Simbolismo na arquitetura de Lojas Maçônicas: estudo de caso da Loja Renascença nº 3 em Belém – Pará

Alison Ramos da Silva,* Marcelo Vitor Branco de Lima,** Ronaldo Marques de Carvalho*** e Cybelle Salvador Miranda****

Como citar: SILVA, Alison Ramos da; LIMA; Marcelo Vitor Branco de; CARVALHO; Ronaldo Marques de; MIRANDA, Cybelle Salvador. Simbolismo na arquitetura de Lojas Maçônicas: estudo de caso da Loja Renascença nº 3 em Belém – Pará. 19&20, Rio de Janeiro, v. XIX, 2024. https://doi.org/10.52913/19e20.xix.02

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Breves considerações sobre a maçonaria

1. A maçonaria é definida, segundo seus próprios estatutos, como uma organização filantrópica composta de homens livres e de bons costumes, dedicados ao estudo da filosofia e ao exercício da filantropia em busca do desenvolvimento da humanidade (CAMINO, 2013). Embora documentações oficiais remetam sua formação às guildas de pedreiros do período medieval, sua formação filosófica é baseada na criação do Templo de Salomão dedicada à deidade do povo hebreu, há aproximadamente três mil anos. Estas duas vertentes de influências históricas são refletidas em toda a simbologia presente na ritualística maçônica (KNIGHT & LOMAS, 2007). As edificações nas quais os maçons se reúnem são denominadas Lojas, e baseiam-se na ideia de casas rústicas ou acampamentos nas quais os pedreiros medievais se reuniam, denominadas lodges. Estes espaços apresentam estrutura fortemente influenciada pela simbologia de conhecimentos como os da cabala judaica, da astrologia, dos Cavaleiros Templários, da cultura greco-romana e outras de notória influência (ISMAIL, 2012). O presente trabalho objetiva apresentar a estrutura básica da Loja Maçônica segundo o Rito Escocês Antigo e Aceito, uma das ritualísticas maçônicas mais difundidas mundialmente, com destaque para os elementos arquitetônicos de sua conformação. Para ilustrar a explanação, serão utilizadas fotografias da Loja Maçônica Renascença nº 3, situada em Belém do Pará, Brasil.

Caracterização histórica da Loja Renascença n° 3

2. A Loja Maçônica Renascença n° 3 foi fundada no ano de 1872. Está inserida no contexto de nova tentativa de implantação da maçonaria no Pará, em reação a revoltas populares que terminaram por incendiar em 1835 a primeira Loja do Estado, fundada em 1832. Junto de outras Lojas instaladas em Belém, foi a terceira a ser registrada (MONTEIRO, 2012). Está inserida no início do período conhecido como Belle Époque, onde a extração natural e exportação da borracha na Amazônia contribuiu para a urbanização da cidade de Belém. Por estar inserida em uma rota econômica direta com a Europa, várias influências estrangeiras são perceptíveis na cultura local e, principalmente, na arquitetura dos prédios de empresários, que carregam traços principalmente do ecletismo (SOARES, 2008).

3. As Lojas Maçônicas implantadas no contexto da Belle Époque foram fundadas por empresários, políticos, jornalistas e outras personalidades de influência na sociedade da época, que culturalmente, expressavam simpatia por estas ascendentes influências europeias e acabavam por divulgá-la. Desta forma, a Loja Renascença n° 3 expressa em sua composição arquitetônica traços de influência clássica, uso de madeiras nobres e ornamentos vistos apenas nas residências de famílias de influência econômica. Contudo, a orientação para construção de Lojas Maçônicas pelas autoridades maçônicas é fixa, não obstante o período de implantação ou a localidade (SILVA, 2019).

4. Vemos na Loja Renascença n° 3 que essas orientações são seguidas, utilizando do estilo eclético adaptado para demonstrar suntuosidade. Tal característica era buscada principalmente para identificar o prédio como uma instalação da fraternidade e composta por membros de influência social, de modo a inibir novas revoltas populares como a que destruiu a primeira Loja Maçônica da cidade. Parte do princípio de que a retomada da maçonaria no Estado é acompanhada por demonstração pública de quem seriam seus membros e que estes seriam cidadãos de boa fama, ao contrário das especulações de que seriam feitos rituais demoníacos sob suas propriedades, como difundido pelas autoridades eclesiásticas à época. Desta forma, as Lojas passam a se situar em ruas de grande fluxo, em terreno próprio, são claramente sinalizadas como entidades maçônicas e contam com imponência no projeto do edifício (MONTEIRO, 2012).

