Documentos relativos à exposição de José Malhôa no Rio
de Janeiro, em 1906: resenhas em Gazeta de
Notícias, Rio de Janeiro
organização
de Arthur Valle, transcrição de Clevison
Jesus de Carvalho e Diego Alves
VALLE, Arthur (org.); CARVALHO, Cleivison Jesus de;
ALVES, Diego (transcrição). Documentos relativos à exposição de José Malhôa no
Rio de Janeiro, em 1906. 19&20, Rio de Janeiro, v. IX, n. 1, jan./jun. 2014. Página
inicial disponível em: <http://www.dezenovevinte.net/artigos_imprensa/JM_1906.htm>.
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José Malhôa. Gazeta de
Notícias, Rio de Janeiro, 3 jul. 1906, p.1.
Efetua-se amanhã, à 1
hora da tarde, a inauguração da exposição das obra do distinto pintor português
José Malhôa.
A exposição, a cuja
abertura assistirá o Sr. presidente da República, está instalada no salão nobre
do gabinete português de leitura.
Hoje, das 3 às 5,
efetua-se a cerimônia da vernissage, para
a qual o ilustre artista teve gentileza de nos convidar.
O Gabinete Português
de Leitura oferece amanhã, no Restaurant Paris, um almoço ao distinto artista português
José Malhôa.
EXPOSIÇÃO MALHÔA. Gazeta de
Notícias, Rio de Janeiro, 30 ago. 1906, 4 jul. 1906, p.1.
O Gabinete Português
de Leitura abriu-se ontem para o vernissage
da Exposição Malhôa,
que finalmente se apresenta ao público fluminense com uma copiosa e magnífica
coleção de quadros em que palpita toda a vida portuguesa, no que ela tem de
mais característico e mais espontâneo.
Os nossos vernissages são sempre discretos. Em
regra só a eles comparecem os artistas e os nossos artistas não formam legião.
Mas ontem havia um motivo a mais a aguçar a curiosidade: expunha um artista
estrangeiro que veio precedido de grande fama e teve quadros no Salon de Paris.
Não seria justo deixar
de verificar se esse renome era justo. Por isso ao Gabinete não faltaram os
nossos artistas que lá viram, além deles, muitos outros visitantes, levados
pela mesma curiosidade. Malhôa lá estava, sorridente, feliz, a espreitar nas
fisionomias, todas ou quase todas para ele estranhas, a primeira impressão
causada pela sua arte tão real e tão flagrante. E por esse exame rápido mas
seguro, pode verificar que o seu nome triunfou aqui, como triunfara em Portugal
e na França.
Efetivamente o
distinto artista português é um admirável artista e um observador admirável e
os visitantes ficam hesitando em lhe dar a primazia, se na paisagem se na
figura. E, o que é mais, em tão extensa coleção não se nota um quadro inferior
a outro; o que há é um episódio mais insignificante que outro, mas todos
tratados com o mesmo vigor, a mesma segura visão e a mesma energia de colorido
e cuidado de detalhe.
É claro que na coleção
o visitante, percorrido o olhar por todas as telas, demonstra logo
preferências, mas isso é a nota pessoal que se manifesta, podendo-se talvez
assegurar que não há ali um quadro que não desperte simpatias do mais
refratário apreciador. É que Malhôa não se deixa arrastar pelos seus próprios
gostos mas pela sua admirável visão de artista e assim, descobrindo em cada assunto,
por assim dizer, a sua íntima psicologia, o seu oculto motivo, o transporta à
tela com todas as suas nuanças e sutilezas.
Não podemos, sem risco
de antecipar juízos e desfazer surpresas, dar numa noticia de vernissagem as
nossas impressões e as nossas preferências.
Todavia não nos
furtamos o prazer de notar alguns quadros que mais nos impressionaram. São
eles, entre outros, A Ti’Anna [Imagem], uma esplêndida cabeça
de velha, de uma anatomia e de um colorido inexcedíveis; À passagem do comboio, uma tela em que tudo vibra e canta, as
figuras, a luz, o colorido; A apanha das
castanhas, outra tela palpitante de luz e vida; Castanheiros doentes, em que passa no ar uma infinita melancolia; Cócegas [Imagem], uma
larga tela, lançada ao mesmo tempo com arrojo e doçura e da qual ressuma uma
ardente poesia.
