Georgina de Albuquerque e suas estratégias
de consagração: encontros e divergências
Cláudia de Oliveira
OLIVEIRA, Cláudia de. Georgina de Albuquerque e
suas estratégias de consagração: encontros e divergências. 19&20,
Rio de Janeiro, v. XVII, n. 1-2, jan.-dez. 2022. https://doi.org/10.52913/19e20.xvii12.03
*
* *
1.
Cinquenta
anos se passaram do ensaio seminal da historiadora da arte Linda Nochlin, Why
have been no women artists?, que, publicado na revista ARTnews em
1971, provocou o mundo da arte e o campo acadêmico. Nochlin, em seu ensaio
bastante invador para a época, de fato, não procurava responder sua pergunta
provocativa, mas, com ela, desconstruir o que o cânone artístico,
majoriatariamente branco e ocidental, entendia como “Grande Arte” e “Grande
Artista.” Nochlin ressaltava em seu ensaio que, muito embora alguns
historiadores da arte citassem mulheres artistas em seus livros, elas eram
sempre as mesmas, desconsiderando, assim, um vasto repertório de artistas
mulheres.
2.
O ensaio,
que fazia parte da “nova história da arte” (CARDOSO, 2009, p. 106) que emergia
na década de 1970, abria os estudos da história da arte feminista que, desde
então, vem produzindo uma vasta produção bibliográfica e trazendo à luz não só
as artistas mulheres obliteradas pelo cânone, mas também identificando as
estratégias criadas por aquelas que se consagraram. No cânone artístico
brasileiro, uma dessas artistas mulheres foi Georgina de
Albuquerque (Taubaté,1885 - Rio de Janeiro,1962) que, a despeito de
pertencer ao núcleo de artistas da Escola Nacional de Belas Artes do Rio de
Janeiro (ENBA), atuando também como professesora e diretora da Escola em um
momento em que toda a produção realizada pela instituição era desqualificada
pelo modernismo, se consagrou como pintora em seu tempo e tornou-se umas das
artistas mais reconhecidas no cânone artístico brasileiro.
3. Mário
de Andrade, em 1923, em artigo na Revista do Brasil, dizia “que as
mulheres tomaram decididamente para si o lugar importante na pintura nacional.”[1] Contudo,
na miríade de mulheres artistas cariocas e paulistas, as exaltadas por Mário
eram Anita Malfati, Zina Aita e Tarsila
do Amaral. Já pintoras como Georgina de Albuquerque e Regina
Veiga, ambas ex-alunas da ENBA, receberam críticas severas. Em relação à
Georgina, Mário dizia que a pintora tinha valor, “[...] mas essse valor pouco
aparece porque a pintora ainda confunde arte com natureza. Provêm daí um
mal-estar pesado - a saudade pelas coisas naturais que ela procurou imitar, mas
não conseguiu.”[2]
4. A despeito das problemáticas relações entre os artistas e
críticos modernistas e acadêmicos, o fato é que Georgina de Albuquerque foi
consagrada na cena da artistica de seu tempo e após sua morte, como veremos ao
longo deste texto. Então, a pergunta que se coloca é quem
decide quais artistas são lembradas e quais são esquecidas? Porque, como
ressaltou a socióloga Ana Paula Simioni (2007), “a história da arte pode ser
compreendida como uma narrativa constituída a partir de escolhas e exclusões, a
despeito da defesa acadêmica de sua suposta ‘objetividade’ (Alpers,
1982: 184).”
5. Uma
primeira resposta à pergunta aponta para a necessidade de uma postura crítica
por parte dos pesquisadores diante das fontes, porque a produção acadêmica e a
crítica de arte não são discursos neutros. Em se tratando de artistas mulheres
consagradas, outra pergunta - talvez mais provocativa - pode ser lançada. Quais
foram as estratégias realizadas pela artista em seu “tempo vivido” para ser lembrada
no seu “tempo memória”? Talvez
possamos iniciar nossa reflexão considerando o que eu nominei acima como dois
tempos na vida das artistas: o “tempo vivido” e o “tempo memória”. O “tempo
vivido” nos leva a considerar a trajetória das artistas em vida: as exposições
em que participaram, as críticas que receberam, sua presença em artigos na
imprensa, a circulação e a recepção de suas obras, as viajens de estudos, a
rede de contatos dentro e fora do mundo da arte, a institucionalização de
algumas e, sobretudo, a autoimagem criada por elas. As escolhas, as estratégias
e a autoimagem da artista no “tempo vivido” indica as razões pelas quais
algumas foram reconhecidas no “tempo memória,” o que pode, por sua vez, indicar
ao pesquisador os processos que posiconam as artistas mulheres na lembrança ou
no esquecimento.
6. A princípio, parece que, para habitar o “tempo memória,”
as estratégias adotadas pelas artistas mulheres no “tempo vivido” devem
primeiramente ser validadas pelo cânone artístico, que é masculino. Adentramos,
então, o território que Linda Nochlin denomina como a “tríade mulher, arte e
poder”, título de um de seus ensaios. Porque para Nochlin (2021, p. 1358), “a tríade mulher-arte-poder deve ser pensada como um
esforço para discernir os vários discursos sobre o poder em relação à diferença
de gênero coexistente de modo superficial ou elementar ao discurso dominante da
iconografia ou da narrativa.”[3]
7. Partindo das considerações acima, analisaremos a
peculiaridade da pintora Georgina de Albuquerque dividindo este artigo em duas
partes. Na primeira, buscaremos, nos limites deste texto, traçar a trajetória
de Georgina de Albuquerque, reconstruir seu “tempo vivido”, através de suas
escolhas, suas estratégias ou suas “manobras,” utilizando o conceito de Heloisa
Buarque de Hollanda, que afirma que as mulheres artistas sempre se valeram de
“manobras” para adentrar o cânone. Na segunda parte, à luz das escolhas de
Georgina como mulher artista, analisaremos quatro nus femininos da pintora
realizados na década de 1920, com o objetivo de verificar como suas estratégias
ou “manobras” foram representadas na construção de um corpo nu de mulher, bem
como seus ideiais de feminilidade. Ressaltamos que estamos longe de fabular uma
história celebratória de uma mulher heroína, porque Georgina de Albuquerque foi
uma mulher que soube “manobrar” as adversidades impostas às mulheres artistas
de seu tempo, para adentrar o tempo memorável consolidado pelo cânone.
Georgina de albuquerque: estratégias e “manobras”
8.
A
primeira pergunta a ser lançada sobre a trajetória de Georgina de Albuquerque,
talvez seja: a artista encarnou uma modern woman - a mulher moderna
sintonizada com os comportamentos femininos mais “arrojados” para o seu tempo;
ou uma true woman, uma mulher que incorporou uma feminilidade que
reproduzia as suposições sustentadas pelas ideologias do século XIX em torno do
poder, da superioridade e do controle dos homens sobre as mulheres? No último
“modelo” de mulher, a posicionaríamos como uma mulher devotada ao lar, aos
filhos e ao marido o que, de um modo em geral, emergeria em sua criação como
espelhamento de temas “simplesmente femininos” (NOCHLIN, 2021, p. 1359).
9. Nossa hipótese é que Georgina parece ter habilmente
transitado entre os dois “modelos” de mulher, mostrando-se bastante inteligente
na construção de sua autoimagem, condição que, vista de hoje, torna-se evidente
quando analisamos suas obras e as confrontamos com os seus comportamentos.
Trata-se de uma autoimagem alicerçada no recato, na docilidade, na esposa
exemplar, sequenciando a imagem da “dama” do século XIX, idealizada em termos
de delicadeza, encanto, passividade sexual e emocionalidade contida. Uma
autoimagem que afirma a domesticidade e a dependência.
10. No entanto, Georgina foi uma mulher que trabalhou ao
longo de toda a sua vida e construiu uma sólida carreira como artista e como
docente do ensino superior, em um momento em que a mulher que circulava no
mundo do trabalho era desqualificada, um insulto social. Mesmo considerando que
Georgina habitou o mundo da arte, aparentemente menos convencional, não podemos
deixar de ressaltar que ela encarnou certos valores “masculinos,” como o
autocontrole, a determinação, a disciplina e o domínio emocional. A
personalidade de Georgiana de Albuquerque aponta para uma mulher de caráter
firme, mas calorosa. Estes dados indicam que a artista conviveu com valores ou
formas da “masculinidade” e da “femilidade,” as quais foram habilmente
utilizadas por ela, ultrapassando, de certo modo, a mútua exclusão entre o
feminino e o masculino imposta pela ideologia de gênero de seu tempo.
11.
Devemos
levar em conta, também, que a autoimagem por ela criada não sugere ter sido evidente
em seu tempo. Ao contrário, foi quase imperceptível, uma vez que Georgina, aos
olhos da sociedade brasileira da primeira metade do século XX, soube encarnar o
papel esperado para uma mulher: domesticada e acolhedora. Porém, estas
suposições sobre a fragilidade e passividade de Georgina não se confirmam em
suas práticas quando analisamos sua trajetória como uma mulher
institucionalizada profissionalmente. Quanto às imagens artísticas que criou
sobre o feminino, soube afastá-as de um possível caráter caricato,
posicionano-as no ideal. Como mulher “trabalhadora” – artista e professora da
ENBA e, posteriormente, diretora da insituição -, habilidosamente transitou na
cena artística da primeira metade do século XX, marcada por cizanias entre
acadêmicos e modernos. Este comportamento disciplinado e determinado sugere que
a artista, já em seu “tempo vivido,” adentrou o “tempo memória.”
