“Notícias Artísticas”, por Armínio de Mello Franco: Comentário sobre a Exposição de pinturas de Belmiro de Almeida realizada na Escola Nacional de Belas Artes, em setembro de 1894
organização de Ricardo Giannetti
GIANNETTI, Ricardo (org.). “Notícias Artísticas”, por Armínio de Mello Franco: Comentário sobre a Exposição de pinturas de Belmiro de Almeida realizada na Escola Nacional de Belas Artes, em setembro de 1894. 19&20, Rio de Janeiro, v. V, n. 4, out./dez. 2010. Disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/artigos_imprensa/amfranco1.htm>.
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Apresentação
“Notícias Artísticas - Belmiro de Almeida”, artigo da autoria de Armínio de Mello Franco, foi publicado originalmente na coluna “Correspondência” do jornal Minas Gerais, em Ouro Preto, a 19 de setembro de 1894[1]. Apresenta comentário sobre a Exposição de pinturas de Belmiro de Almeida - um conjunto somando vinte e sete telas -, aberta no dia 14 daquele mês, numa das salas da Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro. Trata-se de um texto que permaneceu esquecido nos arquivos da imprensa mineira.
O artigo tem hoje sua importância visto que diante das apreciações do autor compreende-se um pouco mais como foram recebidas no Rio de Janeiro as telas inovadoras de Belmiro, assim consideradas, que integraram a apresentação pública. Logo as linhas iniciais informam ter havido significativa movimentação em torno do evento, já de resto aguardado com expectativa. Perante a expressiva coleção, há que se destacar, sobretudo, ter deixado Mello Franco bem clara sua opinião certeira:
Belmiro de Almeida denunciou-nos o quanto ele sabe compreender a natureza no que ela tem de verdadeiramente estético, revelou-nos toda a pujança do seu talento criador, nesses quadros feitos pelos processos mais difíceis da arte, essa nova pintura que tem feito a sua irrupção triunfalmente pelos domínios da arte acadêmica, avassalando-a; mostrou-nos com eles o quanto ele é capaz de vencer.
Reconheça-se aquele momento como de transição, quando almejava-se a sequência das reformas do ensino no âmbito da transformada Escola Nacional de Belas Artes. Os termos empregados nesse trecho do artigo motivam algumas indagações: o que significava, com maior abrangência, a mencionada irrupção da “nova pintura” pelos “domínios da arte acadêmica”? Para a época, quais as influências e as implicações daquela atuação? Cabe sempre inquirir e mensurar. Em relevância serão fortemente ampliados os conceitos próprios do cronista, caso sejam eles tomados, afinal, como pensamentos de um representante da geração que se lançava, nos derradeiros anos do século XIX.
Puvis de Chavannes, por sua produção marcante, é um pintor lembrado como referência. O médico e professor francês Henri-Étienne Beaunis aparece citado por trabalhos científicos baseados em investigações no campo da apreciação estética e do conhecimento das sensações internas do espectador da arte.
A despeito da brevidade do texto jornalístico, e, como consequência, de uma certa simplicidade em algumas abordagens, tem-se como ponto positivo a sublinhada admiração do jovem Armínio pela pintura de Belmiro: “[...]sentimos com o artista, vemos a natureza reproduzida ali em toda a sua verdade, parece-nos que não se pode apanhar a vida, transportando-a para a tela de um modo diferente daquele.” Está bem definido seu entusiasmo pela forma com a qual o pintor se mostrou naquelas obras recentes, concebidas durante a estada na Itália.
Por outro lado, em vista desses comentários de Mello Franco, que agora revivem, ocorre relembrar o fato do historiador José Maria dos Reis Júnior, ao referir-se ao conjunto de obras mostrado por Belmiro no Rio de Janeiro, naquele ano de 1894, haver manifestado estranheza, conforme sua avaliação, por constatar uma nula reação por parte do público, e, sobremodo, pelo silêncio reinante entre os conceituados críticos de arte da época, denotando indiferença frente a novidade da pintura que se exibia:
Quando regressou [da Europa] em 1887 trouxera-nos a lição do realismo com “Arrufos”; agora, em 1893, trazia-nos a técnica pontilhista. Assim, o Brasil tomava conhecimento dessa inovação quase simultaneamente com seu aparecimento na França, pois em 1894 exibia na Exposição Geral de Belas Artes pinturas realizadas nessa técnica.[...]
