dignidade à imagem,[21] e uma
figura heroica, encarnada no corpo masculino.
19. Existem
duas leituras acerca da representação simbólica dessas figuras. Segundo
Michelli Cristine Scapol Monteiro,
20.
No Rio Grande do Norte, o escultor Bibiano
da Silva realizou o Monumento à Independência, inaugurado em 1922, na praça
sete de Setembro, em Natal. A obra possui placas em que se destacam Dom Pedro I
e José Bonifácio e também Frei Miguelinho, um dos revolucionários pernambucanos
de 1817, nascido em Natal, além de Antônio José de Melo e Souza, presidente
daquele Estado entre 1920 e 1924. No topo, uma alegoria da República recebe um
potiguar com um ramo na mão, simbolizando a integração do Estado à República
Brasileira.[22]
21. Porém,
para Helder Nascimento Viana:
22.
Fincado sobre um pedestal de granito no
centro da praça, o monumento tinha como eixo duas figuras simbólicas: uma
feminina, representando a Pátria; a outra masculina, representando o Povo. A
Pátria, apontando para o Livro da História apoiado sobre um bloco de granito,
indica as duas grandes datas que não se devem esquecer, o 7 de setembro de
1822, data da independência nacional, e o 7 de setembro de 1922, data da
comemoração do centenário dessa independência. No bloco de granito que apoia o
livro está gravado o escudo do Estado. O Povo aparece dirigindo-se à Pátria e
oferecendo-lhe um ramo de louro. O louro simboliza a vitória e a paz conquistadas
no país, conquistas estas garantidas pela força que a espada representa.[23]
23. Embora
a identidade simbólica das figuras seja distinta para os autores, ambas são
próximas, pois a alegoria da República faz menção à Pátria, assim como a
representação do Povo em relação ao índio potiguar, o nativo que simboliza a
origem da população norte-rio-grandense. Além disso, o monumento possui outras
características e detalhes que expressam os valores republicanos do
período.
24.
Todo esse conjunto escultórico repousa
sobre um pedestal de base quadrangular com 2,60 metros, com três degraus. Nas
quatro faces desse pedestal se encontram quatro medalhões de bronze, sendo um
deles dedicado ao Padre Miguelinho, com a inscrição “7 de setembro de 1822 – 7
de setembro de 1922. O Primeiro Centenário da Independência da Pátria. Aos que
trabalharam e a fizeram”; e outro destinado ao Imperador Dom Pedro I. Na base
do monumento aparecem gravadas as seguintes inscrições latinas: “Potyguarensium
genus / Duras naturae vices perferendo / Fortins factum / Et filiórum robere
fultum, / Erit semper termis sed indefessus / Patriae unitatis et magnifudinis
/ Factor…”
25.
Desenhos ornamentais espalham-se por toda
a peça, simbolizando qualidades profundas do republicanismo, como a palma,
símbolo do martírio; a oliveira, denotando o sacrifício; e o carvalho,
representando a fortaleza.[24]
26. O monumento
marcou a celebração do 1º Centenário da Independência no território do Estado
do Rio Grande do Norte, confrontando homens ilustres da história nacional e
afirmando os heróis locais, sobretudo, no caso do retrato do Padre Miguelinho
em um dos medalhões de bronze. Todavia, é ainda nas inscrições latinas e nos
detalhes dos desenhos ornamentais que a força e a luta do cidadão do Estado
norte-rio-grandense são engrandecidos. O monumento também apresentava
expressões latinas que reforçavam o sentimento nacionalista corrente no
contexto da obra. Essas podem ser assim traduzidas:
27.
O Rio Grande do Norte fortalecido pela
luta contra a natureza e amparado pelo vigor dos seus filhos, será sempre um
pequeno, mas incansável operário da união e da grandeza da Pátria.
28.
[...]
29.