12.
Se
pudermos projetar que Georgina criou uma automimagem marcada pelo recato, que
esta imagem foi capaz de despertar o prazer no olhar do outro que a via como
tal, e, por consequência, admirava suas criações a partir da valorização em
torno desta imagem, talvez possamos compreender sua “vitória.” Como Georgina
equilibrou os “estereótipos do feminino”? Porque, em um primeiro olhar, parece
existir uma contradição neste sujeito criador feminino, uma vez que é uma
criadora, porém, como mulher, teve que fazer concessões para exercer a
atividade artística. Essa contradição muitas vezes pode reforçar os códigos
iconográficos difundidos pela ideologia dominante e normativa, ou, ainda a
posição social da feminilidade no domínio dos códigos burgueses de
comportamento, porque a diferença de gênero é compartilhada socialmente.
13.
Georgina,
desde muito jovem, já demonstrava sua determinação quando deixou Taubaté, no
interior do estado de São Paulo, cidade onde nasceu, e partiu para o Rio de
Janeiro, então Capital Federal, em 1904, aos 19 anos, para para ingressar na
Escola Nacional de Belas Artes, intituição de maior prestígio do país à época. Esta
tomada de decisão já denota sua capacidade de enfrentar adversidades para
realizar seu projeto de tornar-se uma pintora.
14. Dois anos após ser admitida como estudante na ENBA, em
1906, casou-se com um pintor já renomado e reconhecido no meio artístico da capital
e na própria ENBA, o piauiense Lucílio de
Albuquerque. O casamento com Lucílio transformou a vida de Georgina como
mulher e como artista.[4] Como mulher,
Georgina passou imediatamente para o estatos de senhora casada e respeitada -
condição extremamente importante para a realização de uma mulher à época.
15. Georgina viajou para a Europa não porque recebeu uma
premiação em Salão, mas na condição de esposa de um pintor laureado, em 1905,
com um prêmio que garantiu a Lucilio uma viagem ao exterior. Ambos viajaram
para a França em 1906 e permanecem em Paris até 1911. Não há dúvidas que
Georgina soube aproveitar muito bem sua estada em Paris, onde frequentou a Academia
Julian, a École Nationale Supérieure de Beaux-Arts, expôs nos salões
de belas artes e viajou pela Europa, o que possibilitou a ela uma ampliação de
seus conhecimentos em artes. Na entrevista que concedeu a Angyone Costa em
1927, declarou: “Frequentei museus e procurei pintar, pintar, pintar muito, a
todas as horas, a todos os instantes do dia. Nem mesmo quando os meus dois
filhos, Dante e Firmino, eram pequenos, deixei um só minuto de trabalhar”
(COSTA, 1827, p. 91).
16.
Na
Europa, Georgina filiou-se a um impressionismo tardio, em um período em que
Paris vivia a ebulição das vanguardas modernistas. Filiar-se ao impressionismo
tardio não me parece nada depreciativo, uma vez que essa escolha subjetiva pode
ser entendida como uma diferença que marca a busca por um projeto pictórico
particular.
17. Quando Georgina retorna de Paris, percebemos que se une
em criação a Lucílio, os dois produzindo e expondo como casal, o que as
historiadoras da arte tem nominado como “duplas afetivas” ou “duplas amorosas,”
criando uma mítica em torno de uma criação que ocorre unida (CHADWIC &
COURTIVRON,1995). Porém, sabemos, através das inúmeras histórias sobre duplas
amorosas na arte, que a assimetria é um marco na criação do casal. Percebemos,
assim, que Georgina, no início de sua carreira, vai construindo e alimentando a
mítica de esposa companheira e prestimosa, que coloca a família acima de sua
condição de artista. Tal percepção também vislumbrada por Ana Paula Simioni:
“Georgina soube como poucas artistas manipular a seu favor os mitos em torno de
um casamento feliz, em uma época de valorização da mulher culta como boa mãe
republicana (SIMIONI apud CABO, 2022, p. 12).
18. O corpo indica sinais de caráter. Vemos, na fotografia da
Figura 1, que
Georgina não posa em traje de trabalho para justificar sua profisão, mas usa
uma indumentária de mulher de sua época. Seu penteado recatado, suas mãos de
artista, pequenas e delicadas, seus olhos vivos, por detraz do par de óculos
redondos, a testa larga, os lábios fechados, o semblante resoluto, ao mesmo
tempo doce, radiante e vivo, com traços expressivos que parecem irradiar luz
interior e expressão - todos esses elementos em arranjo apresentam Georgina
como uma senhora. Uma mulher casada envolvida com os afazeres do lar, com seus
dois filhos pequenos, asseados e bem-trajados. É uma imagem que celebra a vida
de uma mulher que se apresenta sóbria e feliz na sua condição de mãe, opondo-se
a uma feminilidade frágil ou fútil. Longe de mostrar-se como uma mulher
impetuosa e fatal, Georgina se mostra delicada e tranquila na função de mãe,
afastando qualquer ideia sobre uma vida ociosa e sem rumo. Porém, esta
autoimagem registrada pela câmera fotográfica pode reforçar noções de
domesticidade e criar a impressão que sua arte é menos ameaçadora, porque a
mulher está contida na moldura da família e do lar (CHERRY, 2000).
19. O relato descritivo de Angyone Costa sobre a convivência
harmoniosa do casal de pintores, na obra A inquietação das Abelhas
(1927), parece completar essa imagem específica:
20.
A casa de D. Georgina e de Lucilio de
Albuquerque é um sereno recanto onde se vive da arte e para a arte. Aquele
casal realiza bem o ideal de perfeição, dificilmente atingido, e vai dando à
vista a mais garciosa impressão de encanto, possível num lar de artistas.
Poucas vezes duas indoles, dois temperamentos combinaram tão bem. Há equilíbrio
naquela casa amável onde dois espíritos, na aparência desiguais, um grave e
outro alegre, ajustam-se admiravelmente. E o segredo desta combinação reside,
justamente, na similitude dos dois temperamentos, por isso que um não se
apresenta com demasiada gravidade, nem o outro com a alegria exagerada, que
desencanta e banaliza a intimidade. São o que se pode desejar um casal
acertado, duas criaturas que se uniram para a realização de uma grande obra e
vão dando ao seu sonho a elasticidade concreta de uma vida perfeita, num lar de
onde renovam inspirações para a vitória das suas ideias sobre pinturas e arte
em geral, de que são dos mais apaixonados (COSTA, 1927, p. 89).
21. Vemos, então, que esta imagem de mulher e artista vai
sendo retroalimentada e reforçada pela crítica de arte na imprensa da época e,
posteriomente, pela história da arte, como podemos perceber nas palavras de
Quirino Campofiorito, ao comentar sobre a produção de Georgina em Paris: “Sua
estada em Paris não pôde apresentar igual produtividade à de Lucílio, pois eram
irremovíveis os encargos domésticos com os filhos lá nascidos” (CAMPOFIORITO
apud CABO, 2022, p. 27).
22. Pesquisando sobre a artista em revistas ilustradas como Fon-Fon!,
percebemos que o casal Lucílio e Georgina de Albuquerque expunha junto
frequentemente [Figura 2].
Nos parece ainda, que se tornam uma dupla independente de outros artistas, como
podemos verificar no comentário do diretor de arte da revista - que, muito
provavelmente, era Gonzaga Duque - em 2 de setembro de 1911: “nada menos que 5
exposições em dois meses na cidade: a exposição dos Alunos de Bellas Artes, a
exposição de Ricardo Hall, a exposição da senhora Berthe
Worms, a exposição do Grêmio Juventas e a exposição do Casal Lucílio e
Georgina de Albuquerque” (Fon-Fon!, ano V, n. 35, 2 set. 1911, p.
20).
23.
É
importante ressaltar que do Grêmio Juventas faziam parte as pintoras Angelina
Agostini, Sylvia Meyer e Fedora do
Rego Monteiro, também vistas como jovens pintoras promissoras e com uma
sólida participação nos salões. Verificamos, portanto, que Georgina de
Albuquerque não era a única pintora apreciada pela crítica da época e, ainda,
que ela parece se distanciar das demais pintoras mulheres para investir em sua
imagem junto a Lucilio, reforçando a mítica de pintora promissora e esposa
devotada.
24.
Como
entender esta construção de sua autoimagem? A princípio parece uma “manobra”
sutil para tornar-se respeitada como mulher no mundo da arte. A manobra vai
sendo construída na maneira como Georgina vai se amparando na imagem de Lucílio
para construir a sua. Não há nada de mal neste comportamento ou estratégia, uma
vez que as artistas mulheres, como ressaltou Heloisa Buarque, sempre fizeram “manobras
- pequenas ou grandes - mas sempre radicais.” Qual a radicalidade de Georgina
de Albuquerque? Os dados parecem indicar que foi perceber a singularidade de
sua posição como mulher e como artista e investir nesta singularidade para se
projetar.
25.