Esse conjunto de obras, exemplares pela segurança da execução, do qual constava “Efeitos de Sol”, pelo ineditismo da mensagem deveria ter causado alvoroço. Entretanto, tal não se deu.[...] Surpreende-nos, sim, causa-nos estranheza, o silêncio de Angelo Agostini e de Luiz Gonzaga Duque Estrada, sempre tão zelosos em registrar os nossos eventos artísticos[2].
Em seu estudo, deve-se frisar, Reis Júnior não se referiu diretamente à Exposição do dia 14 de setembro, com as vinte e sete telas, noticiada por Mello Franco, e sim às obras de Belmiro que tornaram-se conhecidas através da Exposição Geral de Belas Artes.
A Exposição Geral de 1894 inaugurou-se a 1º de outubro, logo a seguir, portanto, à mostra individual de Belmiro. Figuraram nove quadros do pintor, de números 34 a 42, conforme respectivo catálogo. Na sequência: Tagarela, (propriedade da Escola); Bom tempo, (propriedade da Escola); Vendedora de fósforos, costume italiano; Nuvens, (propriedade do Exmo. Sr. Dr. Ferreira de Araújo); Vaso com flores, (propriedade da Escola); Depois da patroa, eu!; Retrato de Mme. A.; Efeito de sol; Cabeça de contadina[3]. Algumas dessas obras encontram-se hoje no acervo do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro: Tagarela, Bom tempo, Vaso com flores, - que já se viam indicadas no Catálogo da Exposição Geral como propriedade da Escola -, e, ainda, Efeito de sol. Manteve-se assim alguma unidade na coleção. A tela Vendedora de fósforos, costume italiano integra coleção privada. Nuvens, que pertencera ao jornalista Ferreira de Araújo, consta em recente Catálogo da Bolsa de Arte do Rio de Janeiro, Leilão de agosto de 2008, lote nº 127, com o título Idílio. Essas seis obras receberam comentários de Mello Franco. Outras duas telas mencionadas em seu artigo não integraram a Exposição Geral: Cabeça de ciociaro e Dia infeliz.
O pintor, caricaturista e escultor mineiro Armínio de Mello Franco - irmão do escritor regionalista Affonso Arinos, contista de Pelo Sertão -, nasceu em Bagagem, hoje Estrela do Sul, em meados dos anos setenta. Na juventude, contou, por seu talento florescente, com forte admiração do jornalista Alfredo Camarate e do pintor Emílio Rouède, por uma época residentes ambos em Ouro Preto, onde conheceram de perto seu trabalho. Aliava-se Mello Franco ao gosto estético da nova geração. Tecnicamente, dominava bem o desenho, produzia peças em baixo-relevo, utilizava-se com sabedoria da aquarela. Não havendo escola de Belas Artes em Minas Gerais, onde pudesse ter formação adequada, buscava no ambiente do Rio de Janeiro aprimorar os conhecimentos. São poucos, todavia, seus dados biográficos divulgados. Algumas breves menções de seu sobrinho Affonso Arinos de Mello Franco o recordaram em Ouro Preto, naquele final do século, como bom amigo de boemia do escultor italiano Virgílio Cestari. Mais tarde, por meio da carreira diplomática, e de um impulso constante para a aventura, alcançou os continentes, andando por lugares como Quito, Haia, um longo período em Londres, Jerusalém, Panamá, Shangai. Deixa entrever seu fim de vida na condição de interno de um sanatório de tuberculosos de Montana, na Suíça, por um curto período, no início dos anos 1930, morrendo pouco depois num hospital de Paris[4].
Por intermédio destas “Notícias”, o correspondente Armínio de Mello Franco, como um observador privilegiado, trouxe aos leitores mineiros, naquele setembro de 1894, a informação do último acontecimento artístico do Rio de Janeiro, vale dizer, da estreia da nova pintura de Belmiro de Almeida no país. Em primeira mão.
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CORRESPONDÊNCIA
NOTÍCIAS ARTÍSTICAS - BELMIRO DE ALMEIDA[5]
Rio, 15 de setembro.
A exposição do Belmiro, que devia ter-se aberto há um mês, o que não se deu por motivo de desacordo entre o artista e o diretor interino da Escola de Belas Artes[6], inaugurou-se ontem em uma das salas dessa Escola.