Sejam quais forem os seus cuidados, quer o
infortúnio te atormente, quer a felicidade te eleve, terás sempre a Pátria
entre os olhos: por ela darás a tua inteligência, as tuas forças e até a vida.[25]
30. Além
dos sentidos nacionalistas destacados nas palavras grafadas em latim em diálogo
com os medalhões de bronzes, percebe-se que o Monumento à Independência realizado
por Bibiano da Silva foi concebido com os atributos esperados em relação ao
simbolismo e aos modelos artísticos que circulavam à época, cumprindo,
portanto, a função almejada de rememorar e marcar a participação
norte-rio-grandense na festa nacional em prol do 1º Centenário da Independência
Nacional. Contudo, apesar do valor histórico, artístico e patrimonial do
monumento, este encontra-se atualmente com sua integridade parcialmente
comprometida com a ausência dos medalhões e das placas [Figura 5a, Figura 5b e Figura 5c],
carecendo de uma política de preservação e salvaguarda mais eficaz.
Considerações
finais
31. Nosso
estudo vem colaborando com o mapeamento de artistas que trabalharam no contexto
nordestino no século XIX e início do XX, dando visibilidade às obras de arte
localizadas no Estado do Rio Grande do Norte. Embora a investigação em curso
enfrente os desafios da pesquisa no modelo remoto,[26] o
qual impossibilita a busca por fontes em arquivos físicos que possam expandir a
leitura, essas são almejadas e deverão ser incluídas de forma mais analítica no
futuro.
32. Apesar
do desafio aqui mencionado, considera-se que o estudo é uma amostra das
relações de trânsito de artistas no contexto nordestino do período e,
sobretudo, das relações entre Recife (PE) e Natal (RN) e do estímulo à produção
artística regional pela iniciativa do governo norte-rio-grandense em promover
encomendas públicas, inclusive, observando a necessidade de uma participação
ativa do Estado nas celebrações do 1º Centenário da Independência, evento
ocorrido em consonância com as ideias e valores que circulavam na época do
início da República Velha. Ademais, nota-se que a mentalidade do governo da
época desejou
33.
[...] essencialmente na erecção de um
modesto mas expressivo monumento, que ficasse para attestar aos posteros o
sentir do nosso tempo, e festas populares, em que a nossa gente pudesse
expandir o seu regosijo, elevando o coração á Pátria e esquecendo assim,
nalgumas dias rapidos, as contingencias da vida ordinaria. Aquelles, que aqui
viveram a semana Commemorativa, certificarão si o conseguimos.[27]
34. Assim,
entende-se que o Monumento à Independência da autoria de Bibiano da
Silva é uma produção artística que carrega consigo a tarefa de expressar o nacionalismo
entrelaçado à uma visão regionalista do evento comemorado e festejado.[28] É,
portanto, fruto de um contexto específico da história do Brasil, o qual
interferiu nas diretrizes da produção artística do escultor. Igualmente,
considera-se que o mercado estatal do contexto priorizou a criação desse
monumento localizado na capital Natal, estando envolto em estruturas políticas
e simbólicas de um movimento mais abrangente de construção de uma identidade
nacional construída com a participação de todos os Estados, unificados e
singulares na sua participação na história do país. Esse sentido é destacado na
presença de toda a composição do monumento, porém, principalmente nas
expressões latinas que destacam o orgulho da população norte-rio-grandense da
época e na eleição de personagens históricos nascidos no Estado, como no
medalhão de bronze que retrata o Padre Miguelinho. Dessa forma, o monumento
expressou, no contexto das celebrações do 1º Centenário da Independência, o sentimento
de pertencimento nacional e local para a sociedade do período, estratégia
política recorrente em períodos de afirmação de regimes políticos.
Referências
bibliográficas
BURKE, Peter. Testemunha
ocular: história e imagem. Trad. Vera Maria Xavier dos Santos. São Paulo:
Editora Unesp, 2017.
CARVALHO, José Murilo de. A
formação das almas. O imaginário da República no Brasil. São Paulo:
Companhia das Letras, 1990.
COLI, Jorge. Como estudar a
arte brasileira do século XIX? São Paulo: SENAC, 2005.
COSTA, Emília Viotti da. Da
Monarquia à República: momentos decisivos. São Paulo: Unesp, 2010.
LIMA JUNIOR, Carlos Rogerio. Marianne
à brasileira: imagens republicanas e os dilemas do passado imperial. 2020.