O primeiro
episódio a indicar para uma carreira solo de Georgina ocorre em 1920, quando
ela se torna a primeira júri mulher na categoria Pintura, na Exposição Geral da
Escola Nacional de Belas Artes daquele ano. Georgina conseque este lugar porque
no ano anterior havia conquistado medalha na Exposição de Belas Artes. A
posição de jurada - e não de simples expositora - parece abrir seu caminho na
ENBA, pois em 1927 Georgina passa a fazer parte do corpo docente da Escola
Nacional de Belas Artes como livre-docente. Passa a ser, em 1937, Professora
Catedática e, em 1952, torna-se a primeira mulher Diretora da Escola. Não há
dúvidas que essa trajetória foi bastante peculiar levando-se em conta as
restritações impostas às mulheres da época. Como docente da ENBA, como veremos,
à frente foi rigorosa e, sobretudo, equilibrada, no que tange as constantes
desavenças entre artistas.
26. Em 1927, Georgina de Albuquerque apresenta uma exposição
solo no Palace Hotel, local onde expuseram os pintores mais renomados da ENBA e
os artistas modernistas. Em 1929, Georgina é solidária da criação da Associação
dos Artistas Brasileiros (AAB), criada a partir do “descontentamento de uma
parcela da classe artística com o ambiente artístico no Brasil (CABO, 2022, p.
11). A AAB contava com artistas plásticos, arquitetos, escritores, dramaturgos,
atores, músicos e outros intelectuais que eram movidos por um desejo de mudança
no caráter conservador, em especial, da Escola Nacional de Belas Artes.
Georgina foi solidária a esse movimento desde seu início (CABO, 2022, p. 31).
27. Os artistas criaram a AAB em reação à rejeição de mais de
200 obras pelo júri da Exposição Geral de Belas Artes em 1929. O Salão da AAB
se espelhava no “Salão dos Recusados” e foi realizado na Biblioteca Nacional do
Rio de Janeiro. No ano seguinte, em 1930, apresentaram outra mostra “reeditando
o sucesso do Salão de 1929” (CABO, 2022, p. 35). Entre os artistas que
expuseram no Salão da AAB estava Georgina de Albuquerque.
28.
Porém, um
dado bastante significativo e importante mostra-nos que em 1931, entre os
artistas modernistas e acadêmicos, Georgina de Albuquerque não expôs no famoso
“Salão de 31” - o chamado “Salão dos Tenentes” ou, ainda, “Salão
Revolucionário” -, organizado pelo jovem arquiteto Lúcio
Costa, recém-empossado Diretor da Escola Nacional de Belas Artes, cujas
tendências artísticas eram modernas [Figura 3a e Figura 3b]. Segundo Angela Ancora da Luz (2005, p.
101), o “Salão de 31” foi um marco nacional na arte moderna. Embora tenha
obtido grande reprecussão na imprensa da época, recebeu muitas críticas, porque
“a unicidade da estética acadêmica se antagoniza com pluralidade aberta que a
arte moderna manifestava” (LUZ, 2005, p. 101).
29. O “Salão de 31” gerou enorme polêmica entre os
acadêmicos, sobretudo, porque o júri era de tendência moderna: Candido
Portinari, que acabara de retornar de sua estada em Paris; Anita Malfati, Manoel Bandeira e o própio Lúcio Costa. “Apesar de parecer
com o nome júri, em muitos textos, na verdade tratava-se de uma comissão
organizadora do Salão” (LUZ, 2005, p. 105). A comissão não impunha restrições,
julgamentos ou seleções como nos salões tradicionais, pois os organizadores
compreendiam que “o julgamento viria do público” (LUZ, 2005, p. 105). Portanto,
o “Salão de 31” foi aberto a todos os artistas. Nele, além das artistas
modernistas Trasila do Amaral e da própria Anita Malfati, expuseram as pintoras
Sylvia Meyer - que também havia voltado de uma estada em Paris - e Regina
Veiga, ambas provenientes da ENBA.
30.
A
pergunta que se coloca é: porque Georgina de Albuquerque não expôs no “Salão de
31,” se este “marcava um tempo novo de mudanças que se ajustava ao desejo
recolucionário da arte moderna” (LUZ, 2005, p. 105)? Por um lado, as relações
entre a Escola Nacional de Belas Artes e a Comissão Organizadora do “Salão de
31” foram das mais conturbadas (LUZ, 2005, p. 106). Por outro , a imprensa
oscilava entre tradição e modernidade, e havia um grande descontentamento por
parte dos tradicionalistas. Em meio a tantas pressões, Lúcio Costa não teve
outra alternativa se não deixar a Direção da Escola. Para o cargo, foi indicado
“Archimedes Memória, outro arquiteto para dirigrir a ENBA”
(LUZ, 2005, p. 107). Ainda segundo Luz (2005, p. 106), os acadêmicos mais
ferrenhos optaram por não participar do “Salão de 31.” A partir das informações
acima, tendemos a fabular que Georgina de Albuquerque, sendo uma docente da
ENBA e com aspirações à carreira na Escola, optou por seguir os colegas mais
tradicionalistas e não participar do salão. A princípio, seria fácil “condená-la”
por esta posição conservadora. Porém, olhando de hoje, a tomada de posição de
Georgina confirma uma “manobra” muito consciente, que denota suas aspirações
futuras, ou mesmo, suas ambições como mulher em um mundo de homens.
31.
Porém, se
Georgina declinou o “Salão de 31,” neste
mesmo ano a Sociedade Brasileira de Belas Artes, contando com a colaboração da
Associação de Artistas Brasileiros, realizou o I Salão Feminino de Arte, tendo
à frente Georgina de Albuquerque, Regina Veiga, Cândida Cerqueira, Marques
Júnior e Nestor Figueiredo, nomes que compuseram a comissão organizadora (LUZ,
2004, p. 112). Podemos, também, ficcionar que Georgina preferiu investir no I
Salão Feminino e não no “Salão de 31” para proteger sua imagem, ao mesmo tempo
em que se engajava em um projeto político. Afinal. Como veremos à seguir, o I
Salão Feminino e o “Salão de 31” estiveram muito próximos das políticas do
Governo Vargas em relação às artes. Em ambos os Salões, o ministro Gustavo
Capanema esteve em Comissões e a Primeira-dama, Alzira Vargas, e outros membros
do Governo compareceram aos dois Salões.
32.
Porém, na
revista Para Todos..., coluna DE BELLAS ARTES de 6 de março de 1926,
Adalberto Mattos dedica uma crítica ao Salão Feminino de Bellas Artes ocorrido
naquele ano. Isso indica que o I Salão Feminino de 1931 não foi o primeiro e,
ainda, que o Salão Feminino de 1926 em muito se diferenciava do de 1931.
Acreditamos, inclusive que o Salão de 1926 esteve à frente, uma vez que foi um
Salão exclusivamente feminino. Ilustrando a coluna, Mattos apresentou a tela Retrato,
da pintora Sylvia Meyer [Figura
4], e sua crítica dá a ver as suas construções em torno da arte
produzida por artistas mulheres, o que levanta algumas hipóteses:
33.
Dentre cento e poucas artistas que já
possuímos, destaca-se um grupo capaz de levar avante a ideia. A hierarquia
artística nos indica os seus nomes: Julieta de
França, Nicolina Pinto do Couto, Angelina Agostini, Regina e
Georgina de Albuquerque, Maria Braga, Angelina Figueiredo, Sylvia Meyer, Dinorah de Simas Enéas, Adelaide Gonçalves, Margarida Lopes de Almeida, Haydea
Santiago, Edith Aguiar, Sarah Vilela de Figueiredo, tantas outras, cujos prêmios
emprestam credenciais suficientes para vitória do conhecimento. (Para
Todos... , 6 mar. 1926, p. 14)
34. O autor-artista parece criar “hierarquias” entre as
expositoras: a primeira por geração e a segunda por “qualidade.” Julieta de
França e Nicolina Pinto do Couto, como escultoras mais velhas, antecedem as
demais. Em seguida, Mattos posiciona artistas de uma mesma geração em um
patamar que as diferencia em “qualidade”. A primeira a abrir sua lista é a
pintora Angelina Agostini, seguida por Regina Veiga e Georgina de Albuquerque,
seguindo as demais. Tanto Angelina Agostini quanto a gravurista Dinorah de
Simas Enéas haviam sido laureadas com Prêmio de Viajem em 1913. Ainda assim, a
gravurista não ombreia a pintora.
35.
A lista
de Mattos alude, portanto, a uma possível hierarquia entre as artistas. Pode
ser que uma hierarquia existisse entre elas; porém, não temos dados que
confirmem a suposição. Assim, a lista de Mattos é resultado de uma construção
masculina, denotando a ocultação de um “discurso patriarcal de poder sobre as
mulheres, que se disfarça em verniz” (NOCHLIN, 2021, 1358). Contudo,
acreditamos que tal lista não se posicione no campo da vilania (na disputa
entre homens e mulheres por espaço) ou, ainda, que o poder é algo possuído por
um grupo e dirigido contra outro. Em vez disso, acreditamos na existência mais
efetiva de uma rede de práticas, instituições e tecnologias que sustentam
posições de dominância e subordinação dentro de um âmbito particular (BORDO,
1997, p. 24). Pois, no parágrafo seguinte, Mattos idealiza os seguintes
“arranjos”:
36.