Logo que foi anunciada no dia 13, tudo quanto havia de mais puro, de mais fino no mundo artístico e literário do Rio, afluiu para vê-la, o que é para o Belmiro uma prova do bom conceito e da simpatia de que ele goza e da ansiedade com que era esperada a sua exposição.
São 27 esplêndidas telas, todas executadas em Roma de 1892 a 1893, dispostas com arte, com sentimento, na sala artisticamente ornada de ricas tapeçarias, 27 bonitos trabalhos, com os quais mostrou-nos o Belmiro que todas as esperanças que prometia o seu talento, já conhecido, não eram vãs, que ele era realmente um artista.
Com efeito, diante daquelas 27 telas, diante, por exemplo, daquele Efeito do sol [Figura 1] - uma bonita figura de contadina, de um desenho corretíssimo, admiravelmente pousada numa paisagem serena, muito plácida, opulentamente banhada de um sol de estio, vibrante, que beija lascivamente a sua face sadia, muito corada, sente-se um bem estar, uma impressão agradável que só dá um quadro verdadeiramente bom.
Impressionaram-nos também dois outros quadros deliciosos - Bom tempo [Figura 2] e Nuvens [Figura 3], este que foi adquirido pelo dr. Ferreira de Araújo, e aquele pela Escola de Belas Artes.
Bom tempo e Nuvens são dois capítulos admiravelmente trabalhados de um mesmo romance muito simples: - o primeiro, em um jardim, em plena luz de um belo dia de sol, sentada à beira de um tanque uma graciosa camponesinha italiana sorri, enquanto seu namorado, o pastor, - um belo rapagão, que ela vira aproximar-se sorrateiramente, sem que, por malícia, deixasse-lhe ver que o percebera, com um raminho faz-lhe cócegas titilando-a na nuca, fazendo-a rir de gozo, voluptuosamente; o segundo - Nuvens - a mesma paisagem, mas na penumbra de uma manhã hibernal, nevoenta; o pastor assenta-se no segundo plano, à borda do mesmo tanque, meditativamente, olhando despeitado para a camponesinha que passeia arrufada, sem querer olha-lo, fazendo o seu tricot, afetando uns ares de indiferença, com que quer feri-lo no coração de amante.
Estes dois quadros, no estilo de Puvis de Chavannes, feitos só de nuanças, dão-nos uma impressão de calma, de frescura, trabalhados com um perfeito apuro de observação e de sentimento e com uma correção de linhas admirável, com um esmerado estudo da distribuição de luz, do claro escuro, dificílimo naquele gênero.
Diz Beaunis, em seu livro sobre as sensações internas que um espectador que tenha verdadeiro sentimento artístico, quando se acha diante de um quadro ou de uma estátua não se contenta de examiná-lo com um olhar imóvel; não se contenta de receber nos olhos a simples silhouette dessa estátua ou a impressão em massa desse quadro; seus olhos seguem as curvas do corpo, as inflexões dos membros, o contorno do desenho, a cabeça inclina-se, levanta-se, abaixa-se, fazendo a cada instante variar o ponto de vista; suas mãos mesmo desenharam o contorno que o seduz; refazemos por assim dizer essa estátua ou esse quadro, vazando nele alguma cousa de nós mesmos, animando-o com o nosso sentimento e admirando-o cada vez mais ainda[7].
É essa a sensação que se tem diante dessas duas telas magníficas, profundamente sugestivas; diante delas sentimos com o artista, vemos a natureza reproduzida ali em toda a sua verdade, parece-nos que não se pode apanhar a vida, transportando-a para a tela de um modo diferente daquele.
Belmiro de Almeida denunciou-nos o quanto ele sabe compreender a natureza no que ela tem de verdadeiramente estético, revelou-nos toda a pujança do seu talento criador, nesses quadros feitos pelos processos mais difíceis da arte, essa nova pintura que tem feito a sua irrupção triunfalmente pelos domínios da arte acadêmica, avassalando-a; mostrou-nos com eles o quanto ele é capaz de vencer.
Agradam-nos também pelo modo por que são executados o Vaso com flores [Figura 4], a Vendedora de fósforos (costume italiano) [Figura 5], a Tagarela [Figura 6], a Cabeça de Ciociaro, uma belíssima cabeça de homem, dessa bela raça italiana, muito expressiva, tratada com muito esmero e com um estudo perfeito -, o Dia infeliz, um quadrinho poético, muito sugestivo.
Agora tenho o orgulho de dizer que Belmiro de Almeida é mineiro, e mineiro genuíno; sentindo que não houvesse ainda em nenhum ponto do vasto território de Minas um só trabalho seu[8].