Na exposição figuram
também duas grandes telas com os retratos de SS. MM. Fidelíssimas [Imagem,
Imagem],
duas primorosas pinturas que vão figurar no edifício da Caixa de Socorros D.
Pedro V, que já as adquiriu.
A exposição abre-se
hoje e certamente provocará grande concorrência, marcando um inesperado
acontecimento na nossa história artística.
Exposição Malhôa - A
INAUGURAÇÃO - O BANQUETE. Gazeta de Notícias, Rio de Janeiro, 5 jul. 1906, p.1.
Inaugurou-se ontem
solenemente, à 1 hora da tarde, com a presença do Sr. presidente da República,
muitos representantes do mundo oficial e grande numero de cavaleiros, senhoras
da nossa melhor sociedade, a Exposição Malhôa.
O Sr. presidente da
República chegou ao Gabinete Português de Leitura acompanhado do chefe de sua
casa militar, Sr. general Souza Aguiar.
Sr Ex. foi recebido à
entrada pelos Srs. Malhôa, Julião Machado,
Gaspar Pacheco, Visconde de S. João de Madeira, J. [...] Silva.
Na ante-sala uma
orquestra composta de 10 professores e sob a regência do maestro Quirino de
Oliveira, executou o hino nacional.
O Dr. Rodrigues Alves
subiu então ao salão dos Brasões, onde está instalada a exposição de quadros,
manifestando a sua admiração e tecendo elogios às obras do notável artista.
Entre outros quadros,
o s que mais admiraram os visitantes foram: A
Ti’Anna [Imagem], Cócegas [Imagem], A apanha das Castanhas, O Cavaleiro de S. Thiago [Imagem], À passagem do Comboio, As pupilas do Sr. Reitor, O viático da aldeia [Imagem],
A compra do voto e os dois grandes
quadros retratos do Rei D. Carlos [Imagem] e da Rainha D. Amélia [Imagem], de Portugal.
Durante todo o tempo
em que estava sendo visitada a exposição, a orquestra executou várais e lindas
peças.
À [...] 15 da tarde
retirou-se do Gabinete o Sr. presidente da República, que foi acompanhado até a
porta pelos mesmos cavalheiros que o receberam.
Entre o grande número
de visitantes, vimos o Srs.: Dr. Pereira Passos, prefeito do Distrito Federal,
comendador José Prestes, João Francisco Corrêa, Antônio Reis e família, Dr.
Augusto de Carvalho, Antônio José de Almeida Rabello, Dr. Fernandes Mendes de
Almeida Júnior, Rodolpho
Bernardelli, Alexandro [...] Rodrigues, Coelho
Netto, Luciano Falaça, Miguel da Costa Pinheiro, Visconde de [...],
comendador Frederico [...], ministro da Holanda, Antônio Silva Costa, Camillo
Gomes Nogueira, João Gomes [...], E. Navares (?), Manoel Joaquim Dias, Amadeu
Alegria, Euzebio de Andrade, Antônio Severo de Araujo, Joaquin Freire, Julio de
Moraes, Emilio Kemp, Emilia da Silva Barbosa, José Maria da Cunha Vasco,
comendador Antônio Januzzi, diretores de Associação dos Empregados do Comércio,
Manuel Simão, Justino Ferreira Alegria, Manoel Pereira [...], Antonio Joaquin
Peixoto de Castro, Rodolpho
Amoêdo, Baldomero Carqueja e família, Antônio Pinheiro, Pinto Moreira, João Batista da Costa e
Souza Lage.
-
O Gabinete Português
de Leitura ofereceu ontem, no salão do Hotel Paris, um banquete a José Malhôa.
Dizemos simplesmente
José Malhôa, porque quando na arte, ou nas letras, ou nas armas, se conquista a posição a que chegou
Malhôa, todos os adjetivos senão são idiotas, são supérfluos.
A esse banquete,
glorificador do artista ou, talvez melhor, de agradecimento pela visita,
concorreu tudo que o poderia enaltecer. Homens de letras, artistas, membros da
Escola de Belas Artes, amadores, representantes das sociedades e comércio
portugueses, imprensa, enfim um conjunto que em si exprimia a admiração e a
estima de que é tão legítimo merecedor o José Malhôa.