Para os que acompanham de perto a questão
da arte, ou se derem ao trabalho de compulsar os catálogos das exposições [...]
nestes últimos vinte anos não passará desapercebido a multiplicação sintomática
dos elementos femininos, no mundo das artes [...] nele, verifica-se o desabrochar
do engenho e do amor pelas coisas belas, mas compatíveis com o espírito
delicado das nossas patrícias [...] a arte é o caminho indicado para a
independência social da mulher sem lhe arrancar a aureola delicada, aureola tão
de acordo com a sua beleza, com os sentimentos refinados e privilegiados por
Deus: melhor que o homem a mulher vence na senda da arte, por ela ter a
natureza, motor sublime que a dotou de gosto congenito e da poesia espontanea.
(Para Todos...Anno VIII, N. 337, 3 de março de 1926, p. 17)
37.
Muito
embora Mattos celebre e congratule as colegas astistas, vemos que as instala na
equação milenar dos discursos de gênero: o feminino encarnando a Natureza em
oposiçao ao masculino que encarna a Razão, evidenciando, assim, uma
oposição entre o masculino viril e a fragilidade feminina, condição que parece
se reforçar quando Mattos afirma: “verifica-se o desabrochar do engenho e do
amor pelas coisas belas, mas compatíveis com o espírito delicado das nossas
patrícias”
38. Finalizando o parágrafo, Mattos ainda opera um falsear na
realidade das artistas mulheres, ao dizer que elas vencem os homens na “senda
da arte.” Estas operações, como chama atenção Linda Nochlin (2021, p.
1358), “são operações do poder em seu nível ideológico, operações manifestadas
em um sentido muito mais difuso, mais absoluto e, todavia, paradoxalmente mais
ardiloso, em algo que poderemos chamar de discursos de diferença de gênero.”
39. A crítica de Mattos, se instala na tradição filosófica
ocidental, onde as emoções, que ocupam o campo da Natureza, são consideradas
prejudiciais ao conhecimento. De Platão até a contemporaneidade, com algumas
exceções, a razão e não a emoção tem sido julgada a faculdade indispensável ao
conhecimento e este é masculino (JAGGAR, 1997, p. 155). De forma típica, embora não invariável, o racional tem
sido posto em contraste com o emocional e esse par contrastado tem sido, por
sua vez, vinculado a outras dicotomias. A razão não só se opõe à emoção, mas é
associada ao mental, ao cultural, ao universal, ao público e ao masculino,
enquanto a emoção é associada ao irracional, ao físico, ao natural, ao
particular, ao privado e, obviamente, ao feminino (JAGGAR, 1997, p.157).
40. Assim vemos que os comentários “sutis” acionam as
diferenças de gênero, onde os homens sequestram as falas das mulheres, imputam
juízos de valor e atribuem características masculinas - como uma hierarquia
entre mulheres - que, muitas vezes, passam a compartilhar destas estruturas de
poder masculinas para conquistarem reconhecimento social, neste caso,
artístico. É igualmente importante lembrar que o poder simbólico é invisível e
só pode ser exercido com a cumplicidade de quem se equivoca em reconhecer que
está submetido a ele, ou que o exerce (NOCHLIN, 2021, p. 1359).
41.
Porém,
interessa-nos assinalar que a luta das artistas por um lugar no mundo da arte
carioca é anterior ao I Salão Feminino de 1931 e, ainda, que este, por não ser
exclusivamente feminino, evidencia como as artistas tiveram que lidar com as
operações ideológicas de gênero. Assim, o I Salão Feminino levanta a pergunta:
porque as artistas mulheres dividiram seu espaço com artistas
homens?
42.
Uma
crônica sobre o I Salão Feminino, na revista Fon-Fon! em 27 de junho de
1931, assinada por Oscar D’Alva, nos dá algumas pistas interessantes. A
primeira delas é que no Salão expuseram também alunas da Escola Orsina da
Fonseca e da Escola Profissional Paulo de Frontin. As duas foram escolas
profissionalizantes extremamente atuantes na chamada República Velha na
profissionalização de jovens mulheres. A Escola Orsina da Fonseca foi
criada em 1911 pela então Primeira-Dama do Brasil, Orsina da Fonseca, esposa de
Hermes da Fonseca que, junto à Leolinda Daltro e a poetisa Gilka Machado,
criaram o Partido Feminino Republicano (PFR). A escola foi, portanto, uma
iniciativa do PRF para formar jovens meninas e mulheres, oferecendo-lhes o
acesso ao conhecimento de literatura, artes e ofícios. A Escola Profissional
Paulo de Frontin foi criada em 1917 no âmbito
das discussões da Conferência para o Progresso Feminino, organizada pela
Federação Brasileira para Progresso Feminino, capitaneada pelo movimento
feminista em torno de Bertha Lutz. A Conferência apresentava questões de ordem
para a formação profissional para as mulheres. Da “Comissão de Educação e
Instrução” da Conferência fazia parte Carneiro Leão, Diretor de Instrução
Pública do Distrito Federal. Um dos grandes investimentos de admisntração de
Carneiro Leão foi o a criação de escolas profissionalizantes, sobretudo para as
jovens mulheres. Os cursos profissionalizantes davam destaque ao bordado, mas,
também, à datilografia, estenografia e escritos comerciais, para inserí-las no
mercado de trabalho. Além destes, era dado especial destaque aos cursos de
desenho. “Nelas o desenho e a modelagem são a base de tudo. Trabalho algum é
executado antes de devidamente projectado e desenhado pela alumna”, dizia
Carneiro Leão (apud BONATO, 2001, p. 4). O desenho, para Carneiro Leão, era a
base para a “ciência do lar” e a “educação doméstica”.
43.
No início
da década de 1930, a despeito de toda a misoginia e oposição masculina, o
movimento feminista havia conquistado espaço na sociedade carioca na luta pela
conquista do voto pelas mulheres. O movimento havia ganho ainda o apoio de
Alzira Vargas. Um vasto grupo de mulheres do universo das letras, das artes e
intelectuais em geral havia se aproximado de Bertha Lutz. A pintora Sylvia
Meyer foi uma das primeiras artistas a se unir a FBPF. Sylvia desenhou em
pergaminho a Moção entregue ao Presidente Getúlio Vargas, cujo texto foi
escrito pela escritora Júlia Lopes de Almeida. Posteriomente, Georgina de
Albuquerque também participaria da FBPF.
44. Assim, o I Salão Femino de Artes incluiu os trabalhos de
jovens mulheres provenientes das classes trabalhadoras, dos colégios
profissionalizantes. Na apreciação de Oscar D’Alva, “Ali figuram, não só
ensaios, mas também obras definitivas, - não só produtos de talento mais ou
menos vulgares, como criações de alto valor artístico” (Fon-Fon!, ano
XXV, n. 24, 13 jun. 1931, p. 48).
45. D’alva também elabora uma lista hierárquica entre as artistas
femininas profissionais. Inicia com a escultora Nicolina de Assiz, passando a
comentar a tela Alvorada da pintora mineira Maria Francelina. O mais curioso na observação de D’alva
sobre essa obra é que o cronista confirma o olhar masculino sobre o corpo nu
feminino como inerente ao male gaze - um corpo disposto para o prazer
masculino -, alertando que tal olhar não é desperto na tela da pintora: “o
olhar masculino se esquece da nudez da modelo para admirar a beleza do modelado,
o esplendor da forma feminina iluminada pelo sol nascente, se não é este o sol
que se ilumina com aquele esplendor” (Fon-Fon!, ano XXV, n. 24, 13
jun. 1931, p. 48, grifo da autora).
46. D’Alva elogia, ainda, os trabalhos de Elisa de Carvalho,
Eneida Silva, Maria de Lourdes de Sá Earp, Lydia Gomes de Oliveira, Lygia de
Oliveira. Para todo este grupo de artista D’alva evidencia qualidades e tece
elogios. Por fim, tece elogios e críticas a pintora Candida de Gusmão Cerqueira (Campos de Goytacases, 1901 -
Rio de Janeiro, 1994), uma das organizadoras do Salão:
47.
A primeira vista impressionam mal os seus
trabalhos. Embora sem competência para julgar, nem por isso deixamos de ter a
liberdade de sentir. E perante nosso sentimento não nos agradam os processos da
pintora. São açás os chamados mais ou menos futuristas, muito embora sejam
ultrapassadistas. Como quer que seja não os apoiamos [...]. Condizendo com o
processo pictural [...] a idealização plástica dos casebres erguidos a beira
d’agua deu-nos reais dimensões de beleza. O que vem demonstrar o erro dos
juízes apressados, e ao mesmo tempo revelar que a pintora poderá sem processos
extravagantes, e mesmo apesar deles, merecer lugar de destaque entre os
cultores femininos da pintura. (Fon-Fon!, ano XXV, n. 24, 13 jun. 1931,
p. 48).
48. Candida de Gusmão Cerqueira pertenceu ao Núcleo Bernardelli, participando das mostras coletivas do
grupo denominadas de “salões” e realizadas em 1932, na Sociedade Rio-Grandense
de Cultura, no Liceu de Artes e Ofícios; em 1933, na Escola Nacional de Belas
Artes em 1934; e em sua própria sede, em 1935. Foi muito ativa nas
manifestações do Núcleo contra a pressão dos grupos acadêmicos na ENBA, que
dificultavam a acesso de seus integrantes ao Exposição Geral de Belas Artes e à
própria Escola. Foi casada com outro participante do Núcleo Bernardelli, José
Meneses, e teve um autorretrato seu pintado por Candido Portinari. O grupo Bernardelli
incorporou o construtivismo de Cézanne, o cubismo, o impressionismo e
pós-impressionismo que os auxiliavam na busca da liberdade de expressão
artística.