Fachada

5. Embora existam exceções, a principal referência para composição da fachada de Lojas Maçônicas e a mais difundida no Brasil é exposta na Loja que é objeto deste estudo, com influência direta da fachada de templos gregos [ Figura 1 ] . Apresenta normalmente frontão triangular ou algo que remeta a essa conformação. Muitas das Lojas mais antigas em atividade utilizam esta versão de fachada por terem sido construídas durante a vigência do ecletismo no Brasil. Preservam um eixo de simetria, padronização de aberturas e ornamentos em alto relevo (SILVA, 2019). Desta forma, remetem ao período clássico, que é considerado um dos mais importantes para a maçonaria, devido à fundamentação de algumas das principais vertentes de artes, ciências e filosofia em voga até a atualidade. O uso do frontão triangular também remete a elementos simbólicos próprios da maçonaria relacionados ao número três, que remetem a simbologias de diferentes culturas: Pai, Filho e Espírito Santo no Cristianismo; Ying, Yang e Tao no Taoísmo; Brahma, Vishnu e Shiva no Hinduísmo e outras culturas (D’ELIA JUNIOR, 2017).

6. Frequentemente o tímpano – espaço interior do frontão – é preenchido por uma imagem de um olho, denominado “Olho Que Tudo Vê” ou “Olho da Providência,” que na maçonaria representa a deidade observando a humanidade. Considerando que os maçons são aceitos independente da religião que professem, o “Olho Que Tudo Vê” é a forma de representar materialmente a deidade à qual o maçom presta sua devoção particular (CASTRO, 1977a).

7. Embora não haja especificação dos elementos constantes na fachada de uma Loja Maçônica, é de senso comum que o uso do frontão esteja em destaque, além do uso da cor azul celeste na pintura, principalmente das Lojas então inauguradas no Brasil. Estes elementos serviriam para identificação visual da Loja para a população e para seus membros em trânsito pelo país.  A cor azul remeteria, dentre diversas interpretações, à deusa romana Minerva, representativa da sabedoria (SILVA, 2019).

8. O enquadramento da fachada da Loja Renascença n° 3 é dividido em três corpos, sendo que o corpo central apresenta platibanda com o clássico frontão triangular com o “Olho Que Tudo Vê” inserido no tímpano. Tal frontão não apresenta característica estrutural, não sendo sustentado por colunas ou com conexão com o telhado, servindo apenas como elemento estético que remete ao entablamento clássico. Ainda neste corpo central está localizado um relógio analógico acima do frontão e, no telhado, um cata-ventos.

9. Dos dois pavimentos perceptíveis, no superior há janelas com frontões batidos acima de cada uma, além de um frontão batido maior nas três janelas do corpo central. As bandeiras das janelas são rendilhadas, compostas com peças em vidro, sendo cada peça colorida em tonalidades diversas. O pavimento inferior é um porão elevado, com um óculo circular em cada uma das laterais e óculos retangulares no centro (ALBERNAZ; LIMA, 1998a; ALBERNAZ; LIMA, 1998b). A adoção do porão elevado é uma característica do período da Belle Époque, sendo uma medida higiênica tomada para evitar que águas pluviais e poeira adentrassem nas edificações (SOARES, 2008). O acesso ao interior do prédio é possível pelos corpos laterais, com uma entrada à esquerda ligada ao porão e uma entrada à direita por uma escada que garante acesso direto ao pavimento superior.

10. Outras características do período eclético no contexto da Belle Époque notáveis se expressam no uso de expressivos ornamentos: uso de balaustradas nas janelas da fachada e guarda-corpo da escada, mísulas abaixo da balaustrada da fachada, pedras lavradas com diferentes elementos simbólicos – rosetas, acantos e cogulhos – principalmente nos frontões, coroamento da platibanda e trabalho de gradeado em ferro. Há também uso de rusticação, com emprego de linhas paralelas horizontais do chão até a cornija (ALBERNAZ; LIMA, 1998a; ALBERNAZ; LIMA, 1998b). Apesar da fachada possuir características ecléticas com influências clássicas, não foi adotado o uso de nenhuma coluna das ordens clássicas tradicionais.