ARMÍNIO DE MELLO FRANCO.
[1] FRANCO, Armínio de Mello. Notícias Artísticas - Belmiro de Almeida. Correspondência. Minas Gerais. Ouro Preto, 19 set.1894, p. 5.
[2] REIS JÚNIOR, José Maria dos. Belmiro de Almeida (1858-1935). Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1984, p. 35-36.
[3] CATÁLOGO DA EXPOSIÇÃO GERAL DE BELAS ARTES, 1894. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Belas Artes, p. 7-8. Exemplar da Biblioteca do Museu Nacional de Belas Artes. Pesquisa de Arthur Valle.
[4] MELLO FRANCO, Affonso Arinos de. Roteiro Lírico de Ouro Preto. Rio de Janeiro: Sociedade Felippe D'Oliveira, 1937. Um estadista da República. Afrânio de Melo Franco e seu tempo. Fase provincial. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1955. A alma do tempo: memórias (formação e mocidade). Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1961.
[5] Texto com ortografia atualizada.
[6] A desavença, às vésperas da exposição que deveria ter acontecido no mês de agosto, deu-se entre Belmiro, então professor interino na vaga de Pedro Weingärtner, na aula de Desenho figurado da Escola Nacional de Belas Artes, e o diretor interino da instituição, Rodolpho Amoêdo.
[7] BEAUNIS, Henri-Étienne. Les sensations internes. Bibliothèque Scientifique Internationale, vol. LXVII. Publiée sous la direction de M. Émile Alglave. Paris: Félix Alcan, Éditeur, 1889, p. 140-141. Na época da publicação deste trabalho H. Beaunis era professor de fisiologia na Faculdade de Medicina de Nancy e diretor do laboratório de psicologia fisiológica na Sorbonne (Hautes-Études). Os comentários de Armínio de Mello Franco estão baseados no parágrafo original seguinte: “Quand on est devant une statue ou un groupe, on ne se contente pas de l'examiner d'un oeil immobile; on ne se contente pas de recevoir dans l'oeil la simple silhouette de cette statue ou de ce groupe, et pour s'en assurer, il n'y a qu'à regarder le premier amateur venu, je ne parle pas du spectateur banal qui jette un coup d'oeil et qui passe, mais du véritable connaisseur. Celui-ci ne reste pour ainsi dire pas un moment en place; ses yeux 'suivent' les courbes du corps, les inflexions des membres; la tête s'incline, s'élève, s'abaisse, faisant à chaque instant varier le point de vue; ses mains même dessineront dans l'espace le contour qui le séduit; c'est qu'en effet nous associon à la vue les sensations musculaires; nous ajoutons à l'élément visuel purement passif, l'élément actif, musculaire, qui nous appartiens, qui vient de nous-mêmes; nous refaisons pour ainsi dire cette statue, nous y mettons quelque chose de nous, nous animons ce marbre inerte et froid et nous l'en admirons davantage.”
[8] Ao concluir o artigo, lamentou Armínio, com razão, não haver em Minas Gerais um só trabalho do pintor. A bem da verdade, Belmiro de Almeida, nascido no Serro em 1858, com uma carreira toda ela construída entre Rio de Janeiro e Paris, onde faleceu em 1935, manteve realmente uma ligação muito discreta com a vida artística do Estado natal. Contudo, abrindo parênteses, pode-se, resumidamente, relacionar alguns trabalhos do pintor que, de alguma forma, tiveram ligações com Minas.
Seu conhecido Auto-retrato, datado de 1883, óleo sobre tela, 60 x 48 cm, importante trabalho que integra a Coleção Gilberto Chateaubriand, Rio de Janeiro, consta situado na cidade de Três Pontas, Minas Gerais, tendo ao lado uma dedicatória à sua mãe, senhora Palmyra de Almeida.