49. Candida foi também uma das artistas expositoras das
coletivas internacionais Latin American Exhibition of Fine and Applied Art
e Latin American Exhibition of Fine Arts, no contexto da Feira Mundial
de Nova York. A primeira, realizada em 1939, contou com artistas, como Anita
Malfati, Vicente
do Rego Monteiro, Tarsila do Amaral, Di
Cavalcanti, Cicero Dias, Lasar
Segall, dentre outros. A segunda, em Riverside, ocorreu em 1940 (CARDOSO,
2019).
50. Acreditamos que a pintura de Candida para Oscar D’Alva -
por ser “singular”, uma vez que a artista fazia parte do grupo de pintores do
Núcleo Bernardelli - certamente se distanciava de muitas faturas provenientes
da ENBA, como a própria fatura de Georgina de Albuquerque. Não obstante,
Candida de Gusmão Cerqueira faz parte da coleção de artistas obliteradas pelo
cânone.
51. Uma Paisagem de Candida de Gusmão [Figura 5] nos parece se
aproximar do impressionismo e, em certa medida, dialogar com Cézanne. Vemos
pinceladas flúidas, sugerindo certa abstração na construção das figuras e da
paisagem. Há, também, a sugestão de um mosáico de cores, com cada parte tendo
uma função na composição. A profundidade é sugerida pela variação de tons e de
cor. O mesmo ocorre com as formas, construídas em diferenças de azuis, verdes,
ocre e amarelos. O verde da vegetação e os cinzas e azuis se espalham em blocos
fragmentados que se integram ao todo que é articulado. De certo modo, Paisagem
de Candida de Gusmão parece sugerir um diálogo pictórico com telas como Mountains
in Provence L’Estaque (c.1880), de Cézanne.
52. A análise sobre o I Salão Feminino, ao agrupar artistas
profissionalizantes e artistas homens, parece indicar que a mostra foi mais um
engendramento político do Governo Vargas, do que uma mostra para apresentar as
obras das artistas mulheres já profissionalizadas da época. Assim, o Salão não
parece sugerir “um salão
Feminino no limiar da década de 30 [...] o que sinaliza os primeiros passos em
direção à liberdade [da mulher], uma atitude moderna para seu tempo” (LUZ,
2005, p. 112).
53. De todo modo, interessa à nossa análise as estratégias
utilizadas por Georgina de Albuquerque no contexto das exposições em 1931 [Figura 6]. A pintora
decidiu se engajar na organização do I Salão Feminino. Certamente esta escolha
poupou sua imagem entre os acadêmicos, ao mesmo tempo em que a colocou em um
projeto que tinha um forte caráter político.
54. Percebemos que a partir da década de 1930, a instituição
“casal” vai sendo substitída progressivamente pela carreira solo de Georgina de
Albuquerque, que vai ganhando projeção como pintora e, por consequencia,
deixando de ser a snra. Luílio de Albuquerque. O número de exposições do casal
praticamente desaparece e Georgina passa a expor com frequência, tanto em
mostras solos como em coletivas. Isso leva a supor que, a partir dos anos 1930,
Georgina já é uma pintora consagrada.
55. Em 1933, Georgina expôs no Palace Hotel e foi apresentada
pela imprensa como a primeira pintora do Brasil, com concepções próprias,
com capacidade de construir uma personalidade no mundo artístico [Figura 7]. A mostra
teve as participações do Ministro da Educação e outros representantes do mundo
oficial, Alzira Vargas e vultos do universo inetelectual e artístico. O artista plástico Hernani de Irajá, em um dos exertos da crônica sobre essa
exposição de Georgina, comentou: “Seus nus contam a vitória da luz, da cor, da
forma que ali se eterniza numa perenal primavera: seus recantos de praia
ensolarada ou penumbra misterioras de bosques e jardins dão-nos, para dentro
d’alma, a convicção de que a vida é mesmo boa quando o espírito se purifica na
religião encantadora da beleza” (Fon-Fon!, ano XXVII, n.30, 29 jun.
1933, p.15).
56.
Mais à
frente analisaremos alguns nus de Georgina. Por enquanto, entendemos ser
importante ressaltar que a análise de Irajá sobre os nus de Georgina repete o
mesmo olhar de D’Alva sobre o nu da pintora Maria Francelina: a mulher e suas
criações são colocadas no campo da idealização porque, para Irajá, eternizam
“uma perenal primavera.”
57. Ainda em 1933, Georgina participa com Lucílio do 5º Salão
de Artistas Brasileiros no Palace Hotel [Figura 8]. Esta mostra coletiva contou com a presença
de Portinari, Carlos Oswald, Hernani de Irajá, Oswaldo
Teixeira, dentre outras artistas mulheres, Maria Francelina, Palmyra Pedroa
Domenichi, Solange Frontin Hess, Rosalita Candido Mendes, Luci Poli,
Nicolina de Assis.
58.
Em 1936,
Georgina participa do Salão dos Artistas Brasileiros [Figura 9], uma feira de
arte organizada pela deputada paulista Carlota Pereira de Queiros (São Paulo,
1892 - São Paulo, 1982), o que sugere a sua aproximação com o movimento
feminista. Queiros era médica, pedagoga e, não só foi uma militante feminista,
como foi, também, a primeira Deputada eleita para o Parlamento no Brasil. Em
1936 vemos, também, Georgina de Albuquerque participando de um evento da high
society, como membro do júry do “Reveillon de Inverno,” organizado pelo
pintor Celso Kelly, no Automóvel Clube do Brasil, abrindo a
estação de inverno carioca. Georgina foi júri no concurso de penteados e
arranjos de cabeças, organizado por Mendel, “o notável artista parisense, que
faz milagres de beleza e expressão com a sua fotografia” (Fon-Fon!, 28
out. 1936, p. 35). O episódio foi seguido por baile que reuniu as grandes damas
cariocas, a “raffinée dos nossos mais expressivos valores sociais” (Fon-Fon!,
28 out. 1936, p. 35). O júri foi composto também pelas senhoras “Laurinda
Santos Lobo, a benemérita patroness dos artistas, senhora Carlos Gross, senhora
Leonor Murtinho Guimarães, sra. Maria Helena de Freitas Guimarães, Srs Rodrigo
Otávio, Chermont de Brito, Miranda Neto e Povina Cavalcanti” (Fon-Fon!,
28 out. 1936, p. 35)
59. Em 1937, é criado o Museu Nacional de Belas Artes.
Lucílio de Albuquerque falece em 1939. Em 1940, o Ministério da Educação e
Saúde homenageia o pintor com uma grande retrospectiva no novo prédio do
Ministério da Educação e Saúde (MES). Segundo Angela Ancora da Luz, Lucílio era
um pintor de todos os gêneros e que “aos poucos procurou libertar-se da ‘forma’
acadêmica na busca da forma modernista,” alcançando liberdade “sobretudo nas
paisagens, onde as áreas de cor procuram organizar árvores, montanhas e céus,
mas não chegou a abalar os fundamentos acadêmicos (LUZ, 2005, p. 116). É
importante destacar que sua retrospectiva foi realizada no MES, “local de
exposição, emblema da direção que a década [de 1930] afirmava” (LUZ, 2005, p.
116).
60. Três anos após a realização da mostra de Lucílio, em
1943, Georgina de Albuquerque organiza em sua residência, na Rua Ribeiro de
Almeida n. 22, no bairro de Laranjeiras, Rio de Janeiro, a Exposição Lucílio de
Albuquerque, com o objetivo de preservar a obra do artista ameaçada de
dispersão. Muito embora, posssamos ficcionar que Georgina quisesse prestar uma
homenagem ao marido que muito a auxiliou em sua carreira como artista, a
pergunta que se coloca é: porque Georgina não dá existência a um museu do
casal, uma vez que ambos criaram em parceria? Será que podemos entender essa
tomada de decisão de Georgina a partir das análises da historiadora Michelle
Perrot (2007), que afirma que as mulheres raramente construíam memórias de si
próprias porque se sentiam secundarizadas na hierarquia de gênero? Será que
Georgina se considerava uma pintora menor que Lucílio, mesmo com a sua já
consagrada posição nos anos 1940? São perguntas complexas. Contudo, de
alguma forma, apontam para uma certa instabilidade na percepção de Georgina
sobre si mesma e que merece uma pesquisa mais aprofundada.
61. A partir da década de 1940, Georgina não é nem mencionada
pela Imprensa como a viúva de Lucílio. Torna-se um nome independente, uma
mulher atuante no mundo social e das artes. Em 1948, participou da
Exposição de Pintura Internacional Feminina, no Ministério da Educação [Figura 10]. Mostra que
também contou com a presença de várias outras artistas, como Maria Francelina e
Jenny Pimentel Barbosa. Entre todas, Georgina foi a mais distinguida. Fez
parte, nessa mesma mostra, da mesa de encerramento com as pintora Regina Veiga
e Jeronyma de Mesquita, e o Ministro do Uruguai, Aliséres.