Planta

11. A estrutura dos espaços que compõe a planta de uma Loja Maçônica pode variar conforme os serviços oferecidos e/ou desempenhados pela Loja, como atendimento à comunidade ou espaços de lazer, de estudos ou de exposição. Considerando os espaços ligados diretamente à ritualística maçônica, cinco são obrigatórios: a) a Sala dos Passos Perdidos; b) Átrio; c) Templo; d) Salão de Ágape e; d) Câmara de Reflexões (SILVA, 2019) [ Figura 2 e Figura 3 ].

12. A Sala dos Passos Perdidos é um espaço de acolhimento dos maçons e visitantes que chegam à Loja, similar a uma sala de estar. Normalmente seu mobiliário é composto por sofás, cadeiras, poltronas e em alguns casos, televisores. Também pode ter quadros de personalidades da maçonaria local. É o primeiro espaço a receber o visitante, seja maçom ou não, e por isso é um espaço de permanência quando a Loja não está em atividade ritualística.

13. O Salão de Ágape é um espaço para celebrações para finalidades diversas, similar a um salão de festas. Dentro da ritualística maçônica é imposto que, após as reuniões, sejam realizadas confraternizações, com consumo de comida e bebida, de modo a estreitar os laços entre a fraternidade. Em ritualísticas específicas como nas celebrações dos solstícios, as mesas são posicionadas em forma de ferradura ou U, mas no geral podem assumir qualquer conformação (ISMAIL, 2012). Neste espaço, que costuma ser amplo, também podem ser recebidos amigos e familiares para festejos diversos, além de receber ações filantrópicas abertas à comunidade. Desta forma, a sala não possui ornamentação especial além do mobiliário padrão de mesas e cadeiras.

14. O Átrio é o espaço imediatamente anterior ao Templo, onde o maçom já paramentado com a vestimenta adequada aguarda o início das cerimônias. Em algumas Lojas há apenas uma cadeira para que alguém controle o acesso ao Templo. Pode ter armários para que os maçons guardem itens pessoais, pois em algumas Lojas a entrada do Templo deve ser precedida por abandono de tudo o que seja considerado mundano (SILVA, 2019). Assim, não são permitidos celulares ou itens pessoais em muitas Lojas. Nenhuma ornamentação é obrigatória, mas algumas Lojas costumam ter elementos simbólicos como colunas e frontão na porta de entrada para o Templo ou quadros de personalidades maçônicas.

15. A Câmara de Reflexões é um espaço exclusivo para a cerimônia de iniciação maçônica. É um espaço sem janelas, de dimensões suficientes para abrigar apenas uma pequena mesa e uma cadeira, onde o maçom permanece sozinho para refletir suas reais intenções antes de ingressar na fraternidade. Orienta-se que, sempre que possível, este espaço seja instalado em ambiente abaixo do nível do piso principal, de modo que seu acesso seja por uma escada. Este fato, aliado à simbologia e ritualística da cerimônia de iniciação, serviria para passar a impressão de que o futuro maçom estaria adentrando na terra e, após a reflexão necessária, renasceria livre de vícios e apto para a imersão completa na fraternidade. Por este motivo, a ornamentação da Câmara de Reflexões carrega elementos que remetem à morte, com paredes de cor preta na qual estão emblemas e palavras fúnebres de cor branca. A iluminação pode ser feita por uma lâmpada fosca ou por uma vela (URBANO JUNIOR, 2016).

16. Por se tratar de um prédio antigo, alguns espaços da Loja Renascença n° 3 tiveram seu uso adaptado aos tempos atuais. O porão, que anteriormente era inutilizado em construções ecléticas na cidade por serem inundados por lama e poeira das ruas passou a ser utilizada como a Sala dos Passos Perdidos, sendo o primeiro acesso às dependências da Loja, pelo corpo esquerdo. A entrada principal, situada no corpo direito, anteriormente era o principal acesso para o Salão de Ágape, situado na fachada da Loja e com visualização para a rua. Tal salão passa a ser usado apenas em situações específicas, normalmente em ações filantrópicas de atendimento à comunidade e o novo Salão de Ágape passa a ser utilizado em espaço climatizado na área ampla abaixo do Templo. O átrio/entrada do Templo é adornado com frontão triangular sustentado por dois pares emparelhados de colunas em estilo coríntio e as paredes contém fotografias de personalidades maçônicas históricas. Todo o piso da Loja utiliza madeiras nobres, em composição de Pau-amarelo e Acapú. Os detalhes de degraus da escadaria interna e balaustrada são em madeira com pintura dourada. As portas do Templo são de madeira, com gravações de símbolos usados na maçonaria, como o Sol e a Lua. Por motivos relacionados à ritualística maçônica, a Câmara de Reflexões não foi identificada em planta ou por imagens.