Uma crônica de Olavo Bilac, datada de 4 de janeiro de 1894, enviada de Ouro Preto para a Gazeta de Notícias, descreveu com detalhes a estátua de Tiradentes, que seria inaugurada em abril na praça da Independência. O texto, com sua apreciação estética, contou com ilustração em zincografia de Belmiro de Almeida, havendo sido o desenho elaborado a partir de croqui da obra, feito pelo próprio autor da escultura, Virgílio Cestari, e de uma fotografia da estátua do mártir, material este remetido por Bilac ao ilustrador no Rio de Janeiro. Vale a pena comentar ainda, que, após breve interregno de um mês sem circular, por motivos políticos, a Gazeta de Notícias voltava a ser editada naqueles dias, oportunidade na qual se renovou graficamente. Belmiro ficou responsável, exatamente, pela ilustração da primeira página, utilizando-se do processo de zincografia, sendo a impressão realizada em prelo rotativo, possibilitando a produção de milhares de exemplares em reduzido tempo. Ferreira de Araújo, Eça de Queiroz, Machado de Assis, Alfredo Camarate, Olavo Bilac, dentre tantos outros nomes, assinavam artigos e matérias. O jornalista Ferreira de Araújo, proprietário do jornal, viria adquirir a tela Nuvens de Belmiro, conforme consta no artigo de Armínio de Mello Franco.
Em 1894, atendendo a uma encomenda da Câmara Municipal de Campanha, Belmiro pintou o retrato do Marechal Floriano Peixoto. A data escolhida pela Municipalidade para a solenidade de sua inauguração foi a da comemoração nacional de 13 de maio, tendo o quadro sido colocado na sala de sessões da Câmara. Residindo no Brasil, era imperioso cumprir compromissos como esse: o artista mantinha-se ativo profissionalmente e garantia remuneração.
Em outubro de 1897, praticamente às vésperas da transferência oficial da capital do Estado para a então cidade de Minas (depois, Belo Horizonte), Belmiro de Almeida esteve em Ouro Preto. Na oportunidade, o pintor trazia consigo uma tela, pintada recentemente em Paris, para exibi-la na cidade histórica. Intitulara-a Má Notícia, obra de inspiração bem próxima ao realismo de Arrufos, tela de 1887. Ficou exposta por algum tempo no salão do Liceu de Artes e Ofícios de Ouro Preto e causou ótima repercussão, considerando a frequência do público que se verificou. Adquirida pelo Governo, foi em seguida levada para a nova capital, sendo então colocada no Palácio da Presidência. Hoje integra o acervo do Museu Mineiro.
Na recém-inaugurada capital mineira, no salão nobre da Secretaria do Interior, na praça da Liberdade, figurou a tela de Belmiro intitulada Aurora [ou Apoteose] de 15 de Novembro, obra que anteriormente tivera suas qualidades questionadas pela crítica do Rio de Janeiro. Arthur Azevedo, em visita à Belo Horizonte no ano de 1901, considerou-a uma obra pouco representativa na produção do pintor serrano.
Pertence ao acervo do Museu Mariano Procópio, Juiz de Fora, o quadro Amuada, c. 1905-1906, óleo sobre madeira, 41 x 33 cm. Esta obra participou da Exposição Geral de Belas Artes do Rio de Janeiro, em 1906. De pequenas dimensões, leve, contido, silencioso, é um trabalho executado de forma minuciosa pelo pintor. Individualizadas em múltiplos toques de pincel, as cores tênues favorecem toda a composição.
Em abril de 1909, o presidente de Estado Wenceslau Braz inaugurou, em solenidade que contou com a presença do pintor, a tela intitulada Bárbara Heliodora, estabelecida no “plafond” do salão nobre do Palácio, ambiente ornado por trabalhos de Frederico Steckel. O obra fôra encomendada a Belmiro bem anteriormente, ainda pelo governo de Silviano Brandão. Conforme descrito à época, representava uma cena na qual a esposa do inconfidente Alvarenga Peixoto, isolada em seu retiro no sul de Minas, encontrava-se abatida pela imensa saudade que terminaria por levá-la à loucura. Em 1925, o trabalho de Belmiro foi substituído pela pintura alegórica de Antônio Parreiras.
É datado de abril de 1909, o pequeníssimo Retrato de Antônio Augusto de Lima, óleo sobre madeira, 21 x 13 cm, dedicado por Belmiro ao retratado. Encontra-se hoje na coleção de Luiz Octávio Augusto de Lima, São Paulo, e está reproduzido na Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, ano XLIII, nº I, janeiro - julho de 2007, página 64. É provável que seja este o quadro que, durante a estada de Belmiro em Belo Horizonte, por ocasião da inauguração da tela Bárbara Heliodora - ato presenciado por Augusto de Lima -, esteve em exposição na Casa Colombo. Por um lapso, foi atribuída sua autoria ao pintor Alberto Delpino, engano este logo desfeito.