62. A última presença de Georgina de Albuquerque na revista Fon-Fon!
ocorre em 1958, por ocasião do “Mate Gelado” oferecido ao embaixador Negrão de
Lima no Teatro Municipal do Rio de Janeiro [Figura 11]. O evento
foi organizado por Fernando Pamplona, que convidou artistas da ENBA para
decorar o teatro para o baile carnavalesco daquele ano com motivos do folclore
afro-brasileiro estilizados “numa bela harmonia de luz e cores” (Fon-Fon!,
s/n, 1958, p. 52). O evento contava ainda com as persenças de Hilda e Quirino
Campofiorito. Georgiana de Albuquerque é, então, mencionada como a ex-Diretora
da Escola Nacional de Belas Artes, e, sua imagem sugere uma mulher feliz e
realizada.
63.
Georgina
faleceu em 1962 como uma pintora consagrada e talvez a única, entre as as
pintoras provenientes da ENBA a ser lembrada na história da arte brasileira.
Foi uma artista que produziu intensamente em seu “tempo vivido”: 54 exposições
em vida e, ainda 19 mostras póstumas - entre 1997 e 2004 -, segundo dados
informados pela Enciclopédia Itaú Cultural. Acreditamos que sua trajetória,
formada por suas opções de vida, seu equilíbrio estratégico e sua
institucionalização na ENBA sejam os fatores mais relevantes no esclarecimento
dos motivos que a levaram a ser consagrada em seu tempo e lembrada a
posteriori pela história da arte brasileira.
64. À luz da trajetória acima, analisaremos, na próxima
parte, o modo como Georgina de Albuquerque representou o nu femininino e
idealizou a feminilidade, a partir de quatro obras que ela dedicou ao tema.
A poética do nu feminino em Georgina de Albuquerque:
“intervencões feministas”[5]
65.
Algumas
informações são bastante significativas para percerbermos o modo como Georgina
de Albuquerque criou os seus nus na década de 1920. Sabemos que na Europa,
tanto na França quanto na Grã Bretanha, as artistas mulheres travaram uma
verdadeira batalha para terem acesso às classes de modelo vivo, porém, quando
finalmente tiveram, outra empecilho surgiu para elas: “a posse do corpo, fosse
ele feminino ou masculino” (SILCOCK, 2019, p. 21).
66.
As
primeiras gerações de alunas que passaram frequentar as classes de modelo vivo,
enfrentaram um enorme estigma associado ao nu realizado por uma mulher
(SILCOCK, 2019, p. 21). Segundo Jane Silcock (2019, p. 23), a aspirante a artista passou a dividir-se entre
ser “uma mulher honesta,” ou “uma grande artista,” uma vez que as duas
condições eram, a princípio, consideradas mutuamente exclusivas. Silcock conta
como a estudante inglesa Kathleen Bruce, então com 23 anos, na Académie
Calorossi, em Paris, em 1901, se confrontou pela primeira vez com um modelo nu
masculino. Bruce deixou escrito em seu diário que: “Antes da perda da razão pude
controlar o instinto, virei-me, fugi e fechei-me no lavatório e comecei a
vomitar.” Ana Paula Simioni também relata o exemplo da pintora Helena Pereira
da Silva Ohashi, em 1913: “Comecei o modelo vivo pela primeira vez na Academia
Julian da Passages de Panoramas; quando vi o modelo nu, muito me intimidei. Eu
ficava acanhada” (SIMIONI, 2007, p. 95).
67.
A
estrutura extremamente generificada do mundo da arte da época posicionava as
artistas femininas no limiar entre ser uma “mulher honesta” ou “uma boa pintora,
imagem associada a de uma mulher decaída” (REYNOLDS, 2000, p. 328). Para além
desta situação extremamente constrangedora, as artistas femininas, ainda eram
acusadas de serem incapazes de criar uma nova representação sobre o corpo nu,
feminino ou masculino. Segundo a crítica da época e também dos artistas
masculinos, as artistas femininas apenas reproduziam o modo masculino do gênero
nu. Como resultado, seus nus femininos ou masculinos eram exemplos de obras mal
executados, porque não correspondiam à uma experiência artística feminina, ao
contrário, apenas apontavam para suas deficiências artistas (REYNOLDS, 2000, p.
330). A historiadora Margaret Walter faz ainda a ressalva que “mesmo com o
advento do nu de vanguarda nada mudou para as artistas mulheres” (WALTERS,
1979, p. 345).
68.
O fato é
que oriundas de classes de modelo vivo, cujos mestres eram homens e, para serem
aceitas nos Salões, as artistas criavam a partir das recomendações e
ensinamentos de seus mestres (homens). Como poderiam criar uma experiência feminina
de representação do corpo humano, frente a todos as restrições artísticas e
sociais? Porém, como ressaltam as Silcock, Walters e Reynolds, o ato das
artistas femininas representarem um corpo nu, feminino ou masculino, mesmo que
a partir dos ideais masculinos, simbolizou, de fato, uma ruptura com a
tradição. Esta atitude representou uma tomada de posição que indicava como as
artistas, progressivamente iam transpondo as dificuldades impostas e, ainda,
passaram a ter, elas mesmas, o olhar de controle (o gaze) sobre o corpo
do outro, fosse feminino ou masculino.
69.
Assim,
entendemos que é dentro deste contexto que devemos situar a análise dos nus
femininos de Georgina Albuquerque. Como veremos abaixo, nos parece que a
artista soube transitar entre poéticas pictóricas distintas, como o academicismo e o impressionismo.
70. Quando Angyone Costa, em A inquietação das Abelhas (1927)
pergunta à Georgina sobre o “caráter de sua pintura,” a artista responde:
“Impressionista, que é a feição moderna, alguma coisa de novo, em pintura. Foge
inteiramente aos moldes pré-estabelecidos” (COSTA, 1927, p. 88). Em 1927, o
Impressionismo era um movimento de “feição moderna.” Porém, vale notar que, no
Brasil, o pintor Eliseu Visconti, por exemplo, já desenvolvia a técnica do registro
dos efeitos da luz solar nos objetos e seres humanos desde o final do século
XIX, com a qual ganhou várias medalhas; em
1927, ele era um artista consagrado no Brasil e bastante conhecido na França.[6]
71.
Outra informação
refere-se a tese premiada de Georgina de Albuquerque, em 1937, entitulada, “O
desenho como base no Ensino das Artes Plásticas” (1964) apresentada para o
concurso de Professor-tilular. A tese, com 124 páginas, é dedicada a Lucílio -
“AO PATRONO DA CADEIRA EM CONCURSO O GRANDE ARTÍSTA E EMÉRITO PROFESSOR LUCÍLIO
DE ALBUQUERQUE” (ALBUQUERQUE, anos 1940, p.2) - e é uma grande digressão sobre
a importância do desenho no ensino de arte.
72.
A tese é
dividia em duas grandes partes. Na primeira, Georgina traça uma história
do desenho desde as pinturas rupestres, passando pelo desenvolvimento da
técnica entre os assírios, egípicios, gregos até o Renascimento. O
Renascimento, segundo Georgina, marca o momento de maturidade e vigor nas
artes. Em sua visão, Leonardo da Vinci e Michelangelo Buonarroti foram os
maiores mestres da história da arte, uma vez que implementam as noções e os
elementos mais importantes para a construção de um espaço plástico: a
perspectiva e a geometria. Assim o espaço plástico renascentista, para
Georgina, é o exemplo da perfeição. Para ela, as cópias tinham imensa
importância na construição de um bom desenho, uma vez que possibiltavam a
percepção sobre a distibuição da luz e dos materiais utlizados.
73.
Ao ler a
tese de Georgina hoje, e refletindo sobre os argumentos que ela desenvolve para
justificar a importância do desenho nas artes visuais, pode parecer
contraditória se levarmos em conta sua resposta a Angyone Costa em 1927. O
Impressionismo foi o primeiro movimento na pintura moderna a romper
relativamente com os cânones acadêmicos. Contrapondo-se a estes, a pintura
feita ao ar livre e a captação das variações de luz e cores da Natureza eram os
elementos fundantes da práticas dos artistas que procuravam se libertar da
simetria e dos conceitos geométricos, passando a obedecer à sua própria
perceção sensorial no momento da criação, afirmando a liberdade de expressão
individual do artista. De modo que, se a artista se “filia” a um movimento que
rompe com os cânones acadêmicos, como e porque escreve uma tese, onde enfatiza
a importância do elemento mais importante para a pintura acadêmica?
74. O desenho, desde os primeiros tratados renascentistas,
como salientam os tradistas Alberti, em Da Pintura (1435), Francisco de
Holanda, Da Pintura (1548) e Giogio Vasari em sua Vida dos Artistas (1550)
é elemento fundante na arte para pintores, iluminadores, arquitetos e
escultores. Do mesmo modo, as primeiras academias, como a de São Luca, em Roma,
e as academias de Florença e de Bolonha, são erguidas tendo o desenho como base
para a aprendizagem do artista (PEREIRA, 2016, p. 14). O historiador da arte
português, Fernando António Pereira afirma que, entre os séculos XVI e XVIII,
havia uma relação direta entre a prática artística e o desenho, ensino
artístico, produção literária sobre arte, “materializada em tratados,
discursos, biografias de artistas, dicionários, descrições, ensaios ou cartas”
(PEREIRA, 2016, p. 15). De modo que a tese de Georgina parece seguir preceitos artísticos renascentistas e
acadêmicos.