Templo

17. O Templo Maçônico é o espaço onde ocorre a maior parte da ritualística maçônica e como tal, apresenta a maior carga simbólica dentro da edificação [ Figura 4 e Figura 5 ]. É comum que as grandes instituições de autoridade maçônica orientem o layout de sua construção e ornamentação, embora nem todas sejam seguidas de fato. As principais regras não seguidas se referem à dimensão e posicionamento, pois necessitariam de um terreno com dimensões específicas, que dependendo da localidade não são possíveis de ser obtidas.

18. O dimensionamento indicado deve seguir a proporção áurea ou 1:1618…, que consiste em uma constante algébrica considerada mística por ser encontrada na natureza e utilizada pelo arquiteto Phidias no projeto do Parthenon grego. Essa proporção se baseia na divisão de uma reta em dois segmentos e, quando esses são somados e em seguida divididos pelo maior segmento, o número encontrado é 1,618…, o chamado Número de Ouro. Quando a proporção é aplicada em um retângulo, é criada uma espiral, que pode ser vista em valores aproximados em árvores, frutos ou animais, sendo o exemplo mais conhecido a espiral na concha de caracóis (CASTRO, 1977b).

19. A orientação indicada é no sentido de oeste para leste, ou de ocidente para oriente. A motivação está relacionada ao fato de o Sol nascente vir da direção leste e desta forma os lugares de maior importância nas ritualísticas maçônicas estarem neste setor. Assim, em sua ascensão na maçonaria o iniciado adentra pelo lado oeste e, quanto mais avança em conhecimento, pode adentrar nos cargos de honra, situados no Templo no oriente, na direção leste. Há também a vertente que analisa esse posicionamento se utilizando pelo uso da Cabala, que é uma corrente filosófica da cultura judaica. Segundo esta visão, o Templo maçônico se organizaria em uma estrutura sobreposta ao esquema da Árvore da Vida, que é uma estrutura que representa os dez aspectos de Deus (URBANO JUNIOR, 2016). Considerando o posicionamento dos maçons dentro do Templo, o aspecto mais elevado estaria onde se localiza a autoridade que comanda as cerimônias, denominado de Venerável Mestre, que sempre se posiciona no Leste. Também há uma vertente de pensamentos que considera as culturas orientais como detentoras de conhecimentos e tradições de importância fundamental no desenvolvimento da humanidade e, por isto, os relembra situando as autoridades maçônicas nesta direção.

20. No centro do Templo Maçônico deve estar localizado uma porção de piso diferenciado, denominado Pavimento Mosaico. Ele é formado por peças nas cores preta e branca, formando um padrão semelhante a um tabuleiro de xadrez. Em suas bordas estão peças triangulares e comumente suas faces estão marcadas com a orientação dos quatro pontos cardeais. Sua simbologia representa as dualidades, como bem e mal, positivo e negativo, materialidade e espiritualidade e outras, que, apesar de existirem, devem conviver em harmonia no homem, de modo a formar o equilíbrio. As peças triangulares que delimitam o pavimento mosaico são denominadas Bordas Dentadas, e representam os princípios de atração universal, como os planetas ao redor do Sol, filhos em torno dos pais ou mesmo os maçons ao redor do Venerável Mestre. É o local onde o iniciado maçom presta seu juramento antes de adentrar na fraternidade, fazendo alusão ao Santo dos Santos, que seria o local mais sagrado localizado dentro do antigo templo do povo hebreu. Acima do Pavimento Mosaico, há um pequeno púlpito onde se localiza o Livro da Lei a qual o maçom iniciado professa sua fé particular. No teto acima do Pavimento Mosaico. está posicionada uma lamparina denominada Lâmpada Mística, que representa a luz que iluminará os passos do iniciado maçom em sua nova jornada (CASTRO, 1977b).