Tese (Doutorado em Estética e História da Arte) - Estética e História da Arte,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. DOI:
10.11606/T.93.2020.tde-16062021-151518. Acesso em: 2021-08-14.
MONTEIRO, Michelli Cristine
Scapol. São Paulo na disputa pelo passado: o Monumento à Independência,
de Ettore Ximenes. Tese (Doutorado em História e Fundamentos da Arquitetura e
do Urbanismo) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2017.
MONTEIRO, Michelli Cristine
Scapol. Mercado e Consagração: o Concurso Internacional do Monumento à
Independência do Brasil. H-ART. Revista de historia, teoría y crítica de
arte, n. 4 (2019). Disponível em: http://dx.doi.org/10.25025/hart04.2019.05
Acesso em: 14 ago. 2021.
RIO Grande do Norte. Mensagem
lida perante o Congresso Legislativo na abertura da Segunda Sessão da Undecima
Legislativa em 1º de novembro de 1922, pelo governador Antonio J. de Melo e
Souza. Typ. Commercial - J. Pinto & C. - Natal. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/873330/2788
Acesso: 05 jul. 2021.
SALGUEIRO, Valéria. De
Pedra e Bronze: um estudo sobre monumentos. O Monumento a Benjamin
Constant. Niterói: EdUff, 2008.
ONOFRE JR, Manoel. Monumento.
Cidade de Natal (I). Jornal O Poti, 1981. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/031151_04/2351
Acesso: 13 set. 2021.
VIANA, H. do N. A construção
do espaço cívico: monumentos e rituais de memória na Natal republicana
(1902-1922). Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, [s.
l.], v. 27, p. 1-44, 2019. DOI: 10.1590/1982-02672019v27e07. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/anaismp/article/view/138800 Acesso em: 14 ago. 2021.
TORRES, Niedja Ferreira dos
Santos. O ensino de desenho na Escola de Belas Artes de Pernambuco (1932 a
1946). Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) - Centro de Artes e
Comunicação, Universidade de Pernambuco, Recife, 2015.
______________________________
[1] Sobre o assunto, ver:
COSTA, Emília Viotti da. Da Monarquia à República: momentos decisivos.
São Paulo: Unesp, 2010.
[2] Este artigo é um estudo
preliminar desenvolvido dentro do Projeto de Pesquisa “Pensar imagens: Cultura
Visual e História das Artes Visuais no Rio Grande do Norte” (Processo
18598-2021), na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), coordenado
e executado pela profa. Fabíola Cristina Alves.
[3] CARVALHO, José Murilo
de. A formação das almas. O imaginário da República no Brasil. São
Paulo: Companhia das Letras, 1990.
[4] LIMA JUNIOR, Carlos
Rogerio. Marianne à brasileira: imagens republicanas e os dilemas do
passado imperial. 2020. Tese (Doutorado em Estética e História da Arte) -
Estética e História da Arte, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020, p. 43.
[5] MONTEIRO, Michelli
Cristine Scapol. Mercado e Consagração: o Concurso Internacional do
Monumento à Independência do Brasil. H-ART. Revista de historia, teoría y
crítica de arte, n. 4 (2019), p. 84. Disponível em: http://dx.doi.org/10.25025/hart04.2019.05 Acesso em: 14 ago.
2021.
[6] SALGUEIRO, Valéria. De
Pedra e Bronze: um estudo sobre monumentos. O Monumento a Benjamin
Constant. Niterói: EdUFF, 2008.
[7] O monumento foi
inaugurado em 1922, porém incompleto. A conclusão ocorreu em 1926.
[8] VIANA, H. do N. A construção
do espaço cívico: monumentos e rituais de memória na Natal republicana
(1902-1922). Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, [S.
l.], v. 27, p. 1-44, 2019, p 22. DOI: 10.1590/1982-02672019v27e07. Disponível
em: https://www.revistas.usp.br/anaismp/article/view/138800 Acesso em: 14 ago. 14.
[9] RIO Grande do Norte. Mensagem
lida perante o Congresso Legislativo na abertura da Segunda Sessão da Undecima
Legislativa em 1º de novembro de 1922, pelo governador Antonio J. de Melo e
Souza. Typ. Commercial - J. Pinto & C. - Natal. Foi mantida a
ortografia original. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/873330/2788
Acesso: 5 jul. 2021.