75. Porém, na entrevista a Angione Costa, em 1927, dez anos
antes, afirmava ser uma artista moderna, cuja pintura fugia inteiramente dos
moldes pré-estabelicidos. Ives e Stein, pesquisadores do Metropolitan Museum
of Art, de posse de um grande número de desenhos de Vincent Van Gogh,
afirmam a importância do desenho para o artista: “Van Gogh engajou desenho e
pintura em um diálogo rico, o que lhe permitiu realizar plenamente o seu
potencial criativo em ambos os meios de expressão” (IVES; STEIN, 2014).[7] Asssim
como Van Gogh, supomos que Georgina de Albuquerque, ao defender o desenho como
técnica fundamental para a realização da pintura, parece ter, também, mantido
um diálogo frutífero com o desenho, espandindo sua criatividade. Esta
capacidade da artista de dominar o desenho repercutiu no mundo da arte,
confirmando, de certo modo, as práticas de ensino acadêmicas na ENBA.
76.
Uma
categoria importante da arte clássica ocidental, o nu feminino, é muitas vezes
vista como pornográfica e erótica pelas historiadoras/es da arte feminista. A
categoria tem sido examinada por eles e elas como objeto de um olhar fascinado
- do artista masculino -, uma vez que, dadas as convenções da pintura clássica,
o nu feminino, na maioria dos casos, é reduzido a um “objeto sexual” (HESS e
NOCHLIN, 1972; BERGER, 1979; WALTERS, 1979; PARKER e POLLOCK, 1981; BROUDE e
GARRAD, 1982; O’NEILL, 1997).
77.
As
figuras femininas, para o conjunto de historiadoras/es da arte elencados acima,
são frequentemente retratadas num espaço privado ou num lugar de fantasia, onde
sua nudez é destinada ao espectador masculino. Para elas e eles, tanto a nudez
como a disposição de corpos, gestos, olhares e movimentos raramente expressam
uma atuação sexual feminina. De fato, na pintura européia clássica, os poderes
sexuais próprios da mulher são minimizados precisamente para intensificar os
sentimentos de potência e domínio que o espectador masculino obtém ao
contemplar os nus - ou “o corpo da modelo,” como ressaltou Oscar D’Alva, em
1931.
78. A distinção que o historiador da arte Kenneth Clark
(1956) faz entre “o nu” e “o despido” é bem relevante nesta análise. Clark diz
que o nu não é simplesmente uma amostra do tema abordado, mas uma “maneira de
ver” e de celebrar a forma humana de acordo com as várias convenções formais
historicamente específicas. O corpo despido é transformado num objeto estético
- é transformado numa “visão” - no nu. Para Clark, o argumento é válido tanto
para os nus masculinos como para os femininos. Contudo, para a historiadora
Eileen O’Neill, ainda permanece a pergunta essencial: qual é a maneira
específica pela qual os nus femininos são representados como objetos, e não
como objeto estético? (O’Neill, 1997. P. 138).
79. Para a historiadora Linda Nead (1992), Clark, em sua obra,
voltou-se para uma tradição específica. The Nude (1956) encontra-se
dentro das tradições de representação clássicas e idealizadoras, nas quais
ganham força as normas culturais gerais e essencialistas contra todos os outros
modos de representação do nu (gótico, barroco, não-europeu, etc.). Todos são
categorizados como transgressores, como um “outro” cultural. O texto de Clark,
para Nead, tornou-se um monumento da cultura oficial. Para ela, o livro de Clark ilustra muito bem as
dificuldades que o nu apresenta a connouisseurship, uma vez que
vagamente baseado em uma estética kantiana da forma pura e da apreciação
desinteressada, seu quadro crítico parece inadequado ao condicionar o nu
feminino em uma simples representação visual do corpo:
80.
Clark evoca o
processo postulado por Freud sobre a sublimação [...] a atividade humana
aparentemente desvinculada da sexualidade, mas que se supõe ser motivada pela
força dos impulsos sexuais. Esses impulsos são sublimados na medida em que são
voltados para um novo objetivo não sexual, como o artístico. De acordo com
Clark, no entanto, os instintos sexuais não podem (e possivelmente não devem)
ser deslocados na criação e contemplação do nu. A experiência estética pura e
independente fica assim seriamente comprometida pelo nu. Se a transmutação dos
impulsos sexuais em criação artística é impossível, então o nu representa
também um risco sexual para a arte. O triunfo de uma representação
“bem-sucedida” do nu é o controle desse risco potencial. (NEAD, 1992, p. 38,
tradução da autora)
81. A luz dos argumentos acima, onde posicionamos os nus de
Georgina de Albuquerque? Aqui analisaremos quatro composições da artista sobre
o tema: Flôr de Manacá (c.1922) [Figura 12], Raio de Sol (1926, originalmente
intitulada Dia de Verão) [Figura 13], e dois
trabalhos sem título [Figura
14 e Figura 15],
sendo um deles de c. 1920. É importante ressaltar que Georgina de Albuquerque
foi uma das poucas artistas mulheres formadas pela Escola Nacional de Belas
Artes a pintar nus femininos na década de 1920, momento em que, como já mencionado,
as hierarquias de gênero eram rígidas e demarcadas. Para uma mulher pintar um
nu feminino, nas condições sociais impostas à mulheres na sociedade
conservadora carioca na década de 1920, é uma decisão que aponta para um
arrebatamento. Supomos que a condição de senhora casada e o seu comportamento,
que transitava entre o delicado e o sóbrio, devem ser levados em conta no
ímpeto de adentrar um tema masculino, por excelência.
82. Tanto Flôr de Manacá quanto Raio de Sol
foram telas muito bem recebidas pela crítica de arte do período, constituída
por homens que os viam como repletos de luz e harmonia dentro de uma duradoura
primavera. Em Flôr
de Manacá [Figura 12],
vemos o corpo de uma figura feminina nua, ocupando um terço da tela, de lado e
com as pernas dobradas que se projetam em direção ao espectador. A jovem está
sentada, com os braços que se dirigem às flores, deixando ver apenas os seios.
A luz, em tons entre o rosa e o lilás, amarelos, verdes e creme, é o elemento
que projeta o corpo, as flores e a vegetação para criar uma atmosfera
harmônica, onde Mulher e Natureza são uma mesma entidade e conformam a
narrativa da composição. O jogo de luz e sombra constrõe também as noções de
perspectiva e profundide, as quais criam o efeito de que a figura centralizada
é circundada pelas flores e pela vegetação. Na construção da figura feminina,
Georgina demonstra sua extrema habilidade no desenho da figura humana, onde proporção
e simetria são equilibradas e proporcionais. A jovem mulher encarna o arquétipo
do ideal feminino da pintora: embora tenha volume, não é robusta mas esbelta. A
forma é contida e se integra perfeitamente à Natureza, conformando uma imagem,
na qual Georgina logra plenamente sua aspiração de apreender a beleza feminina
em uma Arcádia eterna, inundada de sol. A figura feminina está emoldurada e a
matéria lasciva do corpo feminino e da sexualidade feminina é nitidamente
regulada e contida.
83.
Raio de
Sol [Figura 13] é uma
composição muito semelhante a Flôr de Manacá. O corpo da figura também
ocupa um terço da tela, é circular e centralizado na tela. As pernas cruzadas
parecem se projetar para fora da imagem e encobrem a região púbica. A cabeça e
os olhos baixos sucitam um certo diálogo com as Vênus Capitolina e Pudica que
encobrem os seios ou a púbis - embora a figura feminina na tela Georgina esteja
sentada e não na posição vertical, como as Vênus de Praxíteles (364-361 a.C) e
suas várias cópias. A luz, em mistura dos tons terracota e rosa, predomina na
composição e se espalha de maneira imprecisa por todo o quadro, criando a
sugestão de que mulher e flôr (Natureza) são, mais uma vez, uma mesma entidade.
Em relação ao tratamento da figura humana, a artista representa um corpo, cuja
forma é ligeiramente pesada: os seios são firmes, ombros arredondados e cabeça
ovalada, em pose idealizada e caráter sonhador.
84.
Assim, as
duas composições referidas resumem a fascinação que Georgina parecia sentir
pelo nu feminino e sua capacidade para criar obras com um joie de vivre,
representadas pela integração Mulher e Natureza: Uma natureza de primavera
eterna cheia de vida e de cor. Contudo, Flôr de Manacá e Raio de Sol
mostram contornos, margens e molduras como procedimentos e formas que regulam
tanto as formas como o corpo feminino, chamando a atenção para uma conduta
adequada do espectador em perspectiva (masculino).
85.
Porém,
também percebemos que as composições apresentam rupturas na representação da
profundidade visual. Ao utilizar-se destas rupturas, próprias da técnica do
impressionismo, em ambas as telas, Georgina despertou no espectador as noções
de registro e de realidade visual, ao utilizar-se dos efeitos transitórios de
luz e cor. Por outro lado, a artista não rejeitou os tratamentos imaginativos
ou idealizadores convencionais da pintura acadêmica, como a posicionalidade das
figuras femininas que estão, como dissemos acima, contidas na moldura. De modo
que, a importância do nu feminino, tal como executado por seus pares homens,
não foi reproduzida: embora desperte a atenção do espectador masculino sobre o
corpo feminino, este surge em combinação entre cores, tons e texturas. As duas
figuras femininas apresentam-se decorosamente, longe de qualquer sentido de
impudícia ou obscenidade
86.