21. Nas paredes internas do Templo, percorrendo toda a sua extensão, deve estar afixada ou pintada uma corda com 81 nós. Esta é a Cadeia da União, que indica a união entre os maçons e faz alusão às cordas que os pedreiros medievais utilizavam para realizar medições. Os 81 nós simbolizam o quadrado do número 9, que possui diversas interpretações. Na numerologia, por exemplo, representa o altruísmo, o início e fim de ciclos e está ligado à espiritualidade (CASTRO, 1977b).

22. O teto do Templo é sustentado por 12 a 14 colunas, sendo que 12 delas representam cada um dos signos do zodíaco. Em algumas Lojas são gravados em cada coluna um símbolo zodiacal, com seu astro regente e elemento característico. As duas colunas restantes representam as colunas que estariam ornamentando a entrada do primeiro templo hebreu, denominadas Coluna B ou Boaz e Coluna J ou Jachin. Em algumas Lojas, elas assumem também a função das colunas zodiacais e, desta forma, representariam a coluna de Aries e a coluna de Peixes. Comumente são situadas à entrada do Templo e tem ornamentação diferenciada no topo, onde a Coluna B sustenta um globo terrestre e a Coluna J um globo celeste, ambos representando as ciências ligadas à astronomia e geografia. Os globos são apoiados por romãs, que, por supostamente terem 613 sementes, referenciam na cultura judaica o número de mandamentos da Torah, seu livro sagrado. O fuste de ambas apresenta detalhes desenhados ou entalhados de lírios, que indicam pureza e boa-fé (ASLAN, 1978).

23. O teto do Templo é uma representação da abóbada celeste, e como tal, comumente é detalhado com os ornamentos que lembram estrelas, constelações e planetas. O Sol nascente é posicionado na direção leste, acima do local onde se situa o Venerável Mestre, indicando a iluminação necessária para se assumir o cargo. Posicionados acima dos lugares de outros membros estão outros corpos celestes: Lua; estrela de cinco pontas e a constelação de Órion no centro; as Plêiades, Hiades e Aldebarã ao noroeste; Régulo a nordeste; Ursa Maior a norte; Arcturus a noroeste; Spica a leste; e Antares a oeste. Orienta-se que sempre que possível o teto seja abobadado (URBANO JUNIOR, 2016).

24. No leste deve estar situado um triângulo em destaque, denominado Delta Sagrado ou Luminoso. Este remete à estrutura do triângulo equilátero, com seus lados idênticos que indicam equilíbrio e perfeição. Também remete à numerologia simbólica do algarismo três, com suas referências simbólicas anteriormente citadas. O centro do Delta Sagrado pode ser gravado com a letra hebraica IOD (), que representa a primeira letra do nome hebraico de Deus, ou pelo “Olho que Tudo Vê”. É considerado o mais sagrado dentre todos os símbolos presentes no Templo e, por esta razão, nunca é coberto (CASTRO, 1977a).

25. O local onde as autoridades maçônicas se reúnem e localizado no oriente é separado do restante do Templo por uma balaustrada, além de ser elevado. Para o acesso ao oriente é necessário subir degraus, que representam sete virtudes que o Venerável Mestre deve alcançar. Desta forma, é comum afixar placas em cada degrau, sendo a ordem crescente os dizeres Força, Trabalho, Ciência, Virtude, Pureza, Luz e Verdade.

26. O Templo da Loja Renascença n° 3 apresenta todos os componentes anteriormente citados, com componentes ornamentais principalmente em madeira lavorada. Embora possua aberturas nas paredes, estas podem ser veladas por longas cortinas. Apenas o Pavimento Mosaico é feito de mármore e granito, sendo o restante do piso feito de madeira em composição similar ao restante da Loja. Todas as colunas apresentam ordem coríntia, sendo as colunas B e J sem função estrutural. O detalhamento celeste no teto é feito em combinação de astros em alto-relevo afixados e em pintura. Há presença de detalhes em ferro na ornamentação de objetos, principalmente na lâmpada mística e suportes para velas.

Lojas Maçônicas durante o ecletismo em Belém

27. A Loja Renascença n° 3 é situada na travessa Padre Eutíquio, uma das principais vias de Belém, ainda no período colonial, quando assumia caráter rural e afastado do centro da cidade. Com o desenvolvimento do núcleo urbano durante a Belle Époque, tal trecho concentra algumas das edificações mais antigas de Belém, caracterizando o atual entorno do centro histórico da cidade. Grande parte dessas edificações são de cunho residencial, com traços característicos do período eclético (SOARES, 2008). Na travessa Padre Eutíquio estavam localizadas mais três Lojas Maçônicas além da Loja Renascença n° 3, criadas em anos próximos. Tais Lojas foram planejadas para serem órgãos maçônicos e, como tal, seguiram os delineamentos das autoridades maçônicas, apresentando as simbologias citadas no presente trabalho.