Não descrevemos o menu do banquete.
Nestas festas, o
objetivo principal, e que se [...], é não menos do que o que se bebe, como
muito mais o de que se conversa. Só podemos asseverar que se comeu bem e se
bebeu melhor, embora não se saísse dos limites da temperança.
Ao champagne, perdão, ao espoucar do champagne, como dizem os cronistas modernos, ergueu-se,
modestamente, talvez procurando ocultar-se e para falar em nome do Gabinete
Português de Leitura. Julião Machado, não falou mas leu o seguinte:
“É inútil afirmar, meus
senhores, que a data de hoje ficará no livro de ouro do Gabinete Português de
Leitura como uma das mais honrosas da sua história.
Na missão de trabalho
e de confraternidade a que a nossa instituição se destina, a iniciativa que
hoje festejamos é das que mais a desvanecem, pela sua delicada significação e
pelo êxito que brilhantemente a completa.
Ao receber a obra de
José Malhôa, nome já tão glorificado pela crítica universal, não foi intuito
nosso exibir por pura vaidade o
progresso da arte portuguesa. Se fosse esse, porém, o nosso desejo, ele teria a
mais honrosa justificação ao aplauso sincero e quente dos vultos proeminentes
da arte e da crítica deste belo país tão apaixonadamente artista - aplauso que
se confirma no nobre interesse com que neste momento, acompanham a homenagem de
admiração e reconhecimento que o Gabinete Português de Leitura presta ao nosso
eminente compatriota.
A razão do nosso
convite foi bem diversa.
É que se os laços que
ligam os dois países, indissolúveis pela história, pelo sangue e pela língua,
cada vez mais se estreitam pelas suas relações diplomáticas e comerciais,
pareceu à transata diretoria do Gabinete Português de Leitura que seria esforço
digno da sua missão concorrer, na modesta medida das suas forças, para a
completa intimidade dos dois povos irmãos.
As relações de
interesse material podem manter sempre vivas, é certo, as ligações entre países
que se estimam - mas só a sua Arte pode uni-los na intimidade absoluta e
carinhosa que só vêm depois do amplo conhecimento do intimo sentir de cada um.
É pela arte que essa
intimidade se estabelece e se perpetua.
O artista que tão
brilhantemente honra a preferência do Gabinete é justamente o que mais
vigorosamente exprime o nosso intuito. É ele o que mais tem feito vibrar na sua
obra tão pessoal e tão sentida, toda a pitoresca meiguice da alma simples e sã
da sua pátria.
Porque se na luz, na
língua, nos costumes e nas almas os dois países são absolutamente gêmeos, - em
alguma coisa o Criador os distinguiu, querendo que dessa distinção resultasse
maior encanto para ambos. Os fez por isso diferentes nas linhas e na cor dos
seus campos, embora igualmente belos.
Se a vastidão de um
deu a infinita amplidão dos seus panoramas, a imponente majestade das altas
montanhas e a sua maravilhosa vegetação (sempre pródiga de sombra e frutos) - o
intenso colorido metálico, tão rico de soberbos contrastes como se tivesse
querido nesse solo abençoado a afirmação da sua divina
fantasia) - na pequenez do outro reuniu todas as modestas suavidades de desenho
e toda a meiguice da sua paleta divina, como se assim quisesse justificar-se de
o ter feito tão pequeno.
Honrado pela diretoria
do Gabinete Português de Leitura (de que sou o mais humilde membro), com a
incumbência de saudar o glorioso artista que tão brilhantemente acedeu ao seu
convite e de lhe dizer a nossa admiração e o nosso sincero agradecimento,
aproveito o ensejo para resumir em
uma frase curta a minha veneração pelo artista e pelo homem. Saúdo o mestre!
Seguiu-se uma série de
brindes, ainda em nome do Gabinete, pelos Srs. Visconde de S. João da Madeira,
Moço da Silva, Olavo
Bilac e Coelho Netto, que,
falando da arte portuguesa, e especialmente de Malhôa, foram de uma eloquência
arrebatadora. Morales
de Los Rios falou pela Escola de Belas Artes e Rodrigo Octavio pela
Academia de Letras. Ao brinde a imprensa respondeu Henrique Chaves. O brinde de
honra foi eloquentemente feito pelo Sr. Eugenio da Silveira, ao Brasil.