[10] Idem.
[11] Idem.
[12] Concurso vencido por Ettore
Ximenes. O Monumento à Independência Nacional foi erguido no local onde
foi proclamada a independência do Brasil por Dom Pedro I, no Ipiranga, São
Paulo/SP.
[13] MONTEIRO, Michelli
Cristine Scapol. São Paulo na disputa pelo passado: o Monumento à
Independência, de Ettore Ximenes. Tese (Doutorado em História e Fundamentos da
Arquitetura e do Urbanismo) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo,
Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017, p. 104.
[14] Idem, p. 142.
[15] TORRES, Niedja Ferreira
dos Santos. O ensino de desenho na Escola de Belas Artes de Pernambuco (1932
a 1946). Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) - Centro de Artes e
Comunicação, Universidade de Pernambuco, Recife, 2015, p. 109. No estudo
desenvolvido por Niedja Torres (2015) não é mencionado o nome da exposição na
qual a obra “Libertus” concorreu ao prêmio. Sabe-se que Bibiano Silva concorreu
ao Prêmio de Viagem na Exposição Geral de Belas do Rio de Janeiro. Contudo,
segundo dados divulgados pelo Diário da Manhã de Recife em 10 ago. 1934,
o artista participou do concurso apresentando um trabalho inspirado na novela de
Franklin Tavora. A obra de Bibiano Silva recebeu o título “O cabeleira”. Ver: http://memoria.bn.br/DocReader/893722_02/15063
[16] Informações disponíveis
em: http://bibianosilva.org/bibiano_pt/
Acesso em: 14 ago. 2021.
[17] Informação disponível
em: http://www.dezenovevinte.net/egba/index.php?title=Especial:Páginas_afluentes/Bibiano_Silva
Acesso em: 2021-08-10. Observa-se que o original em gesso do Monumento à
Independência realizado para o projeto da cidade de Natal foi apreciado
pelo público no Salão do Centenário. Ver: Illustração Brasileira,
Rio de Janeiro, jan. 1923, n/p. disponível em: http://www.dezenovevinte.net/egba/index.php?title=CREMONA%2C_Ercole._O_Sal%C3%A3o_do_Centen%C3%A1rio._Illustra%C3%A7%C3%A3o_Brasileira%2C_ano_IV%2C_n._29%2C_jan._1923%2C_n/p. Acesso em: 2021-08-12.
[18] TORRES, Niedja Ferreira
dos Santos. O ensino de desenho na Escola de Belas Artes de Pernambuco (1932
a 1946). Dissertação (Mestrado em Artes Visuais) - Centro de Artes e Comunicação,
Universidade de Pernambuco, Recife, 2015, p. 109.
[19] Idem, p. 49.
[20] Informações disponíveis
em: http://bibianosilva.org/bibiano_pt/
Acesso em: 14 ago. 2021.
[21] Em sentido semelhante
ao pensado pelo historiador Peter Burke. Ver: BURKE, Peter. Testemunha
ocular: história e imagem. Trad. Vera Maria Xavier dos Santos. São Paulo:
Editora Unesp, 2017, p. 107.
[22] MONTEIRO, 2017, p. 18.
[23] VIANA, 2019, p 23.
[24] Idem.
[25] ONOFRE JR, Manoel.
Monumento. Cidade de Natal (I). Jornal O Poti, 1981. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/031151_04/2351 Acesso: 13 set. 2021.
[26] Em função do contexto
pandêmico referente à Covid 19.
[27] RIO Grande do Norte. Mensagem
lida perante o Congresso Legislativo na abertura da Segunda Sessão da Undecima
Legislativa em 1º de novembro de 1922, pelo governador Antonio J. de Melo e
Souza. Typ. Commercial - J. Pinto & C. - Natal. Foi mantida a
ortografia original. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/873330/2788
Acesso: 5 jul. 2021.
[28] Em sentido semelhante
ao tratado por Burke quando ele discute o tema “Imagens de Ideias”. Ver:
BURKE, 2017, p.95-103.