28. Na segunda metade do século XIX, impulsionado principalmente pelo advento da exportação da borracha, começa a ser implementado o movimento arquitetônico baseado em características estilísticas europeias clássicas, tomando como base o uso de simetria e proporção, arcadas e frontões, as cinco ordens arquitetônicas principais da tradição greco-romana – dórica, jônica, coríntia, toscana e compósita – além do uso de figuras geométricas simples. Considerando que as principais influências arquitetônicas brasileiras deste período advêm principalmente das culturas francesa, italiana e portuguesa, muitas das construções iniciadas no período da Belle Époque carregam adaptações tardias deste período (FARIA, 2013). Tal movimento é visto em edificações públicas e nas residências, encontradas no eixo de expansão da cidade na travessa São Matheus, que futuramente seria renomeada travessa Padre Eutíquio em homenagem ao padre e maçom Eutíquio Pereira da Rocha.

29. Todas as Lojas localizadas na travessa Padre Eutíquio criadas ao final do século XIX carregam características ecléticas na fachada e ornamentação interna. Pelo fato de a maçonaria procurar demonstrar sua importância na sociedade da época, foram utilizados materiais e ornamentos considerados nobres, com o uso de grades de ferro e piso em ladrilhos hidráulicos decorados. No entanto, o uso de características clássicas conseguiu se agregar perfeitamente à simbologia da maçonaria, como o emprego da simetria, a adoção de colunas gregas e a utilização de frontão triangular ou abatido. Desta forma, o ecletismo conseguiu se moldar adequadamente aos preceitos de delineamento do projeto arquitetônico de Lojas Maçônicas, sem que os fundamentos do estilo arquitetônico ou da simbologia fossem prejudicados.

Considerações finais

30. o Templo maçônico é claramente uma representação do primeiro templo hebreu, destruído pelos babilônios em 586 antes de Cristo. A cultura hebraica é a maior influência na simbologia da Loja Maçônica, visto que as origens filosóficas da maçonaria são baseadas na lenda de Hiram Abiff, o arquiteto do templo de Salomão, e o relato alegórico de sua história é transmitido oralmente dentro da ritualística maçônica. Contudo, outras influências presentes são ligadas à astronomia, filosofia e alquimia. Embora este artigo procure explanar as simbologias principais, outros significados podem estar assimilados aos elementos apresentados, diferindo de acordo com a cultura avaliada. É notável que a adoção estilística eclética por parte das Lojas Maçônicas erigidas a partir da segunda metade do século XIX tenha sido claramente bem adaptada por se utilizar de traços arquitetônicos clássicos, sendo a cultura greco-romana rememorada dentro da filosofia maçônica. Por se tratar de uma ritualística centrada na tradição oral e sabidamente conhecida por manter privacidade de suas cerimônias, muito da simbologia dos elementos maçônicos acaba por ser desconhecida mesmo pelos seus membros. Procuramos, com este trabalho, esclarecer os principais componentes da Loja maçônica, de forma a orientar as comunidades científica e maçônica da importância simbólica e arquitetônica encontrada nestes espaços.

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* Arquiteto e urbanista graduado pela Universidade Federal do Pará.

** Cientista da Religião. Mestrando em Ciências da Religião Pela Universidade do Estado do Pará, Mestre Maçom pela Loja Cândido Marinho da Rocha nº 62, Grande Secretário das Relações Interiores da Grande Loja Maçônica do Estado do Pará.

*** Arquiteto e urbanista. Doutor em Engenharia de Recursos Naturais. Professor Associado I na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará, Pesquisador associado ao Laboratório de Memória e Patrimônio Cultural (LAMEMO) da Universidade Federal do Pará.

**** Arquiteta e urbanista. Doutora em Antropologia, Pós-doutoramento em História da Arte, Pesquisadora PQ 2 CNPq, Coordenadora do Laboratório de Memória e Patrimônio Cultural (LAMEMO) da Universidade Federal do Pará.