E com esse brinde
terminou a festa, festa que se pode dizer de artistas, na sinceridade das suas
manifestações.
Mais satisfeitos - e
muito satisfeito deve ele estar - do que Malhôa devem ter ficado os que a ela
concorreram.
Ao banquete estiveram
presentes os Srs. comendador João Salgado, cônsul de Portugal, conde de
Fernando Mendes, Candido Mendes, Olavo Bilac, Arthur Azevedo, Edmundo
Bittencourt, Francisco Souto, Coelho Netto, Henrique Chaves, Carlos Souto,
Vasco Abreu, João de Souza Lage, Alcindo Guanabara, Eduardo Salamonde, Jovino
Ayres, Eugênio Silveira, Rodrigo Octavio, barão de Peixoto Serra, Arthur Lucas, Cunha
Vasco, Dr. Rego Barros, conde de Avellar, Visconde de Moraes, Alves Mateus,
José Freitas, Léo de Affonseca [sic], Cypriano de Oliveira, Arthur Leite, João
Nunes da Rocha, João Reynaldo de Faria, Bernardino Prista, Dias Garcia, Moura
Leite, R. Bernardelli, Belmiro
de Almeida, A.
Girardet, Teixeira da Rocha, A. Petit, Modesto Brocos, A. Figueiredo, R. Mendes, Raul Pederneiras,
Batista Coelho, H.
Bernardelli, Baldomero Fuentes, Eduardo Victorino, Morales de Los Rios,
Agenor Carvoliva, Calixto,
etc.
A exposição está
franca ao público de hoje até o dia 15, das 11 às 15 horas da tarde.
EXPOSIÇÃO JOSÉ MALHÔA. Gazeta
de Notícias, Rio de Janeiro, 6 jul. 1906, p.2.
Nota dos quadros
vendidos hoje, 6 de julho:
12, cuidados de amor [Imagem], Sr. Gaspar José
Rodrigues Pacheco; 31, rua Serpa Pinto (Figueiró), Sr. Silva Carvalho; 9, 7°
não furtar...as uvas ao Sr. Cura. [Imagem] Sr. J. Souza Freitas; 85,
cebolas, Sr. J. Souza Freitas; Soalheiro, Sr. Cunha Vasco; 32, Costume do
Moinho, Sr. barão Peixoto Serra; 23, Apanha das castanhas, Sr. João Lopes
Chaves; 29, Pai e filha, Sr. Dr. João do Rego Barros; 109, Cócegas (estudo),
Sr. Dr. João do Rego Barros; 40, Esperando o peixe, Sr. comendador Cypriano
Costa; 98, Castanheiros, Sr. Joaquin Carvalheiro; 28 Estudando à borda do
pinhal, Sr. Joaquin Carvalheiro; 44, Ida para o trabalho, comendador Baldomero
Carqueja Fuentes; 73, Prulsab [sic] ao fundo da igreja de Figueiró, Sr. José
Pinheiro Duarte; 11, O viático na aldeia [Imagem], Sr. comendador Costa
Pereira; 78, As mações [sic] ao cair da tarde, Sr. Oscar Costa; 71, Esperando a
vez, Sr. Visconde de S. João da Madeira; 22, Aldeia da Castanheira ao pôr do
sol, Sr. Visconde de S. João da Madeira; 110, Ermida da Madre de Deus, Sr.
Eduardo Victorino; 96, Cabeça de estudo, Sr. D. Maria Falcão; 64, Outono na
vida e na Natureza, Sr. Rodrigues Barbosa; 19, Amanhã os arranjarei, Sr. Dias
Garcia; 72, A caminho da horta, Sr. Antonio Reis; 42, Barbeiro na aldeia
(estudo), Casa Mozart; 26, Notícias financeiras, Sr. E. Laboriau; 45, Nasceu
[sic] da lua, Sr. Antônio José Dias de Castro; 8, Chegada do Zé Pereira á
romaria [Imagem], Sr. comendador J. Vasco
Ramalho Ortigão; 18, Pensando no caso [Imagem], Sr. Sebastião Cruz.