As obras
da Figura 14 e da
Figura 15 - ambas
sem título, uma delas presumivelmente realizada na década de 1920 - se
diferenciam das analisadas acima porque posicionam a mulher em um ambiente
fechado; portanto, não estão em plein air. Ao mesmo tempo, confundem o
entendimento sobre o que possa ser um ambiente íntimo feminino, porque ambas
representações foram realizadas no ateliê de Georgina e a mulher em tela é uma
modelo. Quando Griselda Pollock, em Marry Cassatt. Painter of Modern Women
(1998), afirma que mulheres representadas em ambientes fechados estão
posicionadas em um espaço moderno, Pollock, primeiramente, relaciona o espaço
íntimo à classe social da mulher em representação, em se tratando de uma mulher
da classe social de Cassatt, falamos da mulher burguesa parisiense. Em segundo
lugar, associa os espaços íntimos bugueses com os espaços da casa reservados ao
universo feminino (quartos de vestir, espaços para maquiarem-se, pentearem seus
cabelos, lerem, escreverem etc).Assim, tais espaços são reservados à intimidade
da mulher burguesa, portanto, são lugares em que os homens não têm acesso,
diferentemente de espaços como o boudoir (POLLOCK, 1998).
87.
A
pergunta que se coloca para esta representação de mulher de Georgina é: porque
uma mulher nua em descanso em seu ambiente íntimo teria a preocupação de
encobrir sua região púbica? Uma primeira resposta indica que há claramente um
distanciamento entre a pintora e a modelo e não uma intimidade entre as duas
mulheres. O desenho, bastante estilizado, parece reforçar a noção da mulher
como um sign - o corpo para a exposição do olhar voyeur masculino -,
porque a figura não só é passsiva, mas a ideia de descanso do corpo feminino é
contraditória, uma vez que a artista usou uma modelo feminino para reforçar a
sugestão de um corpo nu feminino em descanso seguindo representações clássicas.
Neste aspecto, não creio podermos posicionar este corpo de mulher em um espaço
íntimo moderno, como identifica Griselda Pollock, porque o corpo feminino não é
presença, mas objeto de contemplação voyerística.
88. Nesse aspecto concordamos com Candilf quando afirma. em
sua análise sobre o desenho da Figura 14, que “a forma da modelo é carregada de
erotismo, pela posição sinuosa de seu corpo e o ângulo do braço direito, que
repousa sobre o seu órgão feminino - além disso, sua cabeça está inclinada
sobre o sofá e ela permanece de olhos fechados, o que nos remete a um voyeurismo do espectador da cena”
(CANDILF,1986, p. 1127). O corpo feminino como um sign faz de seus contornos,
margens e molduras estejam controlados pelo voyer. No desenho de Georgina, o
tema torna-se um veículo para uma composição artística de áreas com cores
planas e a profundidade da perspectiva é minimizada para que o espectador olhe
para o corpo nu feminino na superfície da imagem e não para o espaço
tridimensional ilusório que ela criava. Por outro lado, a geometria dos
padrões, em cores vivas, com suas cores saturadas estabelecem uma harmonia que
suscita aconchego e leveza para a figura feminina em exposição.
89. Por fim, a tela da Figura 15, sem título e sem data, apresentada por Thaís
Candilf, é proveniente da coleção João Lucílio de Albuquerque. Como ressalta a
autora, a fatura é bastante moderna, e alude a certa abstração, “apresentando
pinceladas largas e sem contornos muito definidos” (CANDILF, 1986, p. 1128).
Esse nu feminino, diferentemente dos demais, não alude a uma metáfora de
Castidade, porque não estão presentes os processos de separação e ordenação da
formação do eu da pintora e do espaço do outro, a modelo. Ainda que a mulher em
representação seja uma modelo, há intimidade entre modelo e pintora, que se
mostra através desse corpo relaxado que, mesmo reclinado e tendo a púbis
encoberta, não pressupõe contenção. A sinuosidade da figura não sugere que os
contornos do corpo estejam controlados pelas formas clássicas de arte que
regulam e mantêm o corpo feminino contido. A pose da mulher em tela pode
representar o feminino em um espaço íntimo, mesmo sendo este espaço o ateliê da
artista.
90. Sem dúvida, Georgina de Albuquerque exibiu a mulher em
seus nus femininos como sexualmente passivas frente ao espectador masculino,
reproduzindo o lugar da mulher nas estruturas de gênero da época. Supomos que
Georgina não ousou, pelo seu próprio caráter e posição, como artista e como
mulher, retirar suas personagens femininas dessa moldura. Seus nus femininos
obedeciam a tradição clássica ocidental masculinista, reproduzindo o binômio
Mulher/Natureza e Homem/Cultura. A mulher em Georgina encarna a Natureza,
habitando a economia libidinal masculina, a Razão. Porém, tais representações
não fazem de Georgina uma artista menor. Ao contrário, como várias artistas
européias, norte-ameriacanas e latinas, ela transpôs resistências artístiscas,
sociais e, também, pessoais, e foi uma das primeiras artistas da Escola
Nacional de Belas Artes a se aventurar em um gênero masculino.
A guisa de conclusão
91. Os nus de Georgina de Albuquerque expressaram a ideia de
que as mulheres devem ser representadas como sexualmente passivas em relação ao
espectador masculino, porque reproduzem o lugar da mulher nas estruturas de
gênero da época. Supomos que Georgina não ousou, pelo seu próprio caráter,
retirá-las dessa moldura. Seus nus femininos obedecem o tradição clássica
ocidental, reproduzindo a distinção Natureza/Cultura. A mulher em Georgina é
Natureza, portanto, subjugada ou fertilizada por meio do poder físico, ou da
potência sexual masculina, porque habita a economia libidinal masculina, a
Razão.
92. Contudo, Georgina foi capaz de se aventurar em um campo
da arte exclusivo ao masculino no Brasil até então, o nu feminino, embora não
se afastando das tradições clássicas e idealizadoras. Ela representou o corpo
com a destreza de uma artista que dominava muito bem a representação do corpo
humano, utizando-se do “instrumento” considerado por ela fundamental para a
arte: o desenho.
93. Como mulher e artista soube habilmente deslizar nas
hieraquias de gênero de seu tempo, construindo de modo desenvolto a sua
autoimagem, cativando a crítica e o público, alcançando autonomia e
reconhecimento, em uma sociedade conservadora e patriarcal. Acreditamos, assim,
que suas manobras, como mulher e artista, foram os principais elementos a
posicionar Georgina de Albuquerque no “tempo memória,” ou no cânone da história
da arte brasileira.
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______________________________
[1] Ver: http://ver-anitamalfatti.ieb.usp.br/1923-1925/
Acessado em 12 mai. 2022.
[2] Ibidem.
[3] Neste artigo estamos utilizando a
versão do texto de Linda Noclhin “Mulheres, Arte e Poder” traduzido por
Leonardo Nomes e publicado na revista Ars, n. 42, ano 19, 2021, p.
1357-1424. Publicado originalmente em:
NOCHLIN, Linda. Women, Art and Power. Nova
York: Westview Press, 1988. Esta tradução utiliza a
versão da coletânea Women, Art and Power, and Other Essays (Nova York:
Routledge, 2018, p. 1-36), devido às revisões produzidas pela autora para o
volume.
[4] É interressante assinalar que muito
pouco sabemos sobre sua vida em Taubaté. Sabemos apenas que em 1900, aos 15
anos de idade, torna-se aluna do pintor italiano Rosalbino Santoro, que vivia em sua casa, e com ele
aprendeu os princíos básicos da pintura, como perspectiva e as técnicas de
mistura de tintas. Como aluna de Santoro, Georgina expôs pela primeira vez, em
1903, na X Exposição Geral de Belas Artes, na ENBA. Podemos assumir, ainda, que
seu nome de solteira fosse Moura de Andrade. Porém, nada sabemos sobre seu
capital hereditário. Também nada sabemos sobre o tempo em que viveu no Rio de
Janeiro antes de seu casamento, ou como foi seu namoro e noivado com Lucílio. O
que indica que para historiadores e críticos de arte, sua vida se inicia após o
casamento com Lucílio de Albuquerque. E, assim, a história se repete desde suas
primeiras notas biográficas.
[5] “Intervenções feministas” é projeto
elaborado pela historiadora da arte feminista Griselda Pollock. O objetivo é
intervir nas obras realizadas por artistas mulheres, ao longo da história da
arte, tomando os estudos em psicanálise, corpo, filosofia, história,
sociologia, narratologia e gênero. Em nossa “intervenção feminista”
utilizaremos os estudos das historiadoras da arte Alison Jaggar, Susan Bordon e
Eillen O’Neill (1978) sobre o corpo; de Linda Nead (1992) sobre arte e
psicanálise e filosofia; e, também, de Criselda Pollock (1998).
[6] Sobre estas informações ver site.
[7] IVES, Colta; STEIN, Susan Alyson. A importância do desenho para Vincent Van
Gogh (1853-1900). Arte e Blog, 29 abr. 2014. Disponível em: https://www.arteeblog.com/2014/04/a-importancia-do-desenho-para-vincent.html
Acessado em 1 mai. 2022.